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A 26 de Junho de 1808 …alistaram-se num batalhão académico os estudantes que ainda se encontravam em Coimbra.
… No dia 28, um destacamento de 15 estudantes com um furriel, saiu de Coimbra para fazer aclamar o príncipe regente em Pombal e Leiria, tendo prestado, com o auxílio do povo, relevantes serviços nessa expedição.
… Com muita valentia – segundo se lê em fidedigna fonte de informação – puseram cerco ao forte da Nazaré, tomado aos franceses, fazendo 50 prisioneiros.
... «Enquanto o exército anglo-luso marchava contra os franceses, ficou a brigada académica – caçadores, cavalaria, artilharia e artífices – de guarnição a Coimbra, por ser um ponto importante que convinha manter bem defendido…»
… No princípio de Agosto ainda de 1808, chegou à praça de Almeida, o batalhão académico organizado em Coimbra. E, a 24 desse mês, expediu o marechal Beresford, de Castelo Branco, a seguinte ordem do dia:
«O marechal comandante em chefe do exército, querendo dar descanso à parte do corpo académico de linha, que se acha presentemente em armas, e que tem servido depois da última invasão dos franceses com um patriotismo, um desinteresse e uma vontade que lhe fazem a maior honra, deseja que o corpo passe, para depositar as suas armas, a Coimbra, para que aí estejam prontos, se o inimigo tentar ainda a invasão deste reino, não duvidando que a mesma lealdade ao seu príncipe e amor da pátria, que têm dirigido este corpo, o reanimarão para tornar às armas. O marechal deseja que todo este corpo, que serviu debaixo das ordens do coronel Trant sobre o Vouga, e depois no Porto, que marchou voluntariamente para as fronteiras, receba a sua aprovação e agradecimento por seus serviços.
… Por aviso régio de 11 de Outubro seguinte, foi concedido perdão de ato aos estudantes da Universidade, a pedido das diferentes Faculdades, em atenção aos distintos serviços que haviam prestado os estudantes que se alistaram, e ao valor de patriotismo que desenvolveram.
Nota: Perdão de ato em linguagem atual significaria passagem administrativa.
Loureiro, J. P. 1967. Coimbra no Século XIX. Separata do Arquivo Coimbrão, Vol. XXIII. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra. Pg. 58 e 59, 64 e 65
A 25 de Junho de 1808, saiu de Coimbra em direção à Figueira … um destacamento de 40 voluntários, na sua quase totalidade estudantes, sob o comando de um estudante da Universidade e sargento de artilharia, de nome Bernardo António Zagalo, com o fim de se apoderar do Forte de Santa Catarina.
Zagalo ordenou … que este destacamento … tomasse pela margem esquerda do Mondego, enquanto ele, com quatro cavaleiros seguia pela margem direita … Por toda a parte onde passaram se aclamou o príncipe regente, com repiques de sinos e inúmeros vivas, descobrindo-se as armas reais, onde se encontravam ocultas.
Uma vez juntos em Montemor-o-Velho, prosseguiram na sua caminhada durante a noite, chegando à Figueira às 7 horas da manhã, acompanhados por cerca de 3.000 homens das ordenanças, armados de piques, foices e lanças.
O sargento Zagalo determinou o ataque da vila por duas divisões … Aprisionaram 11 franceses, que andavam fora do forte, e puseram sentinelas à porta do governador.
Encaminharam-se seguidamente para o forte, com o fito de obrigarem a guarnição a render-se pela fome … Mas, adiantando-se o povo temerariamente … o sargento Zagalo surgiu à sua frente e obrigou-o a retroceder.
Nesse momento, porém, os franceses dispararam mosquetaria e uma peça de artilharia sobre o povo que, avisado a tempo, se prostrou no chão, ninguém tendo sido atingido.
… como se estabelecera rigorosamente o cerco … o sargento Zagalo intimou os franceses a renderem-se … ao que o comandante, que era um tenente de engenheiros português, declarou que não podia render-se em virtude do perigo em que colocaria a sua família, que se encontrava em Peniche, em poder dos franceses.
Por esse motivo prosseguiu o cerco e, no dia 17 … recebeu o sargento Zagalo ordem do governador de Coimbra para regressar imediatamente a esta cidade.
