Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]

A' Cerca de Coimbra


Quarta-feira, 10.05.23

Coimbra: A arte do ferro forjado 1. História da Escola Livres das Artes do Desenho, parte 1

Iniciamos com esta entrada, uma série de treze, onde transcrevemos o artigo da Doutora Regina Anacleto publicado no volume História, Empresas, Arqueologia Industrial e Museologia, editado pela Universidade de Coimbra em 2021, e destinado a homenagear o Professor Doutor Amado Mendes, após a sua jubilação.

Obra citada.jpg

Op. cit., capa

Trata-se de um artigo de síntese que dá a conhecer a pesquisa efetuada por Regina Anacleto relacionada com Escola Livre das Artes e do Desenho e, neste caso concreto, com a plêiade de artistas que então batiam o ferro e ali foram formados – os ourives do ferro – artistas que colocaram Coimbra no topo da serralharia artística do País.

O artigo constitui um todo, embora seja possível dividi-lo tematicamente, como aqui o tentamos. Dada a sua extensão, poderão vir a ocorrer hiatos na sua sequência.

 

Coimbra, nos finais do século XIX e inícios do XX apenas saía da pacatez que a envolvia quando festejava qualquer santo da sua devoção, quando se realizavam as tradicionais feiras, romarias e festas populares ou quando aqui se deslocavam personalidades, quase sempre, do foro político ou cultural. Nessa ocasião, o quotidiano das gentes do burgo sofria alterações.

Portagem. Locomotiva a atravessar a cidade. 1930 a

Comboio na Portagem

Na urbe, grosso modo, intelectuais e artífices movimentavam-se em quadrantes espaciais diferentes e, enquanto os primeiros, gravitavam em torno da velha alcáçova, os segundos haviam-se instalado preferencialmente na zona baixa, já fora de portas, em ruas estreitas, que se desenrolavam circularmente em torno dos já inexistentes muros, apenas a adivinharem-se no perímetro urbano da cidade. É verdade que na zona da Alta também se encontravam instalados artesãos, mas relacionados, quase sempre, com aspetos culturais; refiram-se, como exemplo, os operários que exerciam a sua atividade nas diversas tipografias ali sediadas.

No entanto, em Coimbra, o desenvolvimento industrial era lento e penoso, até porque se tratava de uma terra quase provinciana, de parcos recursos económicos, onde muito pouco havia para investir.

Cinema Tivoli.jpg

Avenida Navarro, 1.ª metade do sec. XX. Acervo RA

Mesmo assim, nos finais de Oitocentos, existiam na cidade, embora com relevância diversificada, várias fábricas; algumas delas, apesar de apelidadas como tal, não ultrapassavam a dimensão de meras oficinas ou de pequenas unidades fabris.

Recorde-se a sociedade “Aníbal, Lima & Irmãos”, de fiação e tecelagem, fundada em 1887 e que, quando em 1894 instalou no Rego de Benfins, próximo de Coselhas, a Fábrica conimbricense de artefactos de malha introduziu em Coimbra a indústria algodoeira; o grupo altera o pacto social no ano de 1913 e, provavelmente, na sequência, constrói uma nova fábrica na Rua do Gasómetro (atual João Machado), passando a designar-se “Aníbal de Lima & Irmão, L.da”. Encerrou em 1978.

Do outro lado do rio, em Santa Clara, mais concretamente na Rua da Feitoria dos Linhos, localizava-se a Fábrica de sabão, fundada em 1871 por Augusto Luiz Martha, ainda a laborar no ano de 1983 sob a designação de “Augusto Luiz Martha, Sucessores, L.da”.

Fábrica de Sabão A Lusitana conhecida por Martha

Fábrica de sabão “A Lusitana” conhecida por Marthas. Imagem acedida em https://www.google.pt/search?q=augusto+luiz+martha+sucessores+lda&source

... A Fábrica de lanifícios de Santa Clara, instalada no antigo convento de S. Francisco, também na margem esquerda, girando sob o nome de “Peig, Planas & C.ª”, iniciou a sua atividade em 1888; no ano de 1983 ainda se mantinha aberta com o nome de “Clarcoop. Tecidos e confecções”, mas encerrou definitivamente as portas em 1994.

