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Monsenhor Nunes Pereira, conimbricense por adoção, foi um Homem, um Sacerdote e um Artista cuja grandeza e simplicidade se tornaram reconhecidas pela Cidade onde viveu a maior parte da vida e que o identificou como um dos seus maiores.
Importa lembrar que o atual Executivo, já perto de terminar o seu mandato, por certo vai, em breve, honrar o compromisso que assumiu, procedendo à inauguração do monumento que o lembrará aos vindouros e cujo projeto foi delineado pelo artista plástico José Maria Pimentel e pelo arquiteto António José Monteiro.
Projeto do monumento a instalar na R. Nunes Pereira
De Nunes Pereira, podemos atualmente admirar muitas obras que se encontram espalhadas por igrejas e por casas particulares, o vitral da Ressurreição que orna, em Coimbra, a capela-mor da igreja de S. José e que pode ser considerado o seu testamento artístico, bem como o espólio que se encontra na Oficina-Museu Nunes Pereira, localizada no Seminário Maior de Coimbra, local onde trabalhou até ao fim da vida.
De momento está ali exposta uma mostra temporária intitulada “Da Terra e do Céu - No Caminho da Esperança” que bem merece ser visitada.
Oficina-Museu Nunes Pereira. Cartaz da mostra temporária
E, se pretenderem aprofundar o conhecimento da sua obra, poderão deslocar-se a Fajão, sua terra natal (concelho da Pampilhosa da Serra), a fim de visitar a Casa-Museu Nunes Pereira.
Uma aldeia típica e um museu que vala a pena ir conhecer.
Casa-Museu Monsenhor Nunes Pereira. Acedida em: https://www.aldeiasdoxisto.pt/media/filer_public_thumbnails/filer_public/ce/...
À dimensão artística da obra de Nunes Pereira há ainda que acrescentar a sua vertente de investigador, com destaque para a antropologia cultural, neste caso, local, de que o seu livro Contos do Fajão é um excelente exemplo.
Nesse volume traduziu, em registo escrito e ilustrado, os contos de raiz popular que foi recolhendo ao longo dos anos, relacionados com a cultura e com as tradições da antiga vila de Fajão.
É para ele que, agora, chamamos a atenção dos nossos leitores.
Capa do livro
Na “Nota Prévia” à 1.ª edição”, a Direção do Museu e Laboratório Antropológico, salienta que Os «Contos de Fajão» tão oportunamente recolhidos por Monsenhor Nunes Pereira tornam-nos espectadores de tramas movimentadas e pitorescas representadas por uma galeria de personagens finamente recortadas pelo olhar perspicaz, atento e sensível do artista, sobre a cultura e tradições da antiga vila de Fajão. Efetivamente, sem perda do colorido e sabor tradicionais, o recolector soube captar com todo o rigor e expressividade o imaginário da autocaricatura introspetiva„ contrastante na sua ingenuidade e sagacidade jocosa, por vezes brejeira, mas acima de tudo de raiz popular, traduzida no registo escrito dos contos.
O valor pedagógico desta obra é referenciado sobretudo na figura do «almocreve», herói cultural que introduz soluções oportunas e «miraculosas», nem sempre devidamente assimiladas, a exemplo de «A caça aos ratos» ou «Como os de Fajão iam à serra todos os dias buscar a manhã», como ainda na emblemática personagem do «Juiz», tão irreverente quanto protagonista de sentenças justas e prontas.
Ao que o Autor acrescenta na “Nota prévia à 2.ª edição”, historiando o seu trabalho. Quando resolvi publicar a coletânea dos Contos de Fajão, que fui recolhendo ao longo de cerca de vinte anos, bem certo estava do seu enorme interesse no campo da literatura oral portuguesa. O interesse com que o Museu
Antropológico da Universidade de Coimbra prefaciou e publicou a primeira edição desta obra, e o facto de ela se ter esgotado, confirmam essa minha convicção.
Ao publicar uma segunda edição, agora a cargo da Junta de Freguesia, através do Museu de Fajão, pareceu-me oportuno acrescentar uma nota.
