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Dos festejos dos Carnaval de 1854 e dos incidentes então ocorridos, existem, como refere a publicação do Arquivo Histórico Municipal de Coimbra a que aludimos na entrada anterior, outras narrativas menos jocosas, mas mais rigorosas e minuciosas.
Tanto esta entrada, como as outras duas que se lhe seguem, servem-se da informação saída da pena de Joaquim Martins de Carvalho.
Joaquim Martins de Carvalho. Imagem acedida em: https://arepublicano.blogspot.com/2018/09/joaquim-martins-de-carvalho-1822-1898.html
Pelo entrudo de 1854 houve em Coimbra alguns acontecimentos muito deploráveis. Essas tristes ocorrências eram tanto mais para lamentar, quanto todas as pessoas prudentes reconhecem, que muito convém que entre os habitantes desta cidade e a academia reine a harmonia mais cordial.
Nos dias do carnaval os académicos entregavam-se aos costumados folguedos dos mais anos, arremessando ovos às pessoas que das janelas das suas casas presenciavam as mascaradas que transitavam pelas ruas. Aos habitantes da cidade desagradava este género de divertimento pelo incómodo e prejuízos que lhes causavam.
No domingo gordo, 26 de fevereiro, houve por tal motivo principio de desordem na praça de S. Bartolomeu, pelo que o prelado da Universidade, o sr. conselheiro José Manuel de Lemos, atual bispo de Coimbra, deliberou mandar rondar de dia, na segunda feira, pelas ruas da cidade, os empregados de policia académica, recomendando-lhes que usassem de todos os meios suaves e persuasivos para evitar as cenas do dia anterior.
Praça de S. Bartolomeu, hoje Praça do Comércio. Inícios do séc. XX. Col. RA
Os desejos do prelado foram em parte atendidos, dando-se, contudo, nesse dia a circunstância de ser a ronda académica recebida por alguns estudantes com vozerias e apupos.
Á noite um grupo numeroso de estudantes percorreu as ruas da cidade, dando vivas á independência académica e gritos contra os archeiros. Chegando as coisas a este estado, entenderam as autoridades que convinha como medida preventiva distribuir a pequena guarnição militar pelos principais pontos da cidade, a fim de acudir a qualquer conflito que pudesse aparecer, visto que os habitantes mostravam desagradar-lhes o procedimento dos estudantes.
Largo de Sansão, hoje Praça 8 de Maio. Desenho de José Carlos Magne. In: Monumentos, 25, p. 147. Praça de Sansão, 1796.
Ás três horas da tarde desse dia uma mascarada dava no largo de Sansão uma corrida de touros em caricatura. Estavam algumas famílias ás suas janelas, e nessa ocasião dos grupos dos estudantes partiram ovos para várias casas. Daí resultou que um individuo clamasse contra os estudantes, e, insistindo estes, arremessou-lhes da varanda uma panela de barro, não resultando, contudo, daí nenhum mal para ninguém. Os estudantes julgaram-se ofendidos por tal motivo; e os habitantes da cidade, pela maior parte artistas, que presenciavam o espetáculo na rua, tomaram logo um aspeto ameaçador, e daí resultou travar-se entre uns e outros altercação, que redundou prontamente em vias de facto.
Por maiores que fossem os esforços que algumas pessoas empregaram para apaziguar a desordem, o conflito continuou, as portas e janelas fecharam-se, e o terror espalhou-se por toda a cidade. Acudiu então o posto militar da antiga porta fidalga de Santa Cruz, que foi envolvido pela multidão, e não pode empregar a força para restabelecer a ordem.
Imagem onde são visíveis as portarias do Mosteiro.Pormenor do desenho de José Carlos Magne. In: Monumentos, 25, p. 147. Praça de Sansão, 1796.
Apareceu pouco depois o governador civil, que então era o sr. conselheiro António Luiz de Sousa Henriques Seco. S. Ex.ª empregando todos os esforços, conseguiu restabelecer a ordem naquele ponto, tranquilizando-se os paisanos, retirando-se os académicos para a Calçada, e entrando em formatura os soldados que tinham ali acorrido.
A desordem agravou-se de novo, quando pouco depois correram da Calçada a Sansão muitos estudantes, bradando vingança contra os paisanos. O tumulto prolongou-se logo pela rua da Sofia, a despeito dos gritos de ordem que soavam por parte das autoridades e outras pessoas.
A força militar do posto de Santa Cruz, vendo que o tumulto tomava um aspeto medonho, correu a marche-marche pela rua da Sofia, para separar os grupos dos tumultuários. Fazendo, porém, alto, foi logo envolvida pelos académicos.
Neste momento chegou o resto da guarnição disponível, que com a que estava não chegaria a 50 praças, e formou toda em linha. Conseguiu-se finalmente apaziguar a desordem na Sofia e Sansão pelos esforços do administrador do concelho, bacharel António dos Santos Pereira Jardim, e outras pessoas de influência que ali estavam, empregando-se particularmente o meio de mandar recolher os paisanos a suas casas, e dirigir para a Calçada os estudantes.