Como, porém, desejava terminar satisfatoriamente a empresa a que metera ombros, propôs ao comandante do forte que se entregasse, podendo seguir com a sua gente para Peniche, levando espingardas e mochilas, sem pólvora nem balas.
Aceite a condição … descarregaram-se as espingardas e os franceses foram embarcando para atravessar o rio e tomarem o rumo de Peniche.
O povo, porém, não tendo aprovado esta convenção verbal, foi examinar as cartucheiras dos franceses, descobrindo mais de 20 cartuchos em cada uma, ficando em consequência todos prisioneiros, além de dois tenentes
… A bandeira portuguesa foi arvorada no forte, com salvas de artilharia … Posto isto, seguiram para Coimbra, trazendo consigo os prisioneiros, as suas armas e cinco peças de artilharia para defesa da cidade.
Loureiro, J. P. 1967. Coimbra no Século XIX. Separata do Arquivo Coimbrão, Vol. XXIII. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra. Pg. 57 e 58
No dia 26 (de Junho de 1808) não havendo pólvora para a luta a travar iniciaram-se no Laboratório Químico da Universidade os trabalhos da sua produção, sob a direção do Doutor Tomé Rodrigues Sobral, lente da Faculdade de Filosofia. Nesse dia de tarde, veio da Quinta de Santa Cruz, ainda então propriedade dos frades crúzios, uma carrada de vides para se fazer carvão. Às 10 da noite já havia alguma pólvora feita, faltando contudo o pessoal para a encartuchar. Por isso se mandaram vir do hospital dois soldados portugueses convalescentes, para se lhes incumbir essa tarefa, bem como todos os ourives e funileiros para fundirem as balas. Nessa faina levaram a noite inteira, sem descanso algum, preparando as formas, fundindo metal e ensinando outras pessoas.
Na mesma noite se cuidou de produzir metralha para as peças que se esperavam da Figueira; e às seis horas da manhã estavam feitos mais de 3.000 cartuchos … Até ao dia 14 de Julho estavam já feitos 60.000 cartuchos …
«Além do material de guerra fabricado … foram consertadas grande número de espingardas e preparado um número extraordinário de objetos necessários para a campanha, na fábrica de fiação de Manuel Fernandes Guimarães, estabelecida na Rua João Cabreira…»
No mesmo dia 26, tocando-se a rebate em Coimbra, por haver chegado a Viseu o general Loison (o odiado e temido “maneta”) que segundo voz corrente se encaminhava para Coimbra, o Governador da Cidade, Doutor Manuel Pais de Aragão Trigoso, publicou uma proclamação ordenando a todas as autoridades civis e militares que convocassem às armas as ordenanças, milícias e quaisquer militares que tivessem tido baixa desde o ano de 1801 e todos os corpos civis. E no dia seguinte – maravilha foi presenciá-lo – 15.000 a 20.000 paisanos se apresentaram, «armados de lanças e roçadoiras, armas que não erram o tiro» ávidos de lutarem contra os inimigos.
… Nesse mesmo dia, alistaram-se numerosos estudantes, posto que a maioria se encontrasse já ausente, em gozo de férias. E com os inscritos organizou o Doutor Tristão Álvares da Costa Silveira, lente de cálculo e major de engenharia, um corpo académico.
Loureiro, J. P. 1967. Coimbra no Século XIX. Separata do Arquivo Coimbrão, Vol. XXIII. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra. Pg. 55 a 57
Umas execuções de 9 soldados e de alguns populares feitas pelos invasores nas Caldas da Rainha, a 29 de Fevereiro de 1808, e a opressão tornando-se dia-a-dia mais insuportável, constituíram fatores que tornaram inevitável o rompimento.
… a 22 de Junho, vieram do Porto, em direção a Coimbra, o doutor José Bernardo de Azevedo, José Pedro da Silva e Custódio José da Maia, este acompanhado de alguns voluntários, com o propósito de surpreenderem e aprisionarem a guarnição francesa desta cidade.
Uma vez chegados a Óis do Bairro, trataram de pedir todo o possível auxílio ao respetivo coronel das milícias … marchando incorporados sobre Coimbra a cujo subúrbio norte, no sítio da Ponte Nova, modernamente Rua do Padrão, chegaram às 8 horas da tarde de 23 de Junho.
