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No início do século XX o plano estava quase completo. O Matadouro implantou-se no limite norte da Quinta e foi inaugurado em 1897. O mercado foi ampliado e construído o Pavilhão do Peixe segundo projeto de 1901, do Arquiteto Silva Pinto. A estrada de ligação a Celas foi aberta através da rua Lourenço de Almeida Azevedo. O Jardim Público, aproveitando o antigo Jogo da Bola, foi denominado Parque de Santa Cruz e passou a ser utilizado por toda a população, que elegia aquele espaço para a realização de várias festas populares. O parque infantil foi construído na década de trinta, junto à praça D. Luís e denominado o Ninho dos Pequeninos. As águas da quinta foram canalizadas e conduzidas para o chafariz do largo da cadeia. E o planeado boulevard, ícone do urbanismo do século XIX, foi finalmente construído em 1906.
Para além dos equipamentos projetados, o novo bairro permitiu implantar a Escola Central do Ensino Primário (1905), o Teatro-Circo do Príncipe-Real (1892), a Central de Inspeção de Incêndios (1891), a Manutenção Militar e a Associação Comercial e Industrial (1909).
Concluindo
A extinção das corporações religiosas e a consequente desamortização dos seus bens permitiu ao município de Coimbra delinear uma estratégia concertada de modernização da cidade. Numa primeira fase procedeu à simples ocupação dos edifícios e terrenos desocupados, sem relevantes obras de adaptação às novas funções, mas sem descurar a organização geral da cidade. Num segundo momento, consciente das necessidades de cada função, promoveu obras de adaptação ou em casos mais radicais demoliu o existente, como no caso do edifício dos Paços do Concelho.
A maturação da experiência administrativa e a efetiva transformação da cidade contribuíram para um novo entendimento que esteve na base do primeiro levantamento topográfico da cidade, encomendado aos irmãos Goullard em 1873. Conhecendo a cidade, o município conseguiu avançar para lá dos limites cedidos e empreender a primeira operação de crescimento da cidade desde a abertura da Rua da Sofia no século XVI. Aproveitando os terrenos da antiga Quinta de recreio do Mosteiro de Santa Cruz, empenhou-se numa operação ambiciosa e marcou a entrada de Coimbra na era da modernidade, inaugurando de forma consciente o moderno planeamento urbano na cidade.
Fig. 11. Planta da autora de reconstituição da execução do Plano de Melhoramentos da Quinta de Santa Cruz a partir do levantamento da cidade de 1934
Fig. 12. Fotografia vertical do Bairro de Santa Cruz em 1934. Arquivo Histórico das Forças Armadas
Calveiro, M.R. Apropriação e conversão do Mosteiro de Santa Cruz. Ensejo e pragmatismo na construção da cidade de Coimbra. In: Cescontexto, n.º 6, Junho 2014. Coimbra, Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Pg. 227-240. Acedido em
Matadouro
Dos vários equipamentos apontados como essenciais para o funcionamento da cidade, o primeiro a ser criado foi o matadouro municipal. Antes mesmo de cedido o edifício, o município deliberou ocupar o antigo edifício do palheiro da Quinta de Santa Cruz “na esperança de que pelo governo não seria negado à camara aquele pequeno recinto”. Não foi de facto, instalando-se o matadouro municipal neste velho edifício até à construção de um novo na década de 1890.
Nota: O matadouro construído em 1890 estava localizado no terreno hoje ocupado pela igreja de Nossa Senhora de Lurdes e jardim que lhe está junto. Posteriormente este segundo matadouro municipal foi substituído por um terceiro, localizado na Pedrulha, num terreno hoje devoluto.
Matadouro construído em 1890
Planta com a implantação do matadouro
Iluminação Pública
Introduzida em Lisboa, no ano de 1802 pelo intendente de polícia Pina Manique, que mandou colocar candeeiros a azeite em todas as esquinas das principais ruas da cidade, constituía um acréscimo de segurança e conforto, permitindo prolongar “o dia pela noite dentro”. Um ano depois de solicitada, na noite de 17 de Novembro de 1836, as principais ruas e praças da cidade [de Coimbra] começaram a ser iluminadas com candeeiros alimentados a azeite
…. Neste mesmo ano, na capital, começavam os primeiros esforços para a introdução da iluminação a gás e para a construção da primeira fábrica de gás.