Parecia terminada a desordem, da qual tinham resultado alguns ferimentos, posto que leves; mas os estudantes, reunindo-se novamente na Calçada, continuavam a agredir os paisanos, deixando-se arrastar pela excitação, e não cedendo aos conselhos de algumas pessoas, entre as quais se contavam vários académicos, que tratavam de restabelecer o sossego.
Foi ainda necessário que o sr. governador civil marchasse com a força toda para a Calçada, para onde tinha já ido o sr. administrador do concelho, achando-se também aí o sr. presidente da camara, dr. Cesário Augusto de Azevedo Pereira, Aires Tavares Cabral, e outras pessoas, que tentavam dispersar os estudantes antes da chegada da tropa. Junto desta tinha o sr. governador civil exigido que marchassem também dois bedéis e alguns archeiros, a fim de reconhecer os estudantes que "estavam envolvidos na desordem”.
Logo que apareceu a tropa na Calçada, o ajuntamento académico, que estava defronte do Arco de Almedina, começou a gritar — fora os soldados! As pessoas empenhadas na pacificação correram para os soldados, rogando que se retirassem: e daí resultou que, aproximando-se os tumultuados da tropa, esta calou instintivamente baioneta, mas sem avançar, retida pelas instâncias do sr. governador civil, a fim de evitar derramamento de sangue; e pela mesma razão a fez recuar para o principio da rua do Coruche.
Alguns estudantes bateram então palmas, e a esta demonstração parou a tropa, por ordem do sr. Governador civil, para não ser exautorada a força publica.
Graças aos esforços pacificadores o tumulto dissipou-se, recolhendo a tropa a quartéis.
Carvalho, J. M. Graves conflitos em Coimbra pelo entrudo de 1854. In: Apontamentos para a História Contemporânea, 1868: Coimbra, Imprensa da Universidade, pp. 241-248. Acedido em: https://drive.google.com/file/d/1v-_FRydFPXvB6h6mwq3J2w75ylFmkMsd/view?fbclid=IwAR3I0Zqi_2y3soFLcZe6r5fLsX-Q2qn4McLYJbRj10EtL39pkTqs53l7Oys.
Continuando a debruçar-nos sobre a obra Coimbra e a República. Da propaganda à proclamação, de Carlos Santarém Andrade, abordaremos de seguida o último capítulo, dedicado à Proclamação da República em Coimbra. Primeira parte.
No dia 4 de Outubro, o jornal "Defeza", de Coimbra, dá-nos uma curta, embora destacada, notícia sob o título "Revolução em Lisboa?", sem adiantar desenvolvimentos.
"A Tribuna", do dia 5, dá mais pormenores, no artigo "A revolução de Lisboa", sobre os sucessos na capital, descrevendo vários episódios da luta travada no dia anterior, mas cujo desfecho era ainda desconhecido. Sobre o assassínio de Miguel Bombarda, no dia 3, por um dos seus doentes do foro psiquiátrico, tenente do exército, informa-nos ser o seu autor natural de Coimbra, onde fez os Preparatórios para a Escola do Exército, tendo prestado serviço como alferes no Regimento de Infantaria 23, aquartelado nesta cidade. Sem conhecimento do rumo dos acontecimentos, os republicanos viveram horas de angústia e ansiedade, decidindo enviar a Lisboa um emissário para se inteirar do que se passava.
Jornal “Defeza”, de Coimbra. Op. cit., pg. 147
No dia 5, à noite, corre em Coimbra que a República fora proclamada, o que provoca que, na Praça do Comércio (onde se situava o Centro José Falcão) se juntasse muita gente. E quando, cerca das 3 horas da manhã do dia 6 de Outubro, um emissário do governo republicano, entretanto formado, confirma a proclamação da República, há grandes manifestações de regozijo, acompanhadas do lançamento de foguetes, sendo arvorada no edifício da Câmara e na Universidade a bandeira republicana, como nos informa o "Notícias de Coimbra", do dia 8 de Outubro. O mesmo jornal descreve que "a filarmónica «Boa União» toca a «Portugueza», formando-se um cortejo em direcção ao Governo Civil, aonde se encontra já o novo Governador Sr. Dr. Fernandes Costa".
O alferes medico sr. João Augusto Ornellas, falando ao povo das janellas da Camara de Coimbra, após a notificação da proclamação da Republica. In: Illustracção Portugueza, II-1910, n.º 224, Lisboa, 1910.10.24, p.539.
Dr. Fernandes Costa. 1.º Governador Civil de Coimbra após a implantação da República-Op- cit., pg. 148
Na sede do Governo Civil (então, na Rua Larga, onde hoje se encontra a Faculdade de Medicina) a passagem do testemunho do até então governador, Dr. José Jardim, faz-se com toda a urbanidade, sendo mesmo cumprimentado à saída do edifício. O extenso cortejo regressa à Baixa, ao som de vivas à Liberdade e à República, terminando na Praça do Comércio, cerca do meio-dia.
