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Continuando a debruçar-nos sobre a obra Coimbra e a República. Da propaganda à proclamação, de Carlos Santarém Andrade, abordaremos de seguida o último capítulo, dedicado à Proclamação da República em Coimbra. Primeira parte.
No dia 4 de Outubro, o jornal "Defeza", de Coimbra, dá-nos uma curta, embora destacada, notícia sob o título "Revolução em Lisboa?", sem adiantar desenvolvimentos.
"A Tribuna", do dia 5, dá mais pormenores, no artigo "A revolução de Lisboa", sobre os sucessos na capital, descrevendo vários episódios da luta travada no dia anterior, mas cujo desfecho era ainda desconhecido. Sobre o assassínio de Miguel Bombarda, no dia 3, por um dos seus doentes do foro psiquiátrico, tenente do exército, informa-nos ser o seu autor natural de Coimbra, onde fez os Preparatórios para a Escola do Exército, tendo prestado serviço como alferes no Regimento de Infantaria 23, aquartelado nesta cidade. Sem conhecimento do rumo dos acontecimentos, os republicanos viveram horas de angústia e ansiedade, decidindo enviar a Lisboa um emissário para se inteirar do que se passava.
Jornal “Defeza”, de Coimbra. Op. cit., pg. 147
No dia 5, à noite, corre em Coimbra que a República fora proclamada, o que provoca que, na Praça do Comércio (onde se situava o Centro José Falcão) se juntasse muita gente. E quando, cerca das 3 horas da manhã do dia 6 de Outubro, um emissário do governo republicano, entretanto formado, confirma a proclamação da República, há grandes manifestações de regozijo, acompanhadas do lançamento de foguetes, sendo arvorada no edifício da Câmara e na Universidade a bandeira republicana, como nos informa o "Notícias de Coimbra", do dia 8 de Outubro. O mesmo jornal descreve que "a filarmónica «Boa União» toca a «Portugueza», formando-se um cortejo em direcção ao Governo Civil, aonde se encontra já o novo Governador Sr. Dr. Fernandes Costa".
O alferes medico sr. João Augusto Ornellas, falando ao povo das janellas da Camara de Coimbra, após a notificação da proclamação da Republica. In: Illustracção Portugueza, II-1910, n.º 224, Lisboa, 1910.10.24, p.539.
Dr. Fernandes Costa. 1.º Governador Civil de Coimbra após a implantação da República-Op- cit., pg. 148
Na sede do Governo Civil (então, na Rua Larga, onde hoje se encontra a Faculdade de Medicina) a passagem do testemunho do até então governador, Dr. José Jardim, faz-se com toda a urbanidade, sendo mesmo cumprimentado à saída do edifício. O extenso cortejo regressa à Baixa, ao som de vivas à Liberdade e à República, terminando na Praça do Comércio, cerca do meio-dia.
À uma da tarde desse dia 6 de Outubro estava prevista a proclamação da República nos Paços do Concelho. E essa tem lugar perante o Dr. Fernandes Costa e a vereação que até aí gerira o município, e que então pede a demissão. Como informa o mesmo jornal, no Salão Nobre completamente cheio, "esta cerimónia termina por constantes vivas à Pátria, a Portugal, ao exército e armada e à República, no meio do maior e mais indiscritível entusiasmo", que acrescenta: "Duas bandas de música, a «Boa União» e a «Conimbricense», tocam em frente, no largo, formando-se, em seguida novo cortejo, composto por milhares de pessoas que percorre, com as duas filarmónicas, várias ruas da cidade".
O povo depois do discurso do sr. João Ornellas a caminho do quartel de infantaria 23. In: Illustracção Portugueza, II-1910, n.º 224, Lisboa, 1910.10.24, p.539.
Auto da Proclamação da República em Coimbra em 6 de Outubro de 1910. Op. cit., pg. 150
Também o quartel do Regimento de Infantaria 23, então na Rua da Sofia, pelas quatro da tarde, se associa à proclamação, hasteando no seu mastro a bandeira do novo regime. Momento registado pelo referido periódico: "Há então um indiscritível entusiasmo, a que se associam os soldados, erguendo vivas à República e confraternizando com o povo. Ouvem-se pouco depois os primeiros acordes da «Portugueza»”. É a banda militar que a toca. Novas manifestações, igualmente calorosas, se ouvem, com vivas ao exército e à armada". À noite seriam iluminados os edifícios públicos e mesmo casas particulares, percorrendo as ruas da cidade grupos de populares em marchas «aux flambeaux». No dia seguinte novas manifestações de alegria teriam lugar em vários pontos de Coimbra.
Uma nota muito curiosa é-nos ainda revelada pelo jornal: "É agora cumprida a disposição testamentária do falecido Dr. Inácio Roxanes, em virtude da qual, no dia da implantação da República, devia ser distribuída a quantia de 100$000 réis pelos pobres da freguesia de Santa Cruz, desta cidade. O respectivo testamenteiro anda cumprindo já a referida disposição".
Andrade, C.S. Coimbra e a República. Da propaganda à proclamação. 2022. Coimbra, Edição Lápis da Memória.
Era dos «Eremitas descalços de St.º Agostinho», que fundaram este seu Colégio universitário em 1755, dando-lhe, como titular da pequena igreja, S.ª Rita de Cássia.
Construíram um bom e amplo edifício, ao cimo do sítio denominado Palácios Confusos, na escarpa ocidental do monte onde assenta a Universidade, e muito próximo desta; local magnífico, com belas e dilatadas vistas para Ocidente, estendendo-se pelos campos e colinas dos arredores de Coimbra.
Colégio de S. Rita ou dos Grilos, portal e fachada meridional
Em 1785 ainda não haviam sido dadas como conclusas as obras de construção, embora já de há muito ali vivessem os colegiais. A 3 de setembro deste ano... adquiriram e consolidaram o seu domínio direto com o útil, das três moradas de casas, cuja compra haviam ajustado ... para a construção da sua igreja.
Colégio de S. Rita ou dos Grilos, fachada ocidental
O povo denominava os eremitas descalços - «Grilos»... Aquele apelido, um pouco extravagante, vinha do nome da quinta, perto de Lisboa, onde tinham a sua sede.
... Primavam os «grilos» pelo seu carater modesto, pacifico, bondoso, que os tornava muito simpáticos ao povo, e no meio universitário, sem contudo deslustrar ou prejudicar os seus merecimentos e reputação de muito eruditos e sábios, e de pedagogos distintos. Apesar de ser curta a história deste Colégio, pois não chegou a ter oitenta anos de existência apontam-se com veneração e elogio os nomes de alguns dos seus frades.
...Pela extinção dos Colégios em 1834, e expulsão dos seus colegiais, não ficou o edifício abandonado, como sucedeu a quase todos. Instalou-se logo ali a autoridade administrativa distrital, que veio depois a chamar-se Governador Civil, com as repartições respetivas.
Mas não foi prolongada essa aplicação... Transferiu-se para lá em breve a Administração geral do distrito, e o edifício foi entregue à Universidade... 27 de outubro de 1836. Passou a ser arrendado a uma república de estudantes ... Decorridos anos, o Governo mandou-o vender, avaliado em 5.600$000 reis, base de licitação. Realizou-se a praça a 27 de Abril de 1844.
Posteriormente, neste Colégio funcionou até à construção da sua nova sede, a Associação Académica de Coimbra.
Vasconcelos, A. 1987. Escritos Vários Relativos à Universidade de Coimbra. Reedição preparada por Manuel Augusto Rodrigues. Volume I e II. Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra, pg. 280, do Vol. I
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