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Há dias realizamos um curto passeio pela zona do Jardim Botânico e verificámos que a maior parte dos muros e dos portões, muitos deles recentemente recuperados, apresentavam uma enorme degradação decorrente dos escritos que lhe haviam sido apostos.
Concluímos que estávamos perante atos de puro vandalismo, pois trata-se apenas de destruir ou danificar a propriedade alheia, pública ou privada, de forma intencional e sem qualquer outro motivo aparente que não seja o propósito de, sem permissão do dono, causar prejuízos e desfigurar o existente.
A denominação “vandalismo” foi, num primeiro momento, atribuída pelos romanos às ações praticadas por um povo bárbaro germânico, oriundo da Europa Central, que se caracterizava por atuar de maneira selvagem, descontrolada e sem respeito para com nada. Na sequência, essas gentes, acabaram por ser formalmente chamados de Vândalos. Não é por acaso que esse nome, com o tempo, tivesse sido transferido para nossa língua, a fim de denominar as pessoas ou os grupos que se comportam de maneira caótica e, por vezes, violenta.
A comunidade acaba por ser a mais afetada pela destruição referida, na medida em que a situação atinge diretamente os lugares públicos que fazem parte do cotidiano de todos nós.
Estes grupos atuam, na maioria dos casos, pela calada da noite, altura em que a segurança não é tão eficaz, permitindo-lhes uma maior liberdade e dando-lhes a possibilidade de não serem apanhados em flagrante delito.
As inscrições feitas em paredes são vulgarmente chamadas de grafite, grafito ou grafíti, pois trata-se de uma inscrição caligrafada ou de um desenho pintado ou gravado sobre um suporte que não se destina a essa finalidade.
Os grafitos foram olhados durante muitos anos como assunto irrelevante ou como mera infração considerada de pequena gravidade, mas a sua significação tem variado, ao longo dos tempos de acordo com a evolução da sociedade e, atualmente, nalguns casos, já os consideram como uma forma de expressão incluída no âmbito das artes visuais, mais especificamente, da street art ou “arte urbana”, em que o artista aproveita os espaços públicos, criando uma linguagem intencional destinada a interferir na cidade.
Contudo, há quem não concorde e equipare os grafitos à pichação, ou seja, ao ato de escrever ou rabiscar sobre muros, fachadas de edificações, asfalto de ruas ou monumentos, usando tinta em spray aerossol, dificilmente removível, marcadores ou mesmo rolo de tinta. Regra geral escrevem frases de protesto ou de insulto, assinaturas pessoais ou mesmo declarações de amor. Para transmitir a sua mensagem podem utilizar grupos de letras que funcionam como abreviaturas, símbolos e logotipos.
A praga é velha e até já foi pior.
Mas, lentamente, vai voltando e trata-se de uma praga que – em nosso parecer – para ser combatida carece de trabalho persistente levado a cabo, nomeadamente pelas escolas, destinado a alertar os mais jovens para a salvaguarda de um património que é de todos.
Embora o rápido apagar destes “escritos” deva ser uma preocupação das Autoridades, julgamos que a resolução do problema passa, num primeiro momento e primordialmente, pela formação cívica a que deve ser incutida em todos os cidadãos e que estes têm a obrigação de vivenciar.
Aqui fica o nosso protesto acompanhado de elucidativas imagens.
Rua dos Combatentes/Ladeira das Alpenduradas, casa recentemente recuperada
Alameda Júlio Henriques
Alameda Júlio Henriques, muro do jardim dos patos
Jardim Botânico, muros exteriores
Rua dos Combatentes, portão de garagem
… Data de 1818 a aprovação do projecto para o portal principal do jardim, da autoria de José do Couto dos Santos Leal. Trata-se de um desenho a tinta da china e aguada sobre papel que se conserva no Museu Nacional Machado de Castro.
Projecto para o portal do jardim botânico. José do Couto dos Santos Leal. 1818
… O portal de entrada do lado dos Arcos foi levantado também nas primeiras décadas do século XIX.
…Em Outubro de 1854 foi aprovado o projecto geral da estufa, riscada pelo engenheiro francês Pedro José Pezerat, e um ano depois já estavam concluídos os alicerces para esta construção. Em Julho de 1857 celebrou-se com o Instituto Industrial de Lisboa o contracto para a execução da obra, tendo chegado a Coimbra, em Outubro de 1859, a primeira parte da estufa.
