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Os estabelecimentos prisionais de Coimbra - Penitenciária
A Rua de Tomar, tal como a Garrett delimitam parcialmente, se é que assim se pode dizer, o Bairro de Santa Cruz e a primeira, conjuntamente com a Rua Pedro Monteiro e com a Rua Infantaria 23 contornam os estabelecimentos prisionais de Coimbra.
Na sequência da Reforma Penal e de Prisões acontecida em 1876, que avançava com uma nova maneira de olhar os reclusos e se debruçava sobre as condições físicas e morais em que estes eram mantidos, tornou-se premente renovar os edifícios prisionais.
Em Coimbra foi escolhido espaço pertencente outrora ao Colégio de Nossa Senhora da Conceição, de Tomar ou de Cristo, onde se instalavam os alunos pertencentes àquela Ordem e que frequentavam a Universidade.
Fig. 42 – Colégio de Tomar. 1870. [Monumentos, 25, p. 42]
A estrutura fora erguida no âmbito da transferência dos Estudos Gerais para a cidade, em 1537, por ordem de D. João III. Face ao processo de desamortização, em 1852, o Colégio a sua cerca foram vendidos a um particular e, posteriormente, adquiridos pelo município que acabou por ceder o espaço, a fim de nele ser construído um estabelecimento prisional.
A Penitenciária mondeguina segue o risco de Adolpho Ferreira de Loureiro, engenheiro que já anteriormente foi referido. Convém esclarecer que, bastas vezes, a autoria do projeto aparece, erroneamente, atribuído ao engenheiro Ricardo Júlio Ferraz (1824-1880).
Fig. 43 – Penitenciária em construção [Revelar Coimbra, 46].
A cadeia Penitenciária de Coimbra começa a ser construída em 1876, inaugurou-se em 1894, mas só em 1901 entraram no estabelecimento os primeiros dez reclusos, embora o edifício, depois de concluídos os trabalhos, estivesse apto a receber mais oitenta presos.
Penitenciária já concluída.
O referido estabelecimento prisional segue o modelo panótico radial, de planta em cruz latina, e mostra “4 alas ortogonais em volumes de predominante horizontal, das quais 1 maior e 3 de média extensão, conjugadas com 4 alas menores inseridas em volume poliédrico octogonal, configuram um conjunto de 8 braços irradiando a partir de um ponto focal ou panóptico, assinalado por espaço de acentuada verticalidade”.
Na sua construção predomina o ferro, a madeira e o vidro, tendo o primeiro, nesta obra, um papel muito relevante bem visível na estrutura da cúpula ou nos pormenores (guardas, claraboias, óculos, etc.).
No caso conimbricense, a especificidade radica ainda no recurso ao vocabulário neogótico, presente nos vãos em arco quebrado, nos muros ameados e em outros elementos.
Pode afirmar-se que a este contexto não estará “seguramente, alheio o contributo dos mestres da Escola Livre das Artes do Desenho de Coimbra”.
Fig. 44 – Penitenciária e Bairro de Santa Cruz. 1915. [Monumentos, 25, p. 126].
A adaptação ao terreno envolvente, a erudição das casas do diretor e dos chefes de guarda, as oficinas (que tornaram este espaço numa cadeia-oficina) e os logradouros revelam um traçado erudito que reforça a originalidade do projeto.
A cúpula da Penitenciária, feita em 1887, saiu da forja de Manuel José da Costa Soares, dono de uma alquilaria, sita à Rua da Sofia, na inacabada igreja de S. Domingos e que, ao fundo, um pouco afastado da entrada, montara a fundição. Os seus trabalhos de ferro já eram conhecidos, pois, como referi, é também da sua responsabilidade a parte metálica do Theatro-Circo, erguido na Avenida Sá da Bandeira.
Fig. 45 – Penitenciária. Cúpula. [Foto RA].
Construído expressamente para o efeito, este edifício prisional conserva as suas características originais, constituindo um dos três exemplos de planta radial existentes no nosso país.
Anacleto, R. Coimbra: alargamento do espaço urbano no cotovelo dos séculos XIX e XX. In: Belas-Artes: Revista Boletim da Academia Nacional de Belas Artes. Lisboa 2013-2016. 3.ª série, n.ºs 32 a 34. Pg. 127-186. Acedido em https://academiabelasartes.pt/wp-content/uploads/2020/02/Revista-Boletim-n.%C2%BA-32-a-34.pdf.
