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Com esta entrada iniciamos uma exploração do que nos é revelado no livro O Património Artístico da Universidade de Coimbra.
O Património Artístico da Universidade de Coimbra, capa
A Capela de São Miguel foi uma das extensões manuelinas dos paços antigos. Do oratório dos primeiros tempos existem alvarás de D. Afonso V que se referem a uma capela, capelães e encargos, etc. A obra atual é inteiramente manuelina, segundo o traçado de Marcos Pires, que faleceu no fim de 1521. Ficou incompleta, faltando o lajeamento, caiações, etc., e os tetos que, sendo de madeira, não eram da sua empreitada, mas pertenciam à de Pêro Anes.
Vista da fachada da Capela de São Miguel. Op.cit., pg. 53
Interior da Capela de São Miguel. Op. cit., pg. 54
As cornijas no transepto e capela-mor que são já renascença e devem-se a Diogo de Castilho. Talvez tenha sido projetada uma abóbada para a capela-mor que, por morte do mestre, abortaria, tanto mais que se deu acabamento sumário aos Paços. Em 1544, estavam ainda tantos entulhos na capela que subiram a 200 carradas. João de Ruão trabalhou também nestas obras de acabamento.
No tempo intermédio continuaram os atos religiosos das obrigações da capeia, mas não se sabe onde se realizavam. Em datas sucessivas, fizeram-se obras secundárias. De 1695 a 1697, foi renovado o teto bem como os telhados. A pintura do estuque é da autoria do pintor lisbonense Francisco Ferreira de Araújo (fal. 1701), e foi renovada, em 1859, por António José Gonçalves das Neves.
O plano é o costumado, dois retângulos, para a nave e capela-mor, tendo aquela duas leves saliências a servir de transepto que, em alçado, terminam abaixo do nível da linha das paredes, da nave, cobertas de pequenas abóbadas nervadas. Os ângulos externos da capela-mor são robustecidos de contrafortes cilíndricos terminados por torreões renascentistas de sabor serliano.
A porta de entrada é lateral, a meio da parede esquerda da nave, acompanhada de duas altas janelas, que se repetem ao lado fronteiro, rasgando-se outras, uma a cada banda, no transepto e na capela-mor, de traçado maís simples.
A porta é uma composição típica de Marcos Pires, num manuelino naturalista. Entre dois contrafortes, em forma de pilar torcido, recorta-se o arco decorativo, tricêntrico, cujos aros se entrelaçam e rematam em desenvolvida cruz. Ficam-lhe inferiores os dois vãos, de verga policêntrica e abatida que um pilar médio separa, pilar fruto duma restauração de 1895, em substituição duma coluna clássica. Fica sobre este o Escudo Real, acompanhado, nos extremos do espaço, da Cruz de Cristo e da Esfera Armilar. Três escudetes suplementares mostram símbolos da Paixão.
Escultura barroca de São Miguel da Capela de São Miguel. Op. cit., pg. 62
No vértice da empena do topo da nave, ergue-se a cópia de uma escultura de pedra, manuelina evocativa de São Miguel, da autoria de Diogo Pires-o-Moço. O original está guardado.
Dias, P. e Gonçalves, A.N. O Património Artístico da Universidade de Coimbra. 2.ª edição revista e aumentada. 2004. Coimbra, Gráfica de Coimbra, Ld.ª
1131, 28 de Junho – Colocação da primeira pedra do Mosteiro de Santa Cruz “o nascimento visível da comunidade sediada na zona dos Banhos Régios, a pouca distância da muralha norte de Coimbra”.
1150 (cerca de) – Ano provável da conclusão do templo, bem como da parte conventual
... subsistem alguns vestígios arquitetónicos da notável igreja românica, que se pode conhecer e reconstruir através de restos construtivos e decorativos de valor excecional, porque realçam um saber qualificado, verdadeiramente responsável pela solidez das estruturas ainda visíveis, levantadas sob orientação técnica do mestre Roberto, coadjuvado de canteiros peninsulares ... a nave, de grandes proporções e com abóbada de berço, seguia da capela-mor até próximo do coro superior, a que correspondem os dois tramos dos atuais abobadamentos. Nos flancos, possuía três capelas laterias, em pleno coincidentes com as presentes e que mutuamente se ligavam por grandes arcos, perspetivando naves colaterais, cujos eixos eram perpendiculares ao da principal. Um átrio, repartido de três estreitas naves perpendiculares e cortadas de três outras transversais, abria na direção da nave central.
