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A' Cerca de Coimbra


Quinta-feira, 01.02.24

Coimbra: Viola toeira, na Miami University, em Oxford, Ohio, EUA 2

Concluímos, nesta entrada, a divulgação da publicação onde se relata o trabalho que está a ser desenvolvido na Miami University, relacionado com a revitalização da viola toeira.

A viola toeira e Coimbra

A viola de Coimbra tinha duas denominações distintas: a “Banza” e a “Farrusca,” sendo que o termo Banza descende provavelmente do instrumento africano “Mbanza” levado na memória dos escravos para o Brasil e daí o termo ser utilizado para denominar um instrumento de corda.

Coimbra foi, até às invasões francesas, a universidade do Brasil, os estudantes que vinham estudar na universidade traziam consigo a sua musicalidade, com ritmos, melodias e ambientes harmónicos dos “lundus,” combinando harmonia europeia e ritmos africanos, e a modinha brasileira, baseado na moda portuguesa e sempre acompanhada pela viola. A modinha ficou tão popular que o Jornal de Modinhas foi publicado em Lisboa entre 1792 e 1795. José Ramos Tinhorão confirma que “o costume dos estudantes, tanto de Lisboa quanto em Coimbra, de preencherem as suas horas de lazer com tocatas e cantorias chamadas de estudantinas, levava-os a compor canções.”

Quando um estudante se enamorava era costume convencer alguns dos seus colegas para o acompanhar nas noites mais claras, iluminadas pela lua cheia, pois não existia iluminação publica nas ruas, a cantar à janela da sua amada. Ouvia-se uma serenata deliciosa. Cantando versos como “menina vinde ao luar, vinde ver quem está a cantar,” o instrumento que acompanhava a sua voz era a viola de Coimbra, conhecida agora como viola toeira. Assim nasceu a Serenata, assim nasceu o Fado de Coimbra. Francisco Faria, em Fado de Coimbra ou Serenata Coimbrã?” interroga-se: “Por que chamar a isto fado? Canção coimbrã é uma música de ar livre, a estiolar em ambientes fechados, nos quais perde força expressiva e significado social, para se tornar canção-espetáculo...”

Provavelmente aprenderiam a cantar com familiares e tutores que sorviam a estética parisiense e, no caso da música, a italiana e a austríaca. Por esta razão ouve-se cantar na canção das ruas de Coimbra, a técnica operática do canto lírico que persiste na atualidade e que muito a diferencia do fado de Lisboa. A viola que acompanhava os estudantes era denominada de banza (muito raramente ainda se utiliza hoje expressão como “profissional da banza”). Era semelhante à farrusca a viola dos futricas e tricanas, mas ao nível das decorações era bastante ornamentada e rica segundo a estética barroca, com a utilização de madeiras nobres, madrepérola e marfim.

Quando um estudante se enamorava era costume convencer alguns dos seus colegas para o acompanhar nas noites mais claras, iluminadas pela lua cheia, pois não existia iluminação pública nas ruas, a cantar à janela da sua amada. Ouvia-se então uma serenata deliciosa.

Viola toeira 4.jpg

Eduardo Loio a tocar uma réplica da viola de Bento Martins Lobo. Op. cit.,

Provavelmente aprenderiam a cantar com familiares e tutores que sorviam a estética parisiense e no caso da música a Italiana e austríaca. Por esta razão ouve-se cantar na canção das ruas de Coimbra, a técnica operática do canto lírico que persiste na atualidade e que muito a diferencia do fado de Lisboa. A viola que acompanhava os estudantes era denominada de banza (muito raramente ainda se utiliza hoje expressão como “profissional da banza”). Era semelhante à farrusca a viola dos futricas e tricanas, mas ao nível das decorações era bastante ornamentada e rica segundo a estética barroca, com a utilização de madeiras nobres, madrepérola e marfim.

Revitalização e construção

A viola toeira está a passar por uma revitalização nos últimos anos, com muito interesse nas comunidades académicas e musicais, reconhecendo o potencial de um instrumento com possibilidades expressivas. Com o movimento de early music e o desejo de voltar a usar instrumentos originais na música histórica, vários instrumentos extintos ou esquecidos estão a ser reutilizados em tipos de música antiga e folclórica. A viola toeira cai nesse movimento, e a canção coimbrã.