Estufa grande. Século XIX
Chegamos a 1873, data da atribuição a Júlio Augusto Henriques da regência da cadeira de botânica e da direcção do jardim (1873-1917). Professor dedicado, investigador incansável, notabilizou-se pela sua pedagogia activa e pelo seu empenho em engrandecer o jardim, o museu botânico e a sua biblioteca. A sua acção extravasa os limites temporais deste trabalho e assume-se como verdadeiro ponto de viragem na história e evolução do “Horto botanico”.
Planta do Jardim Botânico. Segunda metade do século XIX
Este começará a assumir, a partir de então, a forma que hoje conhecemos, embora caiba ao século XX, com a nova reforma da Universidade trazida pelo Estado Novo, a palavra final.
Brites, J.R.C. 2006. Jardim Botânico da Universidade de Coimbra: de Vandelli a Júlio Henriques (1772-1873), Coimbra, 2006 (Policopiado). [Trabalho escrito apresentado no seminário “Património e teorias do restauro”, integrado no Mestrado de História da Arte da Universidade de Coimbra e, depois de refundido, publicado pela autora, com o mesmo título, no Arquivo “Coimbrão. Boletim da Biblioteca Municipal”, Vol. XXXIX, Coimbra, 2006, p. 11-60].
…. Em 1805 o desenhador Gregório de Queirós era encarregado de delinear as obras que se projectava fazer no jardim. Em 1807 realizou-se finalmente a compra, por 1:800$00 reis, da parte da cerca dos Marianos, agendada há já 33 anos, sendo a sua incorporação definitiva no terreno do jardim bem expressa no plano elaborado nesse ano por José do Couto Santos Leal e Neves.
Plano elaborado em 1807 por [José do] Couto [Santos Leal] e Neves
É também deste ano o pronunciamento mais decisivo de Félix Avelar Brotero, encarregado desde 1791 da organização científica do Jardim e da regência da cadeira de botânica e agricultura , acerca do plano a seguir no jardim . O relatório enviado ao reitor, a 5 de Março de 1807, reveste-se da maior importância, quer pelo facto de nele Brotero precisar a definição e os objectivos deste tipo de estabelecimento, quer pela indicação das suas partes essenciais e secundárias, acompanhada do levantamento do que estava feito e do que havia de o ser.
Partes essenciais e secundárias num jardim botânico, segundo Avelar Brotero
Dela se depreende, concomitantemente, uma crítica velada às anteriores restrições pombalinas, as quais, embora na memória, seriam conveniente e conscientemente esquecidas com o passar dos anos e o avolumar de exemplos de similares jardins que outras universidades europeias vinham promovendo.
… O minucioso exame que acabámos de transcrever deixa transparecer não só o pragmatismo do docente, mas também o seu profundo conhecimento da realidade do dito recinto. Contudo, os tempos que se avizinhavam não viriam a permitir que este relatório assumisse o carácter de programa a levar à prática.
Planta do jardim botânico elaborada por [José do] Couto e datada de Outubro de 1807
Com efeito, aproximavam-se as invasões francesas e, com elas, todas as obras seriam interrompidas. O último apontamento que temos do ano de 1807, um plano do jardim elaborado com grande qualidade por José do Couto, ficaria na gaveta e só seria retomado após o fim da Guerra Peninsular.
Brites, J.R.C. 2006. Jardim Botânico da Universidade de Coimbra: de Vandelli a Júlio Henriques (1772-1873), Coimbra, 2006 (Policopiado). [Trabalho escrito apresentado no seminário “Património e teorias do restauro”, integrado no Mestrado de História da Arte da Universidade de Coimbra e, depois de refundido, publicado pela autora, com o mesmo título, no Arquivo “Coimbrão. Boletim da Biblioteca Municipal”, Vol. XXXIX, Coimbra, 2006, p. 11-60].
… A Relação geral do estado da Universidade redigida pelo reitor-reformador e remetida, em 1777, à soberana, materializa o intuito de não deixar cair por terra a reestruturação principiada … Este manuscrito tinha como complemento, segundo se crê, um volume intitulado, na encadernação, Riscos das Obras da Universidade de Coimbra, o qual compreende, além da descrição do estado em que se encontravam, em Setembro de 1777, os novos estabelecimentos, bem como da enumeração das despesas, uma série de trinta desenhos, relativos a essas construções. Os dois finais dizem respeito ao jardim botânico: um é o plano elaborado por Júlio Mattiazzi, sobre o qual já nos detivemos; o outro é o Risco das Estufas do Jardim Botanico da Universidade de Coimbra sem data ou assinatura.