À uma da tarde desse dia 6 de Outubro estava prevista a proclamação da República nos Paços do Concelho. E essa tem lugar perante o Dr. Fernandes Costa e a vereação que até aí gerira o município, e que então pede a demissão. Como informa o mesmo jornal, no Salão Nobre completamente cheio, "esta cerimónia termina por constantes vivas à Pátria, a Portugal, ao exército e armada e à República, no meio do maior e mais indiscritível entusiasmo", que acrescenta: "Duas bandas de música, a «Boa União» e a «Conimbricense», tocam em frente, no largo, formando-se, em seguida novo cortejo, composto por milhares de pessoas que percorre, com as duas filarmónicas, várias ruas da cidade".
O povo depois do discurso do sr. João Ornellas a caminho do quartel de infantaria 23. In: Illustracção Portugueza, II-1910, n.º 224, Lisboa, 1910.10.24, p.539.
Auto da Proclamação da República em Coimbra em 6 de Outubro de 1910. Op. cit., pg. 150
Também o quartel do Regimento de Infantaria 23, então na Rua da Sofia, pelas quatro da tarde, se associa à proclamação, hasteando no seu mastro a bandeira do novo regime. Momento registado pelo referido periódico: "Há então um indiscritível entusiasmo, a que se associam os soldados, erguendo vivas à República e confraternizando com o povo. Ouvem-se pouco depois os primeiros acordes da «Portugueza»”. É a banda militar que a toca. Novas manifestações, igualmente calorosas, se ouvem, com vivas ao exército e à armada". À noite seriam iluminados os edifícios públicos e mesmo casas particulares, percorrendo as ruas da cidade grupos de populares em marchas «aux flambeaux». No dia seguinte novas manifestações de alegria teriam lugar em vários pontos de Coimbra.
Uma nota muito curiosa é-nos ainda revelada pelo jornal: "É agora cumprida a disposição testamentária do falecido Dr. Inácio Roxanes, em virtude da qual, no dia da implantação da República, devia ser distribuída a quantia de 100$000 réis pelos pobres da freguesia de Santa Cruz, desta cidade. O respectivo testamenteiro anda cumprindo já a referida disposição".
Andrade, C.S. Coimbra e a República. Da propaganda à proclamação. 2022. Coimbra, Edição Lápis da Memória.
A obra que hoje divulgamos ressalta de um estudo académico que se debruça sobre a vida do Hospital e Asilo da Ordem Terceira, atualmente Lar de Idosos, no período balizado entre 1851 e 1926, e que nos permite um conhecimento da realidade daquela Instituição.
No edifício, que se encontra adstrito à igreja de Nossa Senhora do Carmo, funcionou o Colégio dos Carmelitas Calçados, um dos vários colégios universitários da Rua da Sofia e que já tivemos ocasião de abordar neste blog.
Do referido trabalho académico transcrevemos o que se segue.
Imagem da capa da obra citada
A Venerável Ordem Terceira da Penitência de S. Francisco de Coimbra foi fundada a 5 de janeiro de 1659 como pessoa moral canonicamente ereta, no convento de S. Francisco da Ponte, com a prática dos seus exercícios espirituais na capela colateral da parte do Evangelho da igreja do referido convento.
Desde cedo promoveu a assistência espiritual e material aos seus membros, com o acompanhamento à sepultura e a atribuição de esmolas, por exemplo. O Hospital e Asilo, fundados respetivamente em 1851 e 1884, são a prova maior da assistência material prestada aos membros da Ordem Terceira de Coimbra, que desta forma garantiu o socorro na doença e na velhice aos irmãos franciscanos seculares conimbricenses.
Igreja do Carmo, claustro. Imagem acedida em https://www.cm-coimbra.pt/areas/visitar/ver-e-fazer/roteiros-tematicos/coimbra-patrimonio-mundial#&gid=1&pid=29
Alcançado o edifício do extinto colégio dos Carmelitas Calçados, na rua da Sofia, em 1841, após a extinção das ordens religiosas masculinas, a preocupação dos diversos Definitórios foi garantir rendimentos que suportassem as obras de adaptação do imóvel às novas funções assistenciais; para isso, contaram com o apoio financeiro de ministros, benfeitores, irmãs e irmãos seculares.
… Na segunda metade do século XIX, aquando da fundação do hospital (1851) e asilo (1884) da Venerável Ordem Terceira, existiam na cidade de Coimbra, a Misericórdia, os Hospitais da Universidade de Coimbra, o Hospício dos Abandonados, o Asilo da Infância Desvalida e o Asilo de Mendicidade, para além das inúmeras confrarias espalhadas pela cidade.