Fábrica de Lanifícios de Santa Clara.jpg

Fábrica de Lanifícios de Santa Clara, vista aérea das instalações

A Cerâmica de Coimbra, L.da, trabalhava o barro, pelo menos desde 1867, num local que se situa entre a Rua Direita, o Quintal do Prior e o Terreiro da Erva.

O Conimbricense, em 1891, referia ainda a existência, em Coimbra, de fábricas de massas, de moagem e de padarias. Seis anos depois, o mesmo periódico informa, especificando-as, que se podem encontrar em Coimbra trinta e uma fábricas.

A fundição e a serralharia apresentavam então um certo desenvolvimento, não só porque existiam estabelecimentos em número considerável, como porque eram credenciados, dado que recebiam “numerosas encomendas para esta cidade, e para fora d’ellla”.

Acerca do assunto, O Conimbricense, em 1891, escrevia: “Da fundição ha em Coimbra os estabelecimentos dos srs: Manoel José da Costa Soares, rua da Sophia. José Alves Coimbra, rua das Solas. E de serralheria temos conhecimento das seguintes officinas: Eduardo & Almeida, rua da Magdalena. Joaquim Diniz de Carvalho, largo da Fornalhinha. Antonio Diniz de Carvalho, rua da Gala. Augusto Diniz de Carvalho, rua das Padeiras. Francisco Marques da Costa, Paço do Conde. José Pedro de Jesus, rua das Solas. José Simões Paes, Ameias. José dos Santos Donato, rua da Moeda. João Lopes Junior, rua da Sophia. José Miguel Cabral, rua Direita. Francisco Nogueira Secco, terreiro da Erva. João Pedro de Jesus, Ameias. Manuel Pedro de Jesus, rua da Magdalena. António Gomes, rua da Moeda. Antonio da Silva Espingarda, rua das Solas. Justiniano Gomes Ferreira, rua de Borges Carneiro. Bento Ferreira, claustro de S. Salvador. José Dias Ferreira, rua dos militares. Também junto á serralheria dos srs. Eduardo & Almeida está a officina de carruagens dos srs. Bento Rocha & C.ª. E o sr. Manoel José da Costa Soares, além da fundição, tem oficinas de carruagens e serralheria, e fabrica de moagens”.

Contudo, penso poder dizer que estas oficinas gravitavam em torno de trabalhos quase sempre relacionados com as necessidades do quotidiano, ou seja, com a lavoura e com os transportes.

 Anacleto, R. A arte do ferro forjado na cidade do Mondego, primeira metade do século XX.  In: História, Empresas, Arqueologia Industrial e Museologia. 2021. Edição Imprensa da Universidade de Coimbra, pg. 259-292.

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Rodrigues Costa às 17:03

Terça-feira, 13.03.18

Coimbra: O Santo Cristo do Arnado

O Professor Doutor Nelson Correia Borges acaba de divulgar este excelente texto sobre o Santo Cristo do Arnado. Consideramos que as informações nele contidas, dada a sua importância, merecem uma mais ampla difusão e não devem ficar confinadas ao círculo restrito dos leitores do jornal onde foi publicado.

Santo Cristo do Arnado.JPG

 Senhor Santo do Arnado. Claustro da Sé-Velha de Coimbra

 

Era um cruzeiro de caminhos, como tantos outros que assinalam a entrada das localidades. Situava-se na antiga entrada de Coimbra, para quem vinha do Norte.

A velha estrada do Porto correspondia à atual rua da Figueira da Foz. Passava à Gafaria de S. Lázaro, fundada e dotada pelo rei D. Sancho I e, antes de chegar à rua da Sofia, aberta por Fr. Brás de Braga para a construção dos colégios universitários, derivava para o lado do rio em terreno de areais que deram o nome ao sítio: Arnado. Foi nos campos do Arnado que o mesmo rei D. Sancho I, ainda infante, fez o seu alardo em 1181, isto é, reuniu os homens de Coimbra que com ele partiram para combater vitoriosamente no Alentejo um rei mouro de Sevilha. O largo ainda hoje mantém aproximadamente o mesmo espaço de outrora. Dele partia uma viela para o porto de Santa Justa, no Mondego, a que corresponde a atual rua do Arnado; uma outra azinhaga, mais a sul, conduzia ao porto dos Cordoeiros. Daqui se entrava na cidade pela rua Direita, uma das mais importantes de Coimbra, onde se estabeleceram violeiros e cordoeiros.