Risco das Estufas do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra. Sem autor. Sem data
Curiosamente, este último encontra também, na biblioteca do departamento de botânica, um desenho que muito se lhe assemelha. Titulado Risco das Estufas do Real Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, o grandioso projecto apresenta, pese embora a sua visível deterioração, as plantas, alçados e cortes das estufas, cuja interpretação nos é facilitada pela legenda à esquerda do conjunto.
Risco das Estufas do Real Jardim Botânico da Universidade de Coimbra. Sem autor. Sem data
Por outro lado, o facto de tanto o plano do jardim como o das estufas que se acham na dita biblioteca encontrarem um “correspondente” nos desenhos enviados em 1777 à soberana, leva-nos a considerar a hipótese de ter havido, da parte do reitor, a tentativa de retomar a configuração outrora reprovada pelo ministro de D. José. Se assim foi, o intuito de D. Francisco de Lemos não vingou uma vez mais, pois nem estas estufas foram construídas, nem o jardim obedeceu ao grandioso feitio. O remediado plano seguido parece ter sido, afinal, o resultado da adaptação das linhas italianas às possibilidades económicas, às sensibilidades dos que sobre este espaço se foram debruçando, aos condicionalismos do terreno e das ocasiões e às necessidades pedagógicas que reclamavam um ponto final a este moroso processo construtivo.
… O projecto para as estufas no jardim botânico, assinado por Manuel Alves Macomboa e datado de Abril de 1791, articula uma resposta a esta necessidade.
Projecto para as estufas no Jardim Botânico. Manuel Alves Macomboa. 1791
Desconhece-se se este traçado veio a ser executado. No entanto … parece-nos que tal proposta veio a ter, de forma parcial, seguimento.
Projecto para o jardim botânico. Sem data nem assinatura
…. Em 1801 ordenou a construção das escadas do segundo plano. O desenho a tinta da china e aguada castanha e cinzenta sobre papel, não datado nem assinado, que se encontra na biblioteca geral da Universidade de Coimbra, constitui, com probabilidade, o projecto, guisado no final do século XVIII e posto em prática no começo da centúria seguinte, para o levantamento das escadas que “se andem fazer para subir do 2.º o 3.º plano”
Brites, J.R.C. 2006. Jardim Botânico da Universidade de Coimbra: de Vandelli a Júlio Henriques (1772-1873), Coimbra, 2006 (Policopiado). [Trabalho escrito apresentado no seminário “Património e teorias do restauro”, integrado no Mestrado de História da Arte da Universidade de Coimbra e, depois de refundido, publicado pela autora, com o mesmo título, no Arquivo “Coimbrão. Boletim da Biblioteca Municipal”, Vol. XXXIX, Coimbra, 2006, p. 11-60]
Esta planta apresenta uma notória semelhança com o Risco do Jardim Botânico para a Universidade de Coimbra, não datado, da autoria de Júlio Mattiazzi, publicado juntamente com outros Riscos das obras da Universidade de Coimbra, em 1983, pelo Museu Nacional Machado de Castro.
Risco do Jardim Botânico para a Universidade de Coimbra, Júlio Mattiazzi. Sem data
Este projecto foi, com probabilidade, formulado a jusante do primeiro, pois denota em relação a ele alguma simplificação.
… Num ofício de 5 de Outubro de 1773, o estadista rejeita veementemente o “dilatado espaço”, talhado “pelas medidas da (…) Fantasia”, o qual “absorberia os meyos pecuniarios da Universidade antes de concluir-se”.
… Os trabalhos acabariam por se iniciar sob planos mais modestos, mantendo, todavia, um traço tipicamente italiano. A Universidade tomou conta do terreno a 16 de Janeiro de 1774 e sem demora as obras foram avançando. Principiou-se a construção da muralha de suporte do lado da cerca dos Beneditinos, bem como as obras de terraplanagem. Para ambas foram aproveitadas grandes quantidades de pedra e entulho, provenientes de demolições de parte do edifício dos Jesuítas e do castelo.
