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Colégio de Santo Agostinho ou da Sapiência, vulgarmente conhecido pela denominação de Colégio Novo. (Hoje Faculdade de Psicologia).
Referem os cronistas do mosteiro crúzio, que lá dentro do mosteiro, houve, desde a reforma joanina das escolas gerais fixadas em Coimbra, um Colégio universitário propriamente dito ... Decorridos porém alguns anos, vieram os cónegos regrantes a reconhecer as grandes vantagens que lhes resultariam de constituírem um Colégio distinto e separado do seu mosteiro.
... Adquirira o mosteiro em 1552, por escambo feito com a Câmara Municipal, um pedaço de chão à «porta Nova» (que mais tarde se denominou «porta de Santo Agostinho») com seu muro e barbacã. Ficava ao fundo da Couraça dos Apóstolos, encostado à muralha, no ângulo N-O de «almedina», em sítio de soberbas vistas sobre o arrabalde e os campos do Mondego. Foi este o local destinado ao «Colégio-Novo».
Mas a área desse terreno era bastante irregular, terminando a N-E num ângulo muito agudo. Escolheu-se para elaborar o projeto do edifício o célebre arquiteto italiano Filippo Terzi.
... Correu célere a construção. Decorridos escassos onze anos, a 25 de março de 1604, já ali se instalaram os cónegos regrantes, mestres e alunos universitários.
Colégio de S.to Agostinho, fachadas ocidental e setentrional
Eis um dos mais interessantes e grandiosos edifícios colegiais de Coimbra.
Colégio de S.to Agostinho, igreja
Construção no estilo da renascença, é bem uma obra de arte italiana; especialmente o claustro e a igreja chamam e prendem as atenções – aquele pela euritmia e nobreza das linhas, esta por isso também e pela bela ornamentação das abóbadas.
Colégio de S.to Agostinho claustro
Este Colégio tinha uma boa cerca, hoje bastante reduzida, que se estendia pela riba N da cidade, entre a muralha que a coroava, e a rua pública que acompanhava a quinta de Santa Cruz, a qual em baixo, no vale, se dilatava a N-E; confinava a E a cerca do Colégio da Sapiência com a cerca dos jesuítas.
... O Colégio da Sapiência comunicava com a respetiva cerca por um passadiço sobre o arco de Santo Agostinho ou porta Nova, e perfurava a parte inferior da contígua torre de defesa, ultimamente transformada em casa de habitação; e tinha também comunicação direta com o mosteiro de Santa Cruz, por um corredor subterrâneo abobadado e com escadas.
... em 1834... sucedeu a este edifício o mesmo que aos restantes: ficou abandonado, e exposto à voracidade da escória social.
... 15 de setembro de 1841 ... ordenou que fossem entregues à Santa Casa da Misericórdia, tanto o edifício deste Colégio, como a cerca anexa.
Vasconcelos, A. 1987. Escritos Vários Relativos à Universidade de Coimbra. Reedição preparada por Manuel Augusto Rodrigues. Volume I e II. Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra, pg. 257-261, do Vol. I
… Já fora de portas, encontrava-se um outro núcleo de propriedade régia, onde a concentração era quase compacta: a Judiaria Velha, no local onde existe a Rua Corpo de Deus.
… Em Coimbra, como sucedia em muitas outras cidades e vilas do país, o rei era o grande proprietário das casas habitadas pela minoria judaica …
… Embora correspondendo grosso modo ao espaço que é hoje ocupado pela Rua Corpo de Deus como aliás indicam os limites fixados no título da descrição “que se começa tralla ousia de Santiago e se vai ferir na rua derecta acima da egreja do Corpo de Deus”, a judiaria contava seguramente com outras ruas… provavelmente de menores dimensões, são as ruas da Marçaria, do Pintosinho e da Moreira.
… Na data em que o tombo foi realizado (1395) já a judiaria se encontrava desativada, tendo os judeus aí residentes passado para a judiaria próxima do mosteiro de Santa Cruz, local mais tarde designado por Rua Nova.
É uma imagem de abandono a que perpassa pelo texto onde se descreve a maioria das propriedades como abandonadas, em rossio ou em chão.
