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Nesta entrada iremos referir os objetos de arte levados de Santa Cruz, para o hoje Museu Nacional Soares dos Reis, arrolados no seguinte documento transcrito por Madaíl.
Mosteiro de Santa Cruz, santuário
«Termo de entrega das pinturas e mais objectos para o Mozeu da Cid.e do Porto
Aos quatro de Junho de mil oitocentos e trinta e quatro annos em Coimbra e Mosteiro de Santa Crus aonde eu Escrivão vim Com Francisco Pedro de Oliveira e Souza, Comicionado do Mozeu Portuençe para este na forma da ordem retro escolher, e Serem entregues os objectos que houvesse na mesma Casa para fazer Conduzir ao mesmo Mozeu e procedendo o mesmo na mesma escolha Se entregar e lhe forão entregues os objectos escolhidos que Saõ os que Se Seguem –
Seis paizages ao Devino pinturas em Cobre
Seis floreiros ditos, em Cobre
Cinco Nascimentos do Menino, em Cobre
Tres descimentos da Crus, em Cobre
Quatro Vezitações dos tres Reis Magnos, em Cobre
Tres Santos Antonios a receber o Menino, em Cobre
Huma pintura da flagelação de Christo, em Cobre
Outra ditta Calvario, em Cobre
Duas dittas a Sepultar Christo, em Cobre
Outra ditta = Senhora da Piedade, em Cobre
Outra ditta = Vezitaçaõ de Santa Izabel, em Cobre
Duas ditas Assençaõ de Nossa Senhora, em Cobre
Outra ditta de Trnafiguraçaõ no Horto, em Cobre
Outro ditto de Santa Izabel Raynha da Ungria, em Cobre
Outro ditto = Morte de Saõ Francisco, em Cobre
Outro ditto = Baptismo de Christo, pintura em pedra
Outro ditto de Nossa Senhora apresentando o menino a Santa Catherina, em Cobre
Outro dito de Saõ Joaõ pregando no dezerto, em Cobre
Outra ditta de Nossa Senhora entre huma gloria de Meninos Com dois Santos em adoração.
Outros ditos de Saõ Pedro, e São Paullo em Cobre e redondos
Duas famílias Sagradas, piquenas em Cobre
Huma dita redonda, Senhora da Cadeira, pintada em pedra
Outra pintura dita do Nascimento pintada em pedra e ouvada
Hum saõ Jeronimo em Cobre
Outra pequena pintura em pedra, vezitaçaõ dos tres Reis
Quatro Evangelistas, pinturas em Cobre
Huma Senhora com o Menino em Cobre
Santa Maria Magadallena em Cobre
Vinte e Seis pequenos quadros esmaltados em Cobre, da Paixão de Christo.
Mestre da Paixão de Cristo; esmalte pintado sobre cobre. In: O Património Artístico das Ordens Religiosas entre o Liberalismo e a atualidade
Três notas finais;
– No documento ora transcrito são ainda arrolados 21 títulos, sendo o primeiro Antiguidades Gregas, Italicas, e Romanas com 52 volumes;
- Para além da livraria do Mosteiro também foram também levados livros do Colégio de S. Agostinho, sendo referido o título Homens Ilustres, com 52 volumes;
Colégio de S. Agostinho, claustro. Coleção Regina Anacleto
- Não foram encontrados documentos referentes à retirada da espada dita de D. Afonso Henriques, nem da escrivaninha/tinteiro, aqui referidos em entradas próprias.
Madail, A.G.R. 1949. Inventário do Mosteiro e Santa Cruz à data da sua extinção em 1834. Separata revista e aumentada da Revista O Instituto , vol. 101, 1943, acedida em:
http://webopac.sib.uc.pt/search~S17*por?/tinstituto/tinstituto/1,291,309,E/l856~b1594067&FF=tinstituto&1,1,,1,0
Nesta entrada iremos abordar o que foi levado de Santa Cruz no que respeita a livros e manuscritos. Madaíl começa por referir que com a ocupação de Coimbra pelas forças liberais em 8 de Maio de 1834, cidade que era conhecida, desde o relato de Balbi, pelas suas magnificas Bibliotecas monásticas, caem, ato contínuo dois emissários da Comissão de Administração dos bens dos Conventos abandonados … um deles era Francisco Pedro de Oliveira e Sousa, por parte do Museu portuense; o outro, Alexandre Herculano, pela Biblioteca.
