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A' Cerca de Coimbra


Quinta-feira, 12.12.24

Coimbra: Cristianização de Coimbra e do seu aro 2

Segunda entrada dedicada à obra de Augusto Filipe Simões (1835-1884), intitulada Relíquias da Arquitectura Romano-Bysantina em Portugal e Particularmente em Coimbra.

…. segundo os fragmentos do concilio de Lugo de 569, à catedral de Coimbra não pertenciam então mais que cinco igrejas.

Se desde essa época até aos fins do século VII, a influencia da civilização visigótica chegou a estender-se a esta parte da Península, comunicando à arquitetura e às demais artes o impulso, que em Toledo receberam, é o que ainda se ignora. Já, porém, dissemos que não faltam razões para crer que a opulência e a perfeição da arquitetura e da escultura se limitariam às cidades mais poderosas, onde a proteção e os tesouros dos reis as acolhiam e sustentavam. Confirma de algum modo esta hipótese o não ter aparecido até hoje em Coimbra um só vestígio da época dos godos, a não ser uma inscrição que se perdeu, e que parece desse tempo, com quanto Coelho Gasco, que foi quem dela conservou memória, lesse no seu último verso a era de 1200.

Nos séculos IX e X, dilatado o cristianismo, apesar da reação sarracena, aumentou-se o número das casas destinadas aos exercícios religiosos. Não era somente nas povoações grandes que se edificavam templos. Nos tratos de terra, que os reis ou os nobres davam á cultura dos servos ou colonos, construíam-se também pequenas igrejas, mosteiros ou oratórios. Multiplicaram-se depois estas instituições, por devoção ou por interesse dos sacerdotes e seculares, empenhados não somente em firmar a religião, mas ainda em celebrar ou perpetuar seus nomes e pôr os bens ao abrigo das extorsões com a proteção eclesiástica. Às casas da oração consideravam-se, como as terras, os gados e os moveis, propriedades particulares, e delas se faziam frequentemente doações, trocas e vendas.

…. No cartório do mosteiro de Lorvão ficou um documento interessante em que se vê o atraso artístico dos povos que no século X habitavam Coimbra e suas circunvizinhanças. É uma memória escrita em latim bárbaro no livro dos testamentos, na qual se refere que no tempo do abade Primo (978 a 985) viera de Córdova para aquele mosteiro mestre Zacarias, o qual o concelho de Coimbra mandou pedir ao abade que lho desse, para lhe fazer pontes em seus ribeiros. Respondeu o abade que sim; porém que, para memória, acompanharia o mestre. Vieram, pois, ambos e chegando a «IIlhastro» [sic] (junto ao lugar que chamam hoje Fornos) aí assentou o abade sua tenda e mandou aos homens da terra que trouxessem carros, pedra e cal, com o que fizeram uma ponte. Vieram a Cozelhas e fizeram outra. Vieram à ilharga do Bussaco e fizeram outra. E ultimamente chegando à ribeira de Forma [sic] construíram ainda outra ponte e junto dela uns moinhos.

Fica, portanto, bem patente que no século X não havia em Coimbra pedreiros, capazes de fazer, ao menos com segurança, as pontes dos minguados ribeiros circunvizinhos; que um mosteiro rico, situado a três léguas da cidade, mandava vir de Córdova um mestre de obras, para suprir à falta de artistas nesta parte remota dos domínios do rei de Leão; que o concelho de Coimbra uma embaixada ao abade do mosteiro, como se lá estivesse o primeiro arquiteto do mundo; e, finalmente, que o poderoso donatário, por fazer favor á cidade, e mais ainda por zelar os interesses do convento, acompanhava o mestre cordovês pelo território conimbricense, estacionando com ele pelas margens dos ribeiros e assistindo á construção das pontes e moinhos, como se foram obras admiráveis de grande e primorosa fábrica.

…. A primeira conquista da cidade de Coimbra pelos sarracenos no primeiro quartel do século VIII foi talvez a que menos estragos causou.

…. Com diversidade de circunstâncias se fizeram as posteriores conquistas, se dermos crédito às cronicas antigas. Afonso III, quando tomou Coimbra no século IX, transformou-a num deserto, para depois a povoar com gente da Galiza.

