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A' Cerca de Coimbra


Terça-feira, 10.12.24

Coimbra: Cristianização de Coimbra e do seu aro 1

Na série de entradas que agora iniciamos, iremos abordar um trabalho de Augusto Filipe Simões (1835-1884), intitulado Relíquias da Arquitectura Romano-Bysantina em Portugal e Particularmente em Coimbra.

Reliquias. capa.jpgOp. Cit., capa

Reliquias. augustofilipesimoes-2.jpgAugusto Filipe Simões. Imagem acedida em: https://www.bing.com/images/searchview=detailV2&ccid=71m%2FVdQs&idFbad.pt%2Fwpcontent%2Fuploads%2F2023%2F09%2Faugustofilipesimoes

Utilizando uma linguagem romântica própria da sua época, em 6 de junho de 1870, o autor dedica o referido livro “À Cidade de Coimbra”, acrescentando que o mesma ilustra uma das épocas mais remotas e obscuras da sua história; persuade com as provas irrefragáveis, deduzidas do adiantamento das artes, que serviu de berço á civilização portuguesa; patenteia, enfim, que esses homens esforçados, que alevantaram o glorioso edifício da independência nacional, foram, a vários respeitos, muito menos bárbaros que certos apologistas do presente, que assim os reputam.

Inicia a obra com uma longa Introdução, na qual procura explicar o enquadramento histórico da evolução arquitetónica religiosa até ao século XI, no espaço que hoje é Portugal.

Dedica o Capítulo I a Coimbra que analisa até ao final dos séc. XII. No primeiro tema «A imperfeição da arquitetura cristã … o templo … o conimbricense até ao século XI», destaca a relevância atribuída a D. Sesnando, referido como o «povoador e edificador». Dessa parte inicial transcrevemos os primeiros parágrafos.

Raiou muito cedo na cidade de Coimbra a luz do cristianismo. Seus bispos autênticos principiam a ser conhecidos no meado do século VI; já, porém, antecedentemente tinha Sé anexa à de Mérida.

Nessa antiguidade tão remota diminutíssimo deveria ser o número das igrejas pertencentes á diocese conimbricense.

Primeiro que a nova religião se fortalecesse, teve de sustentar porfiosas lutas, resistindo á violência com que reciprocamente se combatiam os povos bárbaros, afrontando suas seitas e heresias, conquistando, enfim, palmo a palmo, o terreno, onde por tantos séculos obtiveram culto geral os deuses dos romanos.

No Capítulo II aborda, especificamente, as igrejas de S. Tiago, de S. Salvador e de S. Cristóvão, textos que serão objeto de entradas próprias, tal como acontecerá com o Capítulo seguinte, dedicado unicamente à Sé Velha de Coimbra.

A problemática das edificações religiosas do norte do País, consequentemente já fora da área de Coimbra, é estudada no Capítulo IV.

Em nota de rodapé à transcrição que acima fazemos de parte do Capítulo I, seja-nos permitido acrescentar, a fim de exemplificar o que seria a religiosidade dos povos então a integrar o aro de Coimbra antes da emergência do cristianismo, um pequeno excerto da nossa publicação, Murtede. O concelho que foi, a freguesia que é.

Referimo-nos, especificamente, à descoberta, em 1957, junto à igreja de Murtede (atualmente uma freguesia do concelho de Cantanhede), de uma ara erigida por Caius Fabius, consagrada a Tadudicus, divindade lusitano-romana.

Reliquia. ara votiva. Imagem cedida por José Enca

Trata-se de uma ara votiva erigida por aquele cidadão romano, descrita por José Rodrigues como sendo uma coluna de 80 cm. de altura, de base quadrada e fuste cilíndrico cingido a meio, por uma grinalda airosamente esculpida, que apresenta a seguinte inscrição:

TADVDICO

FABIVS VIATOR

LA DD

O Doutor José d’Encarnação apresentou a seguinte leitura da epígrafe:

A Tadudico.

O viajante Caius Fabius

Consagra fervorosamente ao Deus Senhor

O mesmo Autor explica, ainda, que se trata de um interessante monumento religioso mandado erigir por um cidadão romano desta região que metido em aventurosa viagem fez um voto à divindade venerada na sua terra, para o caso de sair são e salvo.

Acrescentamos, como refere a Professora Doutora Regina Anacleto, que, frequentemente, as igrejas primitivas cristãs eram edificadas em locais onde, anteriormente, já era praticado algum tipo de culto.

Terá sido esse fator que interferiu na localização das igrejas primitivas de Coimbra?

Rodrigues Costa

Simões, A. F. Relíquias da Arquitectura Romano-Bysantina em Portugal e Particularmente em Coimbra. 1870. Typographia Portugueza, Lisboa.

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por Rodrigues Costa às 11:05

Quinta-feira, 03.10.24

Coimbra: Regina Anacleto, um exemplo e um orgulho para a Cidade

Conheci Regina Anacleto nos idos dos anos 80, do século passado, quando, após a feliz iniciativa do Dr. Mendes Silva – a Operação Chiado – o edifício passou à posse do Município e me coube, por força das funções então desempenhadas, ser o responsável pelo programa de animação daquele novo espaço municipal.

Um dos primeiros problemas a resolver decorreu do exagerado número de propostas de exposições destinadas a ali serem apresentadas. A conjuntura tornou evidente a necessidade de nos socorrermos de pessoas competentes, capazes de colmatar as insuficiências que sentíamos, a fim de elaborar um programa de eventos adequados à Cidade e ao espaço.

Neste contexto, entre outros, solicitamos ajuda ao Instituto de História da Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra que designou a então assistente estagiária Regina Anacleto para desempenhar essa função. A sua boa vontade e empenho rapidamente se manifestaram.

Voltei a reencontrar a então já Professora Regina Anacleto, quando deixei de lecionar na Universidade Lusófona e regressei definitivamente a Coimbra, dedicando-me, a partir de 11 de maio de 2015, à criação e manutenção do blogue “A’Cerca de Coimbra”, onde a sua ajuda tem funcionado, ao longo do tempo, e sempre que solicitada, como suporte.

RA 1. Regina Anacleto.jpgProfessora Doutora Regina Anacleto

Numa viagem a Espanha, planejada por um grupo de amigos, tive ocasião de me aperceber da estima que esta investigadora portuguesa ali soubera granjear.

A obra ora publicada em Salvador da Bahia, Gabinete Português de Leitura. 160 anos de história evidencia que a autora é também reconhecida no País Irmão.

Tanto a Universidade, como a cidade de Coimbra, terra que adotou como sua, se podem sentir agradadas por esta publicação, no Brasil, pela Editora Quarteto/Gabinete Português de Leitura e que vem juntar-se à sua bibliografia.

RA 5. Capa.jpgOp. cit., capa

No livro, ora colocado em letra de forma, a autora debruça-se, assentando numa investigação profunda baseada na documentação existente, sobre a história da instituição desde o momento fundacional (1863) até à inauguração do edifício-sede (1918). Procura, ainda que de forma sucinta, explicar as razões do surgimento da arquitetura neomanuelina em Terras de Santa Cruz, a origem e a difusão dos chamados “Cabinets de Lecture”, bem como os motivos do surto migratório português em direção àquela então Colónia. Termina com uma minuciosa cronologia relacionada com o edifício estudado e com imagens fotográficas ilustrativas.

RA 2. Estátua. Camões.jpgEstátua de Camões executada pelo escultor italiano Bellando Bellandi. Op. cit., pg. 153

RA 3. Patamar 02.jpg

Painel frontal das escadas com quadros pintados por Carlo de Servi. Op. cit., pg. 156

RA 4- Salão nobre 01.jpg

Salão nobre (vista parcial). Op. cit., pg. 162

Refira-se que, aos 82 anos, viu reconhecido o trabalho realizado ao longo da vida, ao ser nomeada, pelos seus pares, Académica de Mérito da Academia Portuguesa da História.