Em Novembro desse ano o horto botânico estava pronto para receber as primeiras plantas, vindas por mar … Da sua plantação era encarregado Júlio Mattiazzi, jardineiro do Real jardim botânico da Ajuda, o qual deveria regressar à corte após o cumprimento de tal diligência, ficando João Luís Rodrigues responsável por delas cuidar, tornando-se este, assim, o primeiro jardineiro do novo jardim.
… Resta-nos a certeza de que, pouco depois da vinda do referido jardineiro, se realizaram alterações ao nível da área e nivelamento do jardim. De facto, entendendo-se necessário aumentar o terreno destinado às culturas, o Reitor estendeu, através da compra de um olival, a área do jardim até à estrada pública e pediu autorização ao Governo para adquirir mais terreno, com vista a conferir ao Horto uma forma mais regular. Concedida a licença a 7 de Dezembro de 1774, a compra foi ajustada com os frades marianos, apesar de só muito mais tarde ter sido realizada.
Em 1776 construiu-se uma pequena estufa, no valor de 82$265 réis, para se poder realizar a cultura de algumas plantas mais delicadas. A partir de 1777, com o falecimento do rei D. José I e a consequente morte política do Marquês, o abrandamento do ritmo das obras universitárias não deixou de se reflectir também na construção deste estabelecimento, apesar dos esforços movidos por D. Francisco de Lemos para cativar a atenção da nova rainha, D. Maria I.
Brites, J.R.C. 2006. Jardim Botânico da Universidade de Coimbra: de Vandelli a Júlio Henriques (1772-1873), Coimbra, 2006 (Policopiado). [Trabalho escrito apresentado no seminário “Património e teorias do restauro”, integrado no Mestrado de História da Arte da Universidade de Coimbra e, depois de refundido, publicado pela autora, com o mesmo título, no Arquivo “Coimbrão. Boletim da Biblioteca Municipal”, Vol. XXXIX, Coimbra, 2006, p. 11-60].
O jardim botânico de Coimbra nasce com a reforma pombalina da Universidade, constituindo um dos mais fiéis reflexos do espírito e objectivos que a impulsionaram.
… É certo que o projecto de criação de uma tal valência na cidade não era novo pois, durante o longo reitorado de Francisco Carneiro de Figueiroa, Jacob de Castro Sarmento enviara àquele reitor, um plano, idealizado pelo arquitecto E. Oakley, com data de 1731, para a realização de um jardim botânico.
Planta para um Horto Botânico delineada pelo arquitecto E. Oakley
A gravura apresenta quatro canteiros quadrangulares, cortados por oito ruas convergentes para uma fonte central de repuxo. Num dos topos, figura a planta e o alçado neoclássico da fachada principal da biblioteca de botânica.
… Não passaria, contudo, do papel, sendo necessário aguardar pelo pragmatismo férreo da «nova fundação» para que a formulação concreta de um horto botânico no espaço da Universidade visse a luz do dia.
… Os novos Estatutos foram publicados em 1772 …. Previa-se ainda a construção de diversos equipamentos … e o jardim botânico (agregados à faculdade de Filosofia).
… A 3 de Fevereiro de 1773, o reitor-reformador tranquilizava o ministro, noticiando-o de que “já se acham n’esta cidade os Doutores Ciera, Vandelli e Dalabella, e com elles e Franzini irei ámanhã ver o sítio que V.ª Ex.ª designou para n’elle estabelecer-se o Jardim Botanico.”.
… Finalmente, uma solução reuniu consenso: “a parte da mesma cêrca [dos monges beneditinos] que confronta de uma parte os Arcos da cidade, da outra com a estrada que vae para S. José dos Mariannos, e da outra com huma vinha dos ditos P.es Mariannos”.
Planta do terreno destinado para o Jardim Botânico, 1773(?)
... No espaço de meses, os professores italianos enviam para Lisboa uma sumptuosa planta para o jardim botânico da Universidade de Coimbra.
Planta para o Jardim Botânico da Universidade de Coimbra. 1773 (?)
Trata-se, presumivelmente, do desenho a tinta de china e aguada sobre papel que se encontra na biblioteca do departamento de botânica, sem data ou assinatura devido à falha que apresenta na sua parte central superior, onde se leriam essas informações, bem como as legendas do plano.
