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A' Cerca de Coimbra


Terça-feira, 21.01.25

Coimbra: Colégio dos Jerónimos, construção e transformações

Em 1549, a Ordem de S. Jerónimo adquirira um terreno junto ao castelo de Coimbra e da porta oriental da cidade para aí se construir um colégio universitário. Já desde 1535 que havia a intenção de se construir em Coimbra um colégio daquela ordem.

…. Ergueu-se o colégio sobre as muralhas da cidade, desde a Porta do Castelo, à qual ficou encostada a igreja, e continuou-se o dormitório para norte, em direção ao Colégio das Artes. Ainda hoje se reconhece bem delimitado o edifício com os seus cubelos de reforço da fachada oriental. O claustro é o elemento organizador da planta do colégio, ocupando uma posição central ladeado pela igreja a sul.  O desenho deste espaço é certamente da responsabilidade de Diogo de Castilho.

…. O claustro de S. Jerónimo, começado em 1565, foi o último de uma série que Diogo de Castilho desenhou para vários colégios de Coimbra.

 Col.10.jpg

Claustro de S. Jerónimo. Diogo de Castilho. 1565. Op. cit., pág.60.

…. O claustro não forma propriamente um quadrado. É de dois pisos e tem cerca de catorze metros no sentido norte-sul e doze no sentido este-oeste.

…. As galerias térreas são cobertas por abóbadas de meio-canhão, apoiadas numa mísula contínua e revestidas de caixotões … O segundo piso separa-se do de baixo por uma cimalha …. Observando o claustro anterior de S. Tomás, que ainda se preserva no interior do Palácio da Justiça, pode-se ter ideia do aspeto original do andar superior do claustro de S. Jerónimo …. preserva um ar de recolhimento conventual.

…. A igreja do Colégio ocupava o imponente volume que se ergue no extremo sul do edifício, profundamente alterado em finais do século passado.

Col. 11.jpg

Igreja de S. Jerónimo. Diogo de Castilho. 1565-? Axonometria. Op. cit., pág. 63.

Exteriormente conservam-se da igreja primitiva apenas os quatro cunhais e o cornijamento do alçado sul, alçado lateral da igreja …. À esquerda da antiga fachada resta também o arranque da torre da igreja …. Do espaço interior da igreja sobram apenas duas capelas laterais.

…. Por ocasião das obras de adaptação do Colégio de S. Jerónimo a hospital, o espaço da nave da igreja foi preenchido com dois andares intermédios.

…. A gravura do inglês Vivian, do Séc. XIX, mostra toda a extensão do alçado nascente do Colégio de S. Jerónimo com os cinco cubelos de reforço que ainda se mantêm ….

Col. 12.jpgEstampa … G. Vivian … Da esquerda para a direita, avista-se a Igreja de S. Jerónimo, junto ao Arco do Castelo, a torre que lhe ficava encostada e o grande edifício do Colégio de S. Jerónimo. Op. cit., pág. 64.

No extremo esquerdo da gravura pode-se ver a igreja de S. Jerónimo e a respetiva torre. Pouco acima da parte que resta da torre rasgavam-se as ventanas que deveriam ser uma em cada face.

…. Das estampas referidas pode-se constatar que a planta da igreja de S. Jerónimo é claramente inspirada na anterior igreja da Graça, de Diogo de Castilho, construída entre 1543 e 1555.

…. Sobre a entrada da nave da igreja de S. Jerónimo existia … um coro alto.

…. Do Colégio do Séc. XVI resta ainda praticamente todo o pavimento térreo da ala nascente, sobre a muralha. De sul para norte, a partir da igreja, existe a antiga sacristia ladeada por um pequeno oratório, ambas as salas com ligação ao claustro e com abóbadas revestidas de caixotões, perpendiculares àquele. Segue-se-lhes uma outra divisão, de abóbada longitudinal de sete tramos de quatro caixotões. Terminam esta parte do edifício o antigo refeitório, com teto em estuque pintado, do Séc. XVIII, e a antiga cozinha onde hoje se encontra um pequeno anfiteatro …. Do colégio original é também a sala abobadada … a norte do claustro, no rés-de-chão …. No rés-de-chão ficou um átrio, iluminado do exterior, mantendo-se os quatro grandes arcos e a galeria adjacente coberta por abóbadas de aresta.

…. Atualmente de três andares, a composição setecentista deveria resumir-se aos dois pisos inferiores. A porta de entrada é ladeada por duas colunas-hermes que suportam um frontão ondulado interrompido, em composição própria do reinado de D. João V.  Por cima ficam três portas-sacadas, correspondentes ao espaço de receção do primeiro andar, que ligava a escadaria às salas sobre o claustro e ao corredor central das celas, no lanço nascente. Toda esta zona é também, obviamente, obra do Séc. XVIII.  O átrio de entrada no rés-de-chão comunica diretamente com a escadaria monumental, à esquerda, e com o claustro, do lado oposto.