Em termos acadêmicos, investigadores estão explorando a história e desenvolvimento da viola toeira e música composta para o instrumento, pesquisando a música em arquivos e museus em Portugal e no exterior. Várias teses e dissertações foram escritas recentemente, explorando música disponível como o “Coimbra Codex” em arquivos como a Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, a Biblioteca Nacional e a Fundação Gulbenkian, em Lisboa. Outras fontes estão a ser descobertas, e muita informação está disponível na internet. Instrumentos antigos estão a ser estudados também, com exemplares de violas portuguesas de 12 cordas do século XVIII acessível em museus em Portugal e outros países, construídas por António dos Santos Vieira, de Lisboa, exposta no Ashmolean Museum, em Oxford, Inglaterra, a de Pedro Ferreira de Oliveira (Lisboa, c. 1790), da antiga coleção de Arnold Dolmetsch, actualmente no Horniman Museum, em Londres, outra de José Pereira Coelho (Lisboa, c. 1785) no Museu Nacional de Etnologia, em Lisboa.

Uma parte dessa revitalização é a construção de instrumentos, principalmente nas últimas décadas. Construtores redescobriram o instrumento e começaram a construir instrumentos baseados nos exemplares históricos, alguns muito elaborados, outros mais simples. Ultimamente, ateliers e fábricas começaram a produzir instrumentos em número significativo.

A construção da viola toeira respeita as técnicas de construção ibéricas que remontam ao século XVI, em que o braço e o cepo ou bloco da quilha são uma peça única, onde as laterais, ilhargas ou costilhas são coladas em duas ranhuras perpendiculares à mediana do braço, previamente serradas. Este método de construção é muito diferente do utilizado em França e Itália, que emigrou para os Estados Unidos onde a caixa acústica é construída separadamente do braço sendo unidos posteriormente através de um encaixe ou malhete.

A cidade de Coimbra é uma parte essencial da revitalização e a construção da viola toeira, com estudantes, músicos e luthiers amadores e profissionais interessados em construir e tocar o instrumento.

Há muitos websites dedicados às violas portuguesas e à viola toeira, e é possível comprar instrumentos, estojos e cordas em vários países do mundo. Projetos como EcoMusic na Universidade de Aveiro estão a investigar a história e revivalismo do instrumento e outros aspetos da música portuguesa.

A viola toeira tem um passado interessante e variado, e será fascinante ver o que o futuro reserva para esse instrumento.

Viola toeira Imagem 5.jpg

Thomas Garcia a construir uma viola toeira na Coimbra Luthier School. Op. cit.,

Garcia, T.G.C. e Loio, E. A Viola Toeira: História, Desenvolvimento, Revitalização e Construção. Acedido em: https://veduta.aoficina.pt/14/a-viola-toeira/

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por Rodrigues Costa às 19:07

Terça-feira, 30.01.24

Coimbra: Viola toeira, na Miami University, em Oxford, Ohio, EUA 1

Encontrei, com espanto e tristeza, no decurso das minhas buscas pela internet o texto que ora passo a divulgar. Espanto, porque nunca imaginei que uma estrutura deste tipo existisse e muito menos nos Estados Unidos. Tristeza porque Coimbra, mais uma vez, fica mal na fotografia e mais uma vez manifesta a sua faceta madrasta.

Importa salientar que os autores do texto são Thomas George Caracas Garcia, violonista e professor de etnomusicologia na Miami University em Oxford, Ohio, EUA, com especialização em cordafones (sic) e música luso-brasileira e Eduardo Loio, Diretor do projeto Museu da Música de Coimbra, Diretor da Coimbra Luthier School e Coordenador do Núcleo de Estudos da Viola Toeira.

No final desta série, composta por duas entradas, publicarei uma outra, a fim de recordar o que, em 1983, quando era Vereador da Cultura da Câmara Municipal de Coimbra o saudoso Fausto Correia e eu tinha a honra de chefiar o Departamento de Cultura, se implementou relativamente a este instrumento.

A viola toeira é um instrumento indelevelmente ligado à cidade de Coimbra, e foi o instrumento utilizado pelos estudantes da universidade para as serenatas que evoluíram até serem conhecidas como o Fado ou Canção de Coimbra. A viola foi utilizada até o início do século XX pelos estudantes e até à segunda metade do século XX pelo povo (futricas). Poucos instrumentos sobreviveram, a maioria localizados em museus. A influência do instrumento, entretanto, pode ser sentida no mundo lusófono até os presentes dias. Recentemente, um movimento de recuperação e reutilização da viola toeira desenvolveu-se, com músicos portugueses e de outros países redescobrindo o seu potencial e beleza como um instrumento expressivo. Instrumentos contemporâneos são construídos em ritmo crescente tanto por luthiers profissionais quanto por amadores, atestando a importância da viola toeira no contexto artístico do país.