… A Judiaria Velha de Coimbra era, pela sua localização, um exemplo paradigmático das judiarias portuguesas: junto a uma via principal, económica e socialmente importante, a Rua da Calçada, encostada à muralha e quase delimitada nos topos por duas portas da cidade, Porta Nova e Porta de Almedina, para além de vizinha de um templo cristão, o de São Tiago, como tentativa de conversão da população judaica.
Embora pouco saibamos das casas que constituíam o bairro, não nos parece que se distinguissem do panorama geral. Oscilando entre o piso único e os dois pisos, por vezes recorrendo ao meio sobrado como forma de ganhar uma câmara extra, algumas contavam com cortinhais, num caso com uma amoreira noutro com quatro pés de oliveira. Um terceiro fora aproveitado para a edificação de uma cozinha. Só duas casas parecem fugir à regra: uma descrita como «paaço grande» a outra, de dois pisos e quatro portais, embora provavelmente dividida em duas moradas já que a traziam aforada Boroeiro Judeu e Samuel peneireiro.
O tombo não deixa perceber até que ponto a Judiaria era um espaço fisicamente delimitado e efetivamente fechado, embora a porta da Judiaria seja referida por duas vezes. Junto a esta, e na zona de maior movimento pela confluência com as Ruas da Calçada e de Coruche, situava-se a albergaria dos judeus. Não muito longe a carniçaria onde, provavelmente a cargo de «Salomon carneçeiro», a carne era tratada segundo os preceitos hebraicos.
… Um instrumento redigido a pedido dos judeus por Vasco Martins tabelião, em 1357, diz que moravam em cerca apartada e “sob chave e guarda de el-rei”.
Trindade, L. 2002. A Casa Corrente em Coimbra. Dos finais da Idade Média aos inícios da Época Moderna. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra. Pg. 122 a 123
O «campo» começava dentro da própria cidade, sob a forma de quintais onde cresciam hortas, parreiras e árvores que tornavam risonho o aglomerado ao altearem-se por entre as casas empilhadas em ruas estreitas. Topónimos como Rua das Parreiras e Rua da Videira parecem inculcar o facto.
Da sua presença, no burgo de Celas, populoso já em 1608, não se pode duvidar.
… A Porta do Castelo dava para olivais ou vinhas. Junto dela laboravam lagares de moer e espremer a azeitona
… Para lá dos muros da cerca dos Bentos, a sua quinta, até junto ao rio, com um salgueiral plantado nas margens … As quintas da Alegria, que se continuavam ao longo do rio, para montante, até encontrar «o aprazível e cheiroso das hortas da Arregaça»
… A Porta Nova conduzia, por sua vez à Ribela. Neste vale, o longo dos anos, é fácil encontrar referências a vinhas, hortas, olivais, nogueiras, laranjeiras e sinceiros; a lugares devassos para pasto do gado da cidade, «grosso, miúdo ou bestas»; ao curral do concelho, a «engenhos» de fazer azeite ou moer pão, movidos a água pelo menos durante uma parte do ano.
… As outras saídas da cidade, todas elas, conduziam, igualmente a paisagens semelhantes, logo que terminavam as casas.
Oliveira, A. 1971. A Vida Económica e Social de Coimbra de 1537 a 1640. Primeira Parte. Volume I. Coimbra, Universidade de Coimbra, pg.321 a 325
Nada mais natural pensar que a antiga estrada da Beira até á Portela tenha seguido um traçado que a atual decalca; o próprio terreno parece indicar esse lógico trajeto; e todavia não se deu isso.
… A estrada da Beira partia não da ponte mas da parte alta, da porta do Castelo … Passada a porta da fortaleza tinha-se logo abaixo ao lado direito o caminho que permitia voltar á cidade pela porta da Traição; à esquerda a estrada de Entremuros que levaria a Fonte Nova, de onde se tomaria para a porta Nova ou rua das Figueirinhas ou ainda se cortaria a norte para o Montarroio.