Brites, J.R.C. 2006. Jardim Botânico da Universidade de Coimbra: de Vandelli a Júlio Henriques (1772-1873), Coimbra, 2006 (Policopiado). [Trabalho escrito apresentado no seminário “Património e teorias do restauro”, integrado no Mestrado de História da Arte da Universidade de Coimbra e, depois de refundido, publicado pela autora, com o mesmo título, no Arquivo “Coimbrão. Boletim da Biblioteca Municipal”, Vol. XXXIX, Coimbra, 2006, p. 11-60].
É tradição dizer-se que o Jardim Botânico de Coimbra foi projetado por Vandelli. Uma análise mais aprofundada mostra, no entanto, que o Jardim que vimos hoje já nada tem que ver com Vandelli e foi sendo feito pelos sucessivos diretores. O projeto (c. 1773) ... foi chumbado pelo marquês de Pombal, por excesso de luxo.
... a proposta de Vandelli ficou reduzida a um terraço, a que se chamou o “Quadrado”: na encosta da cerca do convento beneditino, onde se instalara a universidade por altura da Reforma Pombalina. Deste projeto restam os muros de suporte, pois o espaço foi totalmente remodelado, correspondendo hoje ao tabuleiro mais largo com fontanário central e canteiros em arco, desenhados na altura em que o professor Abílio Fernandes foi diretor do jardim (de 1942 a 1974)
Jardim Botânico planta executada em Agosto de 1807
Felizmente, encontra-se também no arquivo uma planta do Jardim Botânico, que segue as instruções de contenção do marquês e foi mandada desenhar sob orientação de Brotero. Este sim foi o primeiro impulsionador da maior parte do Jardim Botânico, construído e plantado para o ensino da Botânica na Universidade de Coimbra.
Jardim Botânico, canteiros
... Das descrições de Brotero sob a forma de preparar um jardim, confirmamos ainda hoje, no terreno, algumas partes, e o belíssimo resultado de um jardim bem planeado, mesmo passados duzentos e quarenta anos. Os tabuleiros que hoje vimos quando entramos na porta central do jardim, onde uma estátua foi erguida ao grande mestre Brotero, são preenchidos por canteiros longitudinais ladeados de buxo. Apesar de hoje não existirem as três mil espécies que Brotero ali juntou, o traçado é bom, a rega foi pensada, a exposição é a melhor da colina que desce para o Mondego, a drenagem funciona: quando for possível refazer a coleção broteriana, não haverá grande dificuldade em plantar as famosas escolas, segundo o sistema de classificação que se entender.
... No século XIX, Júlio Henriques melhora o sistema de águas e, no século XX, Abílio Fernandes manda construir a estufa fria ... Durante a direção deste professor, é colocada uma fonte no centro do Quadrado e são efetuadas melhorias de canalizações, hoje visíveis.
... a estufa que hoje vemos, à direita da grande escadaria, é um belo exemplar da arquitetura de ferro de meados do século XIX.
Jardim Botânico bambuzal
... quando um dia abrir (a mata) os seus 13,5 hectares e ligar a parte alta da cidade às margens do rio, por onde, no passado, chegavam as remessas de plantas, a visita poderá oferecer um passeio pelo mágico bambusal de «Phyllostachys bambusoides», e, escondida no meio deste ambiente oriental, permitir encontrar a capela de São Bento abobadada e coberta de musgo. Relembra-nos a presença dos beneditinos, que mais abaixo deixaram também uma fonte alimentada por uma mina de água, com parede e banco forrados a azulejos do século XVII, local de paragem antes de subirmos para o miradouro.
Castel-Branco. C. Os jardins de Coimbra. Um colar verde dentro da cidade. In: Monumentos. Revista Semestral de Edifícios e Monumentos. N.º 25, Setembro de 2006. Lisboa, Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, pg. 177-180
Fr. Diogo de Murça, monge de S. Jerónimo, fundou em 1555 um Colégio universitário para os «Monges-estudantes de S. Bento», dando-lhes pousada provisória no próprio edifício dos paços reais.
... Não se descuidaram porém os beneditinos de irem tratando de arranjar instalação propriamente sua.
Adquiriram fora da Almedina, no lugar chamado «Genicoca», a Este e Sul da muralha da cidade, umas propriedades, que com o decorrer do tempo foram ampliando, até atingirem a margem do rio. Terreno fertilíssimo, admiravelmente exposto, e que se prestava a grande variedade de culturas, e a plantações florestais. Na parte mais alta, de vistas largas e maravilhosamente belas, projetaram a construção dum grande edifício para o seu Colégio.
