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Dos mercados ao Mercado D. Pedro V
Em Coimbra, os mercados e as feiras foram regulamentados, ao longo dos tempos, por cartas régias, mas os locais onde se processava a troca de produtos permaneceu inalterável até à segunda metade do século XIX.
Durante o período medieval e até a Oitocentos, a permuta de bens estendeu-se, na cidade, por vários locais. Um deles, o Forum Régio, situava-se entre a Torre da Rolaçom e a Sé, ou seja, mais ou menos na zona do atual Quebra-Costas e organizava-se em dois espaços: o “das tendas de baixo” (mais próximo do início do Quebra-Costas) e o “das tendas de cima” (mais chegado à Sé). Um outro local de troca de produtos ocupava, lá no cimo da colina, o terreiro do Paço Real. A partir de 1537, no Largo da Feira, frente à Sé Nova, após a transferência da Universidade para Coimbra, começou a realizar-se, às terças-feiras, um mercado semanal destinado, essencialmente, à comunidade estudantil.
Largo da Feira dos Estudantes. [Passado ao Espelho, p. 58]
Contudo a Praça de S. Bartolomeu (também conhecida por Praça do Comércio ou Praça Velha) pode considerar-se o local onde tradicionalmente acontecia o principal mercado, mas com o andar dos anos e com o aumento da população o espaço vai-se tornando cada vez mais exíguo e alguns produtos, sobretudo aves e grãos, passaram a ser comercializados em frente à igreja de Santa Cruz, no Terreiro de Sansão.
Fig. 07 – Praça do Comércio. [AHMC. Repartição de obras municipais. Luiz Antonio Nogueira. 1878. Pasta 49. B-14].
Os espaços atrás referidos, mesmo se se tiver em conta as contínuas disposições camarárias que especificavam o local exato da venda de cada produto, nem sempre eram acatadas de bom grado pelos vendedores (vendedoras em maior número) que se iam amontoando a esmo, de modo um tanto ou quanto caótico.
A ideia de reunir todas as transações num único local, começa a ganhar consistência e a necessidade de construir um mercado assume-se consensual. A partir de 1852 assiste-se à tentativa de concentrar, não sem oposição, os vários pontos de venda na horta do extinto mosteiro de Santa Cruz. Contudo, as opiniões dividiam-se quanto à localização do mercado e se uns apontavam para aquele local, outros inclinavam-se para a zona da Sota, na velha ‘baixa’ coimbrã.
Neste contexto, a 09 junho de 1858, Hardy Hislop, de nacionalidade inglesa, apresenta à Câmara um projeto para a construção de um mercado público cujos custos, na Sota, rondavam pelos 100 contos de réis e na Horta crúzia pelos 70.000$000 réis.
A escolha da zona onde o mercado se devia instalar, sob forte contestação, acabou por recair na horta de Santa Cruz, até porque esta, em virtude de ser propriedade da edilidade, tornava o cometimento mais acessível, contrariamente ao que aconteceria na Sota, onde, devido às cheias do Mondego, era necessário altear o local e proceder a expropriações.
Mas a debilidade das finanças municipais não consentiu a viabilização do empreendimento; por isso, mais tarde, a Câmara e o Conselho Municipal aprovaram, a 12 de março de 1866, um empréstimo de 13.000$000 réis tendente a fazer face à concretização da nova estrutura que teve por base o mais do que modesto projeto elaborado pelo engenheiro Everard, um provável técnico ferroviário britânico.
Fig. 08 – Mercado D. Pedro V em 1907. [Passado ao Espelho, p. 66].
A vereação, depois de “fazer festejos e convites”, decidiu marcar para o dia 17 de novembro de 1867 a inauguração do novo mercado, batizado com o nome de D. Pedro V; o imóvel foi-se tornando obsoleto e O Despertar, na sua edição de 17 de novembro de 1917, escrevia: “Também faz hoje 50 anos (já meio século!) que foi inaugurado o mercado D. Pedro V. Está a pedir museu das raridades”.
Radicara-se na cidade, entretanto, o arquiteto Augusto de Carvalho da Silva Pinto e a Câmara, em 1902, encarrega-o de riscar, a fim de “completar” o mercado existente, o projeto de um pavilhão destinado à venda de peixe.
Após serem ultrapassadas algumas barreiras, o edifício foi inaugurado em 08 de março de 1908. Esta estrutura que assentava prioritariamente no ferro e no vidro, se se pensar no contexto português e, sobretudo, no conimbricense, desenvolveu-se no âmbito de uma linguagem eivada de modernidade, embora, cronologicamente, face à Europa e à América, se apresentasse como tardia. Mas de nada lhe valeu inserir-se nas “modernas” tecnologias arquitetónicas, porque não deixou de ser depreciativamente apelidada de “aquário” por um dos jornais citadinos, quando, em 1921, o arquiteto emitiu uma opinião desfavorável acerca da transformação da igreja de S. João em “Café de Santa Cruz”.
Fig. 09 – Projeto para um mercado municipal. Arquiteto Silva Pinto. 1908. [AHMC. Repartição de obras municipais. Pasta 36. B-50].
Contudo, a edilidade, cônscia que estava da necessidade de dotar a cidade com um mercado condigno, encarregou o mesmo arquiteto, cerca de 1908, de riscar esse imóvel, que, apesar de aprovado, jamais saiu do papel (neste caso, do marion) e foi pena, pois, a ser edificado “constituiria hoje, sem dúvida, um dos mais curiosos exemplares da chamada arquitectura do ferro, tão representativa de uma época”.