… Muito naturalmente o sítio, na parte mais plana, a do colo do monte, pedia um agregadozinho populacional. Ao lado direito, aonde vinha bater o muro da velha quinta dos crúzios, havia um, como hoje, em frente ao aqueduto. Prolongava-se mais que agora (e duma demolição recente ainda nos lembramos todos), fazendo uma correnteza de casas, tendo só encostadas aos arcos e em frente portanto das outras umas duas ou três.
Tinha para o lado da Penitenciária a modesta capela de S. Martinho, e em ponto levemente anterior o oratório do Santo Cristo das Maleitas, transformação dum cruzeiro de caminho.
Era este o fatal bairro popular que precedia a entrada das cidades fortificadas. Tabernas, pequenos negócios, gente sem eira nem beira, vivendo em tugúrios e pronta a qualquer serviço humilde, a alombar todos os carregos, a encarregar-se de qualquer recado, tudo isso aí ficaria.
Sigamos o caminho, passando sob o arco principal, pois que a topografia foi modificada com o muro do jardim botânico. Era aqui o ladeirento e pequeno campo de Santa Ana, com o chafariz, donde seguia o caminho de Celas e cortava o da Beira para o novo bairrozinho, o de S. José, tirando o nome do colégio conventual de S. José dos Marianos (hospital militar).
… Começava a descida e, à capela de Santo Antoninho dos porcos (pois que ali se fazia o mercado deles) passava o caminho pelo desvio angular que ainda ali se vê, para depois se meter pela ladeira calçada das Alpenduradas.
No fundo da descida, depois do mercado e das traseiras da fábrica, atingindo o vale, encontrava-se, como hoje, o começo do bairro do Calhabé e que se continuava esgarçadamente até perto da passagem de nível, sítio este aonde todos nós conhecemos umas casa baixas. Numa destas parece que viveu o velho Calhabé, prazenteiro e bebedor, mas que fora homem de representação.
Já outrora ninguém pensaria que ainda fosse cidade o Calhabé, bem ao contrário do que os justos fados talharam e que começa a realizar-se: o Calhabé ser a cidade e Coimbra um pobre bairro do mesmo Calhabé!
Podia-se descansar um pouco que uma nova ladeira esperava o caminhante. Lentamente subia-se á Portela da Cobiça. Lançado um último olhar à cidade afastada, transposto o colo, caminhava-se pelo vale transverso até ao rio, que depois se ia acompanhando para cima das Torres. Em frente aos Palheiros esperava-se que a barca do concelho viesse da outra margem e nos transportasse.
A cidade, aonde ficava ela!
… Lá seguiriam os viandantes, pelo cume, até Carvalho. Por Poiares, Almas da Serra, (S. Pedro Dias) iriam cair na Ponte de Mucela, aonde buscariam agasalho conforme a sua bolsa.
A serra máxima, a da Estrela do pastor, esperava-os.
Gonçalves, A. N. 1952. Antigos Caminhos e Pequenos Bairros a Nascente da Cidade. In Diário de Coimbra, edição de 25.12.1951
Concluído em Junho de 1604 o essencial da obra, logo os Professores e clérigos escolares se mudaram no dia 18 de Julho seguinte … O conjunto do Colégio não ficara totalmente concluído até aquela data, sendo a Capela sagrada só em 5 de Maio de 1637.
… o colégio passou a ser popularmente conhecido por Colégio Novo e só anos depois começou a ser referido por Colégio da Sapiência.
… Um alvará de D. João III, de 9 de Maio de 1552, satisfazendo um pedido expresso dos Jesuítas, e a fim de evitar a expansão para nascente dos Crúzios, proibia vender, aforar, ou de qualquer forma ceder um trato de terreno à Porta Nova que os Crúzios estavam a negociar para suas … Aquela Porta Nova … fora entaipada para dificultar a passagem da judiaria … Sobre o seu arco corria uma passagem coberta para ligar a muralha diretamente à Torre de Preconeo … torre que por sua vez estava ligada àquela cerca (a cerca do Colégio dos Órfãos, como era conhecida) … Anos antes os Crúzios pensaram abrir uma passagem mais direta para aquela cerca, que tem uma magnífica colunata conhecida de pouco, e mandaram demolir não só arco reconstruído (da Porta Nova) mas a Torre de Peconeo.