Apesar de limitada pela idade, continua, na medida do possível, a investigar e a escrever, como o comprova o livro aqui citado.

Respigamos desse livro o que se encontra escrito nas badanas.

(…) Como quer que fosse, em Terras de Santa Cruz, simultaneamente com médicos, advogados e jornalistas, conviviam também roceiros e negociantes, que sentiam a necessidade de se juntar, a fim de mitigar as saudades da pátria, de manter e ampliar uma cultura eminentemente nacional e de socorrer os compatriotas menos protegidos.

Foi para responder a estes anseios que nasceu a ideia de fundar associações onde, se, por um lado, concretizaram tantas e tão admiráveis iniciativas de benemerência, por outro lado, consubstanciaram, através de uma ação espiritual notável, o prestígio da cultura; em suma, conseguiram afirmar aquilo a que, genericamente, era hábito chamar de “virtudes lusas”. Assim nasceram os gabinetes de leitura.

“(…) Como acontecia um pouco por todo o ‘continente’ (os brasileiros, por vezes, quando se referem ao seu país, apelidam-no assim), também aqui, na primeira capital de Terras de Santa Cruz, os imigrantes lusos se agruparam e fundaram associações com carater beneficente, cultural ou lúdico.

Em S. Salvador, nos meados de oitocentos, já existia uma coletividade que se ajustava ao primeiro cenário apontado, ou seja, ao filantrópico. Com efeito, no dia 1 de janeiro de 1857, tendo como objetivo assistirem aos emigrantes lusitanos radicados em terras salvadorenhas, “por iniciativa do estimado português Marco José dos Santos”, foi fundada a Sociedade Portuguesa Dezasseis de Setembro, assim denominada pelo facto de o monarca português, D. Pedro V, festejar o seu aniversário nessa data.

A 3 de setembro de 1857 formou-se a Sociedade Portuguesa de Beneficência.

As duas instituições, numa assembleia geral realizada a 14 de julho de 1858, presidida pelo “pai do heroico Serpa Pinto”, Dr. José da Rocha Figueiredo, resolveram unificar-se e passarem a girar sob o nome de Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezasseis de Setembro.

(…) Urgia o aparecimento de uma outra que abarcasse a componente cultural.

A fim de responder a este requisito, um conjunto de portugueses com “prestigio e acendrado patriotismo”, reuniu-se a 2 de março de 1863, justamente na sala das sessões da Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezasseis de Setembro e resolveu “unanimemente instalar [naquela] cidade [de Salvador] uma sociedade literária com o nome de Gabinete Português de Leitura”.

 Anacleto, R. Gabinete português de leitura de Salvador da Bahia. Capa e ilustrações de Abel Travassos. 2024. Salvador Bahia, edição do Gabinete Português de Leitura de Salvador.

 

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por Rodrigues Costa às 15:37

Quarta-feira, 02.10.24

Monumento a Monsenhor Augusto Nunes Pereira, uma dívida que Coimbra quer pagar

Augusto Nunes Pereira – o sacerdote e o artista – é uma figura incontornável da Coimbra da segunda metade do século XX.

NP final 1.jpgNunes Pereira. Desenho F. Pimentel /78

Quem teve a felicidade de conviver com ele guarda na memória a sua bondade e alegria de viver, o sorriso acolhedor e a arte que o levava a desenhar compulsivamente tudo quanto via.

Arte polifacetada, assente num trabalho continuo desenvolvido até ao último dia de vida e que passou por diversas técnicas, com particular destaque para o vitral e para a gravura em madeira.

O Museu Nunes Pereira que, no Seminário Maior de Coimbra, se encontra instalado no local da sua última oficina, é um espaço que os conimbricenses deviam conhecer e do qual se deviam orgulhar.

 

O projeto da construção de um monumento, em Coimbra, a lembrar Monsenhor Nunes Pereira surgiu a 25 de março de 2022, no âmbito do ciclo de palestras designado por Conversas Abertas, promovido pelo blogue “A´Cerca de Coimbra”, com o apoio do Arquivo da Universidade de Coimbra e do Clube de Comunicação Social.

Naquela data foi abordado o tema Mons. Nunes Pereira. O homem, o sacerdote e o artista, sendo palestrantes as Senhoras Dr.as Virgínia Gomes (Técnica Superior responsável pelas coleções de Pintura, Desenho e Gravura do Museu Nacional de Machado de Castro) e Cidália Maria dos Santos (Curadora do Museu Nunes Pereira).

No âmbito desta Conversa Aberta, o Arq.º António José Monteiro e o artista plástico José Maria Pimentel, apresentaram um projeto destinado a servir de base para a construção de um monumento dedicado a Monsenhor Nunes Pereira, que deveria ser instalado em Coimbra, junto da rua com o seu nome, e que, gratuitamente, ofereceram à Cidade.

Proposta que mereceu o apoio e o empenho de todos, o que levou à constituição informal de um Grupo de Cidadãos, para dar sequência à mesma.

Seguiram-se meses de diligências que culminaram no dia 5 de julho de 2023, com a realização, nos Paços do Concelho, de uma reunião na qual participaram, em representação do Executivo Municipal, o Eng.º Nelson Cruz e o Dr. Pedro Peixoto, respetivamente Chefe do Gabinete do Presidente da Câmara e Assessor do mesmo Gabinete e os técnicos do Município Dr.ª Maria Carlos, Diretora do Departamento de Cultura e Dr.ª Elisabete Carvalho, Chefe de Divisão do mesmo Departamento e o Arq.º José Filipe Martins, Chefe da Divisão de Projetos. Em representação do Grupo de Cidadãos participaram a Arq.ª Isabel Anjinho, a Dr.ª Cidália Maria dos Santos e o signatário.

Dessa reunião resultou um acordo, assente nas seguintes bases:

- O monumento seria restringido à imagem de Monsenhor Nunes Pereira, comprometendo-se os Autores a apresentar, para além do material já entregue, o projeto estrutural do monumento a construir;

- O local exato da sua instalação seria definido numa visita noturna à zona, com representantes de ambas as partes;

- A oferta feita à Cidade restringir-se-ia ao projeto do monumento em si.

Este acordo veio, posteriormente a ser assumido pelo Executivo Camarário, em reunião pública, na qual foi autorizada a construção do mesmo.

NP final 2.jpg

Proposta de arte urbana. Monsenhor Nunes Pereira. Autores: José Maria Pimentel, António Monteiro, João Paulo Neves. 1

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Proposta de arte urbana. Monsenhor Nunes Pereira. Autores: José Maria Pimentel, António Monteiro, João Paulo Neves. 2

NP final 4.jpg

Proposta de arte urbana. Monsenhor Nunes Pereira. Autores: José Maria Pimentel, António Monteiro, João Paulo Neves. 3

De seguida o Grupo de Cidadãos empenhou-se em encontrar uma entidade que, no âmbito do mecenato cultural, custeasse a construção do monumento. Depois de algumas promessas não cumpridas, acabou por se concluir pela incapacidade de conseguir tal ajuda.

A situação veio a ser desbloqueada, graças ao empenho – há que o assinalar – do assessor da Presidência da Câmara Municipal, Dr. Pedro Peixoto, que conseguiu reunir as condições necessárias para que, no passado dia 2 de setembro, pudesse informar o Grupo de Cidadãos de que havia sido inscrito, no projeto de Orçamento do Município para 2025, a verba de 20.000 € destinada à construção do monumento.

