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Na Sé Velha de Coimbra existe uma arca tumular, da qual reproduzimos o epitáfio:
AQUY JAZ HUU QUE EM OUTRO TEMPO FOY GRANDE BARON
SABEDOR E MUITO ELOQUENTE AUONDADO E RICO E AGORA
HE PEQUENA CINZA ENÇARADA EM ESTE MOIMENTO
E COM ELE JAS HUUM SEU SOBRINHO DOS QUAES HUN
ERA JÁ VELHO E OUTRO MANCEBO E O NOME DO TIO
SESNANDO E PEDRO AVIA NOME O SOBRINHO.
Este túmulo parece ter sido mandado fazer pelo Bispo Conde D. Jorge de Almeida, nos fins do XV século.
Sé Velha, com arca tumular de D. Sisnando, na sua primitiva localização
Sé Velha, com arca tumular de D. Sisnando, na sua primitiva localização, pormenor
Sé Velha, arca tumular de D. Sisnando, na sua atual localização
Tão curioso epitáfio certamente excitará a curiosidade do leitor. Quem era D. Sesnando? É o que veremos abaixo.
Não se sabe o ano em que nasceu, se bem que deveria ter sido na primeira metade do século XI. Todavia, conhece-se quem eram os seus pais: um rico moçárabe de nome David, senhor de Tentúgal e de outras terras no território conimbricense, e Susana, também dona de vastas propriedades no arrabalde de Santa Cruz. Por este motivo se depreende que Sisnando (ou Sesnando) era natural de Coimbra ou das suas imediações.
Segundo alguns historiadores, num «fossado», que era hábito fazer-se em terras do inimigo, terá sido aprisionado pelos sarracenos e levado para Sevilha. Herculano, porém, admite o ter sido Sisnando muçulmano, até mais tarde passar ao serviço de Fernando o Magno.
A verdade é que, uma vez em Sevilha, pelo seu talento e importantes serviços prestados, o amir Ibn Abbad lhe conferiu o cargo de viziar ou divã, na sua corte.
Mais tarde Sisnando abandona a Corte de Sevilha – fuga motivada, certamente, por descontentamento – e vai oferecer os seus serviços a Fernando, o Magno, rei de Leão e Castela, colaborando com o monarca na reconquista dos territórios da antiga Lusitânia, ao tempo em poder do Islão.
E assim temos o nosso biografado na reconquista de Coimbra, em 1064.
Como recompensa dos seus serviços, D. Fernando nomeia-o governador dos territórios reconquistados, além daquele ao sul do Douro, já pertencente ao Condado Portucalense. O próprio D. Sisnando assim no-lo diz em diploma do seu tempo.
… A Fernando Magno sucedeu o rei Garcia, seu filho, mas D. Sisnando, não lhe faz qualquer referência no diploma a que atrás aludimos, o que leva a crer que este – o Conde D. Sisnando – não gozou das boas graças do novo soberano; em contrapartida diz-nos que após a morte de Magno, obteve o reino «de seu filho, o gloriosíssimo rei D. Afonso (o VI), o qual (…) me confirmou tudo aquilo que seu pai ordenara e me assinou a carta de privilegio».
Era D. Sesnando casado com D. Ourovelido Nunes, filha de D. Nunes Mendo, governador dos territórios ao norte do Douro e que revoltando-se contra o dito rei Garcia, foi por este derrubado e morto na batalha de Pedroso, em 1071. D. Garcia confiscou os bens dos herdeiros de D. Nuno, entre os quais se contava, como é óbvio, seu genro Sisnando.
Não é por isso de admirar que D. Sisnando não faça qualquer referência a D. Garcia.
Foi notável a ação governativa de D. Sisnando, pelo povoamento da região recém-conquistada. Cantanhede, Tentúgal, Montemor-o-Velho, S. Martinho de Mouros, Armamar, Tarouca, Seia, Viseu, Lamego, Arouce, Penela, S. Martinho do Bispo, Alhadas e Figueira da Foz, contam-se entre as «villas» edificadas e cristãmente povoadas, durante o seu governo
Sé Velha. 1862 c.
Muito particularmente a cidade de Coimbra sentiu os efeitos da sua sábia administração. A ele se deve a restauração da sua Sé com a nomeação do Bispo Paterno, vindo de Santiago de Compostela a convite do próprio D. Sisnando, numa visita a essa cidade, em romagem de ação de graças pela tomada de Coimbra.
Também se deve a D. Sisnando a resolução do conflito havido entre os bispos de Orense e de Braga, a favor do último.
Por voltas de 1092 faleceu o Conde D. Sisnando deixando prósperos os territórios sob a sua alçada. Como já se disse jaz na Sé Velha.
Algum tempo depois Martin Moniz retirava-se para Arouca por ter passado o poder para as mãos do Conde D. Henrique.
Nelson Correia Borges
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