GIL VICENTE, AUTO DE INÊS PEREIRA

Sey bem ler

e muyto bem escreuer,

e bom jugador de bola,

e quanto a tanger viola,

logo me ouuireis tanger.

Viola toeira, imagem 1.jpg

Nova Arte de Viola de Manoel da Paixão Ribeiro a mostrar 12 cordas em 5 ordens. Op. cit.

(Obra impressa em Coimbra na Imprensa da Universidade, em 1789).

 Introdução

 A viola toeira, a viola de Coimbra, é um instrumento que ficou praticamente extinto do uso diário no século XX. Ela é uma das violas tradicionais portuguesas que são todas do mesmo tipo fundamental. Essa espécie de viola usava 12 cordas de arame ou tripa organizadas em 5 ordens, um padrão em Coimbra descrito no livro Nova Arte de Viola do Manoel da Paixão Ribeiro, publicado em 1789. Paixão Ribeiro é de Coimbra e refere-se à viola coimbrã do seu tempo, que se terá mantido basicamente inalterável até hoje. Era um instrumento muito importante na vida musical dos estudantes da Universidade de Coimbra até à segunda metade do século XIX, ouvida nas músicas cantadas pela cidade. Entrou em declínio no final desse século, quando foi substituída pela guitarra portuguesa de Coimbra, atualmente usada no Fado de Coimbra, que cresceu dessa música dos estudantes ao ponto de se transformar no que é conhecido hoje, que tem pouco a ver com o Fado de Lisboa.

 Da viola à viola toeira

A viola toeira caracteriza-se pela sua silhueta semelhante à vihuela e viola barroca, boca elíptica predominantemente perpendicular ao sentido das cordas, uma cabeça em forma de lira. Era encimada por um disco solar ou lua cheia às vezes decorado com grafismos gravados na madrepérola. A ponte é muito de acordo com a estética barroca com curvas delicadamente esculpidas em madeira densa. Era armada com ordens de cordas duplas e triplas na afinação mi si sol ré lá, a mesma afinação da viola barroca e viola da terra dos Açores. A viola em Portugal começa a mudar para o instrumento conhecido hoje ainda no final do século XVIII, quando a viola de arame é mencionada pela primeira vez. E a julgar pela Nova Arte de Viola de Manoel da Paixão Ribeiro, na década de 1780, o repertório tanto da viola de tripa quanto da viola de arame era essencialmente o mesmo, embora, segundo Paixão Ribeiro, exigisse do tocador “uma grande modificação nos dedos para sacarem bons vozes,” depois de alguma prática, “a viola se não diferença de hum Cravo.”

Viola toeira Imagem 2.jpg

Viola toeira do Bento Martins Lobo. Op. cit.

A denominação viola toeira foi recolhida por Octaviano de Sá nas oficinas dos construtores da cidade e publicada numa crónica no jornal O Primeiro de Janeiro e divulgada pelo musicólogo Armando Leça no seu livro Música Popular Portuguesa e em seguida devido a uma necessidade de diferenciação regional das várias violas tradicionais portuguesas foi generalizada por Ernesto Veiga de Oliveira em Instrumentos Populares Portugueses. Acreditamos na possibilidade ser esta viola que dava o tom para outros instrumentos afinarem quando tocava em conjunto.

A viola toeira usava cordas de tripa e arame, mas não era o único instrumento a usar mais que um tipo de cordas. A viola barroca era armada com cordas de tripa quando tangida dentro de portas e com cordas metálicas quando tocada na rua. Podemos especular que, com o início da Revolução Industrial, ainda com a água como força motriz, começa a chegar à cidade do Porto trazido pelos ingleses um novo tipo de liga metálica que estava a ser desenvolvida para o piano. Esse material que chegava a Portugal em rolo denominava-se em português arame musical. Poderá ser esta a explicação para viola de arame para as violas tradicionais portuguesas. No entanto poderemos afirmar que a toeira seria armada com cordas de tripa e gradualmente, devido à durabilidade e preço das cordas passou a ser definitivamente armada com cordas metálicas. Segundo Paixão Ribeiro, eram utilizadas cordas de latão, cordas de prata e cordas banhadas a ouro.

