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Não temos qualquer dado sobre quando e aonde o alvazil nasceu, ou onde passou a infância, todavia esse facto não impediu de numerosos investigadores de afirmarem que Sesnando tinha a sua origem em Tentúgal.
... como teria Sesnando Davides, passado de Coimbra para Sevilha? ... Dozy diz que “O Cadi “de Sevilha” fez renderem-se dois castelos...tendo sido assim aprisionado em 1026..., e levado para a corte sevilhana de Abu al-Hacim Mohamed. Contudo, Luis de Parga... aponta a data de 1041-1042.
...recebeu – o cargo de vizir ou wazir era reservado para os mais letrados da administração central árabe-islâmica – sendo o homem mais respeitado dentro da corte sevilhana.
A partir de 1060 deve ter-se juntado a Fernando, o Magno...teria sido o conselheiro que aliciou o rei a conquistar Coimbra logo em 1064...naqueles dias, o próprio rei tendo exortado com honra, o grande príncipe naquele lugar, duque e cônsul fiel, dom Sisnando...sobre a própria cidade, para que a povoe e defenda da gente pagã.
... Sesnando Davides foi um cônsul respeitado por todos, incluindo-se neste campo Fernando o Magno e Afonso VI, permitindo que o alvazil governe Coimbra com uma total autonomia deixando que o moçarabismo florescesse na cidade e na região, cunhando Igrejas e Mosteiros com o nome de diversos santos da liturgia visigótica romana. Foi um homem que nunca se libertou do título de alvazil fazendo questão de o deixar marcado nos documentos não só de Coimbra mas de Leão e Castela, sendo a referência política para os não cristãos. Mas não era só um administrador, era também um guerreiro, um dux, que servira tanto de diplomata como de líder militar em expedições sobre os Reinos de Taifa do al-Andaluz
... Como homem Sesnando terá sido assim um dinamizador, um guerreiro, um diplomata, um conselheiro, um justo juiz, isto à luz dos cronistas árabes como Ibn Bassam, tendo um papel fulcral nos destinos do Termo de Coimbra, e no futuro Condado de Portucale.
Isaac, F.M.B. 2013. Sesnando Davides. Alvazil, Cônsul, Estratega e Moçárabe. Dissertação de Mestrado em História. Lisboa, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, pg. 111-114, 144-145.
Mausoléu de D. Sesnando
Singular osteoteca (no claustro da Sé Velha) de Dom Sesnando, genial alvazir e destacado governador de Coimbra, fautor da reconquista cristã de 9 de Julho de 1064. Data do século XV-XVI. Na cabeceira tem uma composição vegetal e, no frontal, uma simples orla de folhagens a cercar a legenda, feita num gótico minúsculo, de letras ressaltadas, a recordar as qualidades daquele homem memorável, e do sobrinho Pedro, falecido na juventude, cujas cinzas repousam com as do tio Dom Sesnando, no mesmo monumento.
Coutinho, J.E.R. 2001. Catedral de Santa Maria de Coimbra (Sé Velha), Coimbra, Gráfica de Coimbra, 2001, p. 93-94.
Na verdade, algo já deveria estar mal entre o rei (D. Afonso VI de Leão) e o genro Raimundo, pelo menos em 1095, pois nesse ano o rei desloca-se em pessoa aos confins meridionais do condado, onde, quer em Lisboa e Santarém, quer em Coimbra, o encontramos a gerir o território de forma direta, ultrapassando a autoridade e a jurisdição que ele mesmo concedera a Raimundo para esse efeito. Pouco depois, o rei desmembrava a parte meridional do condado que dera a Raimundo em 1090 e depois em 1094, retirando-lhe a parte que ficava entre o Minho e o Tejo e recriando desse modo as fronteiras dos anteriores condados portucalense e conimbricense dos séculos IX e X, que agora entregava a Henrique, com a cedência hereditária do domínio sobre as regiões dos antigos condados portucalense e conimbricense, o que lhe deve ter dado largos poderes senhoriais que geriu ao modo de qualquer senhor «feudal»
... À distância a que estamos, é possível entender que Teresa não soube jogar as suas redes de aliança com a mesma habilidade do marido, e acabou por fazer perigar uma considerável parte do que Henrique conseguira assegurar para o Condado Portucalense como a posse de Coimbra e Porto a Braga, a independência perante a Galiza, a guerra de fronteira com os muçulmanos e, sobretudo, o apoio dos nobres portucalenses ... Ausente do condado na maioria do tempo que decorreu entre 1112 e 1116, encontramo-la envolvida nas questões sucessórias travadas na Galiza ... sofrendo duas investidas da irmã na fronteira galega, aliando-se com Pedro Froilaz no cerco a Urraca em Sabroso em 1116 ... Estas tréguas, que durariam três anos, obrigaram Teresa a suspender as suas ambições e a regressar ao condado ... a debilidade de que padeciam as forças militares portugueses numa altura em que os almorávidas redobravam em agressividade e força e em que Coimbra sofreria um dos mais perigosos cercos desde a conquista de D. Fernando I.