…Pensado no ano de 1831, em sessão de 15 de Maio, e sob proposta do então ministro, o beneficiado Manuel José Ferreira, só com a doação do edifício do extinto Colégio do Carmo, na rua da Sofia, pela carta de lei de 23 de Abril de 1845, o Hospital da Venerável Ordem Terceira da Penitência de São Francisco de Coimbra teve um espaço para a sua fundação … Abriu portas, pela primeira vez, a 14 de maio de 1852 e deu-se ao hospital da Ordem o título de “Hospital de Nossa Senhora da Conceição” para aquiescer ao pedido do benfeitor Sebastião José de Carvalho.
… Anos depois, em abril de 1860, foi apresentada uma representação aos Deputados da Nação, pelo ministro conselheiro José Maria de Abreu, que visava obter a cerca do extinto Colégio do Carmo e um quintal junto à Casa do Noviciado, onde os doentes poderiam fazer os seus passeios higiénicos ... O pedido foi atendido e a cerca foi concedida por Carta de Lei de 11 de agosto de 1860.
Igreja do Carmo, painel de azulejos no claustro. Imagem acedida em https://ordemterceirasaofrancisco.pt/portfolio-item/colegioeigrejadocarmo/
… A fundação do asilo, em 1884, também só foi possível graças à herança legada ao Hospital pelo benfeitor e antigo ministro José Maria de Abreu (1857-1860) no valor de 6.715.870 réis. Com este legado, que aumentava bastante o capital destinado às despesas do hospital, seria possível, “muito em harmonia com a intenção do benfeitor”, criar uma enfermaria destinada aos irmãos inválidos … O Asilo foi inaugurado a 8 de junho de 1884, dia da Santíssima Trindade.
Silva, A. M. D. O Hospital e Asilo da Venerável Ordem Terceira da Penitência de S. Francisco de Coimbra (1851-1926). Dissertação de Mestrado em História, apresentada na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. 2014. Coimbra, Universidade de Coimbra, acedida em
Está a decorrer um conjunto de visitas guiadas à Igreja de Nossa Senhora da Graça que habitualmente está encerrada, só abrindo para as Celebrações Eucarísticas.
Estão ainda livres as seguintes datas: 3.ªs feiras, dias 7 e 14 de setembro; 5.ªs feiras, dias 2 e 9 de setembro; e sábados, dias 4 e 11 de setembro.
As visitas decorrem em dois horários, às 11h00 e às 15h00 e implicam a prévia inscrição para o telemóvel 924 448 266.
Folheto de divulgação
Realizamos ontem esta visita. Foi tempo bem empregue, foi a possibilidade de melhor conhecer uma das igrejas da Rua da Sofia, todas elas tão pouco conhecidas.
Igreja de Nossa Senhora da Graça, exterior
Igreja de Nossa Senhora da Graça, interior
Trata-se de uma igreja bela na sua sobriedade e despojamento, enriquecido que por retábulos de belo efeito,
Igreja de Nossa Senhora da Graça, Capela-mor
Igreja de Nossa Senhora da Graça, Retábulo do Senhor dos Passos. Foto Nelson Correia Borges
Quer, ainda, pela estatuária ali existente.
Imagem de Nossa Senhora da Graça
Imagem de S. Agostinho
Uma visita que se recomenda, enriquecida pelo trabalho bem informado e simpático da Guia,
Rodrigues Costa
Ao longo do texto de Carneiro da Silva As Estalagens Coimbrãs e do seu termo, para além das três estalagens mencionadas na entrada anterior, são ainda referidas:
- Estalagem de Santa Clara, primeira
… nas reuniões da Câmara de 22 de julho de 1642 e na de julho de 1644, se discutiram os problemas que o estalajadeiro … criava na sua «Estalagem de Santa Clara» … por estar notificado não usasse de venda nem de agasalho pessoa alguma em sua casa, de «mau viver», e ele fazia o contrário.
- Estalagem de Santa Clara, segunda
Panorâmica do bairro de Santa Clara. Notar a estrada para Lisboa, e no extremo esquerdo da gravura [não identificada] o que foi segunda estalagem de Santa Clara
Em 1674, Cosme Francisco Guimarães, morador em Sansão, pagava o foro de 200 reis de explorar aquela estalagem no Rossio de Santa Clara [a qual fora construída] «para substituir outras que se tinham arruinado com as cheias perto da ponte.»
- Estalagem na Rua da Sofia
Na passagem do século XVI existiu na Rua da Sofia, na vizinhança da entrada da Rua Nova [uma estalagem que] Diogo Marmeleiro de Noronha … fizera … para agasalho dos passageiros e caminhantes com muito gasalhos e camaras fechadas para fidalgos e pessoas graves.