Segundo o historiador António Nunes, a viola toeira atingiu o seu verdadeiro pico nas décadas de 1850 e 1860, devido ao primoroso fabrico dos Irmãos Bruno e ao virtuosismo de José Dória, no que respeita ao fabrico é importante referir a viola construída por Bento Martins Lobo para a exposição de Coimbra em 1884 e a continuidade dada por António Augusto dos Santos e Raul Simões. A viola toeira dava o som e o caráter da serenata coimbrã, mas com a aparência da guitarra portuguesa, que começara a ser utilizada em Coimbra por volta de 1860; a viola toeira saiu da moda.

Garcia, T.G.C. e Loio, E. A Viola Toeira: História, Desenvolvimento, Revitalização e Construção. Acedido em: https://veduta.aoficina.pt/14/a-viola-toeira/

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por Rodrigues Costa às 18:44

Terça-feira, 19.12.23

Coimbra: Procissão do Corpus Christi, no séc. XVI

Prosseguindo na chamada de atenção dos leitores para a obra recentemente publicada por Jorge Alarcão,

MC 2.jpgMemórias de CoimbraOp cit., capa

escolhemos um tema aqui pouco tratado, socorrendo-nos do capítulo da obra citada, intitulado As procissões em Coimbra no séc. XVI.

Refira-se que no texto não são apresentadas quaisquer imagens. Aliás, manda a verdade que para a época a que o texto se refere, desconhecemos a existência de tais imagens. Restou-nos assim ilustrar a entrada com imagens do espólio guardado no Arquivo Histórico Municipal de Coimbra.

A entrada de hoje é dedicada à procissão do «Corpus Christi» e atualizamos os termos do texto para facilitar a leitura de todos os leitores

 A principal procissão que se realizava em Coimbra, no séc. XVI, era a do «Corpus Christi. Aliás, era festividade comum a todas as cidades do reino, mas a de Coimbra é particularmente conhecida por se ter conservado o Regimento dela, muito pormenorizado.

MC 5.JPGAHMC. Regimento da procissão do Corpus Christi, pg. 1

…. A procissão era algo entre o sagrado e o profano. Não diremos que tinha aspetos carnavalescos, mas, pelo menos, tinha muito de cortejo alegórico; e a população da cidade, mais do que incorporar-se nela, assistiria, das ruas e das janelas, à sua passagem.

Começava a procissão no largo da Sé, onde os participantes (ou figurantes) deviam comparecer pelas sete horas da manhã. Descia à rua Direita, ia ao Arnado e daí retornava à Sé. Com tão longo percurso, demoraria muitas horas a desfilar.

Na procissão incorporavam-se os representantes das corporações de artes e ofícios da cidade, com suas bandeiras.

A «judenga com sua toura» abria a procissão. Era um grupo de pelo menos 6 homens, escolhidos de entre os forneiros, carvoeiros, fabricantes de telha e de cal e lagareiros da cidade. Disfarçados de judeus, levavam nas mãos uma representação da «Torah», livro sagrado daquele povo - pois é nesse sentido que devemos entender «sua toura».

Vinham depois o «segitorio bem concertado e a serpe com huma silvagem grande».

O segitório era um homem de vestimenta colorida, armado de setas que brandia talvez contra a figuração de uma serpente ou dragão (porque serpe também significava dragão).

João Pedro Ribeiro leu: «Os carpinteiros da Cidade são obrigados de dar a Serpe com uma silvagem grande». Outros autores leram: «com um selvagem grande». A primeira leitura parece-nos mais correta: a serpe iria aos ombros de homens; e para que os pés deles não fossem demasiadamente visíveis iam encobertos por uma rede entretecida de silvas.

Provavelmente, segitório e serpente ora avançavam, ora recuavam, na simulação de um combate.

Seguia-se a «folia de fora», grupo de homens (e também de mulheres?) de fora da cidade, mas do seu termo, com seus instrumentos musicais, e talvez dançando.

Os fabricantes de cordas, de albardas, de odres e os tintureiros seguiam a folia, e levavam sua(s) bandeira(s) e quatro «cavalinhos fuscos bem feitos e pintados».

Os barqueiros, que vinham logo após, transportavam um S. Cristóvão «muito grande com um menino Jesus ao pescoço».

