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Em Coimbra, o Jardim Botânico era local aprazível. No Colégio das Ursulinas que lhe ficava contíguo, principalmente em Maio, à tarde, praticava-se a devoção do mês de Maria, o que, o tornava de passagem obrigatória. As damas, envergando os seus melhores trajos, piedosamente, dirigiam-se à igreja, a fim de tomar parte naquela devoção mariana e os cavalheiros, molemente encostados às grades, viam-nas passar, outorgando com a sua presença a organização de tômbolas e festejos. Além dos agradáveis momentos de ócio que estes proporcionavam, permitiam ainda auxiliar qualquer obra de caridade. Em 1899, o Dr. Júlio Henriques, ilustre director daquele Jardim, mandou vir bambus das nossas colónias, afim de construir, na alameda principal, mesmo em frente ao edifício de S. Bento, um coreto onde a música pudesse executar algumas peças do seu repertório. Colmatava desta forma a lacuna que em Coimbra existia, porque tanto o do Cais como o da Quinta de Santa Cruz se encontravam degradados. Esperava-se, contudo, que brevemente fossem reformulados, até porque as filarmónicas da cidade já haviam solicitado à câmara autorização para tocar aos domingos nos referidos coretos. A construção do Botânico alegrou os janotas do tempo e, segundo constava, iria ficar «muito elegante e de excelente gosto» .
Cá em baixo, mesmo junto ao rio, desde 1887 que se transformava lentamente o largo espaço do Cais das Ameias num belo Passeio Público, com canteiros ajardinados e maciços de verdura. Colocava-se o gradeamento do lado do rio e empedravam-se os passeios. Coimbra, no dealbar do século XX, totalmente desfasada até já da capital, aspirava ver concluídas estas obras que lhe permitiriam usufruir, pela disposição, aproveitamento, frescas sombras e formoso panorama, de um dos melhores Passeios Públicos da província . Dirigia os trabalhos o Eng. Jorge de Lucena .
Fazer construir um coreto decente era tarefa que urgia, até porque, realmente, aos domingos a banda exibia-se e, para tal, utilizava aquela ruína a que impropriamente se atribuía tal denominação .
Mas as obras do Cais prosseguiam lentamente, não só porque as dotações camarárias e estatais eram mínimas, como também porque por vezes as desviavam e, em 1902, aquando da efectivarão das festas da Rainha Santa, trabalhava-se ainda febrilmente a fim de as conclui , o que não se verificou .
E toda a imprensa citadina continuava a insistir na necessidade de erguer no novo Passeio Público um coreto que estivesse à altura dos pergaminhos do burgo. Não como aqueles que normalmente se levantavam por ocasião da romaria do Espírito Santo ou da passagem por Coimbra de qualquer personalidade ilustre , arquitectura efémera, logo desmontada e eventualmente destruída após ter servido o fim a que se destinava, mas algo de sólido, duradouro e artístico, procurando honrar o autor e prestigiar a edilidade promotora da construção.
A fim de satisfazer o povo de Coimbra e lhe proporcionar uma distracção de que já desfrutavam outras terras portuguesas com muito menos habitantes, a câmara presidida pelo Dr. Dias da Silva deliberou na sessão de 25 de Junho de 1903 aprovar o orçamento para a construção do envasamento do «encantado» coreto afim de, posteriormente, lhe ajustar um pavilhão de ferro que não podia ultrapassar os 358$563 réis
Anacleto, R. 1983. O coreto do parque Dr. Manuel Braga em Coimbra, In Mundo da Arte, 14, Coimbra, 1983, p. 17-30, il., sep. Pg. 5 a 7
… Dera-se, entretanto, um facto que não poder ser dissociado da história do Mercado D. Pedro V.
A chamada "Lei do Selo" agravava substancialmente os impostos, atingindo particularmente as vendedeiras do mercado, na generalidade de fracos recursos económicos. A aplicação de multas leva as padeiras de boroa das Carvalhosas, logo secundadas pelas vendedeiras de hortaliças e outras, a manifestarem-se ruidosamente no dia 11 de Março de 1903, frente aos Paços do Concelho e nas principais artérias da Baixa.
Coimbra ficou em verdadeiro estado de sítio, prosseguindo os tumultos nos dias seguintes, tendo o comércio fechado, bem como as fábricas e oficinas, movimentando-se milhares de pessoas, o que originou a vinda para a cidade de diversas forças militares.
O acontecimento, que ficou conhecido como a "Revolta do Grelo", viria a ter trágicas consequências, provocando mortos e feridos entre a população, sendo uma das mais violentas manifestações a que Coimbra assistiu.
A própria Universidade e o Liceu foram encerrados, tendo a Academia manifestado inequivocamente a sua solidariedade para com as vítimas da brutal repressão. E, na própria Câmara, na sessão de 14 de Março, em reunião extraordinária, os edis resolveram solicitar a revisão da lei que estivera na origem dos acontecimentos, pedindo ao presidente, Dr. Dias da Silva, ausente em Lisboa, para interceder junto ao governo, de modo a apaziguar os ânimos, para que a cidade retomasse a normalidade. E na sessão seguinte, em 20 de Março, o presidente relatou as suas diligências, tendo sido atendidas as reivindicações e suspenso o imposto que originara o conflito, reconhecendo-se que fora a sua criação e "mais ainda, o modo descaroável por que se pretendeu fazer a sua arrecadação, as causas principais, senão únicas, dos tumultos ultimamente levantados no concelho".
Andrade, C.S. 2001. Mercado D. Pedro V. Uma História com História Texto publicado em suplemento especial no Jornal de Coimbra de 14 de Novembro de 2001.
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