... Desde 1117, Teresa começou a usar o título de rainha e continuaria a sua política pró-galega ... nomeação de Fernão Peres de Trava como governador de Coimbra e Porto e da inoportunidade da maioria das ocasiões em que decidiu hostilizar a irmã Urraca ... resultando a maioria das suas investidas em perdas de território.
... A necessidade de afastar Teresa do Condado Portucalense para garantir a estabilidade do mesmo e até a pacificação na Galiza e em Leão deveria parecer cada vez mais evidente ... Teresa governou como senhora do Condado Portucalense desde o ano da morte de Henrique até ao seu afastamento forçado, em 1128, quando uma aliança entre os nobres destacados do seu condado, os eclesiásticos mais relevantes, o seu único filho de Henrique, Afonso Henriques e, muito provavelmente, o então já rei de Leão, Afonso VII, apoiaram uma ação militar que derrotaria a condessa-rainha e a afastaria do poder.
Branco, M.J. Antes da independência de Portugal. In Portugal e Espanha. Amores e desamores. Volume I. Coordenação de Matos, A.T., Costa, J.P.O. e Carneiro, R. 2015. Lisboa. Círculo de Leitores. Pg. 43 e 44, 54 a 56, 61 e 62
Coimbra que, desde os primeiros dias da independência de Portugal até quase o fim do período cuja história temos escrito, foi a capital do reino, tinha sido organizada e melhor povoada de gente cristã pelo conde Sesnando sem instituições municipais, ou apenas com as fórmulas duvidosas dos concelhos rudimentares. Conquistada a povoação, Fernando Magno a entregara ao célebre vizir moçárabe, autorizando-o para repartir a propriedade territorial, pôr e tirar colonos, julgar as contendas e exercer todos os atos administrativos conforme a sua vontade. Este parece, de feito, ter sido o sistema mais útil e natural no primeiro momento da conquista, em que eram necessárias a energia e a unidade de mando para ordenar o estado tumultuário de uma grande cidade donde se expulsava a população sarracena, que devia ser substituída por outra. Não falaremos dos regulamentos estabelecidos pelo conde, e que propriamente pertencem à época leonesa. Com eles Coimbra se tornara importante e populosa, e o sentimento de força trouxera aí a impaciência da opressão. Os vestígios de revoltas contra os oficiais do conde Henrique e contra ele próprio, nos primeiros anos do século XII, são palpáveis no foral concedido pelo genro de Afonso VI em 1111 aos moradores da capital. Esta carta de comunidade, posto que substituída meio século depois por outra mais ampla, não deixa de oferecer bastante interesse como tipo dos forais concedidos a várias vilas, sobretudo da alta Estremadura. Por ela Coimbra se constituiu um concelho imperfeito, desses a que é aplicável a quinta fórmula. A característica desta, a existência simultânea de cavaleiros e peões com o sistema incompleto de magistraturas, é evidente no foral. Eis algumas passagens que o provam e que, ao mesmo tempo, nos pintam a situação relativa destas duas classes:
Se algum cavaleiro comprar vinha de tributário seja essa vinha exempta («libera»). Se casar com viúva de tributário, qualquer herdade que ela traga seja igualmente exempta.
O tributário, se tiver posses para ser «cavaleiro», seja-o.
Todos os «jugadeiros» que os cavaleiros puderem ter nas herdades, tanto em Coimbra como por outras vilas e castelos, sirvam-nos a eles livremente, e não sejam acoimados por homicídio ou rapto.
Se a algum cavaleiro morrer o cavalo, não tendo com que compre outro, dar-lho-emos nós e, se lhe não dermos, goze das imunidades da sua classe («stet honoratus») até que possa comprá-lo.