De 1568 a 1570 construiu-se o aqueduto de S. Sebastião, para abastecimento de água da cidade, e os arcos daquele aqueduto ficaram em parte situados dentro da propriedade dos colegiais beneditinos.
Colégio de S. Bento, na primeira metade do séc. XIX
... Em 1576 haviam começado as obras do edifício...
Colégio de S. Bento, ala poente
A última das projetadas obras a realizar-se foi a construção da igreja. Quando esta se deu por pronta, já havia muito que o Colégio era habitado definitivamente pelos colegiais, que no interior dele tinham uma capela provisória... Realizou-se com grande solenidade a sagração do magnífico templo... 19 de Março de 1634.
Colégio de S. Bento igreja
... O Colégio beneditino era o maior e mais importante dos edifícios colegiais universitários, exceto o de Jesus, da fábrica maior; mas numa coisa se lhe avantajava o de S. Bento, na situação privilegiada em que se achava, com a esplendida cerca contígua, e o panorama formosíssimo que dele se gozava.
Foi demolido há pouco anos o templo de S. Bento. Era muito vasto e de grande valor arquitetónico, de traça bastante parecida com o templo da Sé Nova, mas tendo a abóbada da capela-mor ricamente ornamentada com decoração escultural admirável.
... Quando se realizou a reforma da Universidade em 1772, os beneditinos do Colégio de Coimbra ofereceram espontânea e generosamente ao Marquês de Pombal a parte da sua cerca, que fosse preferida, para nela se constituir o Jardim Botânico da Universidade.
... Pela extinção das Ordens religiosas; em 1834, ficou abandonado o edifício de S. Bento... 21 de Novembro de 1848 ... ordenou que fossem entregues à Universidade ... para colocação dos estabelecimentos filosóficos, gabinete de agricultura ... com a respetiva cerca, destinada para ampliação do Jardim Botânico.
... Em 1849 foi destinada uma parte do edifício a quartel militar. As barbaridades, vandalismos selvagens e atos de rapinagem, que a soldadesca lá praticou, constituem uma das páginas vergonhosas da história daquele tempo.
... No fim do ano letivo de 1869-1870, realizou-se a transferência do Liceu de Coimbra, que até este ano inclusive funcionara no edifício do Colégio das Artes, para o Colégio de S. Bento.
Vasconcelos, A. 1987. Escritos Vários Relativos à Universidade de Coimbra. Reedição preparada por Manuel Augusto Rodrigues. Volume I e II. Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra, pg. 243, do Vol. I
Em Coimbra, o Jardim Botânico era local aprazível. No Colégio das Ursulinas que lhe ficava contíguo, principalmente em Maio, à tarde, praticava-se a devoção do mês de Maria, o que, o tornava de passagem obrigatória. As damas, envergando os seus melhores trajos, piedosamente, dirigiam-se à igreja, a fim de tomar parte naquela devoção mariana e os cavalheiros, molemente encostados às grades, viam-nas passar, outorgando com a sua presença a organização de tômbolas e festejos. Além dos agradáveis momentos de ócio que estes proporcionavam, permitiam ainda auxiliar qualquer obra de caridade. Em 1899, o Dr. Júlio Henriques, ilustre director daquele Jardim, mandou vir bambus das nossas colónias, afim de construir, na alameda principal, mesmo em frente ao edifício de S. Bento, um coreto onde a música pudesse executar algumas peças do seu repertório. Colmatava desta forma a lacuna que em Coimbra existia, porque tanto o do Cais como o da Quinta de Santa Cruz se encontravam degradados. Esperava-se, contudo, que brevemente fossem reformulados, até porque as filarmónicas da cidade já haviam solicitado à câmara autorização para tocar aos domingos nos referidos coretos. A construção do Botânico alegrou os janotas do tempo e, segundo constava, iria ficar «muito elegante e de excelente gosto» .
Cá em baixo, mesmo junto ao rio, desde 1887 que se transformava lentamente o largo espaço do Cais das Ameias num belo Passeio Público, com canteiros ajardinados e maciços de verdura. Colocava-se o gradeamento do lado do rio e empedravam-se os passeios. Coimbra, no dealbar do século XX, totalmente desfasada até já da capital, aspirava ver concluídas estas obras que lhe permitiriam usufruir, pela disposição, aproveitamento, frescas sombras e formoso panorama, de um dos melhores Passeios Públicos da província . Dirigia os trabalhos o Eng. Jorge de Lucena .