Silva, A.C. 1992. A Criação e Levantamento do Colégio da Sapiência (vulgo Colégio Novo). Coimbra, Santa Casa da Misericórdia de Coimbra. Pg. 32 e 33
Permitam-me algumas notas informativas de quem nasceu e cresceu na Cerca do Colégio dos Órfãos, tendo por Pai um funcionário da Misericórdia de Coimbra profundo conhecedor de todo o espaço em apreço.
Primeira: lembro-me de meu Pai me mostrar o início de uma escadaria atulhada, à direita de um pátio, junto à atual entrada da Faculdade de Psicologia, e de me ter referido que ali começava a escada subterrânea que ligava o Colégio a Santa Cruz.
Segunda: Na Cerca , para além da colunata acima referida, recordo a existência das duas capelas, ainda com vestígios de frescos e encimadas por estátuas de Santos. A que estava no topo da rua com a colunata tinha bancos de madeira e a de cima tinha um assento, em pedra, à volta da mesma.
Terceira: Num dos socalcos da Cerca – o do meio – que designávamos por 'jardim', ainda existiam vestígios de um jardim, nos topos do qual, existiam duas escadarias em pedra que ligavam aos socalcos inferiores.
Quarta: No caminho que indo das escadas a poente do referido 'jardim' para o socalco inferior que era designado por 'recreio', lembro-me de existir, incrustada na parede, uma pedra com uma data inscrita, da qual não me recordo com precisão, mas que julgo era um ano da centúria de 16.
Quinta: Junto à casa da Cerca onde habitávamos eram evidentes os restos da muralha e recordo-me de uma estrutura que agora digo que poderia prefigurar um ângulo de uma torre. No exterior da casa havia uma estrutura que me parecia ser a parte superior do teto de uma abóbada, ouvindo-se o cair da água para dentro da mesma.
Rodrigues Costa
Dado o destino que os seus Colégios tiveram, os Crúzios logo pensaram em edificar um Colégio que substituísse aqueles … Melhor local não poderia escolher que o vasto planalto, levemente inclinado para poente, sobranceiro aos Mosteiro de Santa Cruz, dentro da Muralha, onde os Crúzios ocupavam uma Torre onde tinham os sinos do Mosteiro, conhecida por Torre de Santa Madalena, ou Torre Velha dos Sinos … alguns casebres e terras de cultura, tudo vizinho da oficina de canteiros de João de Ruão, que agora se sabe ali vivia num beco que tinha o seu nome. Aquela torre, entre a Torre do Prior do Ameal e a Torre de Preconeo, é referida no desenho de Moefnagel, e tinha próximo a capela de Santa Madalena, propriedade dos Crúzios, e que dava o nome à Torre … entre os terrenos que os Crúzios adquiriram estava um confinante com a conhecida Torre do Prior do Ameal … Em Julho de 1552 é assinado o primeiro contrato de escambo entre a Câmara e o Mosteiro, contrato em que este cedia àquela o domínio direto de duas casas na Rua do Coruche ‘que he das boas da cidade’, recebendo em troca um ‘pedaço de chão à Porta Nova’, com seu muro e barbacã, e o domínio direto das torres e muros aforados ao licenciado João Vaz.
… Ultrapassadas as dificuldades da aquisição dos terrenos … logo no dia 30 de Março de 1593 se iniciaram as obras, sob traça do arquiteto Filipe Tércio … é naquele dia que é feito solenemente o assento da primeira pedra do novo Colégio … A construção, não obstante rápida dado o volume enorme que tinha, foi sofrendo sobressaltos. Para darem um pouco mais de largura à construção, os Crúzios apropriaram-se de boa parte da rua medieval conhecida por rua ‘que ia da Porta Nova à Sé’, com a projeção aproximada da hoje Rua do Colégio Novo, e assim em domínios da Sé. O Cabido logo interpôs embargos … acabando a contenda por ser solucionada com a transferência para o Cabido de uma propriedade na Beira, pertença dos Crúzios,
Silva, A.C. 1992. A Criação e Levantamento do Colégio da Sapiência (vulgo Colégio Novo). Coimbra, Santa Casa da Misericórdia de Coimbra. Pg. 16 a 20
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