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Nos fins de Março de 1211 Sancho I, na idade ainda robusta de cinquenta e sete anos, cedera ao mal interno que o devorava. Apenas um mês ou pouco mais antes de ir repousar debaixo das abóbadas de Santa Cruz de Coimbra em sono perpétuo, recebia de Roma o arcebispo de Compostela o encargo de desagravar o clero português, com o qual, aliás, o príncipe falecera inteiramente conciliado … Havia dois anos que Sancho não só legara a Inocêncio III cem marcos de ouro no seu testamento, mas aí mesmo lhe rogava que sustentasse e fizesse respeitar as disposições nele contidas … serenados os ódios e restabelecida a paz com os prelados do Porto e de Coimbra, ele a pediu ao papa e, conjuntamente, a da absolvição que obtivera do eleito de Braga pelo arrependimento e penitência dos excessos passados.
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O valor histórico dos vinte e seis anos que durou o reinado do filho de Afonso I não é, porventura menor que o do dilatado governo deste; mas os caracteres das duas épocas são tão diferentes quanto o foram os dotes e os génios dos dois príncipes que presidiram à vida política de cada uma delas. Menos hábil capitão que seu pai … Sancho I ficou mui longe de obter o renome como conquistador … Vingou-se ele, porém, nobremente, trabalhando por adquirir, e merecendo com efeito, apelido de Povoador.
Herculano, A.1987. História de Portugal. Vol. III. Lisboa, Circulo de Leitores, pg. 95 a 97
As dioceses mais importantes da Igreja portuguesa eram nesses tempos (os do reinado de D. Sancho I) Braga, Porto e Coimbra: a primeira, como metropolita da Galiza; a segunda, restaurada havia perto de um século encerrando os distritos mais populosos do país, a terceira, como sendo aquela a que pertencia a capital e dilatando-se até ao Douro por territórios talvez não menos férteis e povoados que o Minho. As sés de Lamego e Viseu, mais circunscritas … sujeitas em boa parte do reinado antecedente aos prelados do Porto e de Coimbra e regidas por delegados deles.
… Entre o rei e o bispo de Coimbra existiam antigos motivos de desgosto, que, segundo parece, tinham já constrangido o bispo a andar exilado largo tempo e que, em parte, eram comuns a todo o clero.
… Se acreditar-mos em todos os pontos de acusação propostos contra o rei, de muitos outros modos mostrava Sancho a sua malevolência para com o sacerdócio. Cada vez que topava com um padre ou monge, dizia ter um encontro de mau agoiro.
… Os ânimos estavam grandemente irritados, e o bispo de Coimbra, movido, talvez por um sentimento de despeito, cometeu a imprudência de escolher semelhante conjuntura para levantar o brado contra o procedimento de Sancho. Rude soldado, não nos deve parecer estranho que fosse crédulo e supersticioso … à suas queixas ajuntou o bispo ordenar a Sancho que afastasse de si a pitonisa … o rei buscou pretexto para romper de todo com o audaz prelado … As casas que aí tinha o cabido foram derribadas, levaram as cavalgaduras aos cónegos e saquearam a igreja. Pôs o bispo interdito na diocese … e interpôs logo apelação para o papa … Sancho aplicou o remédio extremo para tais casos. Substituiu-se ao metropolita e, até, ao papa. Determinou que ninguém respeitasse o interdito, e aos sacerdotes que não obedeceram, isto é, recusaram celebrar os ofícios divinos, privou-os dos seus bens
Herculano, A.1987. História de Portugal. Vol. III. Lisboa, Circulo de Leitores, pg. 88 a 90
Restituído à liberdade (após a prisão resultante do desastre de Badajoz) um dos primeiros cuidados de Afonso I foi armar seu filho cavaleiro, cerimónia celebrada em Coimbra a 15 de Agosto de 1170.
… Nas circunstâncias em que se achava o rei de Portugal a cerimónia celebrada em Coimbra era apenas o prelúdio de resolução mais ponderosa. Fundador de uma nova dinastia, no meio de sociedade igualmente nova, nada mais natural do que conceber Afonso I a necessidade de ir habituando, não só os súbditos, mas também os estranhos a considerarem Sancho como rei, antes que a morte viesse, por assim dizer, produzir uma solução de continuidade entre o pai e o filho e, portanto, na monarquia.
… Em Portugal, não havia instituições particulares que determinassem a sucessão … Não faltava naquela época nem audácia, nem ambição, e a morte do primeiro rei dos portugueses podia produzir sérias perturbações, ou geradas no próprio país ou trazidas de fora … Estas considerações ou outras semelhantes moveram provavelmente Afonso I a associar seu filho ao governo, não por um ato formal, de que não temos notícia, mas dando-lhe larga mão no regimento do estado, principalmente em matérias de guerra.
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Três dias apenas eram passados desde que Afonso I falecera quando seu filho, que estava longe da corte do velho monarca, chegou a Coimbra para subir definitivamente ao trono que ele firmara à custa de tantas fadigas.
Herculano, A.1987. História de Portugal. Vol. II e III. Lisboa, Circulo de Leitores, pg. 186 e 187, e pg. 9
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