Fazer construir um coreto decente era tarefa que urgia, até porque, realmente, aos domingos a banda exibia-se e, para tal, utilizava aquela ruína a que impropriamente se atribuía tal denominação .
Mas as obras do Cais prosseguiam lentamente, não só porque as dotações camarárias e estatais eram mínimas, como também porque por vezes as desviavam e, em 1902, aquando da efectivarão das festas da Rainha Santa, trabalhava-se ainda febrilmente a fim de as conclui , o que não se verificou .
E toda a imprensa citadina continuava a insistir na necessidade de erguer no novo Passeio Público um coreto que estivesse à altura dos pergaminhos do burgo. Não como aqueles que normalmente se levantavam por ocasião da romaria do Espírito Santo ou da passagem por Coimbra de qualquer personalidade ilustre , arquitectura efémera, logo desmontada e eventualmente destruída após ter servido o fim a que se destinava, mas algo de sólido, duradouro e artístico, procurando honrar o autor e prestigiar a edilidade promotora da construção.
A fim de satisfazer o povo de Coimbra e lhe proporcionar uma distracção de que já desfrutavam outras terras portuguesas com muito menos habitantes, a câmara presidida pelo Dr. Dias da Silva deliberou na sessão de 25 de Junho de 1903 aprovar o orçamento para a construção do envasamento do «encantado» coreto afim de, posteriormente, lhe ajustar um pavilhão de ferro que não podia ultrapassar os 358$563 réis
Anacleto, R. 1983. O coreto do parque Dr. Manuel Braga em Coimbra, In Mundo da Arte, 14, Coimbra, 1983, p. 17-30, il., sep. Pg. 5 a 7
O traçado das ruas da cidade romana é indeterminável, pois os únicos edifícios romanos descobertos – o criptopórtico e a cave em frente da Sé Velha – são insuficientes para nos determinarem orientações.
A mediévica Porta do Sol era provavelmente, já no período romano, umas das entradas da cidade; ficava situada ao cimo da rampa natural que o aqueduto romano acompanhava. Do facto de quase todas as inscrições funerárias romanas de Coimbra terem sido achadas metidas nos muros do Castelo, ou nos panos da muralha entre este e a Couraça de Lisboa, V. Correia concluiu que o cemitério romano deveria ficar situado na encosta de S. Bento e do Jardim Botânico, isto é a poente da ladeira que subia até à Porta do Sol.
Desta entrada da cidade, divergiam muito possivelmente duas vias: uma delas, que na Coimbra moderna (mas anterior à demolição da Alta da cidade) era chamada Rua Larga, conduzia ao sítio que o edifício antigo da Universidade presentemente ocupa. Aqui, não pode deixar de ter existido um edifício romano importante, provavelmente publico … Outra via descia do sítio da Porta do Sol ao antigo Largo da Feira e daqui, pelo Rego de Água e Rua das Covas ou de Borges Carneiro, ao largo da Sé Velha. Se este era o principal arruamento da cidade romana no sentido leste-oeste, é tentador ver, na Rua de S. João ou de Sá de Miranda e na de S. Pedro, o eixo principal norte-sul. Nogueira Gonçalves, porém, considera esta última um corte artificial, talvez operado no século XVI.
Se o monumento romano à Estrela era um arco honorífico, devia marcar o início de uma rua da cidade. Esta seria a do Correio ou de Joaquim António de Aguiar, que António de Vasconcelos representa na sua planta de Coimbra no século XII. Na mesma planta, um outro arruamento, de antiguidade bem provável, é definido pelas ruas da Trindade, dos Grilos ou de Guilherme Moreira e da Ilha. Da antiguidade da Rua do Cabido, representada ainda na mesma planta, duvidamos algum tanto; inclinamo-nos mais a ver na Rua do Loureiro outra das principais vias antigas.
Tudo isto, porém, é conjetural.
Alarcão, J. 1979. As Origens de Coimbra. Separata das Actas das I Jornadas do Grupo de Arqueologia e Arte do Centro. Coimbra, Edição do GAAC. Pg. 39 a 40
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