Iam no cortejo as regateiras e vendedeiras de peixe e fruta, com suas gaitas e tamboris. Deviam fazer duas «pelas», isto é, dois grupos. Temos dúvidas sobre se iriam em posição a seguir aos barqueiros, ou se acompanhavam lateralmente o cortejo, ora avançando, ora recuando.

Seguiam-se os oleiros. Eram pelo menos dez, e um deles ia disfarçado de rei e acompanhado de pajem, ambos «bem vestidos e louçãos».

Os pedreiros, seguindo os oleiros, levavam cada um seu castelo nas mãos.

Alfaiates e alfaiatas, juntos com as tecedeiras de tear baixo, deviam levar no grupo um imperador e uma imperatriz, com oito damas que seriam «moças honestas e gentis mulheres bem ataviadas».

Depois vinha a «folia da cidade».

Seguiam-se os sapateiros, formando a «mourisca». Esta era um grupo de homens vestidos como se fossem mouros. Levavam no grupo uma Santa Clara. A presença desta no meio da «mourisca» aludia ao ataque da cidade de Assis pelo Imperador Frederico II com um grupo de sarracenos - ataque que Santa Clara teria repelido exibindo a custódia com a hóstia. O episódio encontra-se representado num famoso retábulo de finais do séc. XIV que se guarda hoje no Museu Nacional de Machado de Castro.

Vinham agora os tecelões e tecedeiras de tear alto, com uma imagem de Santa Catarina.

Os correeiros levavam com eles um homem «que seja bem desposto e alvo» (isto é, de boa compleição e não moreno ou tisnado), que devia representar S. Sebastião.

Seguiam-se os sirgueiros, latoeiros, bordadores, seleiros, adargueiros. Os sirgueiros fariam cordões de seda; os seleiros, selas para cavalgaduras; os adargueiros, escudos de couro.

Vinham depois os cerieiros (que preparavam a cera e dela fariam velas, círios, ex-votos). Diz-se: «sam obrigados de fazerem Santa Maria de asninha, e Joaquim. "Asninha" é o mesmo que "burrinha". Com os cerieiros viria uma senhora (Santa Maria) montada numa burrinha, representando a fuga para o Egipto. Surpreende-nos que o acompanhante seja S. Joaquim, pois devia ser S. José. Ainda hoje se realiza, em Mafra e em Braga (mas com particular importância nesta última cidade), a Procissão da Burrinha. cuja figuração principal é a da Virgem, montada em jumenta e conduzida por S. José.

Não sendo comum a designação de "asninha" para burrinha, vamos encontrá-la no «Auto da Feira» de Gil Vicente, quando Branca Anes, amaldiçoando o marido, exclama: E rogo à Virgem da Estrela / e à Santa Gerjalem / i ós choros da Madanela / e à asninha de Belem / que o veja eu ir à vela / pera donde nunca vem». 

O episódio da fuga para o Egipto, recordado na procissão do «Corpus Christi», foi muito popular em Portugal. Na Beira e no Norte, em afloramentos rochosos,

encontram-se gravuras rupestres pré-históricas, em forma de ferradura, que o povo designa como Fraga das patinhas da burrinha de Nossa Senhora ou Pegadas da burrinha de Nossa Senhora.

A seguir aos cerieiros vinham livreiros e pintores. Os ataqueiros (fabricantes de cordões ou de outros elementos para apertar peças de vestuário ou de calçado?) eram seguidos pelos boticários.

Os espingardeiros, com suas armas de fogo, deviam dispará-las quando a procissão saía do largo da Sé, depois no Arnado, e de novo quando a procissão regressava à Sé.

Barbeiros e ferradores levavam um S. Jorge.

MC 6.JPG AHMC. S. Jorge, (séc. XVIII?). Imagem utilizada na procissão do Corpus Christi, em Coimbra

MC 7.JPGAHMC. do Corpus Christi, em Coimbra. Presumível vestimenta do pajem que segurava o cavalo onde ia montada a imagem de S. Jorge (séc. XVIII?)

Seguia-se uma moça com as armas da cidade.

«As armas da Cidade, que vão com uma moça formosa coroada, e aí detrás da bandeira da Cidade, e estas armas são dadas aos malgueiros tratantes. A bandeira da Cidade há-de ir de trás dos homens de armas, a qual há-de levar o alferes…. e os regedores da Cidade, hão-de de eleger em cada um ano Cidadãos antíguos, que acompanhem a dita bandeira, e irão quatro Cidadãos com a dita bandeira».