Col. 13.jpg

Colégio de S. Jerónimo. Escadaria monumental, da primeira metade do século XVIII, e arcaria da mesma época (?). Op. cit. pág., 65

Col. 16.jpg

Costa Simões.1890. Projeto completo para os HUC… Op. cit., pág. 134

…. Com a extinção das ordens religiosas, pelo célebre decreto de 1834, ficou o edifício abandonado, tendo sido entregue à Universidade no ano de 1836. Em 1848 foi destinado para hospital e mais serviço da Faculdade de Medicina.

 Lobo, R.P.M. Os Colégios de Jesus, das Artes e de S. Jerónimo. Evolução e Transformação no Espaço Urbano. 1999. Coimbra, Departamento de Arquitetura da Faculdade de Ciências e Tecnologias.

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por Rodrigues Costa às 19:54

Quinta-feira, 16.01.25

Coimbra: Colégio das Artes, construção e transformações

O Colégio das Artes … fora criado em 1547 com o objetivo de garantir a preparação para as disciplinas maiores que se lecionavam na Universidade.

…. As aulas começaram em 1548, provisoriamente instaladas nos Colégios de S. Miguel e de Todos-os-Santos, na Rua da Sofia.

…. Entregue à Companhia de Jesus em 1555 foi transferido para a Alta em 1565 de modo a integrar o complexo colegial jesuíta a erguer naquela parte da cidade.

… Menos de dois meses depois de ter sido instalado na Alta, já se lidava em preparativos remotos para a edificação do novo Colégio das Artes, que havia de erguer-se junto ao Colégio de Jesus.

A primeira pedra foi lançada em 1568 … A reconstituição de Francisco Rodrigues é bastante esclarecedora: "A traça do colégio tinha sido anteriormente delineada. Havia de erguer-se perto do Colégio de Jesus naquela mesma elevação. Mas … quando já tinham começado as obras (1569), ainda se lhe introduziram outras alterações”. Dispôs-se de modo que a porta principal abrisse para um terreiro de 302 palmos

…. A construção do Colégio das Artes processava-se de modo efetivo já no ano de 1569 e em 1572 já se ensinava na vasta sala de atos e noutra mais pequena que se acabara. Em 1573, no entanto, cessava a obra do colégio por falta de dinheiro.

…. Só em 1611 se retomaram as obras, com dinheiro do orçamento da Universidade … Em 1616, apesar de ainda não estar completa a obra, foram iniciadas as aulas do novo edifício… O vão media na direção de norte a sul, cerca de quarenta metros, e de leste a oeste quarenta e quatro. Rodeavam-no interiormente nos quatro lados, varandas ou pórticos de colunas de pedra inteiriças, para os quais se iam abrindo por toda volta as aulas … Excediam às demais na vastidão a nobre aula de Teologia, capaz de receber muitos teólogos e doutores para as disputas, e a sala dos atos.

O conjunto de levantamentos efetuados por Elsden em 1772 inclui também uma planta do piso de entrada do Colégio das Artes.

Col. 8.jpgPlanta do piso superior do Colégio das Artes. Reconstituição correspondente à situação da gravura de 1732. Op. cit., pág. 49

Guilherme Elsden, 1772. Planta do piso térreo do Colégio das Artes. Op. cit., pág. 49

Nessa planta podem-se identificar claramente as duas grandes salas às quais se faz referência na descrição anterior, ambas no lanço norte do edifício. Do lado nascente tem-se a grande sala dos atos, com uma tribuna destinada aos lentes encostada à parede lateral. No lado poente existe uma sala identificada. Como capela, que serviria certamente como a aula de Teologia mencionada.

…. Em redor de uma quadra monumental – sem o carater claustral de um mosteiro – dispõem-se quatro lanços com salas de aulas racionalmente concebidas quanto à área, alçados, iluminação e higiene … O primeiro andar era ocupado pelas celas dos noviços.

…. as colunas toscanas que circundavam o pátio do Colégio das Artes suportavam um entablamento reto e não uma arcaria.

Inferiormente, as colunas assentavam em pedestais de cerca de um metro de altura, composição que hoje se mantém. Paradoxalmente, a situação atual apresenta uma arcaria em redor do claustro. Trata-se, contudo, de uma intervenção do início deste século derivada da adaptação do edifício ao Hospital da Universidade.