- Estalagem da Quinta da Portela
Em 16 de Dezembro de 1624 «Diogo Marmeleiro de Noronha me enviou dizer por sua petição que ele queria fazer junto à sua Quinta e lugar da Portela uma estalagem que seria de grande comodidade dos passageiros que caminhavam por aquela estrada que era das mais seguidas da dita cidade por ser a de Madrid e por naquela paragem passar uma barca o rio Mondego, que quando no inverno com alguma cheia não podia passar a dita barca, e os que então caminhavam ficavam dormindo pelos pés das árvores sem terem nenhum agasalho pelo que me pedia lhe fizesse mercê de lhe privilegiar a dita estalagem e mandar passar seu privilégio».
Para além destas surgem, ainda, as seguintes outras referências a estalagens:
- Estalagem das Cardosas
No Paço do Conde … onde hoje está [esteve] uma casa de brinquedos, e onde serviu uma Mariana que há muito deve atender os viandantes do céu.
- Estalagem do Lopes ou Hospedaria do Caes Novo
Situava-se nas imediações do atual Banco de Portugal, visto que tinha outra entrada pela Rua do Sargento-Mor, e ter particularidade de ser pouso de estudantes endinheirados, acabados de chegar, até se mudarem para o seu território da Alta.
Na parte final do texto o Autor refere ainda que Camilo esteve hospedado na «Marquinhas do Leite Morno», na Rua Larga … e que pelos séculos XVII, XVIII e XIX existiram no burgo as estalagens «do Galego» … do «Fernando» mais conhecida pela «Estalagem do Inferno» a do «Raimundo da Teodora» … a do «Francisco Lopes de Carvalho», próximo da ponte, e a hospedaria do «João de Aveiro» que um incêndio destruiu em 1902.
Aqui e ali, muitas vezes nas proximidades das estalagens, existiam também as «albergarias».
Silva, A.C. As Estalagens Coimbrãs e do seu termo. Separata da Munda. 1988.
«Por 1850, Coimbra continuava ainda o velho burgo académico, iluminando-se a candeeiros de azeite, sem águas canalizadas, nem esgotos, nem vias férreas, nem estradas, nem escolas, dormitando letargicamente à sombra da Universidade e restabelecendo-se penosamente e com lentidão do enorme abalo sofrido com a extinção das congregações religiosas que mantinham aqui nada menos de 7 mosteiros e 22 colégios».
Assim escreve José Pinto Loureiro, em 1937, no preâmbulo dos «Anais do Município de Coimbra».
… Eram de facto estas as características da vida urbana. Mas Coimbra não era exceção nem caso isolado. Era a regra. Durante a primeira metade de oitocentos muitas cidades portuguesas e mesmo a capital do reino encontravam-se, quanto ao desenvolvimento urbano, tal como as da grande maioria dos países europeus, expectantes.
Cidade de Coimbra. Pinho Henriques. Séc. XIX
… A construção das infraestruturas é um tema caro às politicas liberais. Como resultado destas iniciativas, a partir da segunda metade do século, Coimbra ganha outro protagonismo dentro da rede urbana nacional. A mala-posta, em 1855, servindo-se de uma estrutura viária renovada, volta a ligar a cidade ao Carregado, retomando-se um serviço de transporte rápido e regular. Mas o tempo de comunicação da informação ainda mais se encurta quando, em 1856, no mesmo ano em que a cidade se ilumina a gás, se inaugura o telégrafo elétrico entre Lisboa e Coimbra, e depois Porto, anunciando a chegada do comboio. No entanto, é apenas em 1864 que a cidade passa a integrar a rede ferroviária com a inauguração do troço entre Taveiro e Vila Nova de Gaia, completando-se a linha do norte. Paralelamente a administração pública municipal vai-se modernizando, de acordo com a lei de 25 de novembro de 1854, reduzindo em número as freguesias e regularizando as suas fronteiras.
Criaram-se, assim, as condições para a implementação dos melhoramentos necessários a Coimbra.
Projecto para instalação de canos de abastecimento à cadeia da Portagem. Joaquim José de Miranda. Séc. XIX
Projecto da estrada entre as ruas da Calçada e da Sofia. João Ribeiro da Silva. 1857
Ponte de Santa Clara
…Como parte do programa de regularização e subida da cota dos cais incluiu-se o redesenho do largo da Portagem e a construção de uma nova ponte. O largo ganhou uma dimensão moderna como entrada urbana e como rótula de distribuição viária, depois de vagas de demolições e obras de regularização. A ponte construiu-se em ferro, no ano de 1875, depois da demolição da antiga ponde de pedra, em 1873,
…. Pela nova ponte continuou a conduzir-se o tráfego que ligava, pelo litoral, o norte ao sul do país, cruzando o largo da Portagem e percorrendo as ruas até Santa Cruz, e daí até à saída pela rua da Sofia, prolongada na rua Fora de Portas. Era este o caminho urbano da estrada real na ligação de Lisboa ao Porto e por aqui passavam as carruagens ao serviço da mala-posta.
Macedo, M.C. Coimbra na segunda metade do século XIX. In: Evolução do Espaço físico de Coimbra. Exposição. 2006. Câmara Municipal de Coimbra. Pg. 43-64.