Bem no meio do largo, no século XVI, os frades do convento de S. Domingos, que ficava próximo, erigiram o cruzeiro, cobrindo-o com uma cúpula sobre quatro colunas. Esta solução construtiva ainda hoje se pode ver em Arazede, Assafarge, Pocariça, Ventosa do Bairro, Vila Nova de Anços e em outras povoações da região.

Em 1652, um devoto, de seu nome Gaspar Mendes ou Gaspar dos Reis, decidiu fazer-lhe algumas benfeitorias: ergueu mais o cruzeiro por causa do assoreamento, ou levantando os degraus antigos ou construindo novos degraus; fechou o espaço entre colunas por três lados, colocando no da frente uma grade. Em 12 de Julho de 1655 os padres de Santa Justa-a-Antiga fizeram uma procissão com o Santo Cristo do Arnado até à sua agora capelinha, sinal de que as obras se prolongaram até esta data, tendo sido durante elas a imagem guardada na igreja de que agora só restam vestígios no Terreiro da Erva.

A imagem rapidamente ganhou fama de prodigiosa. Constou-se mesmo que em 1 de agosto de 1722 suara sangue e água, o que gerou grande afluência de devotos. Logo se tratou de ampliar o espaço reduzido que continha o cruzeiro, transformando-o em capela de uma nave com capela-mor, circundada de sacristia e arrumos. As obras começaram em 1723 e terminaram em 1729, sendo, entretanto, benzida em 1727.

A capela do Santo Cristo do Arnado foi demolida pela Câmara nos primeiros decénios do século XX, para obras de urbanização. Há anos atrás, quando se abriram rasgos para colocar o coletor grande da cidade, pudemos ver os seus restos destroçados e recolher um azulejo de fabrico local, para recordação. As lápides com inscrição relatando a história da capela foram recolhidas ao Museu Machado de Castro e o cruzeiro antigo levado para o claustro da Sé Velha, onde se encontra.

O conjunto escultórico, talhado em pedra de Ançã, é impressionante.  A cruz eleva-se sobre uma coluna de fuste liso com capitel coríntio renascentista, tendo no ábaco a cruz de Cristo. Lateralmente colocaram o brasão de armas da Ordem de S. Domingos e na frente as armas reais com uma píxide sobre a coroa. A cruz é de secção retangular e ergue-se sobre uma base de rocha com uma caveira e tíbias cruzadas. A escultura mostra um corpo emaciado, com os sofrimentos da Paixão patentes, o rosto desfalecido e sereno. Não poderia deixar de ter produzido grande impressão e fervor religioso quando se encontrava na sua casa. Se pensarmos que no século XVIII deve ter havido alguma intervenção na imagem, fácil nos é relacioná-la com o Cristo dos Olivais, de autoria comprovada de João de Ruão. Trata-se de uma obra que seguramente teria saído das oficinas do mestre escultor francês.

Recentemente procedeu-se ao arranjo urbanístico do Largo do Arnado. Foi pena não se ter aproveitado o ensejo para ali colocar uma qualquer memória de um culto que foi marcante no passado da cidade e que marcou muitas gerações de conimbricenses. A lendária Cindazunda já tem lugar de maior honra no brasão de Coimbra.

Nelson Correia Borges

 

Correio de Coimbra, n.º 4.683, de 2018.03.08

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Rodrigues Costa às 09:01

Terça-feira, 11.07.17

Coimbra: a evolução da Cidade 1

Edificada numa colina, e cingida pelo forte círculo de altas e espessas muralhas, tendo lá ao cimo a alcáçova real, o castelo onde residia o Alcaide, e o paço do Bispo, a formarem como que os vértices de um triângulo aproximadamente equilátero, a cidade estendia-se pela encosta ocidental do monte quase até ao sopé.