Uma vez aí, defrontaram-se com quatro soldados de cavalaria dos ocupantes, dois franceses e dois portugueses que, interrogados acerca de quem vivia, prontamente responderam que Napoleão, disparando simultaneamente dois tiros de pistola, correspondidos com uma descarga que pôs três deles por terra, dois mortos e um gravemente ferido, vindo unir-se-lhes o soldado português sobrevivente, que soltou um viva ao príncipe de Portugal … todos arremetendo logo impetuosamente contra a guarda avançada de dez soldados, postada à entrada da cidade, ferindo quatro e prendendo os restantes.
Foi indiscutível o entusiasmo popular resultante deste primeiro êxito, logo se juntando inúmeros voluntários com o apoio dos quais assaltaram o aquartelamento francês, no antigo Colégio de S. Tomás (demolido há anos, erguendo-se em seu lugar o Palácio da Justiça) defendido por 40 soldados, que chegaram a disparar 18 tiros. Mas que foram rapidamente dominados.
O seu comandante, que era um tenente, foi preso na Rua da Sofia, bem como o comissário de guerra e outros franceses.
… Foram chamar o tanoeiro José Pedro de Jesus, juiz do povo, e com ele trataram de descobrir as armas reais da Câmara, bem com as de Santa Cruz e de outros lugares públicos, recobertas com argamassa pelos invasores; e, no dia seguinte … todos os franceses aprisionados, em número de 60, foram enviados na direção do Porto.
Loureiro, J. P. 1967. Coimbra no Século XIX. Separata do Arquivo Coimbrão, Vol. XXIII. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra. Pg. 53 e 54
A 17 de Março de 1808, seguiu de Lisboa para Baiona a referida deputação portuguesa, da iniciativa de Junot, enviada cumprimentar Napoleão Bonaparte. E um dos seus membros foi o reformador-reitor da Universidade e bispo-conde desta diocese, D. Francisco de Lemos de Faria Pereira Coutinho
… Por esse facto, tornou-se o prestigioso prelado suspeito de «jacobino», termo sinónimo de partidário dos franceses, adesão que durante a guerra peninsular foi justamente considerada um dos mais graves crimes, só tendo regressado a Portugal dois anos mais tarde, saído de Bordéus a 15 de Setembro de 1810, e chegando à Mealhada no princípio de Dezembro do mesmo ano.
Tendo, porém, o propósito de dirigir-se a Coimbra, foi impedido de o fazer, recebendo ordem de seguir para o Porto, onde foi sujeito a prolongados interrogatórios por parte do chanceler da Relação e Casa do Porto, plenamente se justificando de tudo quanto praticara.
Mas não foi este o único episódio em que puderam entrever-se estranhos laivos de derrotismo.
A 29 de Maio seguinte (1808), realizou-se uma sessão memorável nas casas da Câmara da vila de Ançã, ao tempo concelho pertencente à comarca de Coimbra … em que tomaram também parte as pessoas mais distintas da nobreza e povo da vila e seu termo, depois de lida uma carta de 17 de Abril da deputação enviada a Baiona, em que vinham promessas de felicidade, feitas e afiançadas por Napoleão … foi assinada uma representação em que se pedia a Napoleão um rei da sua família para Portugal.
E a 28 de Junho seguinte, dois dias após a eclosão do movimento insurrecional de Coimbra, ainda na Figueira da Foz … Ponderando-se que os tumultos e motins populares de algumas cidades e outras terras do reino «contra as autoridades constituídas» faziam temer que ali surgissem também, com grave risco da paz e sossego, assentou-se em que todas as pessoas presentes trabalhassem quanto em si coubesse «para inspirar a todos os mais habitantes sentimentos de tranquilidade e pacificação», e que nesta conformidade se passassem editais.
Todavia, não obstou isso a que noutro auto da Câmara, de 3 de Outubro seguinte, após a expulsão dos franceses do país, se assentasse em fazer uma demonstração de ação de graças pela restauração do reino.
Loureiro, J. P. 1967. Coimbra no Século XIX. Separata do Arquivo Coimbrão, Vol. XXIII. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra. Pg. 52 e 53
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