Pela Senhora Dr.ª Paula França, responsável pelo Arquivo Histórico do Município de Coimbra, fui alertado para a possibilidade de descarregar, na página da Torre do Tombo, as plantas do edifício onde funcionou, em Coimbra, a Inquisição.
As plantas integram o livro datado de 1634, com um longo título, como era costume na época, Livro das Plantas e Monteas de todas as Fabricas das inquisições deste Reino … por Matheus do Couto, Arquitecto das Inquisições deste Reino.
Dado o interesse dos documentos disponibilizados não resisti ao desejo de aqui os divulgar.
Declaração das traças da Inquisição da cidade de Coimbra
Planta 1.ª da Inquisição de Coimbra
Planta do andar dos carceres altos
Planta do andar dos inquisidores e oficiais
Planta do 1.º sobrado dos inquisidores e oficiais
Na mesma página é ainda possível aceder ao texto de documentos relacionados com as obras realizadas nestes edifícios. Apresentamos o seguinte exemplo
Sr.
Os Inquisidores de Coimbra escreveram a esta Conselho que era necessário concertaren se as casas em que pousa o Inquisidor Jeronjmo Teixeira porque estavam muito damnificadas e que se podia fazer de despesa nellas trinta e cinco mil reis.
Pareceo que devia Vossa Alteza ser servjdo mandar passar provisam pêra o thesoureiro da dita Inquisiçam dar dinhejro pera esta obra nam passando dos trin[ta] e cinco mil reis em Lisboa 18 de Fevereiro de 95. Bispo d Elvas - Diogo de Sousa-Marcos Teixeira
Felipe Tertio depois de fazer a traça dos cárceres desta Inquisiçam que mandamos a Vossa Alteza considerando mjlhor nesta obra ordenou outra traça milhor e mais accomodada como elle mostra por razões que vão em hum papel com a dita traça mas pêra poder aver effecto he necessário tomarem se vinte e quatro palmos da Rua a qual ainda fica com largura de quarenta e cinco que he asaz bastante por he Rua por onde passa muito pouca gente e nam se faz prejuizo a ninguém com tomarem della estes 24 palmos de Rua. Nicolao de Frias também está inclinado a esta traça e tem a cargo fazer outra mas como tem muitas occupações he mais vagaroso. Como a der feita a copiaremos a Vossa Alteza. Em Lisboa 28 de Janeiro de [15]95.
O Bispo d Elvas presidente disse a Salvador de Mesquita da parte de Vossa Alteza que se fizesse a [...?] passado este mês e elle respondeo que faria o que Vossa Alteza lhe mandava. Bispo d Elvas - Diogo de Sousa -Marcos Teixeira
À margem:
No he respondido a esta consulta ate gora por esperar a poder conferir esta traça de Felipe Tertio de que aqui se trata com a de Nicolao de Frias que agora se me há embiado y aun que no viene parecer del consejo sobre qual parece mas conveniente (como holgara se me dieram) dire lo que acerca dellas me parece y es que quanto al sitio que se deve de tomar della calle, me parece que se deve de siguir la traça de Phelipe Tercio y en lo demas la de Nicolao de Frias que com reduzir los corredores de la traça de Nicolao de Frias que son de ocho y diez pees o palmos a cinco que es la hanhura que les da Phelipe Tercio y parece bastante si viene reduzir toda misma cosa y el corredor que Nicolao de Frias pone entre los aposentos de los presos está aly mejor que en pátio adonde le pone Felipe Tercio asi pêra el serviço ordinárjo comopera servjr de vigias (como ahy se llamam) y asi se deve de tornar a ver todo esto en el consejo y na[m] sse offrecendo acerca dello algum inconveniente de consideracion dar ordem como se he ja conforme a ello la fabrica y quanto ao sitio que se há de tomar de la calle me parece que es lo mejor tratar com la câmara dessa ciudad y si fuere necesarjo comprar se les y asi parece que pêra esto es menos ter que entervenga la authorjdade de los governadores tambien se podra acudir a pedir se la y avisar do que se fuere haziendo em todo.
Acedido em 2018.10.11, em https://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=2318907
Um leitor deste blogue – que não se identificou – colocou-me a seguinte questão: Um meu tio-avô, enquanto esteve a estudar na UC em 1890-91, viveu na R. da Sofia, n.º 70. Sabe-me dizer se se tratava de algum antigo colégio?
A resposta que lhe posso dar – muito atrasada no tempo, por lapso meu – passa pela afirmativa.
Com efeito, tratava-se do Colégio de S. Miguel que pertencia ao Mosteiro de Santa Cruz e se situava na Rua da Sofia. Ainda sem se encontrar terminado, em 1547, D. João III requisitou o edifício para ali poder instalar o recém-criado Colégio das Artes até que o edifício próprio, em fase de construção na Alta da Cidade, estivesse concluído.