Na sequência, foi marcada para o dia 2 de outubro próximo, às 15h00, uma audiência do Grupo de Cidadãos com o Senhor Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, para formalizar a entrega à Cidade do projeto do monumento a Mons. Nunes Pereira.

No decurso da referida reunião o Presidente do Executivo informou que iria apresentar, em próxima reunião do Executivo, uma proposta no sentido de o Município assumir a construção do monumento.

 

Ao chegar ao termo de um caminho, o Grupo de Cidadãos que se empenharam neste processo, tornam público o seu agradecimento:

- Ao autor da peça escultórica, o artista plástico José Maria Pimentel e aos coautores da estrutura física de suporte, arquitetos António José Monteiro e João Paulo Neves, não só pela generosidade da oferta, mas essencialmente por terem sabido entender a justeza da homenagem que a mesma consubstancia;

- À Câmara Municipal de Coimbra por assumir uma dívida que Coimbra tinha para com Mons. Augusto Nunes Pereira;

- A todos quantos, por qualquer forma, contribuíram para a viabilização deste projeto.

 

O Grupo de Cidadãos,

Ana Maria Bandeira

Armando Braga da Cruz

Cidália Maria dos Santos

Isabel Anjinho

Nuno dos Santos

Regina Anacleto

Rodrigues da Costa

Pimentel, J.M., Monteiro, A., Neves, J.P. Proposta de arte urbana. Monsenhor Nunes Pereira. 2024. Coimbra, trabalho dos Autores

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por Rodrigues Costa às 18:08

Quinta-feira, 04.01.24

Coimbra: Milésima entrada do blogue A’Cerca de Coimbra

A fim de assinalar a milésima entrada do blogue “A’Cerca de Coimbra”, entendemos, em jeito de balanço, solicitar a alguns dos qualificados leitores habituais, um breve comentário sobre o caminho já percorrido.

Pela nossa parte comprometemo-nos a prosseguir o trabalho encetado, enquanto a saúde nos permitir, embora admitamos introduzir alguns ajustamentos que se considerem pertinentes.

Aos Autores dos comentários, apresentados por ordem alfabética, simplesmente, o nosso muito obrigado.  

Rodrigues Costa

 

António Cabral de Oliveira

Cabral de Oliveira a.jpg

Faz anos que sou frequentador assíduo, sempre com renovado interesse e o maior provento, de A’Cerca de Coimbra, o blog de Rodrigues Costa que, com coerência e determinação, tanto tem contribuído para o aprofundamento dos saberes sobre esta cidade – e seu termo –, também para um maior enraizamento do que alguns, poucos, ainda chamam, imagine-se, de orgulho coimbrão.

A ele recorro, sistematicamente, precioso auxiliar numa vida dedicada ao jornalismo, sobretudo de proximidade, para fonte confiável, não raro inspiradora, esclarecer dúvidas, ganhar conhecimentos, melhor me entrosar na realidade histórica e quotidiana de Coimbra.

A quem goste de Coimbra, de conhecer mais intrinsecamente a sua cidade, recomendo, como leitura obrigatória, uma circunstanciada e permanente consulta do blog. É indizível, em verdade, o quanto se aprende, o tanto que havia – há sempre – ainda por descobrir.

Gosto de visitar o site. Só lhe falta, mas talvez um dia, sistematizadamente, o alcance, o toque que a materialidade do papel propicia, aquele resto de cheiro a tinta que nos arrebata no livro.

Dispensado de encómios pessoais – em nome da consideração, respeito e amizade que há décadas nos une –, obriga-me, contudo, uma palavra de grande elogio, na simplicidade que só poucos alcançam, ao trabalho desenvolvido, persistência da regularidade, à excelência alcançada.

Por ocasião da entrada milésima, parabéns, Rodrigues Costa, pelo empenhamento e persistência afirmados. E, permitindo-me falar não apenas a título pessoal, um bem-hajas por mais um serviço, enorme – se isto não é servir Coimbra, não sei, então, o que o será – à cidade que nos enleva.

Longa vida – queira Deus – para nossa inteira vantagem pessoal, essencialmente enquanto inquebrantável esteio na defesa dos superiores anseios de Coimbra, ao A’Cerca de Coimbra.

António Cabral de Oliveira

 

Carlos Ferrão

CF a.jpg

Promover a Cultura é um desafio interminável, que convoca o melhor da inteligência humana a surpreender-se sobre o passado, agir no presente e preparar-se para o futuro.

Durante séculos o mais importante veículo de disseminação da cultura escrita, era o papel em livros, revistas, jornais ou panfletos. O seu uso foi posto em causa durante muito tempo e com o início da era digital, "a morte do papel" tornou-se um conceito plausível de ser discutido por vários teóricos e especialistas, trazendo novos domínios vantajosos, como a mobilidade, a pesquisa, a edição e a partilha.

Com a utilização maciça do computador, o uso do papel não foi totalmente suplantado, mas surgiram espaços próprios e originais para a escrita e apareceram novas ou diferentes convenções do texto que revolucionaram a própria escrita.

A escrita eletrónica e o texto digital parecem potenciar, de facto, a diferenciação de géneros e audiências. No atual contexto de publicação, estão contemplados os textos digitais, os websites, os chats, as redes sociais e em particular os blogs.

Os blogs passaram a ser o “coração” de uma estratégia em ambiente web, uma vez que, dirigidos a audiências especificas e segmentadas, alimentam as redes sociais e permitem a interação entre o editor e o leitor.

Aqui chegados, escolhida a ferramenta para criar e editar e a plataforma de alojamento, o blog “A’ Cerca de Coimbra”, faz o seu primeiro “post” em 15 de Maio de 2015, para um amplo projeto de partilha cultural.

Apoiado na História, na Sociologia ou a Antropologia, e focado no património material e imaterial faz despertar a atenção dos leitores para a enorme e rica herança cultural que a cidade possui, e passou a ser um espaço de excelência onde se procura, ou conquista o saber em conteúdos de qualidade e consistência e onde se encontra uma porta aberta para opinar.

“A’ Cerca de Coimbra”, regista neste mês de dezembro a sua 1000ª entrada. Não pode deixar-se passar em claro este tão relevante facto, e destacar o seu importante papel na transmissão de conhecimento que a partir de um enorme trabalho continuo de investigação, enriqueceu e continua a enriquecer a comunidade.

Parabéns ao Dr. Rodrigues Costa, fundador e editor do blog “A’ Cerca de Coimbra”, pelo empenho e por esta importante conquista que alcançou e faz acreditar que no mundo virtual, esta é uma forma real e transparente do que deve ser a divulgação da cultura.

Venham mais 1000, 2000 ou 3000 “postagens”!

Carlos Ferrão

 

Isabel Anjinho

FotoIAnjinho BlogueACerca a.jpg

Numa época em que todos fazem blogues, mesmo que sejam “blogues acerca de nada”, como pude constatar recentemente, é justíssimo enaltecer e falar um pouco sobre o blogue A’Cerca de Coimbra, iniciado em Maio de 2015, na sua milésima entrada.

Mas, em primeiro lugar, uma palavra sobre o seu autor, António Rodrigues Costa, que me honra com o tratamento por “Filha”, de que já não prescindo. Homem de convicções, “salatina” de gema, na sua modéstia pouco fala sobre os altos cargos que desempenhou na Câmara Municipal de Coimbra, nomeadamente de Vereador e Director de Cultura. Durante a sua passagem pela Praça 8 de Maio, um dos legados que nos tentou deixar e que, infelizmente, os que o seguiram não entenderam manter, foi o saudoso Museu dos Transportes Urbanos de Coimbra. E talvez tenha sido a sensação de um trabalho não reconhecido, nem na sua maioria continuado e até mesmo por vezes deliberadamente escondido, que o levou a encetar este magnífico blogue sobre a história de Coimbra. Nesta empreitada, a que se propôs, esteve apoiado pelos Amigos de sempre, Regina Anacleto e Nelson Correia Borges (permitam-me não usar os títulos, sobejamente conhecidos, dos três protagonistas desta história).