Numa das minhas viagens à Alemanha, sucedeu hospedar-me em Beckum, pequena cidade da Vatesfália, num hotel dos arrabaldes da cidade. Qual não foi a minha surpresa quando vi nas paredes do hotel pinturas de cenas que lembram os Contos de Fajão.
Soube então que são famosos os "Contos de Beckum", ao ponto de serem referidos nos Guias turísticos e um deles ter figurado numa nota de banco.
Obtive mais tarde fotografias das referidas pinturas, e até um livro, publicado em 1985, mas baseado noutro de 1924, com uma coletânea ilustrada desses contos.
O título do livro é: UNSERE BECKUMER ANSCHLAGE. Não sendo iguais aos de Fajão, são, contudo, semelhantes alguns deles.
Dos vinte e quatro contos compilados no livro, destaco o intitulado “Assim se rosna por sua Vila e termo”, não só pela sua beleza divertida e pedagógica, mas também porque me foi revelado por Monsenhor numa das nossas conversas. Recordo com saudade o seu riso divertido e feliz.
O Juiz de Fajão estava um dia sentado à porta do tribunal com um pé calçado e outro não, a dobar uma meada, quando chegou um sujeito ali dos lados do Vidual
e perguntou: Diz-me onde é que aqui mora o Juiz de Fajão? (Não pediu por favor nem tratou por Senhoria).
E vai aqui assim o Juiz - Olhe: o senhor vá por esta rua acima e volte por aquela rua abaixo; onde encontrar um homem sentado à porta, a dobar uma meada, com um pé calçado e outro não, esse é que é o Senhor Doutor Juiz de Fajão.
O homem foi por aquela rua acima, voltou por aquela rua abaixo, e não encontrou nenhum homem sentado à porta, a dobar uma meada, com um pé calçado e outro não, senão aquele. Então caiu nela e disse: Saberá Vossa Senhoria que eu fui por esta rua acima e voltei por aquela rua abaixo, e não encontrei nenhum homem sentado à porta, a dobar uma meada, com um pé calçado e outro não, senão Vossa Senhoria. Vossa Senhoria é que é o Senhor (Doutor) Juiz de Fajão?
- Assim se rosna por sua Vila e termo!
(Versão de José Maria Simão, de Fajão)
Assim se rosna por sua Vila e termo!
Pereira, A. N. Os Contos de Fajão. 2.ª edição. 2008. Pampilhosa da Serra, Junta de Freguesia de Fajão.
O projeto “Conversas Abertas”, iniciativa do blogue “A’Cerca de Coimbra”, com o apoio do Clube de Comunicação Social e do Arquivo da Universidade de Coimbra, depois de um interregno de cerca de dois anos motivado pela pandemia, vai ser retomado de hoje a uma semana.
Arquivo da Universidade de Coimbra, entrada pela Rua de São Pedro n.º 2, parte baixa e traseiras do edifício da Biblioteca Geral da Universidade
A sessão da próxima semana, a decorrer no dia 25 do corrente, 6.ª feira, a partir das 18h00, terá lugar na sala D. João III, do Arquivo da Universidade de Coimbra.
Pretende-se que seja uma singela homenagem ao conimbricense, por opção, que foi Mons. Nunes Pereira.
Monsenhor Nunes Pereira
Tema: Mons. Nunes Pereira. O homem, o sacerdote e o artista.
Palestrantes: Dr.ªs Virgínia Gomes (Técnica do MNMC) e Cidália Maria dos Santos (Curadora do Museu Nunes Pereira).
No âmbito desta Conversa Aberta o Arq.º António José Monteiro e o artista plástico José Maria Pimentel, farão a apresentação de uma proposta de monumento a Mons. Nunes Pereira a instalar junto à rua com o seu nome, em Coimbra.
Para esta sessão foram dirigidos convites aos Ex.mos Senhores Bispo de Coimbra e Presidente da Câmara, entre outras individualidades.
Xilogravura de NP
A Entrada será livre ao limite da lotação, no respeito pelas diretivas em vigor da Direção Geral de Saúde.
Dedicamos a entrada de hoje e as quatro que se lhe vão seguir ao livro Monsenhor Nunes Pereira. O percurso de uma vida.