…. As intervenções apontadas são, no entanto, pouco profundas, reduzindo-se praticamente a dois lanços de escadas novos.

…. Exteriormente …. sobressaíam apenas no tratamento dos alçados, para além das aberturas factuais, os frontões rematados por pináculos que assinalavam os corredores das alas e a entrada principal do colégio no lanço sul. O lanço norte não era coroado por estes frontões dada a sua particularidade na estrutura formal do conjunto. Albergava as duas grandes salas do colégio e o sistema de acessos verticais que interligava os vários pisos: o andar superior das celas, o pavimento do claustro e das aulas e ainda os pisos subterrâneos que ligavam ao colégio de Jesus e às cozinhas e ao refeitório que serviam o complexo edificado da Companhia. No lanço nascente sobressaía na leitura exterior do edifício o corpo de uma capela que existia no piso superior, assente sobre a plataforma que cobria a cisterna do rés-de-chão. Atualmente não é percetível a existência da capela do exterior, uma vez que ficou completamente afogada pela massa edificada resultante das intervenções do princípio deste século. Ficou por isso sem iluminação direta. A sua cobertura erguia-se acima do telhado que corria sobre o lanço nascente, facto que salientava a sua presença na perceção geral do edifício. O plano da capela é retangular, abrindo-se nas paredes quatro janelas, agora sem luz direta. A capela-mor está demarcada por um arco de alvenaria sendo o teto formado por uma abóbada semicircular. Anteriormente à capela, conserva-se o pequeno átrio quadrado, com abóbada de aresta, à direita do qual se encontra a sacristia, situação que não corresponde à original, já que esta inicialmente ocupava o compartimento à esquerda. A porta da capela está datada de 1720.

Col. 9.jpg

Gravura de 1732. Pormenor com o Colégio das Artes, cuja construção foi iniciada em 1568. Op. cit., pág. 51

 

Na gravura de 1732, no entanto, a capela ainda não aparece representada, sendo possível identificar apenas a plataforma que cobre a cisterna. Provavelmente estaria ainda em construção na altura. Tendo em conta a decoração interior com azulejos e talha dourada, trata-se certamente de uma intervenção ainda da primeira metade do Séc. XVIII. O portal da face sul do colégio é também deste século, mais propriamente de 1715. Falta-lhe o remate superior que deveria ter contido o escudo nacional.

…. Em 1759, no reinado de D. José, foi proscrita a Companhia de Jesus e os jesuítas foram expulsos do país…  Em carta régia de 1760, mandava-se separar este edifício do que fora o Colégio da Companhia, o Colégio de Jesus. Ordenava-se obviamente a destruição do passadiço de ligação entre os dois colégios.

Lobo, R.P.M. Os Colégios de Jesus, das Artes e de S. Jerónimo. Evolução e Transformação no Espaço Urbano. 1999. Coimbra, Departamento de Arquitetura da Faculdade de Ciências e Tenologias.

 

Tags: Coimbra sec. XVI, Coimbra séc. XVII, Coimbra séc. XVIII, Colégio das Artes, Colégio de S. Miguel, Colégio de Todos-os-Santos, Companhia de Jesus, Rua da Sofia, Francisco Rodrigues, Guilherme Elsden, D. José,

 

 

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por Rodrigues Costa às 10:59

Quinta-feira, 05.09.24

Coimbra: Vestígios romanos subjacentes ao anfiteatro da Faculdade de Direito

Tivemos, recentemente, acesso a um conjunto de documentos que permitiram conhecer a existência de vestígios arqueológicos romanos relevantes para a história da nossa Cidade. No entanto, mais uma vez, o camartelo do “progresso”, a fim de construir o anfiteatro da Faculdade de Direito, sumiu-os e reduziu-os a meros documentos, mais ou menos amarelecidos pelo tempo, que jazem inertes, apenas vivos para quem os pretenda consultar, num dos inúmeros arquivos estatais.

  Relatório das escavações de emergência realizada nas imediações da alcáçova de Coimbra 1997 (finais de junho e julho de 1997) 

... As sondagens praticadas pontualmente revelaram níveis amplamente remexidos, observação confirmada pelos sequentes trabalhos arqueológicos.

Na fase terminal dos trabalhos mecânicos, o empreiteiro resolveu dar um arranjo um pouco mais cuidado à zona concretizado numa limpeza geral, no aplainamento das superfícies, e nas barreiras limítrofes ao fosso destinado a receber o anfiteatro.

…. Este tipo de trabalho foi determinante no revelar ocasional de estruturas da ocupação romana - muros e pavimento de opus signinum.

Embora imprevisível, não foi surpresa. Inexplicável seria se nada de romano existisse a poucos metros da cintura do que foi a acrópole romana.