O blogue A’Cerca de Coimbra teve o seu começo em 13 de Maio de 2015, sendo o seu objectivo “recolher referências à cidade do Mondego existentes em obras publicadas e divulgá-las utilizando os recursos que as novas tecnologias disponibilizam”.

Bem organizado, por datas e/ou por temas, apresenta uma escrita clara e objectiva, com as “fontes bibliográficas” sempre no final de cada entrada. A sua leitura é um prazer, sendo igualmente um excelente auxílio à investigação. De facto, basta recorrer ao índice de “tags” para, rapidamente, se chegar ao assunto desejado.

De entre tudo o que pude ler no blogue, destaco uma entrada, de 20 de Setembro de 2022, que me impressionou, pelo implícito grito de dor do autor, que o levava a quebrar a sua tão característica descrição no que respeitava aos cargos desempenhados: «... A sua consulta levou-nos a constatar que nesse Inventário [da Documentação de Turismo no AHMC ] se encontra omitido a esmagadora maioria de um significativo número de processos respeitantes ao período situado entre 1974 e 1983, processos esses que se encontravam devidamente organizados e arquivados e que patenteavam evidente e relevante interesse histórico. Em suma, os anos [entre 1977 e 1988] em que tive a honra de dirigir aqueles serviços [municipais de turismo] foram, pura e simplesmente ignorados». Percebemos, depois, que a documentação referente a esses anos simplesmente desaparecera do conjunto arquivístico a tratar, razão porque não pudera ser incluída.  Seria da maior justiça a revisão dessa publicação bem como um agradecimento público, por parte da edilidade ao António Rodrigues Costa.

Isabel Anjinho

 

Mário Araújo Torres

Mário Torres a.jpg

Iniciado em 13 de maio de 2015, o blogue «A’ Cerca de Coimbra», criado e mantido ao longo de quase nove anos por António Rodrigues da Costa, um reconhecido especialista apaixonado por assuntos conimbricenses, atinge a sua milésima publicação.

Nascido na Couraça dos Apóstolos, “na casa da Cerca, adossada à muralha”, “muito jovem, aos 16 anos, tive como primeiro emprego a responsabilidade de dactilografar os difíceis originais do historiador de Coimbra, Dr. José Pinto Monteiro, que rapidamente também me encarregou de fazer pesquisas, nomeadamente nesse magnífico jornal que foi «O Conimbricense». Nasceu daí o meu gosto pela história de Coimbra.” (publicação de 20 de maio de 2015).

Aplicou-se ao longo dos anos, no seu blogue, a dar a conhecer dados sobre a história de Coimbra, recolhendo e divulgando as informações que ia coligindo, enquanto leitor compulsivo que sempre foi. 

Se as primeiras publicações quase se limitaram à reprodução de breves extratos das obras que ia lendo, com o tempo foram aumentando em extensão e enriquecidas com informações bibliográficas e pertinentes imagens.

É insuscetível de enumeração nesta breve nota a quantidade e variedade dos temas tratados, sempre centrados em Coimbra: as vicissitudes da sua história, a origem e beleza dos seus monumentos, as suas paisagens e tradições, as suas personalidades (do Conde Sesnando a José Afonso), a sua bibliografia.

Acresce a pertinência, a riqueza e a qualidade das ilustrações, sempre com a preocupação de indicação das fontes.

E, por último, o completo domínio dos instrumentos informáticos, com inserção de palavras-chave que, com um clique, nos remetem para os textos que tratam as centenas de temas, e um índice cronológico das publicações.

Por ocasião da milésima publicação de “A’ Cerca de Coimbra?”, os seus leitores agradecem a António Rodrigues da Costa o seu ingente esforço e aguardam que finalmente as autoridades municipais manifestem publicamente o seu reconhecimento.

Mário Araújo Torres. 

 

Regina Anacleto

aa. Regina Anacleto.jpg

O blogue “A’ Cerca de Coimbra”, da responsabilidade do Dr. Rodrigues Costa, começou a ser publicado em 2015 e regista hoje a sua 1000.ª entrada.

Esta plataforma digital tinha e continua a ter como objetivo principal a divulgação de temas de recorte específico, maioritariamente relacionados com a história da cidade de Coimbra.   

Utilizando textos de múltiplos autores, sempre devidamente identificados, o blogue procura estabelecer uma conexão profunda com o leitor, disponibilizando-lhe, através desta forma de comunicação, conhecimentos diversificados e, por vezes, de difícil acesso. Para estimular esse diálogo vivo com o público, os textos são, sempre que possível, acompanhados de imagens ilustrativas dos conteúdos.

No blogue, o seu responsável procura dar uma visão global da história da urbe, caldeando textos mais antigos com publicações atuais, portadoras de novas visões e achegas. A História não é uma ciência estática. Está em constante movimento face a novos achados e a novas interpretações, resultantes, algumas vezes, das modernas tecnologias colocadas à disposição do investigador. Convém esclarecer que a perfeição é inatingível e que ninguém consegue saber tudo nem dizer tudo. Por isso, o facto de o Dr. Rodrigues Costa se encontrar umbilicalmente ligado à sua cidade natal e ao estudo da sua história alia-se, no seu blogue, a uma perceção clara dos movimentos da História e do modo como se articulam com a história local.

Saliente-se, de resto, neste contexto, que a história local, durante longos anos ostracizada, tem vindo a despertar o interesse dos investigadores, desde meados do século XIX, na exata medida em que contribui para um mais profundo entendimento da História (em sentido global), tornando-se num precioso auxiliar capaz de aportar múltiplos esclarecimentos aos campos político, económico, social e mental. Os indivíduos, assim como as sociedades, procuram preservar o passado como um guia que serve de orientação para enfrentar as incertezas do presente e do futuro.

Acrescente-se ainda, na esteira da dinâmica deste blogue, que a memória coletiva de uma determinada população estende-se aos territórios onde vive, aos seus monumentos, aos vestígios do passado e do presente, aos seus problemas, à cultura material e imaterial e, também, às pessoas.

De tudo isto dá conta “A’ Cerca de Coimbra”.

Por isso, na ocasião da publicação desta 1000.ª entrada do blogue “A’ Cerca de Coimbra”, não podemos deixar de parabenizar o Dr. Rodrigues Costa pela transmissão de tão grande volume de saber relacionado sobretudo com a cidade do Mondego e de salientar o enorme esforço de criteriosa investigação a que a publicação em causa o tem obrigado.

Resta-nos esperar a possibilidade de continuar a aprender com tão pertinentes ensinamentos.

Regina Anacleto

 

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por Rodrigues Costa às 11:01

Quinta-feira, 04.05.23

Carros Americanos. Achegas para a sua história 3

Terminamos esta pequena série de entradas relacionadas com os carros americanos que circularam em Coimbra, republicando o que sobre o tema escrevemos para a comunicação que apresentámos ao I Encontro Nacional sobre o Património Industrial, trabalho que se encontra publicado nas Actas e Comunicações. Volume I, daquele evento, editado em 1989, a páginas 265-278.