Monsenhor Nunes Pereira. O percurso de uma vida, capa
Monsenhor Nunes Pereira. O percurso de uma vida, contracapa
Trata-se, essencialmente, de um magnifico álbum fotográfico dedicado à vida e à obra dessa figura maior de Coimbra que foi Nunes Pereira.
Para além das excelentes imagens, a obra em apreço apresenta, a enquadrá-las, um conjunto de textos passíveis de fazer um relato do percurso de vida do Homem e do Sacerdote que ele foi e da sua obra artística, afanosamente construída ao longo da vida.
A obra de Nunes Pereira merece a atenção dos conimbricenses e a razão dessa relevância surge assim relatada:
Num café de Coja tomávamos a bica.
Veio à conversa a recente edição da Valceira, Associação de Desenvolvimento sediada em Fajão, de uma recolha de quadras populares coordenada por Maria da Conceição Oliveira e ilustrada por Monsenhor Nunes Pereira. Falámos sobre ele, sobre a sua enorme vitalidade, sobre o que conhecíamos da sua vida e obra, que se nos apresentava em fragmentos mais ou menos dispersos do que sobre ele tínhamos ouvido falar ou lido.
Nos minutos seguintes, a admiração que ambos temos por este homem, para quem a arte é uma paixão desde criança e de todos os dias, fez-nos nascer a ideia de uma fotorreportagem. Não pretendíamos ficar presos à sua biografia, nem tão pouco fazer um estudo detalhado da obra realizada, queríamos antes acompanhá-lo no reencontro com os espaços e ambientes que foram a sua vida e transcrevê-los em imagens.
Seria uma justa homenagem e um projeto que concretizaríamos com prazer.
Apresentámos-lhe a ideia.
Com a habitual modéstia hesitou. Parecia-lhe trabalho a mais para pessoa de interesse relativo.
Ultrapassado à força de argumentos este primeiro obstáculo, encontrámos o entusiasmo que lhe é característico e que põe em tudo aquilo a que se dedica.
Seguiu-se a digressão pelos locais onde viveu, acompanhados por este conversador incansável dotado de um sentido de observação, saber e memória extraordinários.
Assim, fomos descobrindo uma obra com uma dimensão muito superior à que imagináramos, tanto na vertente de intervenção social, como na artística. Até neste último aspeto, talvez aquele que julgávamos conhec.er melhor, nos conseguiu surpreender. Sempre munido de caneta e papel, percorreu a vida a registar o que lhe despertava o olhar: são cadernos e cadernos de desenhos gravuras, aguarelas espalhados entre o seu atual atelier e escritório no Seminário, a casa da Portela (Coimbra), o museu em Fajão (Pampilhosa da Serra), as coleções particulares; são as muitas xilogravuras, vitrais e trabalhos em ferro existentes em igrejas do país e outros edifícios. Deparámos com surpresa que, entre as muitas disciplinas artísticas que praticou, também a banda desenhada mereceu a sua atenção permitindo, ocasionalmente, dar curso a um sentido de humor familiar a quantos o conhecem.
A recolha de imagens foi feita ao ritmo das nossas deambulações, sem encenações nem poses.
À medida que iam surgindo, entregávamos-lhe uma cópia para que seguisse o trabalho. Nasceram, assim, espontaneamente, de sua autoria e em jeito de comentário, as quadras que as acompanham.
Nunes Pereira – Retrato a ponta seca da autoria de José Maria Pimentel. Op. cit., pg. 5
Este livro apresenta Monsenhor Nunes Pereira nos espaços que são hoje o seu quotidiano, sugere o ainda possível dos ambientes que condicionaram o percurso da sua vida, regista os objetos que o têm seguido, muitos fabricados pelas suas mãos. A reprodução de obras nele incluídas não pretende fazer qualquer seleção critica, mas apenas dar nota da sua qualidade e diversidade.
Esperamos ter sido merecedores da confiança que em nós depositou.
Pimentel, J.M. e Oliveira, M.C. Monsenhor Nunes Pereira. O percurso de uma vida. Alguns traços para o perfil de Monsenhor Nunes Pereira, A. Jesus Ramos. Percursos artísticos de Augusto Nunes Pereira, Elisabete Oliveira. 2001. Coimbra, Edições Minerva.
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