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O exercício de uma profissão “arte ou ofício mecânico” exigia um período de aprendizagem prolongado ficando o aprendiz a viver com o mestre. Colaborava em todas as atividades de fabrico na oficina sem auferir salário, até estar apto a realizar a sua obra-prima.
Esse objeto era submetido à apreciação dos juízes do ofício eleitos entre os mestres. O certificado, “carta de examinação e aprovação”, era a condição para poder montar oficina própria. Após o seu registo na Câmara, obtinha-se licença para ter “loja aberta”.
O fabrico e a qualidade dos produtos eram rigorosamente controlados pelas Corporações dos Ofícios, através de um regulamento específico designado por Regimento... encontram-se no AHMC alguns exemplares de Regimentos: dos sombreireiros (séc. XVI), dos Sirgueiros (1582), dos Alfaiates (1596), dos Caldeireiros (1600), dos Cordoeiros (1659), etc.
Os ofícios agrupavam-se por afinidades profissionais escolhendo um santo protetor comum para a bandeira da sua corporação, daí a designação de embandeirados. Cada um desses doze conjuntos embandeirados elegia dois representantes, constituindo a Casa dos Vinte e Quatro dos Mesteres de Coimbra. Desta instituição saía o Juiz do Povo e os Misteres da Mesa que assistiam às reuniões da Câmara. A sua existência está bem documentada para o século XVII, e seguintes possuindo as atas das suas reuniões.
... O arruamento dos mesteres, medida controladora da produção e da concorrência desleal, em Coimbra deixou os seus vestígios na toponímia da cidade, embora não tenha sido observado com tanto rigor como noutras cidades. Ainda é possível encontrar, atualmente, as Ruas dos Oleiros, da Louça, das Padeiras, dos Sapateiros, em zonas onde outrora se fixaram estas profissões.
Outros ofícios localizavam-se em áreas outrora desertas e hoje densamente urbanizadas... Esse é o caso dos fogueteiros que no séc. XVIII se sediavam fora de portas entre a Ladeira da Forca e a Ponte de Água de Maias. É também o exemplo dos Cordoeiros que naquela mesma época possuíam as suas oficinas nos terrenos baldios que iam da Capela de Nosso Senhor do Arnado (entretanto demolida) até ao rio, pela atual Avenida Fernão de Magalhães.
... Entre a documentação compulsada ... surgiram várias referências a Mulheres no exercício dos seus ofícios ... Num breve levantamento encontramo-las a exercer os ofícios mais diversos, desde os que tradicionalmente estão associados à condição feminina e às artes domésticas como parteira, lavadeira, tecedeira, alfaiata, padeira, forneira, etc. como noutros mais invulgares em que partilham o universo masculino. É o caso da profissão de Algebrista, antepassada do endireita e do moderno ortopedista, definida como o ofício de “consertar brasos e pernas e outros quaisquer membros desmanados e bem assi para curar feridas simplises, chaguas, apestemas, entrasas leves que não forem de má qualidade”.
Nota: A Ladeira da Forca é hoje designada, a meu ver mal, por Escadas de Santa Justa; a Ponte de Água de Maias refere-se à ponte que existiu onde agora está a Rotunda da Casa do Sal.
França, P. 1997. Catálogo. Exposição Artes & Ofícios de Outras Eras. 27 Set. a 17 Out.1997. Coimbra, Arquivo Histórico Municipal de Coimbra, Trabalho fotocopiado, pg. 2-4.
As posturas do município não obrigavam os ofícios mecânicos a arruamentos. Mas disciplinavam, em nome do bem público, a localização de certas atividades. … Sendo o produtor ao mesmo tempo vendedor, os mesteres não deixariam de disputar os sítios mais favoráveis ao desenvolvimento económico … Livreiros e impressores, alfaiates, sapateiros, taberneiros e recoveiros, contam-se entre a população da Alta que contribuiu para as fintas das sisas. Os livreiros deviam ter subido a colina depois de 1567. Com efeito, no livro das sisas deste ano, é possível identificar seis. Mas cinco pertencem à freguesia de Santiago. Dos catorze livreiros conhecidos em 1613, moravam 9 em S. Cristóvão e apenas três em Santiago.
… Pelas freguesias da Baixa distribuía-se a maior parte do artesanato e da riqueza que lhe podia estar associada. Mais de três quartos dos ofícios mecânicos identificados em 1567 situavam-se nesta zona. Em 1617 pertenciam-lhe pelo menos 74%. A freguesia de Santa Cruz detinha o maior número de unidades artesanais. Seguiam-se-lhe Santiago, S. Bartolomeu (mesmo excluindo Santa Clara) e Santa Justa.
Os sapateiros e oleiros predominavam em Santa Cruz, os alfaiates e ourives em Santiago. Os cordoeiros sobressaíam em Santa Justa. Em S. Bartolomeu salientavam-se os sombreireiros, sapateiros e barqueiros.
Dentro das paróquias havia locais onde eram (ou foram) exercidos, predominantemente, certos ofícios, como deixam transparecer os topónimos Terreiro das Tanoarias, Terreiro das Olarias e ruas das Solas, dos Sombreireiros, dos Sapateiros, dos Toalheiros … A «nobreza» da Rua de Coruche ou da Calçada, por exemplo, não deixará de andar associada, certamente, aos mercadores, merceeiros ou ourives.
… Nos dias de trabalho as oficinas abriam cedo e fechavam tarde: laboravam, por certo, de manhã cedo até ao cair da noite, de sol a sol. Às sete horas, no tempo da Quaresma, as lojas já estavam abertas. E a esta hora deviam os tabeliães das notas estar na casa da Praça para atender o público. Era a hora normal de iniciar o trabalho ou o estudo … As aulas em Coimbra, pelo menos nos Estudo Menores, começavam às oito horas no Inverno e às sete no Verão.
Oliveira, A. 1971. A Vida Económica e Social de Coimbra de 1537 a 1640. Primeira Parte. Volume I. Coimbra, Universidade de Coimbra, pg. 362 a 364
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