CA Actas e Comunicações. Volume I, capa.jpg

I Encontro Nacional sobre o Património Industrial.  Actas e Comunicações. Volume I, capa

A referida comunicação insere, entre outros, o subtítulo, Os primórdios dos transportes urbanos em Coimbra e o excerto que se segue foi adaptado a partir do que ali se encontra mencionado:

CA. Carro Americano 02 a Col. RA.jpg

Carro Americano. Aguarela de Autor não identificável. Acervo RA

A história. dos transportes urbanos em Coimbra inicia-se em fevereiro de 1873 quando Evaristo Nunes Pinto e Camilo Mongeon, a quem já tinha sido concedida licença para explorarem, na cidade, através da utilização de carros americanos, os transportes públicos, solicitaram à Câmara a autorização, acompanhada da planta do projeto, destinada a instalarem uma linha que ligasse a estação do caminho de ferro do Norte ao centro da cidade.

O município, a 20 de fevereiro, deu o seu aval. Todavia, o processo, forçosamente, teria de se arrastar, a fim de permitir a sua montagem, e, apenas em setembro de 1874, a empresa entretanto criada – a Rail Road Conimbricense – comunica ao Município «a abertura à exploração da linha desde a Calçada à estação do caminho de ferro do Norte».

Na cidade, a inauguração do início da circulação dos carros americanos aconteceu a 15 de setembro de 1874 e, no dia seguinte, foi assim noticiada pelo jornal o Tribuno Popular:

Partiram da Calçada 3 carros americanos. No primeiro seguiam os diretores, as autoridades de Coimbra e demais convidados. No segundo carro seguia na Imperial [deduz-se que, pelo menos um dos carros tinha segundo piso, a chamada «Imperial»] a Filarmónica de Conimbricense que tocava o hino da Carta. Muita gente a assistir, muitos foguetes. Pelas 3 horas da tarde foi servido um opíparo jantar na sede da Sociedade Terpshicore”.

Mas a vida da Rail Road Conimbricense não foi fácil, e o pedido de autorização apresentado em 1885, «Para estender a sua linha da Portagem ao Cais das Ameias» (a atual Estação Nova) e para efetuar «um abatimento de 40 a 60 reis nos preços dos bilhetes», não passou de uma tentativa frustrada destinada a combater uma concorrência mais forte: a entrada em funcionamento do ramal do caminho de ferro de Coimbra B ao Centro da Cidade.

CA. Praça 8 Maio com carro americano puxado a mua

Carro americano na Praça 8 de Maio. Acervo RA

Uma segunda fase de utilização dos carros americanos em Coimbra inicia-se em 30 de outubro de 1902, quando «Augusto Eduardo Freire de Andrade pede a concessão duma linha férrea, sistema americano, nas ruas da cidade, para tração animal».

Este processo só seria concretizado pela Companhia de Carris de Ferro de Coimbra, entretanto criada, em 1 de janeiro de 1904, e permitiu o «estabelecimento da ligação da atual estação de Coimbra-B com o Largo da Portagem, a que se seguiu, em 4 de fevereiro do mesmo ano, a abertura de um novo troço entre a Praça 8 de Maio e a Rua Infante D. Augusto» (junto à Universidade).

CA. Carro americano nos Arcos do Jardim.jpg

Carro americano aos Arcos do Jardim, puxado por 6 cavalos. Acervo Henrique de Melo

Todavia, este último troço cedo se verificou não ser operacional em função do acidentado do percurso e consequente agravamento de custos, como bem se pode comprovar pela observação da gravura anexa.

A derradeira notícia conhecida relacionada com a atividade desta Empresa, data de 3 de fevereiro de 1916, quando o Município reconheceu que «estando o transporte de malas do correio para os comboios da noite a fazer-se no antigo carro americano puxado a muares» decidiu autorizar que o mesmo transportasse também passageiros.

Ainda neste período deve assinalar-se a efémera existência – com início em janeiro de 1907 – da primeira carreira de autocarros em Portugal que, nesta Cidade, ligava a zona da alta à zona da baixa, iniciativa da Empresa Automóveis Tavares de Mello Coimbra, que para o efeito utilizava carros «de 4 cilindros com a força de 24 cavalos e transportavam 20 pessoas».

CA Carreira de Autocarro. Illustração Portuuesa

Autocarro em Coimbra. In: «Ilustração Portuguesa», II Série, n.º 50, de 4 de fevereiro de 1907.

 A terminar, uma curiosidade­: na Figueira da Foz, cerca de 1880, também já circulavam carros americanos.

CA. Figueira. Amaricano. c. 1880.jpg

Carro Americano da Figueira da Foz, c. 1880. Acervo RA

Rodrigues Costa

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por Rodrigues Costa às 16:54

Terça-feira, 10.05.22

Coimbra: Na Judiaria de Coimbra 1

Neste último Sabat do mês de Hexevan da era da criação do mundo de cinco mil setecentos e oito [1947] – bendito e Eterno Deus de Israel – os meus olhos de mortal viram a sombra do grande arrabi da judiaria de Coimbra.

Bem pouco preparado estava para tal encontro.

Dia de maravilha esse: luminoso, tépido, a atmosfera pura como frequentemente acontece no outono, as distâncias nítidas e o ambiente vizinho dum encanto subtil. A luz trespassa-nos e convida-nos a gozar estas horas únicas que a Natureza dá antes de nos mergulhar nos sombrios nevoeiros e no horror do frio.

Eis-me por aí à toa, entregue ao prazer do momento.

Errando por Montarroio encontrei-me numa varanda natural, voltado para cidade velha, mais aliciante nesta luz dourada. Parei a olhar para a antiga judiaria, a rua do Corpo de Deus.

Posição sugestiva, hoje que se vê poeticamente o passado, posição de deserdado seria outrora.

JC. Passava a muralha.jpg

Passava a muralha pela parte de trás, servindo de base agora ao Colégio Novo

 Passava a muralha pela parte de trás, servindo de base agora ao Colégio Novo. Deste ponto o terreno inclina-se violentamente, em escarpas sucessivas, até atingir as linhas demarcadas pela Visconde da Luz e pelo terreno onde assenta o café de Santa Cruz, a sacristia, etc. alongando-se pela antiga Ribela acima.

JC. Rua Corpo de Deus 02.jpg

Rua de Corpo de Deus, nos anos 50 do século passado

 

Havia um socalco levemente mais largo e nele se alcandoraram as casarias do gheto coimbrão, tendo dois acessos, um para o lado da Calçada e outro para a Fonte Nova; barricados estes, transformavam-se quase em fortaleza, bem precária contudo.

JC. Desci ao vale. Avenida Sá da Bandeira. Manute

Desci ao vale por um caminho que representa um outro já multissecular. Fui ter ao sítio da Fonte Nova.

Rua de Entremuros.jpg

Vale da Ribela e Rua de Entremuros. Imagem da coleção particular do Dr. Branquinho de Carvalho

 Pode ver-se de longe esta modelação forte e nobre, sempre repelida de cristãos, nervo do comércio e progresso deles, lançada aqui, como quase em toda a parte, fora das muralhas, como primeira vítima oferecida aos invasores.

Pode ver-se longe esta modelação natural do terreno, por intermédio de certas linhas que servem como que de curvas de nível e que são: a do Colégio Novo, no alto, a da rua do Corpo de Deus, a da parte traseira das casas desta, os diversos socalcos dos quintais até ao ângulo inferior, que serve de esporão terminal aquele dorso da colina, formado pelo ângulo da Visconde da Luz e da linha da rua das Figueirinhas. Representa esta (modificada pelos crúzios) uma estreita vereda que levava à Porta Nova e que nos serve hoje para avaliar rapidamente o declive do terreno.

Pode-se ver de longe esta modelação forte e nobre, sempre repelida de cristãos, nervo do comércio e progresso deles, lançada aqui, como em quase toda a parte, fora das muralhas, como primeira vítima oferecida aos invasores.