Avenida Sá da Bandeira (continuação)
Adquirida a velha cerca, apesar da premência de a urbanizar, a decisão foi sendo sucessivamente protelada, mas o engenheiro Adolfo Ferreira Loureiro acabou por ser encarregado de elaborar, sob a direção do presidente, um plano de benfeitorias (ou seja, de urbanização) da quinta; apresentou-o a 23 de julho de 1885.
Adolfo Ferreira Loureiro.
Na criteriosa opinião do diretor de O Conimbricense, Adolfo Loureiro, o “muito hábil e intelligente director das obras do Mondego” era a pessoa indicada “e decerto não haveria ninguém mais competente para satisfazer este encargo”.
Adolpho Ferreira de Loureiro embora recordado na cidade que, em 1836, o vira nascer pela toponímia, pois existe uma rua com o seu nome, pode considerar-se um quase desconhecido e isso apesar do trabalho vultuoso que desenvolveu ao longo da sua vida profissional, dos diversos e importantes cargos que ocupou e das honrarias que lhe foram concedidas.
… O projeto que Ferreira Loureiro elaborou para o alargamento do espaço urbano conimbricense ainda hoje, no contexto citadino, se mostra estruturante.
Fig. 11 – Um dos projetos de urbanização do Bairro de Santa Cruz. 1889. [AHMC. Repartição de obras municipais. Pasta 43. B-14].
Lourenço Almeida Azevedo ocupou a cadeira municipal durante quase doze anos, mas os seus mandatos, lúcidos e virados para o futuro, foram marcados por acesas polémicas; da proposta apresentada por Ferreira Loureiro ressalta a experiência do pragmático engenheiro, a par com os conhecimentos profundos das necessidades citadinas advindas da clarividência presidencial.
O facto de o nome de Adolfo Ferreira Loureiro não aparecer relacionado com o projeto da abertura da nova avenida a rasgar-se na quinta dos crúzios e do bairro adjacente talvez se fique a dever à morosidade da execução e ao facto de o engenheiro ter deixado Coimbra antes da sua concretização.
Na realidade, o projeto, só tardiamente se cumpriu, até porque a Sá da Bandeira, antes de virar avenida foi pensada como Rua, mas teve sempre por base o plano de Ferreira Loureiro, que “traçou a partir do mercado uma grande avenida de 50 metros de largo que termina à entrada do jogo de bola da quinta por uma grande praça. Da praça partem simetricamente duas avenidas para Celas e para Sant’Ana e outras duas em direcção aos arcos de S. Sebastião”.
Em 1889 inicia-se o loteamento do Vale da Ribela e em junho desse ano são postos em praça diversos espaços destinados à construção de moradias. Os proprietários que então adquirissem os terrenos obrigavam-se a cumprir determinadas obrigações e a iniciar a obra no espaço de um ano; estas regras, que se encontram explicitadas tanto nas atas camarárias, como nos periódicos da época, evidenciam a preocupação da edilidade pelo planeamento urbanístico e pelo arranjo da nova zona citadina.
Os trabalhos desenvolvem-se a bom ritmo e no mês de dezembro desse ano, antes do Natal, em comemoração do batizado do infante D. Manuel (futuro D. Manuel II), inauguram-se os arruamentos de Sá da Bandeira, de Alexandre Herculano, da Escola Industrial (Oliveira Matos), de Castro Matoso, de Tomar e de Almeida Garrett.
Rua de Tomar
Rua Almeida Garrett
A cerimónia revestiu-se de solenidade: para além da presença das mais altas individualidades citadinas, tocou a banda do Regimento 23 e subiram ao ar numerosos foguetes. “À noite foram pela primeira vez acesos os candeeiros de gaz na Praça D. Luiz I [Praça da República], nas ruas Marquês de Sá da Bandeira e Alexandre Herculano”.
Anacleto, R. Coimbra: alargamento do espaço urbano no cotovelo dos séculos XIX e XX. In: Belas-Artes: Revista Boletim da Academia Nacional de Belas Artes. Lisboa 2013-2016. 3.ª série, n.ºs 32 a 34. Pg. 127-186. Acedido em https://academiabelasartes.pt/wp-content/uploads/2020/02/Revista-Boletim-n.%C2%BA-32-a-34.pdf
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