Ao Subprefeito da Província em Coimbra, José Maria Ribeiro Vieira de Castro, repugnou a diligência, que constituía um enxovalho e uma espoliação à cidade, e contrariava as instruções de 18 de Maio que o encarregavam de nomear uma comissão responsável pelos bens dos Conventos. De nada valeu porque em 30 de Maio foi determinado que nada mais lhe competia que cobrar deles recibos dos objetos que escolherem.
… Em 5 de Junho estava a escolha feita, concluída a relação de tudo, assinados os recibos e apensos ao processo; só um deles se encontra datado, mas todos são do punho dos próprios comissionados e constituem impressionantes relações de preciosidades arrebatadas injustamente a Coimbra, que, havia três séculos já, dispunha duma biblioteca na Universidade onde tudo devia ter sido recolhido; por iniciativa do Vice-Reitor, certamente alarmado com o conhecimento do que os comissionados do Porto estavam levantando, como a conjugação das datas permite concluir, assim o compreendeu, e dispôs, a Portaria de 9 desse mês, mandando recolher à Universidade os livros de objetos de Museu.
… Em dezembro de 1834 é que a Universidade foi entregue do que restava da famosíssima Livraria do Mosteiro de Santa Cruz. Chegava em último lugar…
O que foi levado para o Porto foi arrolado em diversos recibos, sendo:
- Manuscritos, num total de 157, sendo o primeiro da lista o Breviarium gothicum.
Breviarium gothicum. Edição impressa de 1775
Imagem acedida em: https://archive.org/details/A104159/page/n6/mode/2up
- No que concerne livros e documentos – de diferentes tamanhos e alguns com dois ou mais volumes – foram agrupados por temas:
- História e Antiguidades, com 439 títulos, sendo o primeiro Historia de la India oriental por San Roman;
Imagem acedida em:
https://www.literaturabrasileira.ufsc.br/documentos/?action=download&id=42118
- Literatura, com 125 títulos, sendo o primeiro Statii opera;
- Ciências e Artes, com 160 títulos, sendo o primeiro Annales du Musée trinta e volumes;
Imagem acedido em:
: https://www.biodiversitylibrary.org/item/189419#page/5/mode/1up
- Jurisprudência, Economia, Política, com 21 títulos, sendo o primeiro Cours diplomatique avec Supplement;
- Teologia, com 37 títulos, sendo o primeiro S. Philastrii opera.
Ou seja, foram levados de Santa Cruz 782 títulos, necessariamente com um número muito maior de volumes. Número que há época era extremamente significativo.
Termina Madail com a seguinte nota.
Herculano deve ter retirado de Coimbra precipitadamente, perante o visível despertar da opinião pública, e o protesto do Vice-reitor da Universidade … A própria Câmara Municipal procurou «varrer sua testada»; convocou uma reunião extraordinária em 5 de junho, data, justamente, da entrega dos objetos aos comissionados do Porto, ficando na ata, para memória, o registo seguinte: «E nesta se deliberou que se fizesse hum officio ao Dezembargador Corregedor desta Cidade para elle, sendo sua attribuiçaõ impedice a remessa dos objectos».
Protesto inútil, meramente formal; fora exatamente o Corregedor quem recebera do Sub-Prefeito ordem para tudo deixar escolher.
Madail, A.G.R. 1949. Inventário do Mosteiro e Santa Cruz à data da sua extinção em 1834. Separata revista e aumentada da Revista O Instituto , vol. 101, 1943, acedida em:
http://webopac.sib.uc.pt/search~S17*por?/tinstituto/tinstituto/1,291,309,E/l856~b1594067&FF=tinstituto&1,1,,1,0
Sob esta epígrafe publicamos há algum tempo um conjunto de informações relativas ao que foi “tirado” do Mosteiro de Santa Cruz e levado para o Porto.
O entendimento das razões desse facto e do que foi levado é possível conhecer a partir do trabalho de Rocha Madaíl que iremos passar a utilizar. Nesta entrada iremos procurar compreender as razões que estavam subjacentes à ira liberal contra o Mosteiro, começando com a seguinte citação de um documento divulgado por Madaíl no trabalho em apreço. Trata-se de uma carta datada de 30 de Maio de 1834 dirigida pelo Sub Prefeito Interino Joze Maria Ribeiro de Castro, ao Corregedor da Comarca de Coimbra, Manuel Homem Rebelo Freire de Almeida.