Gonçalves, A. N. 2019. António Nogueira Gonçalves. Colaboração em Publicações Periódicas. Coordenação de Regina Anacleto e Nelson Correia Borges. Prefácio de José de Encarnação. Coimbra, Câmara Municipal. Volume II, pg. 483-485.

 

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por Rodrigues Costa às 14:57

Quinta-feira, 16.12.21

Coimbra: Presépio da igreja de S. António dos Olivais

No terreiro que está detrás da igreja de S. António dos Olivais, um pouco escondida, está uma pequena capela.

P1010119.JPG

Capela do presépio, no terreiro posterior da igreja de S. António dos Olivais

Dentro dessa capela encontra-se, na sua singeleza de figuras de barro, um presépio que julgamos ser conhecido de não muitos conimbricenses. 

Presépio que foi assim descrito em meados do século passado:

Encostada ao muro do mesmo terreiro, para o lado da estrada dos Tovins, fica a capelita do Presépio, de elementos arquitetónicos do século XVII, abrigando um presépio popular, de algumas dezenas de figuras que devem datar te fins do século XVIII ou já do XIX. Segundo uma lápide foi restaurado em 1929. No seu caráter popular é digno de consideração. O pobre artista inspirou-se de diversos pontos, encontrando-se figuras vestidas à maneira quinhentista, etc.

Presépio 02.jpg

(Correia, V., Gonçalves, N. Inventário Artístico de Portugal. Cidade de Coimbra. 1947. Lisboa, Academia Nacional de Belas Artes, p. 95.)

Mais chegado aos nossos dias numa conferência a que iremos voltar, o presépio é assim descrito:

“Presépio” popular, de algumas dezenas de figuras, e que devem datar já dos finais do século XVIII ou até mesmo dos primórdios do XIX. Apesar do seu carácter popular, é digno de consideração.

Presépio 03.jpg

(Anacleto, R. Conferência. Santo António dos Olivais: de ermitério a freguesia, Comemoração dos 151 anos de elevação a freguesia civil de Santo António dos Olivais.  2005.11.20. Coimbra, Casa Municipal da Cultura.)

Embora se possa visualizar no local, o blogue “Pingo de Luz”, permite aceder em https://umpigodeluz.blogspot.com/2012/12/presepio-da-igreja-de-santo-antonio-dos.html,  a um conjunto muito interessante de fotografias do presépio.

xxx

Esta lembrança fez-me voltar à minha meninice.

Meu Pai era um Homem que sabia fazer quase tudo. Uns dias antes do Natal, num canto da nossa casa, com algumas pequenas tábuas montava a estrutura de uma pequena montanha que tinha no sopé uma gruta à qual todos os caminhos iam dar.

Depois, o meu Pai pintava, com cores escuras, procurando imitar a terra e as pedras, papel de sacos de cimento ou outro qualquer papel grosso e com esse material dissimulava a estrutura de madeira.

Concluída esta fase era tempo de ir, pela sua mão, buscar um saco de serradura, a uma serração que existia ao fundo da rua Direita. Serradura que servia para se representarem os caminhos.

Existia ainda uma outra tarefa de que muito gostava. Depois de descer até à Portagem e atravessar a ponte, subíamos ao monte sobranceiro ao miradouro do Vale do Inferno. Ali havia um belo musgo verde com tons de amarelo das folhas caídas e também um musgo seco branco que parecia a neve.

Esse musgo era colocado com carinho e arte no presépio.

Na véspera do Natal, durante a tarde dispunham-se as figuras todas a caminho da gruta. Figuras compradas, primeiro na romaria do Espírito Santo e, depois, numa loja da Rua da Sofia que ainda existe. O Menino Jesus só era colocado na manjedoura depois da ceia de Natal e os Reis Magos só chegavam em janeiro.

Era a alegria de uma criança feliz de outros tempos. Eu.

Rodrigues Costa

A todos e a cada um, a quem gosta da nossa Coimbra e em particular aos que seguem este blogue desejo um Feliz Natal e um Bom Ano Novo. Até ao início de 2022.

Rodrigues Costa

 

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por Rodrigues Costa às 09:54

Terça-feira, 14.04.20

Coimbra: Presumível capela junto ao Convento de S. Francisco

No passado dia 2, publiquei uma entrada com o título “Coimbra: Fábrica de Lanifícios de Santa Clara 2” e, relacionada com ela, um leitor questionou-me no sentido de saber que estrutura é aquela que se vê à frente do convento … seria alguma capela de alminhas/via sacra como existe na ladeira que desce de Sta. Clara-a-Nova?
Referia-se ao edifício quadrangular que se visualiza na fotografia então publicada.

Complexo industrial da Fábrica de Lanifícios.jpgComplexo industrial da Fábrica de Lanifícios em Santa Clara. Finais da década de 70 do século. Fotografia do arquivo particular de Pedro Planas Meunier, acedida, em https://www.publico.pt/2019/07/08/local/noticia/ascensao-queda-fabrica-coimbra-1878945

Dessa estrutura, a partir de uma outra fotografia, obtivemos o seguinte pormenor que a mostra numa posição frontal.

Presumível capela no antigo Rossio de Santa ClaraPresumível capela no antigo Rossio de Santa Clara, hoje Praça das Cortes (pormenor)
Col. Carlos Ferrão

Respondi que, embora ainda me lembrasse do edifício, nada sabia sobre o mesmo, razão pela qual iria tentar obter algumas informações.

A primeira ajuda veio-me de Carlos Ferrão que disponibilizou boa parte das fotografias utilizadas para ilustrar esta entrada e suscitou várias hipóteses referidas mais à frente.
Uma vez na posse das fotografias pedimos uma opinião a Nelson Correia Borges que nos adiantou o seguinte parecer: Relaciono essa construção com os torreões que existem no terreiro da nossa antiga escola [a Brotero, atual Jaime Cortesão], com um que ainda está a meio da Av. Sá da Bandeira e mesmo com os da entrada no jardim de Santa Cruz.

Antigo torreão da cerca do Mosteiro de Santa CruzAntigo torreão da cerca do Mosteiro de Santa Cruz, localizado na Av. Sá da Bandeira
Imagem do Google Maps

Numa das fotos vê-se bem o cuidado tratamento que foi dado ao lintel da porta e ao óculo superior, pelo que não tenho dúvida que a construção será bem anterior à Fábrica. Estes elementos parecem poder ser datados da segunda metade do século XVIII. Para o que serviria? Inclino-me para uma finalidade de tipo religioso e poderia ter albergado o cruzeiro viário referido pelo Prof. Nogueira Gonçalves. É evidente que teve intervenção posterior, como se vê pelas janelas laterais que se detetam em fotografias. Trata-se, no entanto, de mera hipótese de trabalho.
Perante esta pista, guiados pela mão de Regina Anacleto, chegamos ao Inventário Artístico de Portugal. Cidade de Coimbra e a um texto de Nogueira Gonçalves.
O primeiro, o Inventário, descreve o local, dizendo que dava acesso à Igreja do Convento de S. Francisco uma escadaria dupla, paralela ao adro, existindo uma grande cruz no muro em posição medial.
Na estrada, havia um cruzeiro do século XVII, que pela modificação viária, ficou metido na entrada da fábrica. (In: Correia, V., Gonçalves, A. N. Inventário Artístico de Portugal – Cidade de Coimbra. Lisboa, 1947, pg. 91).