Este imóvel, embora modificado, ainda existe na atualidade e nele, bem como no Colégio de S. Jerónimo que lhe ficava contíguo, funcionou, até 1986, ano em que se transferiu para as novas instalações erguidas lá para as bandas de Celas, o Hospital da Universidade de Coimbra.
O edifício do Colégio de S. Miguel, bem como o vizinho edifício do Colégio de Todos os Santos, no ano de 1566 foram entregues à Inquisição que, para os adaptar aos lamentáveis objetivos da instituição, os transfigurou, levando a cabo obras vultuosas. Mas disso falaremos na próxima entrada.
Para obter mais esclarecimentos sugiro a leitura das entradas aqui publicadas com os títulos:
- Coimbra: A Inquisição e as suas instalações 1 e 2;
- Coimbra: Rua da Sofia e os seus colégios 4
Não posso deixar de se referir um pormenor curioso.
No último andar do edifício número 70 da Rua da Sofia
Edifício da Inquisição frente Sofia
existe esta varanda:
Gradeamento da varanda
No Pátio da Inquisição está o seguinte edifício
Edifício da Inquisição frente pátio
E nele existe esta varanda
Gradeamento da varanda
Como se pode constatar as guardas das varandas são em tudo similares. Pertenciam ao edifício principal da Inquisição que tinha a frente voltada para o chamado Pátio da Inquisição e as traseiras para a Rua da Sofia.
A obra de maior impacto na beneficiação da cidade era, sem dúvida, a construção do cais ao longo do rio, com vista a proteger a Baixa das invasões do Mondego. Implicava obras de alteamento e regularização do cais das Ameias e a construção de um paredão que conseguisse limitar as cheias do rio, além de permitir dispor de um amplo e aprazível passeio público à beira rio.
Melhoramento reclamado desde o seculo XVIII, “presentemente desejaõ muitos, e requerem, que por todo o comprimento da Cidade, e ainda mais adiante se levante alto muro, o qual defenda das inundações todas as ruas baixas” foi sendo sucessivamente adiado, até que em junho de 1837 começaram timidamente as obras do aterro do Cais das Ameias, provavelmente sem um plano devidamente delineado que quatro anos depois, foi alargado até à ponte.
Efetivamente, só em agosto de 1856 foram decretadas as obras do encanamento do rio desde a ponte de Coimbra até ao mar encarregando o Diretor de Obras do Mondego de elaborar o respetivo projeto, apresentado só em 1872. Segundo conseguimos apurar, as obras de alteamento efetuadas entre 1837 e 1872 revelaram-se ineficazes para conter as cheias, em grande parte pela carência de meios financeiros, mas também técnicos, criando mesmo sérios problemas de salubridade pela entrada da água do rio na canalização do esgoto da cidade. Reclamava-se também o imprescindível alteamento da velha ponte, processo iniciado em 1859 e decretado pela Carte de Lei de 10 de setembro de 1861, mas que permaneceu até 1873 em estudo.
Margem do rio entre o Largo das Ameias e a ponte, visível as escadas para o largo já alteado, c. 1860
A par da regularização do Cais das Ameias … em 1835 o município apontava também a necessidade do alargamento da Rua de Coruche. Com efeito, depois de ter estudado e orçado as obras de regularização da rua da Calçada que ligava a ponte à Rua de Coruche e que pretendia iniciar a breve prazo, instava para que o Governo participasse no alargamento desta última rua alegando que; “Além de central a toda a Cidade, serve demais ao transito de todo Norte do Reino para a Capital, e acha-se tão disforme, que apezar de não ser muito longa, tem tortuosidades em varias direcções, que impedem a vista de uma extremidade à outra, e é sobre tudo tão estreita, que em quasi toda ella não pode passar um Cavalleiro apar d’um carro: e em consequência é sempre húmida, e doentia, e que apenas em alguns pontos lhe penetrão os raios do sól em certos momentos ficando o resto inteiramente inacessível: de sorte q estabelecendo-se deligencias entre Porto e Lisboa virão encontrar um grandíssimo obstáculo no meio da terceira Cidade do reino, por que dificilmente lhes dará passagem! Esta obra tão necessária como útil para o aformoseamento da Cidade, viria a fazer a rua o centro de commercio, e certamente é esta epoca em que mais afoitamentese devera empreender por que há um recurso para a indemnização do alojmento interino dos seus moradores, nos extintos Collegios da rua da Sofia, que pela maior parte não acharão compradores.”
Planta com a indicação dos melhoramentos almejados: regularização das margens, alargamento da Rua de Coruche, calcetamento da Rua da Calçada e Nova Ponte
As obras de regularização dos passeios da Rua da Calçada iniciaram-se no ano seguinte
Calmeiro, M.I.B.R. 2014. Urbanismo antes dos Planos: Coimbra 1834-1924. Vol. I. Tese de doutoramento em Arquitetura, apresentada à Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, pg. 202-207
O Professor Doutor Nelson Correia Borges acaba de divulgar este excelente texto sobre o Santo Cristo do Arnado. Consideramos que as informações nele contidas, dada a sua importância, merecem uma mais ampla difusão e não devem ficar confinadas ao círculo restrito dos leitores do jornal onde foi publicado.