Anacleto, R. Coimbra: alargamento do espaço urbano no cotovelo dos séculos XIX e XX. In: Belas-Artes: Revista Boletim da Academia Nacional de Belas Artes. Lisboa 2013-2016. 3.ª série, n.ºs 32 a 34. Pg. 127-186. Acedido em https://academiabelasartes.pt/wp-content/uploads/2020/02/Revista-Boletim-n.%C2%BA-32-a-34.pdf
Coimbra tinha, na primeira metade do século XIX, três mercados que satisfaziam as necessidades alimentares dos seus habitantes: um, com raízes seculares, na Praça de S. Bartolomeu (hoje oficialmente denominada Praça do Comércio, e igualmente conhecida por Praça Velha); o mercado de Sansão, em frente da fachada principal do Mosteiro de Santa Cruz e da sua Igreja (atual Praça 8 de Maio) e ainda um mercado semanal às terças-feiras no antigo Largo da Feira, frente à Sé Nova, reminiscência da chamada Feira dos Estudantes, instituída no século XVI por D. João III, para a comunidade da Universidade, após a sua transferência definitiva para a cidade.
… resolveu a Câmara, em 13 de Junho de 1840, que as vendedeiras de cereais de Sansão passassem para o então denominado Pátio de Santa Cruz, situado no local que é hoje o início da Rua Olímpio Nicolau Rui Fernandes …
Pouco depois, em 6 de Maio de 1857, nova alteração surgiu, com a mudança do mercado dos cereais para a antiga horta do mosteiro … continuando a existir a velha praça em S. Bartolomeu
… Era, ao tempo, consensual a necessidade da construção de um mercado, pois a velha praça instalada em S. Bartolomeu não satisfazia as condições mínimas …as opiniões dividiam-se quanto à sua localização. Alvitravam-se dois locais: a horta de Santa Cruz e a Sota, na velha Baixa Coimbrã … sendo decidido pela Câmara da presidência do Dr. Manuel dos Santos Pereira Jardim, em 5 de Janeiro de 1866 … escolher o terreno da horta de Santa Cruz, em detrimento da Sota … iniciam-se em Outubro de 1866 as obras, com a escavação de 3.695 metros cúbicos de terras, para nivelamento dos terrenos … em 21 de Outubro de 1867 aprovado o regulamento, data em que se decidiu dar ao novo empreendimento o nome de Mercado D. Pedro V … de facto, no dia 17 de Novembro de 1867, era, finalmente inaugurado o novo mercado que tanta polémica levantara … O novo mercado seria contemplado com um candeeiro a gás, a que em breve se juntariam mais quatro.
… logo em 1872 temos notícias de reparações …Até ao fim do século XIX, foi o mercado alvo de pontuais reparações, cobertura de barracas, ou instalação de esgotos … em 12 de Janeiro de 1899, viria a ser tomada a tão útil e necessária decisão de mandar vedar o recinto do mercado.
Andrade, C.S. 2001. Mercado D. Pedro V. Uma História com História. Texto publicado em suplemento especial no Jornal de Coimbra de 14 de Novembro de 2001
Durante muito tempo, pode mesmo dizer-se que ao longo de alguns centénios, o nível demográfico de Coimbra se manteve mais ou menos estável, embora tal não obstasse a que as pessoas tivessem necessidade de se abastecer. A fim de responder a esta precisão, aconteciam mercados e feiras: a Praça Velha, o fórum junto ao Arco de Almedina, o terreiro do Paço Real, e a Feira dos Estudantes, depois de 1537, eram os locais privilegiadamente utilizados para a sua realização. Contudo, depois de a Praça Velha se ter tornado exígua, alguns produtos, sobretudo aves e grãos, passaram a ser comercializados frente à igreja de Santa Cruz, no Terreiro de Sansão.
Estes três espaços (Praça do Comércio, Feira dos Estudantes e Terreiro de Sansão) mantém-se até à segunda metade do século XIX, mas, apesar das contínuas disposições camarárias que especificavam o local exato da venda de cada produto, as vendedoras amontoavam-se de modo um tanto ou quanto caótico …
A edilidade, algum tempo depois da extinção das ordens religiosas, tivera a noção da importância de que se revestia para a cidade a posse do mosteiro (Santa Cruz) e da cerca fradesca, até para que neste último espaço se viesse a construir um mercado público capaz de substituir, com vantagem, a dispersão dos vendedores.
Contudo, tornou-se necessário esperar por 1867 para que a nova praça, projeto mais do que modesto elaborado pelo engenheiro Everard, fosse, com pompa e circunstância, aberta ao público, depois de batizada com o nome de D. Pedro V.
A autarquia decidiu, em 1899, encarregar o arquiteto Silva Pinto de elaborar o projeto de uma praça pública destinada a ocupar o local onde se erguia a de D. Pedro V, mas esse estudo jamais saiu do papel e apenas o pavilhão destinado à venda do peixe se construiu, tendo sido inaugurado a 8 de Março de 1908.
Anacleto, R. 2010. Coimbra Entre os Séculos XIX e XX. Ruptura Urbana e Inovação Arquitectónica. In Caminhos e Identidades da Modernidade. 1910. O Edifício Chiado em Coimbra. Actas. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra, pg. 153, 155
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