1500 (ao longo do século) - ... nos inícios de Quinhentos, começaram as obras do conjunto monumental, repartidas em três fases: a de dom Pedro Gavião que, sob a direção de Boytac, mandou desmanchar o nártex, as abóbadas, fez os atuais abobadamentos e janelas elevadas, a casa capitular, a capela das Donas, a sacristia manuelina; a do Venturoso (D. Manuel I) que, na supervisão de Marcos Pires, estabeleceu terminar os coroamentos da memorável igreja, bem como reconstruir o claustro do silêncio; por fim a de Dom João III, na qual Diogo de Castilho, com Nicolau Chanterene, levantaram o novo portal de pedra branca, na fachada românica
... Repentinamente, tudo desaparecia das interessantes estruturas medievais. Em presença daquelas intensas devastações, o pequeno mosteiro das Donas extinguia-se, ficando livres esses espaços, antes ocupados; o prolongamento das novas alas possibilitaram o claustro da Manga; também um grande refeitório, com anexos e cozinha, ficava circundado dos imprescindíveis apoios e serviços; enfermaria, dormitórios dos cónegos, dos noviços, repartições civis e portaria – com um outro claustro restrito.
Dias, P. e Coutinho, J.E.R. 2003. Memórias de Santa Cruz. Coimbra, Câmara Municipal. Pg. 22, 54, 59 e 61 a 62
Mas parece certo que, ao invés do que ocorreria com a obra crúzia, os trabalhos começariam aqui em obediência a um plano de conjunto – plano a que Marcos Pires dará continuidade, por isso mesmo não só a sua clareza estrutural, como a própria lógica sequencial das «empreytadas» denunciam a existência prévia dessa «conceção geral». Que ao genro de Mateus Fernandes deve, consequentemente, ser atribuída.
De facto, não restam dúvidas de que a intervenção no velho paço fortificado medievo teria o seu início pela ala poente, essa onde avultavam a Capela edificada por D. Pedro e as novas «câmaras» que paralelamente organizara e que, na nova ordem, iriam converter-se nos aposentos da soberana e nas casas do prelado subjacentes. São as campanhas que precederam a entrega do estaleiro a Marcos Pires e, na aparência, as únicas que Boitaca pessoalmente superintenderia. A própria morte da Rainha D. Maria de Castela, em Março de 1517, a quatro dias da nomeação de Marcos Pires por «mestre das nosas obras que se fazem e daquy em diante na dita çidade ouuerem de fazer», obriga a recuar no tempo – ao «tempo de Guomçalo Priuado como de Nycolau Leytam que foram veadores das obras» –, o lançamento desse programa, sabendo-se que o monarca não contrairia terceiras núpcias, com D. Leonor de Aústria, senão em Novembro de 1518, um mês depois do contrato conhecido, da «empreytada noua das casas dos jmfamtes», deixar em silêncio, de forma eloquente, essa ala do palácio, à única exceção da «varanda da Rainha». E é pela medição de 1522 (onde perpassam o «emprestido dos telhados», também ele remontando a Gonçalo Privado e Nicolau Leitão; a «empreytada dos cajamentos», iniciada sob este último e a «dos ladrylhos e guarnyçoes e aluenarias», cujo pagamento se iniciaria em 1519, respeitando todas, necessariamente, a uma área já edificada) que ficamos a saber achar-se concluído e em fase de acabamentos tal setor (por ordem cronológica de assentamento de telhados, caiamentos, ladrilhos e guarnições), quando o Rei confia a Marcos Pires a direção do estaleiro.
Pimentel, A.F. 2005. A Morada da Sabedoria. I. O Paço real de Coimbra. Das Origens, ao Estabelecimento da Universidade. Coimbra, Almedina, pg. 391 e 392
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