A ocorrência de vestígios romanos verificou-se em dois locais no corte oblíquo do lado oeste, quando os trabalhos de remoção de terras se encontravam no seu termo.

….

O edifício do séc. XVI

No séc. XVI, a zona conheceu uma fase de desenvolvimento urbano. Pelas estruturas existentes à superfície e muros que surgiram após a decapagem mecânica da área do futuro anfiteatro de Direito é possível apreender a evolução do sector. Confirma-se que, nalguns pontos, nomeadamente até à rocha, as construções anteriores são arrasadas.

Um grande edifício aparece então (Fig. 3) com uma sólida construção.

Vestigios romanos subjacente anfiteatro de DireitoFig. 3. Op. cit.

… O edifício, que conservava uma altura de cerca de 10m, foi agora arrasado com exceção do muro meridional, hoje parcialmente encoberto pela rampa que descai para a R. Guilherme Moreira;

…. Assim o edifício afeto a um plano retangular fecha a poente a área que … revela ser um espaço essencialmente aberto para o interior.

As evidências arquitetónicas, a fachada contrafortada … levam a aparentá-lo cronologicamente com a imponente colunata levantada a Este, que o contexto convida a pôr em relação com as transformações efetuadas na zona no séc. XVI.

ObraAnfiteatroDireito25Jul1997.JPGFotografia anexa ao documento transcrito

O edifício foi a certa altura parcialmente abandonado ou melhor, transformado em instalações para a Faculdade de Farmácia, em data que não podemos precisar. Estas instalações viriam a ser demolidas no plano de trabalhos da cidade universitária.

As estruturas romanas

Analisemos as estruturas que se identificam com a época romana.

A zona compreendida entre o grande edifício e a arcada quinhentista, a meia encosta, sobre o afloramento rochoso, revelou a presença de estruturas romanas, que, após a remoção da terra até ao aparecimento do nível do muro 6, foram objeto de “escavação”.

ObraAnfiteatroDireitoFotografia2.JPGFotografia anexa ao documento transcrito

…. Três muros perpendiculares ao muro 6, com dimensões mais reduzidas, dirigem-se para ocidente. O primeiro muro, 9, determina o canto nordeste e termina sobre o afloramento rochoso com pouco mais de 2,00 metros de comprimento.

Forma com o muro 8, uma pequena divisão, apontada como D5, parcialmente talhada na rocha, de pavimento térreo. O segundo muro, 8, forma o angulo nordeste da divisão D4, com 8,30m de comprimento e 4,9m de largura. A partir de 3m, testemunha algumas transformações no tipo de construção, passa a ser construído de pedras soltas dispostas muito irregularmente, provavelmente impostas como acrescentos ou transformações efetuadas em época tardia. O terceiro muro, 7, também de boa qualidade, com 0,5m de largura, mediano das divisões D4 e D3 apresenta um pavimento de opus signinum reduzido a uma pequena porção danificada pelo muro 4.

…. Pelo tipo construtivo da canalização poder-se-á definir a sua funcionalidade? Destinar-se-ia a evacuar as águas pluviais ou teria servido de alimentação a fontenário ou tanque? Na primeira hipótese é preciso supor que a recolha das águas pluviais, nesta situação à profundidade de 1m, se fazia por um sistema de caixas de esgoto das quais não se notam quaisquer vestígios e com este fim não parece lógico o acabamento do fundo da canalização em opus signinum com ligeira elevação do lado direito, tipo meia cana. O género de acabamento pressupõe uma conduta de águas limpas para alimentar qualquer reservatório.

…. O vestígio mais significativo é o opus signinum muito bem conservado com uma área aproximada de 20m2 e com 0,12m de espessura.

…. O conjunto de estruturas é muito pouco significativo, pelo que os dados cronológicos recolhidos na zona ocidental da alcáçova são raros. Apenas o elenco dos fragmentos do mobiliário cerâmico em confronto com as diversas concordâncias estratigráficas confinadas às prospeções e “escavações”, são elementos suscetíveis de abordar, com alguma reserva, a sua cronologia.

…. A destruição das estruturas romanas deve ter sido efetuada no séc. XVI com a implantação, nesta época, do outro imóvel descrito.

Auditório Direito 1.webpAuditório da Faculdade de Direito. Foto de José Manuel Alvarez Ilarri. Acedida em: https://www.google.pt/search?q=coimbra&sca_esv=2a19a3414e05e997&sxsrf...

Pinto. A.N. Relatório das escavações de emergência realizada nas imediações da alcáçova de Coimbra 1997.

 

 

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por Rodrigues Costa às 10:52


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