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A' Cerca de Coimbra


Quinta-feira, 20.01.22

Coimbra: Camilo e a cidade do Mondego 2

ESTUDANTE EM COIMBRA (Continuação)

Igualmente em «Cavar em Ruínas», no capítulo «O meu condiscípulo» relembra o romancista os tempos passados no Porto, para referir em seguida: «Dois anos depois cursava eu as aulas em Coimbra».

Na mesma obra, no capítulo A Vida Picaresca», depois de comentar passos do livro de Diogo Camacho, «Jornada à Corte do Parnaso», em que o autor descreve a fome que o assaltava enquanto estudante de Coimbra, escreve Camilo:

«Na Coimbra de hoje já não há fome. Graças a Deus. Ainda no meu tempo, há dezoito anos, se a mesada se desfazia em creme no Paço do Conde aí até ao dia 15, a gente sentia até ao dia 30 um pedaço de Diogo Camacho nos intestinos pelo menos.»

Em Carta a Petrónio, artigo inserto na «Revolução de Setembro», de 13 de setembro de 1871, com o pseudónimo Felizardo, Camilo, a propósito da poetisa coimbrã Amélia Janny, mais uma vez relembra os tempos na cidade do Mondego:

«No nosso tempo de Coimbra, meu caro Petrónio, a poesia estava em tudo, menos nas senhoras.

O aspeto taciturno e desconfiado das damas era como um capacete de neve nas cabeças ardentes daquela mocidade que enxameava no Penedo da Saudade e Águas Maias a namorar a natureza, e Teresa Fortunata também. Não se chamava Teresa Fortunata uma onzeneira que me comprou a loba e a capa por dez tostões e um vintém? Que saudades eu tenho dos meus vinte anos, e de um Tito Lívio edição prínceps, que vendi por setecentos e vinte na rua de Quebra-Costas!»

Camilo. Penedo da Saudade. Miradouro.jpg

Penedo da Saudade

Água de Maias 1.jpg

Águas de Maias, hoje rotunda da Casa do Sal. 

Foto Varela Pécurto 1973 c. In: Coimbra Vista dos Céus”, José António Bandeirinha e Filipe Jorge, Argumentum, 2003

 Em «Vaidades Irritadas e Irritantes», opúsculo com que toma partido na «Questão Bom Senso e Bom Gosto», acrescenta:

«A Primavera [de Castilho], no meu tempo de Coimbra, há vinte anos, tempo em que ali andavam poetas como João de Lemos, Cordeiro, Couto Monteiro, ia ler-se à Lapa dos Esteios, quando as árvores celebradas de Castilho desabotoavam, quando o céu se azulejava e espelhava nos lagos.»

Camilo. Lapa dos Esteios 01 a.jpg

Lapa dos Esteios

 Ainda dessa primeira estada de Camilo em Coimbra, escreve no «Cancioneiro Alegre», referindo-se a Donas Boto:

«Conheci-o em Coimbra em 1846 quando a minha batina esfrangalhada abria as suas trinta bocas para admirar e engolir o latim de um padre que não sei se era Simões. Devia ser. Coimbra é a terra dos Simões.»

Mas voltando a Donas Boto, pormenoriza o encontro, no livreiro Posselius:

«Eu comprara o Dicionário de Morais; e ele, com uma gravidade protetora e paternal disse-me: – Faz bem, seu caloiro. Manuseie o bom Morais com mão diurna e noturna. Gaste assim as suas economias, não as malbarate em fofas novelas gafadas de galicismos, nem me vá por botequins a sorveteá-las nem por lupanares a desbotar as suas primaveras, nem por tavolagem a perder o dinheiro e a vergonha.»

Curiosamente, quando publica o «Cancioneiro Alegre» (1879), Camilo supunha Donas Boto já falecido, como viria a escrever a Tomás Ribeiro, então ministro, em carta de 1 de Dezembro de 1881, através da qual intercede, aliás com êxito, em favor do seu antigo conhecido de Coimbra, então em má situação:

«Dá-lhe alguma coisa, por alma dos homens de letras que morreram na miséria. Conheci-o em Coimbra em 1846.

Andrade, C.S. 1990. Coimbra na vida e na obra de Camilo. Coimbra, Coimbra Editora.

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por Rodrigues Costa às 11:08


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