Alta antes das demolições vista aérea.jpg

A alta antes das demolições do séc. XX

Desde o século XII que a população, extravasando-se pela porta ocidental e principal da cidade, situada onde ainda hoje perdura a denominação de «arco de Almedina», fora construir novas habitações pelo arrabalde, umas pertencentes a comunidades religiosas, outras a pessoas leigas. Assim se edificaram grupos de casaria, como que acostados aos templos que aqui se viam erguidos: os de S. Bartolomeu, S. Tiago e Santa Cruz, formando na planície uma linha quase paralela à muralha, e pouco distantes desta; o de Santa Justa (no que é hoje o Terreiro da Erva) um pouco mais afastado para NO, à beira do caminho que conduzia ao campo do Arnado; finalmente o de S. Domingos, fronteira a Santa Justa, junto ao rio, um pouco abaixo do local onde hoje se encontra a estação do caminho-de-ferro (as ruínas estão sob o Hotel Almedina).

Planta da Cidade 1845 2.jpgPlanta da cidade 1845

Próximo das igrejas de S. Bartolomeu e de S. Tiago, é que o casario mais se apinhava, constituindo um bairro bastante populoso.

Como havia a ponte a ligar entre si as duas margens do rio, já as edificações se tinham estendido para a orla esquerda do Mondego, onde se viam, junto deste, a jusante da ponte o convento de S. Francisco (o primitivo, não o atual); a montante o de Santa Ana (cujas ruínas ainda são visíveis na gravura de Baldi), e um pouco mais afastado o grupo de construções incompletas, modestas e acanhadas, do projetado mosteiro clarista de Santa Isabel de Hungria, começado a edificar por D. Mór Diaz, e que fiaria incompleto (posteriormente incorporado no Conventos de Santa Clara-a-Velha).

Coimbra 38 Vista áerea.jpgVista área da Cidade nos inícios do século XX

Ora essa parte baixa ou suburbana, o arrabalde, que se estendia a Oeste e Noroeste de «almedina de Coimbra», tornara-se o bairro mais apreciado e estimado das famílias coimbrãs; para aqui vinham residir aqueles mesmos que possuíam casas velhas, mais ou menos mesquinhas, no bairro alto, e que ficavam em regra abandonadas, por não aparecer quem as alugasse.

Outro facto concorreu para o grande decrescimento da população da «cerca de almedina», ou bairro compreendido dentro das muralhas. Durante os quatro primeiros reinados fora em Coimbra a residência mais aturada dos monarcas, nos paços da alcáçova, que formavam a coroa da cidade; por isso era então lá o bairro nobre, onde preferiram viver com suas famílias os grandes, os fidalgos, os funcionários palatinos. Quando, em tempo de D. Afonso III, Coimbra deixou de ser a sede habitual da corte, a população cortesão abandonou esta cidade, e devem ter-se fechado por isso muitas das casas da almedina.

 

 Vasconcelos, A. 1987. Escritos Vários Relativos à Universidade de Coimbra. Reedição preparada por Manuel Augusto Rodrigues. Volume I e II. Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra, pg. 82-83, do Vol. I

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Rodrigues Costa às 09:26

Segunda-feira, 08.05.17

Coimbra: Santa Comba, uma santa esquecida 1

Contavam as antigas tradições, que a Virgem cristã Comba (Columba-Coomba-Comba), em tempos em que esta região era dominada pelos mouros, fora requestada por um poderoso príncipe crente de Mafoma, a qual, para se escapar às suas ternuras e solicitações, fugira para estes sítios, então ocupados por floresta inextricável, onde conseguiu ocultar-se algum tempo. Descoberta um dia pelo príncipe apaixonado, quando ela ia ao fundo da colina, buscar água à fonte, que ainda hoje se chama da Santa, novas tentativas de sedução a envolveram.

Como fosse inabalável a resistência da donzela a apostar da fé em Cristo, e a romper o seu voto religioso de virgindade, arrastaram-na encosta acima até uma clareira, onde os cristãos haviam erguido uma grande cruz de madeira para aí se reunirem e orarem; nesta cruz a fixaram os do séquito do príncipe, e, assim exposta, foi alvejada com setas, até exalar o último suspiro, invocando, com os olhos no céu, o divino Esposo.

Depois os cristãos tiraram da cruz o corpo da Mártir, e sepultaram-no naquele mesmo local, onde sofrera o martírio, e que ficou a ser muito frequentado de gente piedosa, que vinha junto da sepultura suplicar as intercessões da Santa.