Alfonso_III_of_Asturias_pf.jpgAfonso III de Leão. Imagem acedida em:  https://pt.wikipedia.org/wiki/Afonso_III_das_Ast%C3%BArias

Al-Manssor procedeu da mesma sorte nos fins do século X. No espaço de sete anos teve a cidade destruída e deserta, até que os moiros a povoaram e edificaram de novo.

Recuperou-a, finalmente, depois de dilatado cerco Fernando Magno em 1064.  

Ferdinand_and_Sancha_receive_a_book.JPG

Fernando Magno, à esquerda. Imagem acedida em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_I_de_Le%C3%A3o,

Assim, ora a cruz, ora o crescente, tremulavam, alternados em cada século nos muros da formosa rainha do Mondego, mudando com suas leis e costumes o estilo de seus edifícios e mais em particular dos religiosos. Estes, pelas repetidas conquistas e assolações deveriam ser os mais comumente destruídos.

…. Não admira, portanto, que se não achem hoje em Coimbra nenhuns vestígios evidentemente anteriores á última conquista que foi, como dissemos, no ano de 1064.

…. A vitoria de Fernando Magno assinalou o princípio de uma época memorável na história de Coimbra. Fazendo esta cidade capital de um extenso e importante condado, que tinha por limites naturais o Douro e o Mondego, o rei de Castella e de Leão confiou o seu governo a Sesnando, pelo qual fora aconselhado a invadir aquela parte da antiga Lusitânia.

O vulto notável de Sesnando sobressaí com vivos e esplendores nas trevas, que precederam a fundação da monarquia. Nas velhas escrituras dos mosteiros do Território conimbricense, na gótica inscrição do seu tumulo acham-se vestígios expressivos do enérgico e fecundo influxo do ilustre moçárabe.

Arca tumular de D. Sesnando.png

Arca tumular de D. Sesnando, nos claustros da Sé Velha

É para lamentar que da sua vida gloriosa, e por tanto da história de Coimbra na metade última do século XI, não ficassem mais copiosos documentos.

Simões, A. F. (1870), Relíquias da Arquitectura Romano-Bysantina em Portugal e Particularmente em Coimbra. 1870. Typographia Portugueza, Lisboa.

 

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por Rodrigues Costa às 09:52

Quinta-feira, 03.11.16

Coimbra: a Estrada de Aveiro

 No Roteiro Terrestre de Portugal editado em 1748, que no Arquivo Histórico da Câmara de Coimbra me deram a conhecer, são identificadas as estradas que saíam de Coimbra.

Destas e das que partem para norte é nomeadamente referido que:

Roteiro para Aveiro, em que se contão nove leguas ao Noroeste

De Coimbra aos Fornos 1 legua; Dahi aos Marcos 1 legua; A Murtede 1 legua; ... A Mamarosa; ... A Aveiro.

Perante este dado, uma questão se me colocou: Qual seria, no distrito de Coimbra, o trajeto da estrada para Aveiro?

Na procura de uma resposta, obtive as informações a seguir referidas.

1 - Junto de habitantes de Enxofães, Silvã e Barcouço

- Em Enxofães, o caminho que atravessa esta aldeia indo para norte até Murtede e para nascente até Rio Covo, era aqui conhecido, pelo menos desde os finais do século XIX, por “Estrada de Aveiro”;

- Em Barcouço, em data idêntica, o caminho que desta localidade vai a Rio Covo, é ainda chamado pela mesma designação de “Estrada de Aveiro”;

- Na Silvã o troço que vai de Rio Covo a Enxofães é conhecido por “Estrada de Aveiro”;

- Não existindo na área em apreço nenhuma localidade com a designação de Marcos, este topónimo não é conhecido pelos habitantes das localidades atrás referidas. Assim, será plausível considerar que se trataria dos marcos da demarcação dos termos de Coimbra e de Aveiro os quais deveriam estar perto da localidade de Grada a qual dista cerca de uma légua dos Fornos.

2 – No Arquivo da Universidade de Coimbra

- A área delimitada por Murtede, Carvalho, Barcouço e Silvã – na sua grande maioria – integrava a designada “Herdade de Enxofães” que pertencia, desde o século XIII, ao Hospital e Gafaria de S. Lázaro de Coimbra;

- No Tombo de 1515 do Hospital de S. Lázaro existe uma Certidam do Juis das Jogadas da qual consta estar resistada a de Marcação das terras de Emxofães pera os Cazr.os por vertude dos Prevelegios do Esprital serem escuzos de pagar, datada de 1604.06.22. Nesse documento encontram-se descritas as extremas da Herdade Enxofães e identificada a localização dos marcos que a delimitavam.