Edifício inserido na entrada da fábrica.jpgEdifício inserido na entrada da fábrica
DGARQ - Centro Português de Fotografia (Estúdios Tavares da Fonseca), pormenor

O segundo, de Nogueira Gonçalves, diz-nos que A região coimbrã teve predileção por certa variante de cruzei¬ros, aquela em que a cruz se abriga num templete, formado de quatro colunas e suportam cobertura hemisférica ou piramidal.
Na própria cidade levantaram se alguns.
A piedade que os ergueu foi os melhorando pelo tempo fora ordinariamente seguindo as seguintes fases.
Primeiramente deu se lhes uma lanterna ou lâmpada e uma caixa de esmolas. Fecharam se lhes depois três lados, por meio de paredes, e no quarto colocou se uma porta com gradeamento de ferro; valorizaram se as paredes internas com diversos reves¬timentos; dotaram se, nalguns casos, de altar. O santuariozinho completou se frequentemente com um corpo de capela, ou mes-mo, amparado de maior favor, foi substituído por uma autênti¬ca capela ampla. (In: A. Nogueira Gonçalves. Colaboração em publicações periódicas. Coordenação de Regina Anacleto e Nelson Correia Borges. 2019. Coimbra, Câmara Municipal, I vol., pg.231)

Foram estes textos que nos levaram a eleger o título da entrada; contudo, eles não nos dão a certeza de que, inicialmente, teria sido essa a finalidade do edifício em apreço.

Como referimos, também batemos à porta de Carlos Ferrão que analisou as possíveis e diversificadas utilizações da estrutura depois da extinção das ordens religiosas e, consequentemente do convento, concluindo:
Independente do que teria sido antes, nos anos 20 do século passado, a estrutura, é apontada como sendo um Posto de Transformação (PT) de eletricidade da rede publica ligado à Fábrica de Santa Clara. Posto que era bidirecional, recebendo e injetando energia elétrica na rede pública.

Outra imagem do edifício.jpgOutra imagem do edifício
Col. Carlos Ferrão

Importa recordar que em Coimbra, existiram 21 centrais elétricas, todas termoelétricas. Uma de serviço público, as outras de serviço particular como a de Santa Clara, da empresa Planas & Cª que funcionou entre 1942 e 1947, com uma potência de 144 kW.
A fábrica por ser também produtora, era vendedora e compradora de energia à Câmara Municipal.

Depois de exploradas estas pistas concluímos que algo se adiantou, embora as dúvidas continuem a persistir.
Decorre daí o facto de serem bem-vindas outras informações passíveis de continuar a aclarar o assunto.

Rodrigues Costa

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por Rodrigues Costa às 10:44

Terça-feira, 25.02.20

Coimbra: Antigos caminhos e pequenos bairros a nascente da Cidade

Com esta entrada iniciamos a divulgação de alguns artigos publicados por Nogueira Gonçalves entre 1921 e 1991, principalmente em jornais. Este texto, um dos que mais nos tocou, integra a obra recentemente editada pela Câmara Municipal de Coimbra, intitulada “A. Nogueira Gonçalves. Colaboração em Publicações Periódicas”, que teve a coordenação de Regina Anacleto e de Nelson Correia Borges.
É nossa intenção voltar, uma e mais vezes, a este livro de grande valor histórico, escrito de uma forma admirável pela sua beleza e singeleza.

Nada mais natural pensar que a antiga estrada da Beira até á Portela tenha seguido um traçado que a atual decalca; o próprio terreno parece indicar esse lógico trajeto; e, todavia, não se deu isso.
Deixaremos para outra vez o caminho da rua da Alegria, Arregaça, seguindo para Marrocos, o caminho da via longa como outrora se dizia.
A estrada da Beira partia não da ponte mas da parte alta, da porta do Castelo.
Sigamo-la.
Passada a porta da fortaleza tinha-se logo abaixo ao lado direito o caminho que permitia voltar á cidade pela porta da Traição; à esquerda a estrada de Entremuros que levaria a Fonte Nova, de onde se tomaria para a porta Nova ou rua das Figueirinhas ou ainda se cortaria a norte para o Montarroio.
Além de entrada principal da cidade travessas várias pois daí se tomavam; não faltaria a qualquer hora gente a calcorrear o ponto de separação viário.

Aqueduto de S. Sebastião. Arco principal 03.jpgNa parte mais plana, a do colo do monte, pedia um agregadozinho populacional. Coleção Regina Anacleto

Muito naturalmente o sítio, na parte mais plana, a do colo do monte, pedia um agregadozinho populacional. Ao lado direito, aonde vinha bater o muro da velha quinta dos crúzios, havia um, como hoje, em frente ao aqueduto. Prolongava-se mais que agora (e duma demolição recente ainda nos lembramos todos), fazendo uma correnteza de casas, tendo só encostadas aos arcos e em frente, portanto das outras umas duas ou três.
Tinha para o lado da Penitenciária a modesta capela de S. Martinho, e em ponto levemente anterior o oratório do Santo Cristo das Maleitas, transformação dum cruzeiro de caminho.
Era este o fatal bairro popular que precedia a entrada das cidades fortificadas. Tabernas, pequenos negócios, gente sem eira nem beira, vivendo em tugúrios e pronta a qualquer serviço humilde, a alombar todos os carregos, a encarregar-se de qualquer recado, tudo isso aí ficaria.
Sigamos o caminho, passando sob o arco principal, pois que a topografia foi modificada com o muro do jardim botânico. Era aqui o ladeirento e pequeno campo de Santa Ana, com o chafariz, donde seguia o caminho de Celas e cortava o da Beira para o novo bairrozinho, o de S. José, tirando o nome do colégio conventual de S. José dos Marianos (hospital militar).
Logo na esquina, tal como hoje, lá esperaria sem sombra de dúvida outra taberna aos que vinham da cidade e aos que cansara a ladeira que nós iremos descer.
Paremos e deixemos que os nossos olhos repousem a despedir-se das duas casas que as demolições deixaram em pé por uns breves dias.
Uma das coisas mais incompletas que há pelo campo das ciências é a geografia humana; em nenhum livro dos vários que dela se ocupam e que percorri (em nenhum!) encontrei este capítulo: – a taberna fulcro da fixação dos agregados populacionais. Valia a pena estudá-lo e escrevê-lo, que daria perspetivas novas a esta ciência.
A taberna atual deverá representar uma série infinda delas. Já ali beberam as tropas de Massena, para não falar em tempos mais antigos. Quantos almocreves, carreiros, gente de todo o género por ali não passou, quantos mendigos ali não trocaram uns tostõezinhos por um bom copo, compensador da miséria e do abandono, dando-lhes um verdadeiro antegosto dum céu particular!
Não há sensibilidade nesta desgraçada terra, não há amor da tradição, escusado será pedir à fria gente da Câmara para a conservar no meio dum larguito, enramada de larga parreira e com um loureiro a dar sombra. Dentro de dias o balcão esmurrado e nodoento será tirado, desaparecerá aquele soalho aonde cuspiram centenas de gerações! Exultaram os higienistas, como é de seu mau instinto, e eu entristecer-me-ei por saber que os malandros que hoje me pedem um tostãozinho não terão aonde o ir empregar sem tardança!

S. Antoninho dos porcos 1.jpgCapela de Santo Antoninho dos porcos, na sua atual localização. Coleção Regina Anacleto

S. Antoninho dos porcos 2.JPGCapela de Santo Antoninho dos porcos, interior. Coleção Regina Anacleto

Começava a descida e, à capela de Santo Antoninho dos porcos (pois que ali se fazia o mercado deles) passava o caminho pelo desvio angular que ainda ali se vê, para depois se meter pela ladeira calçada das Alpenduradas.
No fundo da descida, depois do mercado e das traseiras da fábrica, atingindo o vale, encontrava-se, como hoje, o começo do bairro do Calhabé e que se continuava esgarçadamente até perto da passagem de nível, sítio este aonde todos nós conhecemos umas casas baixas.