…Neste contexto, dezoito anos depois de instalada a primeira iluminação pública nas ruas de Coimbra, presidente Cesário de Augusto de Azevedo Pereira defendeu a substituição pelo novo sistema a gás, utilizado em Lisboa e no Porto e em várias cidades europeias. Além da melhoria da qualidade da iluminação pública, o novo sistema permitia a distribuição de gás aos domicílios. Ainda em 1854 foi assinado o contrato do exclusivo do abastecimento de gás iluminação pública e usos particulares com o empresário inglês Hardy Hislop, concessionário da iluminação na cidade do Porto.
Alçado do gasómetro 1854
Dois anos depois, a fábrica de gás implantada na Rua de Fora de Portas foi inaugurada e Coimbra tornou-se a terceira cidade portuguesa a ser iluminada por este tipo de energia. Apesar de algumas reclamações pontuais, este sistema de iluminação foi amplamente difundido pela cidade e dez anos depois de inaugurado contava com 220 candeeiros públicos e uma ampla rede de canalizações que abastecia a maioria das habitações. Em 1894 o contrato de iluminação foi revisto garantindo o aumento de 130 candeeiros públicos.
Planta de reconstituição da rede de gás e com a implantação da fábrica de gás
Calmeiro, M.I.B.R. 2014. Urbanismo antes dos Planos: Coimbra 1834-1924. Vol. I. Tese de doutoramento em Arquitetura, apresentada à Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, pg. 189-190, 200-202.
A comunicação social, noticiou, que o edifício onde estivera instalada a Manutenção Militar, sito na Avenida Sá da Bandeira, fora reintegrado no património da Câmara Municipal de Coimbra. Esse sucedimento ficou a dever-se, numa primeira conjuntura, ao facto de, na escritura assinada no ano de 1899 entre a edilidade aeminiense e o então Ministério da Guerra figurar uma cláusula que previa a reversão do imóvel para a posse da autarquia, no caso de o “antigo matadouro e respectivos terrenos contíguos” deixarem de ser utilizados para fins militares.
Edificio primitivo da Manutenção Militar
Na sequência da extinção das ordens religiosas acontecida em 1834, a Câmara de Coimbra tomou posse, em 15 de dezembro de 1836, dos edifícios, e não só, do extinto mosteiro de Santa Cruz que lhe haviam sido cedidos pelo Estado; contudo, devido a dúvidas e a abusos de diversa índole ... o governo fez publicar, a 30 de julho de 1839, uma carta de lei destinada a esclarecer que tinham sido concedidos ao município os edifícios do extinto mosteiro de Santa Cruz, com exclusão da igreja e suas dependências, o pequeno laranjal, a horta e a encosta que ficam contíguas aos mencionados edifícios e terminavam na estrada pública situada na zona da Fonte Nova.
Para além da rua que ligava a estrada de Montarroio à horta fradesca, mas ainda no âmbito dos terrenos pertencentes à Câmara, erguia-se o matadouro dos crúzios que, posteriormente, passou a funcionar como municipal. Esse terreno pertencia à edilidade que, após a retirada do matadouro cedeu, por escritura, o terreno, a fim de aí se ergueu o edifício da Manutenção Militar; o imóvel, ao longo dos anos, foi-se ampliando.
Manutenção Militar, ainda se vislumbrando a antiga Viela do Hospício que
durante séculos serviu de saída da Cidade para Norte
Pretende, agora, a Câmara Municipal instalar no imóvel, para além de outras valências, os diversos núcleos do Arquivo Municipal que, ao presente, se encontram dispersos. Para além de dar vida a um imóvel que se encontrava inerte em pleno centro histórico vai facilitar o conhecimento e o estudo de um acervo muito valioso capaz de contribuir para o aprofundar do conhecimento histórico da nossa cidade.
Anacleto, R. In: Diário de Coimbra, 29563, Coimbra, 2017.05.26
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