Senhor Santo do Arnado. Claustro da Sé-Velha de Coimbra
Era um cruzeiro de caminhos, como tantos outros que assinalam a entrada das localidades. Situava-se na antiga entrada de Coimbra, para quem vinha do Norte.
A velha estrada do Porto correspondia à atual rua da Figueira da Foz. Passava à Gafaria de S. Lázaro, fundada e dotada pelo rei D. Sancho I e, antes de chegar à rua da Sofia, aberta por Fr. Brás de Braga para a construção dos colégios universitários, derivava para o lado do rio em terreno de areais que deram o nome ao sítio: Arnado. Foi nos campos do Arnado que o mesmo rei D. Sancho I, ainda infante, fez o seu alardo em 1181, isto é, reuniu os homens de Coimbra que com ele partiram para combater vitoriosamente no Alentejo um rei mouro de Sevilha. O largo ainda hoje mantém aproximadamente o mesmo espaço de outrora. Dele partia uma viela para o porto de Santa Justa, no Mondego, a que corresponde a atual rua do Arnado; uma outra azinhaga, mais a sul, conduzia ao porto dos Cordoeiros. Daqui se entrava na cidade pela rua Direita, uma das mais importantes de Coimbra, onde se estabeleceram violeiros e cordoeiros.
Bem no meio do largo, no século XVI, os frades do convento de S. Domingos, que ficava próximo, erigiram o cruzeiro, cobrindo-o com uma cúpula sobre quatro colunas. Esta solução construtiva ainda hoje se pode ver em Arazede, Assafarge, Pocariça, Ventosa do Bairro, Vila Nova de Anços e em outras povoações da região.
Em 1652, um devoto, de seu nome Gaspar Mendes ou Gaspar dos Reis, decidiu fazer-lhe algumas benfeitorias: ergueu mais o cruzeiro por causa do assoreamento, ou levantando os degraus antigos ou construindo novos degraus; fechou o espaço entre colunas por três lados, colocando no da frente uma grade. Em 12 de Julho de 1655 os padres de Santa Justa-a-Antiga fizeram uma procissão com o Santo Cristo do Arnado até à sua agora capelinha, sinal de que as obras se prolongaram até esta data, tendo sido durante elas a imagem guardada na igreja de que agora só restam vestígios no Terreiro da Erva.
A imagem rapidamente ganhou fama de prodigiosa. Constou-se mesmo que em 1 de agosto de 1722 suara sangue e água, o que gerou grande afluência de devotos. Logo se tratou de ampliar o espaço reduzido que continha o cruzeiro, transformando-o em capela de uma nave com capela-mor, circundada de sacristia e arrumos. As obras começaram em 1723 e terminaram em 1729, sendo, entretanto, benzida em 1727.
A capela do Santo Cristo do Arnado foi demolida pela Câmara nos primeiros decénios do século XX, para obras de urbanização. Há anos atrás, quando se abriram rasgos para colocar o coletor grande da cidade, pudemos ver os seus restos destroçados e recolher um azulejo de fabrico local, para recordação. As lápides com inscrição relatando a história da capela foram recolhidas ao Museu Machado de Castro e o cruzeiro antigo levado para o claustro da Sé Velha, onde se encontra.
O conjunto escultórico, talhado em pedra de Ançã, é impressionante. A cruz eleva-se sobre uma coluna de fuste liso com capitel coríntio renascentista, tendo no ábaco a cruz de Cristo. Lateralmente colocaram o brasão de armas da Ordem de S. Domingos e na frente as armas reais com uma píxide sobre a coroa. A cruz é de secção retangular e ergue-se sobre uma base de rocha com uma caveira e tíbias cruzadas. A escultura mostra um corpo emaciado, com os sofrimentos da Paixão patentes, o rosto desfalecido e sereno. Não poderia deixar de ter produzido grande impressão e fervor religioso quando se encontrava na sua casa. Se pensarmos que no século XVIII deve ter havido alguma intervenção na imagem, fácil nos é relacioná-la com o Cristo dos Olivais, de autoria comprovada de João de Ruão. Trata-se de uma obra que seguramente teria saído das oficinas do mestre escultor francês.
Recentemente procedeu-se ao arranjo urbanístico do Largo do Arnado. Foi pena não se ter aproveitado o ensejo para ali colocar uma qualquer memória de um culto que foi marcante no passado da cidade e que marcou muitas gerações de conimbricenses. A lendária Cindazunda já tem lugar de maior honra no brasão de Coimbra.
Nelson Correia Borges
Correio de Coimbra, n.º 4.683, de 2018.03.08
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