O «infanção» não tenha em Coimbra casa ou vinhas, salvo querendo fazer vizinhança e «servir» como qualquer de vós outros.
Os «peões» deem de ração de cereais que costumavam dar só metade, etc.
Aqui as duas classes estão bem distintas. A primeira estriba-se na propriedade, unicamente nesta. O nobre de raça («infanzon»), se quiser possuir bens em Coimbra, há-de descer ao nível dos cavaleiros vilãos, e os peões favorecidos da fortuna elevar-se-ão à mesma categoria, como, nos últimos tempos do Império Romano, os possessores eram, só também por esse facto, incorporados na ordem dos decuriões. Aos colonos ou caseiros dos cavaleiros vilãos aplica-se em especial a designação de jugadeiros, e aos colonos imediatamente dependentes da coroa a de tributários ou peões.
Vejamos agora os vestígios que o foral de Coimbra nus subministra pelo que respeita às magistraturas:
O saião não vá pôr selo na casa de ninguém. Se qualquer individuo cometer delito, venha ao tribunal («concilium») e seja devidamente julgado.
Os vossos «juiz» e «alcaide» sejam naturais de Coimbra e postos nesses lugares sem ser por peita.
Não deis portagem ou alcavala, nem de comer, aos guardas da cidade ou das portas.
Os magistrados de Coimbra eram, pois, o alcaide do castelo, entidade mista, ao mesmo tempo municipal e régia, e um juiz, ambos nomeados pelo poder supremo. Os oficiais eram o saião, espécie de agente público, provavelmente no distrito inteiro, e os guardas da cidade alheios ao município, cujos membros, aliás, ficavam exemptos dos direitos de barreira ou portagens.
Herculano, A.1987. História de Portugal. Vol. VII. Lisboa, Circulo de Leitores, pg. 91 a 93
Precedida de uma ofensiva estratégica contra a taifa de Sevilha, dinamizada a partir de Mérida, em 1063, destinada a isolar o Reino de Badajoz, a tomada de Coimbra por Fernando I, no ano seguinte, não constituiria um mero episódio na lógica da «Reconquista». Era antes, em certo sentido, o seu próprio e simbólico ponto de partida … A submissão da fortíssima praça - «illarium partium maxima civitas», como refere a documentação medieval – avultava, assim, como prova de fogo da estratégia imperial formulada pelo monarca leonês. Donde a peregrinação a Santiago, de que seria precedida, destinada a impetrar a proteção do santo; donde o conjunto de lendas que se iriam tecer em seu redor, como os «sete anos» de cerco, a ativa intervenção do próprio apóstolo (em tal transe assumindo perfil de «mata-mouros»), a participação de Rui (ou Rodrigo) Dias, o romanesco Cid, armado cavaleiro, após o triunfo, na mesquita. Donde, enfim, nova romagem régia a Compostela, na sequência da conquista, a render graças pelo bom sucesso da empresa.
A fazer fé nos relatos cristãos, os sitiantes haviam combatido “muy fortemente com os engenhos, em tanto que britarom o muro da villa. E os mouros, maao seu grado, veheron a el rei e deitaronsse a seus pees e pedironlhe por mercee que os leixasse hyr cõ seus corpos, e que lhe leixaria a villa e a alcaçova, com quanto aver em ella avya. E el rey com grande piedade outorgoullo. E entregaronlhe a vylla a huum domingo, ora de terça.
…
Coimbra renderia, de facto, um opulento saque em cativos e bens, mesmo que os 5.000 prisioneiros transmitidos pelas fontes pertençam também, provavelmente, aos domínios da lenda. Integrada pelo Imperador no Reino da Galiza, atribuído a seu filho Garcia … seria confiada (bem como todo o território a sul do Douro, reconstituindo, de um modo geral, o velho «condado de Coimbra»), a Sesnando Davides.
…
A nomeação do famoso «alvazir» como governador da cidade e seu território no novo contexto da conquista cristã … representava a possibilidade de utilização, ao serviço da «reconstrução» e em pleno «Andalus», da sua própria origem moçárabe … no âmbito de uma estratégia de aglutinação do tecido social e de atração de novos «povoadores».
Pimentel, A.F. 2005. A Morada da Sabedoria. I. O Paço real de Coimbra. Das Origens ao Estabelecimento da Universidade. Coimbra, Almedina, pg. 218 a 220.
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