Vinha depois uma grande fogaça que as padeiras deviam tender e cozer e que, depois da procissão, era oferecida aos presos.

Na cauda da procissão ia a clerezia, e com ela a «gaiola» que levava a custódia com a hóstia. Junto da gaiola iam quatro anjos tangendo com violas e arrabis [arrabil, instrumento de cordas tocado com um arco]. Acompanhavam a gaiola doze cidadãos dos mais honrados da cidade.

…. Em 1724, por resolução régia, foi proibido que na procissão do Corpo de Deus houvesse danças e jogos, ou se representassem figuras, mesmo que fossem de santos, sendo admitidos somente a imagem de S. Jorge e os andores que as irmandades quisessem levar

…. A procissão do «Corpus Christi» não era a única da cidade. Além das que se faziam na Quaresma, realizavam-se a da Visitação de Nossa Senhora e a do Anjo Custódio, instituídas por D. Manuel ,,,,  e celebradas no dia 2 de Julho e no terceiro Domingo do mesmo mês.

Estas eram procissões que se realizavam em todas as cidades do reino.

Alarcão, J. Memórias de Coimbra. 2023. Coimbra, Edição Lápis de Memórias

 

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por Rodrigues Costa às 15:13

Sexta-feira, 10.11.23

Coimbra: Reforma Pombalina, projetos de construções

Foi, recentemente, publicado mais um número – o 57-2023 – da Rua Larga. Revista da Reitoria da Universidade de Coimbra» que integra vinte e cinco artigos. Trata-se de uma reunião de saberes, escritos numa linguagem acessível, cuja leitura merece o nosso interesse.

RP capa.jpg

Rua Larga. Revista da Reitoria da Universidade de Coimbra, n.º 57-2023, capa

Nesta entrada olhamos para o artigo Modelações 3D de Projetos e Edifícios da Reforma Pombalina da Universidade, (pg. 35 a 41) assinado pelos Professores do Departamento de Arquitetura da Faculdade de Ciências e Tenologias, Rui Lobo e Carlos Moura Martins, magnificamente ilustrado onde, nomeadamente, é dito.

Em 2022, comemoraram-se os 250 da Reforma Pombalina da Universidade de Coimbra A Reitoria da Universidade de Coimbra  (UC), através do vice-reitor professor Delfim Leão, contactou o Departamento de Arquitetura no sentido de se produzir uma coleção de modelos 3D, em formato digital, dos projetos dos  edifícios da Reforma, aprofundando um trabalho começado no âmbito da unidade curricular de História da  Arquitetura Portuguesa, no ano letivo de 2020-21.

Em 29 de setembro de 1772, em sessão solene na Sala Grande dos Atos, Sebastião José de Carvalho e Melo, Marquês de Pombal, apresentava com pompa e circunstância, os novos Estatutos ao corpo reunido da Universidade. Eram criadas as novas Faculdades de Filosofia e de Matemática (substituindo a extinta Faculdade de Artes), mantendo-se as restantes faculdades de Teologia, Direito, Cânones e Medicina, ainda que esta última em formato renovado. Para as novas faculdades e para a reformulada Faculdade de Medicina, promovia-se um novo ensino de caráter prático e experimental, apoiado em novos estabelecimentos criados para o efeito: os Gabinetes de Física Experimental e de História Natural, o Laboratório «Chimico» e o Jardim Botânico para a Faculdade de Filosofia; o Observatório Astronómico para a Faculdade de Matemática; e o Teatro Anatómico e Dispensatório Farmacêutico para a Faculdade de Medicina, além da junção do Hospital Público da cidade à Universidade. Para executar a Reforma no terreno, nos seus mais variados aspetos, foi nomeado Reitor-Reformador D. Francisco de Lemos, verdadeiro «braço-direito» do Marquês em Coimbra.