Tempos decorridos, passou Coimbra ao domínio dos cristãos, sendo então construída uma capelinha modesta, da invocação de S." Comba, que ficou a abrigar a sepultura.

Até aqui o que nos dizem as lendas.

Esta capelinha existia, é certo, no século XII ... nos princípios do 2.° quartel daquele século, foram procuradas as relíquias de S.ta Comba na cripta da sua capela, onde a tradição dizia haver sido sepultada. Lá encontraram o esqueleto, que pelos monges da Caridade foi trasladado para a sua igreja de S.ta Justa, de cujas ruínas ainda hoje restam vestígios no local conhecido pela denominação de terreiro da herva.

Decorridos alguns anos, foram as venerandas relíquias segunda vez trasladadas, agora para a igreja de S. João, contígua ao templo de S.ta Cruz.

Ainda há anos se via numa parede da casa, que atualmente está transformada em café ou restaurante, uma lápide com inscrição a designar o local, onde as relíquias estiveram depositadas. Dizia em belos caracteres do século XII, onciais de mistura com capitais: HIC QVIESCVNT OSSA BEATE COLVMBE

Mais tarde, no século XIII, fez-se nova trasladação, desta vez para o templo do mosteiro crúzio, donde vieram a ser cedidas relíquias para algumas igrejas, indo uma relíquia insigne para a Catedral, onde se erigiu um altar na nave da Epístola em honra de S." Comba.

 

Sé Nova St. Comba.jpgPor fim as relíquias restantes da Virgem e Mártir de Coimbra foram recolhidas no Santuário de S.ta Cruz, e ali se guardam.

... Considerava-se S.ta Comba especial advogada contra as maleitas ou sezões, doença que atacava e dizimava os habitantes dos campos do Mondego, então pantanosos e muito insalubres.

Vasconcelos, A. A ermida de Santa Comba. In “Correio de Coimbra”, 227, Coimbra, 1926.09.25.

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Rodrigues Costa às 11:34

Segunda-feira, 16.11.15

Coimbra na Revolução Industrial 1

Coimbra, do ponto de vista dos ideais, das novas correntes estéticas e das ideias políticas, fervilhava, no terceiro quartel do século XIX … Todavia o seu tecido produtivo continuava a ser o artesanal, muito semelhante ao que sempre fora, desde a Idade Média. Mesmo a Fábrica de Sabão, fundada em 1871 por Augusto Luiz Martha, em Santa Clara (nas proximidades da Feitoria dos Linhos e junto ao futuro Portugal dos Pequenitos) não contribuía para alterar o panorama. Com efeito, aquela não passava de uma grande oficina, que produzia sabão manualmente, como aliás continuaria a fazer, durante mais de um século, mesmo após ter instalado a linha de produção automática … nas unidades artesanais conimbricenses produziam-se artigos de primeira necessidade, sobretudo os relativos à alimentação, ao vestuário, ao alojamento e pouco mais. As fontes coevas mencionam, por exemplo: padarias, refinarias de açúcar, pastelarias e confeitarias, unidades de produção de gasosas, trabalhos de construção civil, alfaiatarias e sapatarias, cordoarias e pirotecnia.
Os produtos destinavam-se, fundamentalmente, ao mercado local ou ao autoconsumo.
… Ao aproximar-se o final de Oitocentos, chegam finalmente a Coimbra os primeiros ecos da Revolução Industrial, através da famosa Fábrica de Lanifícios de Santa Clara que, durante cerca de um século, produziu tecidos de lã, de elevada qualidade, que rivalizavam com o que de melhor se fazia no mundo … A fábrica começou a laborar em 1888 … quando foi constituída a firma “Peig, Planas & C.ª” … tendo encerrado no final dos anos de 1980.
… Além dos lanifícios, a têxtil algodoeira foi igualmente uma das indústrias-piloto da primeira fase da industrialização … Foi a firma Aníbal de Lima & Irmão (sociedade em nome coletivo, estabelecida em 1867) que introduziu a indústria de malhas em Coimbra … instalando a respetiva fábrica, sucessivamente, no Largo do Romal … no Rego de Benfins … e finalmente, na Rua do Gasómetro (futura Rua João Machado).
As suas instalações foram edificadas em 1906-1907, onde se manteve em laboração até 1978.
… Também o Banco Comercial de Coimbra … lutou com enormes dificuldades para sobreviver cerca de um quarto de século (1879-1899).
… Indústria igualmente relevante, nesta fase do desenvolvimento industrial, foi a da cerâmica e da porcelana. Também neste domínio Coimbra tinha tradição. A primeira, que remonta à Idade Média, viria a adquirir certo prestígio do século XVIII para o XIX, graças a Brioso e Vandelli. O seu legado, após uma longa interrupção, viria a ser retomado pela Cerâmica Antiga de Coimbra (Quintal do Prior, também conhecido por Terreiro da Erva), em cujo local se trabalhava o barro, pelo menos, desde 1867.
… merecem destaque, em Coimbra:

