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Artur Paredes … nasceu em Coimbra, onde num Colégio iniciou os seus estudos, duplamente órfão desde tenra idade. Em Coimbra viveu, bancário de profissão, até que, já no 1.º lustro da nova década (1920-1930), a subida de categoria o transferiu para Lisboa …
Posto que não chegasse a ingressar na nossa Academia, foi com académicos de sucessivas gerações que sempre conviveu, perfeitamente integrado no ambiente estudantil, como familiar académico sempre considerado, pois o seu coração, o seu temperamento, a sua sensibilidade nunca deixaram de cultivar essas relações opcionais, sendo certo que as entidades diretivas do nosso foro escolar nunca dispensavam a sua válida colaboração, colocado sempre à cabeça de qualquer programa, como atrativo cimeiro.
Mormente o Orfeon e a Tuna, nas consagradas digressões pelo país e estrangeiro – a Espanha, a França e o Brasil que o digam – faziam gala na ostentação da aura a que se guindara, como aval de um triunfo certo da embaixada! E nunca deixou de ser convidado, afastado muito embora da sua terra natal, a colaborar nas comemorações nas mais relevantes efemérides estudantis, em que esteve presente, ultimamente já na companhia de seu filho Carlos.
Precisamente por tudo isto é justamente considerado uma das glórias do património espiritual académico … Pertence a uma família de cultivadores da guitarra. Era guitarrista seu tio Manuel Paredes … Lembra-se ainda, como há dias me revelou, de ouvir tocar seu avô. Mas veio a receber, indubitavelmente, a veia artística que já convergia em seu pai, Gonçalo Paredes …
A glória de Artur Paredes não reside apenas na excelência da dedilhação, na performance imprimida aos motivos preferidos, quase todos da sua criação, ou no requinte da interpretação com que revestiu temas alheios, a que conferiu auréola de valorização.
Seria muito, mas não era tudo.
A dimensão do seu triunfo espraia-se também na inovação imprimida ao habitual sistema de utilização da mão esquerda, a que fez aliar modificações na estrutura do instrumento, na certeza de que só assim atingiria as coordenadas dum outro horizonte, a que nenhum coevo ou posterior epígono teria sido ou virá a ser capaz de subtrair-se.
E assim cuidou da modificação anatómica do instrumento, alargando-lhe a escala, elevando o nível da pontuação, aumentando a altura das ilhargas, no objetivo de uma maior pureza de notas, isoladas ou em associação, e de uma necessária ampliação do campo de ressonância …
Quanto ao outro aspeto, o referente ao efeito melódico, travejamento do tema, detonação da frase – a orquestração, digamos – atenda-se a que tudo ali era desenhado, orientado e executado num sentido profundamente «linear» …
Tal o segredo de Artur Paredes que, sem perder o sentido lírico ínsito na veia tradicional do nosso povo, arvorou o pendão da modalidade orquestral da guitarra portuguesa.
Sousa, A. 1981. O Canto e a Guitarra na Década de Oiro da Academia de Coimbra (1920-1930). Coimbra, Comissão Municipal de Turismo, pg. 20 a 23.
Quando, como escolar, me incorporei (Afonso de Sousa) na Academia de Coimbra, já dela, ou do seu ambiente artístico, se haviam afastado ou se avizinhavam da deserção credenciados cultivadores do canto e da guitarra, de cujas modalidades os da minha geração foram não menos reverenciados continuadores.
Enquadravam-se naquele afastamento os nomes de Manassés de Lacerda, António Menano, seus irmãos Francisco, Alberto e Paulo, Roseiro Boavida, Agostinho Fontes, Paulo de Sá, Borges de Sousa, plêiade de que ainda restavam, cursando estudos um Aires de Abreu, um Aduzindo da Providência, um Lucas Junot …
Em idênticas circunstâncias de temporalidade se deverão contar Edmundo de Bettencourt e Artur Paredes e que, já afamados em 1920, atravessaram todo este decénio …
Desconheciam-se ainda os futuros pares, adventícios reforços da mesma constelação, colunas de um empório cultural que a Academia jamais logrou superar … estou a lembrar-me dum Luís Goes, dum Zeca Afonso, dum Jorge Tuna e, sobretudo … desse genial Carlos Paredes, em cujas mãos se entregaram os últimos segredos dum sortilégio de que a guitarra, até Artur Paredes, se havia mostrado instrumento de cioso engenho.
Efetivamente, Armando Goes, Paradela de Oliveira, Albano Noronha, Almeida d’Eça, Laurénio Tavares, José Pais de Almeida e Silva surgiram ou evidenciaram-se só por volta de 1923/1924 … mas ainda dentro do aludido ciclo, se viram despontar – um Serrano Batista, um Lacerda e Megre, um Felisberto Passos, um Jorge Alcino de Morais (Xabregas), um Fernando Pinto Coelho, outros não citando porque Pinho Brojo. António de Portugal, João Bagão, Luís Goes, Fernando Rolim, embora próximos, se revelaram somente no ciclo ou ciclos imediatos.
…A guitarra de Coimbra, como instrumento criador de arte, veículo de comunicação de arte, impulsionador de transportes emocionais auditivos, emancipou-se … criando nas paragens do Mondego, um estilo «sui generis», de «variações», composições parcelares curtas, mas que, num lógico encadeamento, estruturando uma característica composição a que o autor, consoante o estilo imprimido (alegre, triste, rápido ou aligeirado), atribuirá um título condizente.
Foram afamados executantes, a partir do já lendário Hilário, (que não se limitou a cantar) Alexandre de Rezende, mais compositor e cantor do que executante, Paulo de Sá, Francisco Menano, Sampaio Mansilha, Manuel Alegre, Borges de Sousa, João Duarte de Oliveira, suponho que também João de Deus Ramos … sendo de justiça não omitir, posto que não académicos, os nomes de Antero da Veiga, Gonçalo Paredes – o patriarca de uma geração inultrapassável -, seu irmão Manuel Paredes, Flávio Rodrigues.
Sousa, A. 1981. O Canto e a Guitarra na Década de Oiro da Academia de Coimbra (1920-1930). Coimbra, Comissão Municipal de Turismo, pg. 13 a 19
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