Calhabé 7 CF.jpgNuma destas parece que viveu o velho Calhabé. Coleção Carlos Ferrão

Numa destas parece que viveu o velho Calhabé, prazenteiro e bebedor, mas que fora homem de representação.
Já outrora ninguém pensaria que ainda fosse cidade o Calhabé, bem ao contrário do que os justos fados talharam e que começa a realizar-se: o Calhabé ser a cidade e Coimbra um pobre bairro do mesmo Calhabé!
Podia-se descansar um pouco que uma nova ladeira esperava o caminhante. Lentamente subia-se á Portela da Cobiça.

Portela da Cobiça.JPGPortela da Cobiça. O que resta, no seu estado original, do percurso descrito

Lançado um último olhar à cidade afastada, transposto o colo, caminhava-se pelo vale transverso até ao rio, que depois se ia acompanhando para cima das Torres.

Barc do Concelho.JPGLocal onde funcionava a “barca do Concelho”

Em frente aos Palheiros esperava-se que a barca do concelho viesse da outra margem e nos transportasse.
A cidade, aonde ficava ela!
Não vale a pena continuar só pela esperança de a tornar a ver do alto do monte, vencida a longa e áspera ladeira.
Lá seguiriam os viandantes, pelo cume, até Carvalho. Por Poiares, Almas da Serra, (S. Pedro Dias) iriam cair na Ponte de Mucela, aonde buscariam agasalho conforme a sua bolsa.
A serra máxima, a da Estrela do pastor, esperava-os. Quantas horas não levariam, moídos do mau piso e da distância! Tudo isso tão longínquo, não é verdade? E, todavia, para a gente da minha infância e um pouco mais velha, com a melhoria das diligências e da estrada a macadame, quão próximo e compreensivo, que os tempos anteriores se poderiam fazer surgir sem espanto; como tudo está longe, porém desta gente que já foi embalada num bom automóvel!
«Diário de Coimbra», 1952.12.25.

Gonçalves, A. N. 2019. António Nogueira Gonçalves. Colaboração em Publicações Periódicas. Coordenação de Regina Anacleto e Nelson Correia Borges. Prefácio de José de Encarnação. Coimbra, Câmara Municipal. Volume II, pg. 498-500

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por Rodrigues Costa às 10:02

Quinta-feira, 30.01.20

Coimbra: Nogueira Gonçalves coletânea de artigos

Será apresentado no próximo dia 6 de fevereiro, às 17h00, na Casa Municipal da Cultura, sala Francisco de Sá de Miranda, o livro A. Nogueira Gonçalves. Colaboração em publicações periódicas.

Capa do livro.jpg

A. Nogueira Gonçalves. Colaboração em publicações periódicas, capa

A obra, editada pela Câmara Municipal de Coimbra, é constituída por 1148 páginas que se dividem por 2 volumes e incluem, no final, os índices onomástico e toponímico que, obviamente, se revelam de enorme utilidade. Reúne os textos que o Padre Nogueira Gonçalves foi inserindo, ao longo da sua vida, em publicações periódicas, não propriamente de índole científica, mas onde procurava transmitir ao cidadão comum, através de palavras simples e de frases bem buriladas, o seu muito saber. Todo este material, que se encontra disperso e, na maior parte das vezes, é de difícil acesso, passa a estar reunido numa única fonte.
Deve-se aos seus discípulos Doutores Regina Anacleto e Nelson Correia Borges a árdua tarefa de terem procurado e agrupado esses numerosos textos.
O índice dos dois volumes, que aqui reproduzimos, é elucidativo.

Índice do livro.jpg

Índice da obra

Lembro-me bem da sua figura de homem alto e austero, a caminhar lentamente pela Cidade, de olhos atentos a tudo o que via.

A. Nogueira Gonçalves.jpg

P.e António Nogueira Gonçalves

Conhecendo parte dos escritos ora reunidos – que iremos divulgando neste blogue – não tenho qualquer dúvida em afirmar que se trata de uma obra que irá ser de consulta obrigatória para todos quantos se interessam e dedicam à história de Coimbra e da Região onde a nossa Cidade se insere.
Deve ainda salientar-se a qualidade estética dos textos, dos quais ressalta a paixão pelos temas tratados e o imenso saber de quem os escreveu.

Rodrigues Costa

Notas biográficas;

António Nogueira Gonçalves deixou uma profunda marca na historiografia da arte portuguesa, uma vez que iniciou caminhos nunca antes trilhados e que se vieram a tornar credibilizadores desta área do conhecimento.
Nasceu a 22 de dezembro de 1901 na Sorgaçosa, pequena aldeia escondida nas pregas da serra do Açor, bem perto da mata da Margaraça, concelho de Arganil… Ordenado presbítero a 26 de julho de 1925.
A “res artística” desde muito cedo o atraiu e, apenas com 19 anos, em setembro de 1921, publica no jornal A Comarca de Arganil, um texto onde dá a conhecer a existência, na igreja de Pomares, de um arco românico.
… A dimensão científica que o virá a projetar no tempo, absolutamente pioneira quando, nessa década de 30, desenhou os seus primeiros passos, prosseguirá quase até ao final da vida e manter-se-á, em muitos domínios, inultrapassada.
… A sua multifacetada erudição permitiu-lhe abranger vastas áreas: da Epigrafia à Pintura, da Heráldica à Arquitetura, da Paleografia à Escultura, passando pela Ourivesaria, pela Cerâmica, pelos Tecidos, etc.
Autor de uma vasta obra da qual se releva os “Inventários Artísticos da Cidade de Coimbra” (1947) e do “Distrito de Coimbra” (1952), inicialmente entregues a Vergílio Correia, mas que este mal teve tempo de começar e nos três volumes do “Inventário Artístico” dedicados ao “Distrito de Aveiro” (1959, 1981 e 1991), já da sua inteira responsabilidade.
… Foi nomeado conservador do Museu Machado de Castro em 1942, e depois da morte de Vergílio Correia assumiu a sua direção.
… Em 1968, a Universidade de Coimbra convidou-o para lecionar, na Faculdade de Letras, as disciplinas de História da Arte. Aí se manteve, até à jubilação, ocorrida no ano de 1976, ultrapassado que era o limite de idade.
… A Universidade de Coimbra concedeu-lhe o grau de “Doctor honoris causa” pela Faculdade de Letras em dezembro de 1979.
A Academia Nacional de Belas Artes, por seu turno, elevou-o à categoria de Académico de Honra e, posteriormente, agraciou-o, em 1991, com a Medalha de Mérito de Belas Artes, classe de ouro.
Anos depois, em 1983, a Câmara Municipal de Coimbra, terra que adotara como sua, numa homenagem merecida, atribuiu-lhe a medalha de ouro da cidade e o título de cidadão honorário.
A edilidade arganilense, considerando-o «uma personalidade multímoda, de saber diversificado e profundo», orgulhosa por o poder contar entre as suas gentes, numa sessão solene realizada a 6 de setembro de 1992, no salão nobre dos Paços do Concelho, condecorou-o com a medalha de ouro da municipalidade.
Homem «de um só parecer, de um só rosto, uma só fé, de antes quebrar que torcer», como diria Sá de Miranda, faleceu na sua Sorgaçosa natal a 25 de Abril de 1998.

In: A. Nogueira Gonçalves. Colaboração em publicações periódicas. Nota biográfica. 2019. Coimbra, Câmara Muncipal, pg. 11-13.

 

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por Rodrigues Costa às 10:11


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