a) A Cerâmica Limitada, e a instalação da sua Fábrica no Loreto, junto à Estação de Coimbra B (em 1919), ainda recordada pelo painel de azulejos – visível da referida estação … nela chegaram a trabalhar 1.000 operários, tendo encerrado em 1980.
b) Por sua vez, em 1924, a Sociedade de Porcelanas, Ld.ª … introduziu o fabrico de porcelanas em Coimbra…

Mendes, J. A. 1910. Coimbra Rumo à Industrialização. 1888-1926. In Caminhos e Identidades da Modernidade. 1910. O Edifício Chiado em Coimbra. Actas. 1910. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra, pg. 138 a 143

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Rodrigues Costa às 12:35

Quarta-feira, 26.08.15

Coimbra, do Adro de Santa Justa ao Terreiro da Erva

Atualmente, ao pensarmos em Santa Justa de Coimbra, identificamos a igreja setecentista, localizada ao fundo da Rua da Sofia, no alto, precisamente, da Ladeira de Santa Justa. Devemos lembrar-nos, porém, que antes existiu uma igreja românica que resistiu cerca de 600 anos às cheias e enxurradas do Mondego e que representou, nos primeiros séculos da nacionalidade portuguesa, o núcleo central de uma paróquia estruturante para a evolução do urbanismo e para a definição da cidade em que habitamos hoje.

Santa Justa de Coimbra é referida na documentação, desde 1098. Por essa altura, talvez se tratasse ainda de uma herdade rural, na margem do rio, a norte da cidade. Em 1102, a sua igreja foi doada ao priorado Cluniacense de Sainte Marie de la Charité sur Loire, pelo bispo de Coimbra … Em 1139, Santa Justa é referida como sede de uma das paróquias da cidade e assim permaneceu até quase aos nossos dias, quando foi extinta e integrada na paróquia de Santa Cruz. Do ponto de vista material, refira-se que o edifício primitivo foi renovado durante o século XII, estando as suas obras concluídas em 1155 … Localizada no arrabalde Norte da cidade, esta paróquia viu o seu povoamento estender-se ao longo da atual Rua Direita. Território intermédio entre o núcleo urbano e o seu aro rural, foi morada de uma população diversificada, da qual se destacavam os artesãos e os trabalhadores agrícolas. Em meados do século XIV, a paróquia de Santa Justa recebia ainda a Judiaria da cidade (atual Rua Nova) e, mais tarde, reconhecem-se as referências à localização de uma mancebia que não seria longe da Gafaria (leprosaria), também aqui fixada. Porta de saída do núcleo urbano, esta, ao contrário de quase todas as outras paróquias de Coimbra, deteve, durante toda a Idade Média, a capacidade de se expandir territorialmente, e de albergar, no seu interior, aqueles que procurassem esta cidade para sua residência.
… ainda hoje se podem identificar alguns vestígios da igreja românica, num dos edifícios do Terreiro da Erva.

Campos, M. A. A. Terreiro da Erva ou Adro de Santa Justa. Reflexão sobre um espaço urbano e o seu futuro. Acedido em 30.07.2015, em http://cidadaosporcoimbra.pt/2014/11/24/terreiro-da-erva-ou-adro-de-santa-justa-reflexao-sobre-um-espaco-urbano-e-o-seu-futuro.

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Rodrigues Costa às 19:12


Mais sobre mim

foto do autor


Pesquisar

Pesquisar no Blog  

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

calendário

Março 2024

D S T Q Q S S
12
3456789
10111213141516
17181920212223
24252627282930
31

Posts mais comentados