Para instalar estes novos estabelecimentos pedagógicos e científicos, estavam disponíveis os edifícios do Colégio de Jesus (dos expulsos jesuítas), o antigo castelo (a nascente da Alta, para o Observatório), conseguindo ainda o Marquês a cedência de parte da cerca do Colégio de S. Bento para o Jardim Botânico. Seria também criada a Imprensa da Universidade, instalada no claustro da Sé Velha, já que a catedral passava a ser a antiga igreja dos inacianos, agora Sé Nova. Para realizar os projetos de arquitetura dos novos estabelecimentos, veio com o Marquês o tenente-coronel Guilherme Elsden, inglês radicado em Portugal, que havia feito carreira no exército português, realizando levantamentos cartográficos e territoriais e dirigindo algumas obras infraestruturais. Trabalharia com Elsden uma equipa de engenheiros militares, que incluía os capitães Izidoro Paulo Pereira e Joaquim Oliveira, e ainda os ajudantes Ricardo Franco de Almeida Serra, Theodoro Marques Pereira da Silva, Guilherme Francisco Elsden (filho do «Diretor das Obras»), Manuel de Sousa Ramos e o discípulo do número Inácio José Leitão.

Após a coordenação dos primeiros levantamentos, realizados durante a estada do Marquês em Coimbra em setembro-outubro de 1772, Elsden e a sua equipa regressariam a Lisboa, onde produziriam as plantas dos edifícios existentes (incluindo uma notável planta conjunta dos colégios de Jesus e das Artes, hoje no Rio de Janeiro) e umas primeiras ideias de adaptação dos mesmos aos novos estabelecimentos, como a proposta de adaptação da torre quadrangular do castelo de Coimbra a um primeiro e modesto observatório astronómico.

Reforma Pombalina 1.jpg

Figura 1: Guilherme Elsden. Primeiro projeto para o Observatório Astronómico, aproveitando a torre de planta quadrada do castelo: desenho de 24 de novembro de 1772, Fundação Nacinal, Rio de Janeiro (modelo 3D: Rita Rodrigues). Op. cit., pg. 34

Reforma Pombalina 2.jpgFigura 2: Guilherme Elsden. Segundo projeto para o Observatório Astronómico, aproveitando ambas as torres do castelo: desenho do verão de 1773. Museu Nacional Machado de Castro (modelo 3D de Rita Rodrigues). Op. cit., pg. 37.

Reforma Pombalina 4.jpg

Figura 4: Manuel Alves Macomboa. Observatório Astronómico do Paço das Escolas, construído entre 1791 e 1799, demolido em 1951 (modelo 3D: Rita Rodrigues). Op. cit., pg. 38

Elsden voltaria a Coimbra em março de 1773, dando início às obras de transformação do corpo nascente do antigo Colégio de Jesus, correspondente à atual fachada do Museu de História Natural, que definia o também novo espaço urbano do Largo do Museu, atual Praça Marquês de Pombal.

Reforma Pombalina 5.jpg

Figura 6: Guilherme Elsden. Segundo projeto para o Laboratório Chimico (teatro das demonstrações químicas) desenho do verão de 1773, Departamento de Quimica da FCTUC, (modelo 3D: Júio Vidotti, Rafaela Alves e Rita Rodrigues). Op. cit., pg. 40.

Reforma Pombalina 6.jpg

Figura 7: Guilherme Elsden. Projeto final para o Laboratório Chimico (teatro das demonstrações químicas) desenhos de finais de 1773 ou inícios de 1774, Livro dos Riscos das Obras da UC, Júlio Vidotti, Rafaela Alves e Rita Rodrigues). Op. cit., pg. 40.

Lobo, R. e Martins, C. Modelações 3D de Projetos e Edifícios da Reforma Pombalina da Universidade.  2023. In: Rua Larga. Revista da Reitoria da Universidade de Coimbra, n.º 57-2023, pg. 35 a 41.

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por Rodrigues Costa às 18:06

Quinta-feira, 14.09.23

Coimbra. Órgão de S. Cruz, restauro

Em 21 de Junho de 2015 realizou-se um concerto destinado a apresentar, após o restauro a que, então, fora submetido, o “novo” órgão histórico da Igreja de Santa Cruz.

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Folha de sala, rosto

O organista Paulo Bernardino foi o responsável pela execução do concerto que teve como tema “A música para órgão na Europa Ocidental nos sécs. XVI a XVIII”.

Extraímos da “Folha de sala” desta memorável audição o texto que ora apresentamos.

Resenha técnica e intervenção de restauro

O grande órgão de tubos da igreja de Santa Cruz é um instrumento que pela sua idade, história e tamanho tem um lugar especial na organaria portuguesa. As partes mais antigas têm aproximadamente 480 anos.