Sendo publico, e notorio que o Prelado Geral do Convento de S.ta Cruz desta Cidade, e mais quatro Religiosos Conventuaes do mesmo Mosteiro, se evadirão, e abandonarão aquella Caza na occazião da entrada das Tropas Fieis [8 de Maio de 1834] nesta Cidade e Acclamação do Governo Legitimo de S. M.J. o Duque de Bragança Regente em nome da Rainha; e sendo de igual notoriedade publica que o referido Prelado serviu hostilmente contra o Governo do Mesmo Augusto Senhor, na qualidade de Commandante, de hum Corpo de Voluntarios, e não menos sabido que o mesmo Convento, recebeo alguns Religiozos dos Conventos Abandonados da Serra, Grijó, em cujos termos hé considerado Supprimido… nomeio a V.S.ª para proceder sem perda de tempo ao Inventario do referido Convento … Sirva-se igualmente enviar-me uma hua relação Nominal de todos os Religiozos do Convento.
Mosteiro de Santa Cruz, fachada da igreja.Coleção Regina Anacleto
… Sobre o drama político, em que desde sempre se consubstanciou a gloriosa mas acidentada vida de S.ta Cruz de Coimbra – arrastada, nos últimos tempos, pelo torvelinho das violentas paizões que dominavam a época e às quais, a instituição não soube ou não pôde manter-se estranha – caía agora, com a frieza terminante do ofício acima transcrito, inglório e implacável, o pano do ultimo ato.
O que se lhe seguiu e aqui se relata, mais do que um epílogo, foi uma farsa que podemos perfeitamente isolar da vida daquela casa sete vezes secular; de comum com ela tem apenas o lugar da ação.
… Pelo que respeita a Santa Cruz de Coimbra é de notar que sempre o mosteiro gozara da fundada tradição de professar ideias antiliberais; com a vinda de D. Miguel a Coimbra em outubro de 1832, de caminho para o Porto, onde os liberais desembarcados no Mindelo se haviam instalado já desde 9 de julho, mais se arreigaram dedicações, e velhas simpatias absolutistas se concitaram.
Mosteiro de Santa Cruz, púlpito. Coleção Regina Anacleto
O Rei [D. Miguel] chegou a Coimbra no dia 20, mas desde 12 que o seu Estado-Maior se encontrava na cidade, e aquartelado justamente no mosteiro de Santa Cruz.
Madaíl transcreve de seguida um documento em que se descreve, minuciosamente. os preparativos para alojar D. Miguel e o seu séquito no Mosteiro, o que não veio a ocorrer pois este preferiu alojar-se no Paço da Universidade.
Mosteiro de Santa Cruz, túmulo de D. Afonso Henriques. Coleção Regina Anacleto
Prossegue Madaíl salientado que Conquanto não lograsse hospedar o monarca adentro de seus muros, o mosteiro recebeu-o nos dias 23 e 25 … vendo todo o convento, santuário e igreja; a pedido do Rei, foram abertos os túmulos de D. Afonso Henriques e D .Sancho I, patenteando-se-lhe, e à régia comitiva, a própria ossada do fundador da monarquia portuguesa.
Mais adiante acrescenta que Na noite de 7 para 8 os miguelistas abandonavam Coimbra às quais se juntaram … o Geral de Santa Cruz e mais quatro Cónegos; para a identificação destes últimos não dispomos de elementos suficientes; mas o Geral sabemos que era D. João da Assunção Carneiro.
… Primeira consequência do abandono do Paço episcopal e do Mosteiro de Santa Cruz por parte, respetivamente, do Prelado e do Prior Geral, foi a instalação das tropas liberais nestes edifícios.
Madail, A.G.R. 1949. Inventário do Mosteiro e Santa Cruz à data da sua extinção em 1834. Separata revista e aumentada da Revista O Instituto , vol. 101, 1943, acedida em:
http://webopac.sib.uc.pt/search~S17*por?/tinstituto/tinstituto/1,291,309,E/l856~b1594067&FF=tinstituto&1,1,,1,0
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