3 – A realidade local

- A área da “Herdade de Enxofães”, integrando algumas gândaras, encontrava-se constituída essencialmente por terras de cultivo em várzeas, que se desenvolvem ao longo dos pequenos vales criados pelas muitas fontes e respetivas valas que drenam para o Rio Mondego. O atravessamento dessas várzeas apresenta, nomeadamente no Inverno, grande dificuldade;

- Existe uma ligação contínua com cerca de 12 quilómetros, ou seja cerca de 2 léguas, desde os Fornos a Murtede que atravessa as seguintes e muito antigas localidades: Trouxemil, Grada, Barcouço, Rio Covo e Enxofães. Desta, Barcouço - Rio Covo – Enxofães, no percurso que as liga entre si, bordejam os terrenos da antiga “Herdade de Enxofães”.

 

De posse destas informações atrevemo-nos a apresentar uma proposta para aquele que considerarmos ser o percurso mais plausível da Estrada de Aveiro, no distrito de Coimbra, o qual dividimos nos seguintes troços:

. Um primeiro troço, comum às estradas de Aveiro e do Porto, partia dos Fornos, subia a Trouxemil, onde, ao sair desta localidade para nascente, depois de passar o curto caminho que levava à muita antiga Feira das Neves, junto da Capela de Adões, se bifurcava: um caminho rumava a Aveiro e o outro, a Estrada do Porto, encaminhava-se em direção a Sargento-Mor;

.Um segundo troço corresponde à descida de Trouxemil até a Grada, onde se inicia uma subida que leva a Barcouço;

. Um terceiro troço corresponde à descida que de Barcouço leva ao antigo porto de Rio Covo – troço que ainda ali é conhecido por “estrada de Aveiro”;

. Um quarto troço que corresponde à ligação de Rio Covo a Enxofães e ao atravessamento desta aldeã, o qual ainda é conhecido pelos mais antigos, quer de Enxofães, quer da Silvã pelo nome de “Estrada de Aveiro”;

. Um quinto troço corresponde à muito antiga ligação de Enxofães a Murtede, terra que era a sede da paróquia a que Enxofães pertencia e na qual existia o cemitério onde se enterravam os seus mortos.

Proposta que apresentamos na esperança de que, a partir da mesma, possam surgir outras soluções melhor fundamentadas.

Rodrigues Costa

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por Rodrigues Costa às 22:22

Sexta-feira, 29.01.16

Coimbra, entradas e saídas da cidade

A estrada romana que ligava Olisipo e Bracara Augusta, ao evitar «tanto os terrenos acidentados do interior, como as baixas alagadiças da beira-mar» encontrou como lugar de eleição para transpor o rio o estrangulamento entre o sopé do cabeço de Santa Clara e o oppidum fronteiro. Aqui surgiu a ponte. E nunca mais, até hoje, se deslocou o local de semelhante travessia.

Nos séculos XVI e XVII, e certamente em tempos anteriores, a ponte real de Coimbra, «estrada que vinha da corte e iha para ella», era das mais frequentadas do País.

… De Cernache (ou Antanhol) podia partir-se para Coimbra, «pollo caminho do campo», indo sair-se a S. Martinho do Bispo. Foi esta a direção seguida pela embaixada do Preste João em 1527.

… Mas outra estrada, mais direta, seguia pela Cruz dos Mouroços, Vale do Inferno – por Santa Eufémia – e, depois de uma «descida perigosa» penetrava na ponte pela Calçada de Nossa Senhora da Esperança.

À saída da cidade, por S. Lázaro, a estrada transpunha a Ribeira de Coselhas, pela ponte de Águas de Maias. Progredindo atravessava Assamassa, passava junto da capela de Nossa Senhora Loreto e subia à Pedrulha, depois de ultrapassada venda da Fontoura. Descendo, penetrava na ponte do Rachado e seguia para os Fornos.

Oliveira, A. 1971. A Vida Económica e Social de Coimbra de 1537 a 1640. Primeira Parte. Volume II. Coimbra, Universidade de Coimbra, pg. 5 e 6, 13 a 17

 

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por Rodrigues Costa às 10:44


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