Igreja de Santa Cruz. Interior 03.jpg

Igreja e órgão de Santa Cruz. Foto João Santos.

Foi construído ou teve intervenções de importantes organeiros (portugueses, espanhóis, flamengos) e possui 3 registos inteiros e 55 meios registos num total de 2920 tubos sonantes tendo na sua fachada um Flautado de 24.

É nas palavras de D. Dionísio da Glória, em 1726 "este Órgão um monstruo de

harmonia''.

A consola encontra-se na parte de trás do órgão, de forma que o organista não tem contacto visual direto com a ação litúrgica, mas por outro lado toda a superfície é aproveitada para colocar tubos.

Mosteiro de Santa Cruz. Órgão 02.jpg

Órgão de Santa Cruz. Acervo RA

O instrumento, apesar de ter um só teclado, está subdividido em 4 secções, designadas pelos respetivos registos mais graves: órgão de 24, de 12 e de 6 (palmos), sendo a quarta secção de cornetas. As secções podem ser controladas através da entrada de vento nos someiros.

Existe uma descrição do instrumento, com uma pequena resenha histórica do mesmo, feita numa linguagem peculiar, redigida logo a seguir ao final dos trabalhos de D. Manuel Benito Gomes de Herrera, feita pelo organista e Mestre-Capela D. Dionísio da Glória, na Páscoa de 1726.

Remetemos os interessados para esse capítulo.

A intervenção de restauro

Os trabalhos de restauro do instrumento tiveram lugar entre o verão de 2004 e a Páscoa de 2008.

O objetivo foi devolver a este instrumento a sua integridade histórica, técnica, estética e musical, de acordo com o estado concebido em 1719-24, pelo organeiro Manuel Benito de Herrera.

Igreja de Santa Cruz. Órgão. Pormenor 07.j

Órgão de Santa Cruz, pormenor. Acervo RA

Igreja de Santa Cruz. Órgão. Pormenor 02.j

Órgão de Santa Cruz, pormenor. Acervo RA

 O sistema de vento foi objeto de uma solução nova, tendo em conta que as condições espaciais (local original dos foles) foram alteradas desde essa data (1724) até aos nossos dias.

Atualmente possui 3 foles novos, colocados atrás do órgão. Para além de funcionarem com motor, que lhes fornece o vento, é ainda possível manobrá-los manualmente...

 Pedro Guimarães von Rohden

Mestre Organeiro

 Von Rohden, P.G. Concerto. Órgão Histórico de Santa Cruz. Folha de sala. 2015. Coimbra.

 

 

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por Rodrigues Costa às 16:55

Sexta-feira, 19.05.23

Coimbra. Conversas Abertas. Castelo de Coimbra

É já na próxima 6.ª feira, dia 26 de maio, pelas 18:00, que irá decorrer no Arquivo da Universidade de Coimbra, na Sala D. João III, a penúltima das Conversas Abertas desta série, como sempre com entrada livre e aberta a participação de todos.

A palestrante será a Arquiteta Isabel Anjinho, que vem realizando uma notável obra da investigação sobre o passado da nossa Cidade e que, desta vez, falará sobre o CASTELO DE COIMBRA.

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Além da exposição oral, as imagens em 3D permitirão conhecer o que era o castelo e como o mesmo se inseria na malha urbana de então.

Apresentamos a folha de sala que estará à disposição de todos os participantes.

CA. 2023.05.26. Isabel Anjimho folha de sala 1 a.j

 

 

CA. 2023.05.26. Isabel Anjimho folha de sala 2 a.j

Folha de sala

Participe e ajude na divulgação deste evento.

Rodrigues Costa

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por Rodrigues Costa às 12:04

Quarta-feira, 29.03.23

Conversa Aberta: Terras do aro de Coimbra

É já depois de amanhã, 6.ª feira que a partir das 18h00, decorrerá mais uma Conversa Aberta que conforme o habitual terá lugar na Sala D. João III do Arquivo da Universidade de Coimbra (por baixo e nas traseiras da Biblioteca Geral), com entrada pela Rua de S. Pedro.

A entrada é livre e após a apresentação do tema segue-se o debate, no qual todos poderão colocar as suas questões e pedir esclarecimentos.

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Desta vez o tema a ser tratado será As Terras do Aro de Coimbra nos documentos e objetos do Arquivo Histórico Municipal de Coimbra

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A palestrante. Dr.ª Paula França é a responsável pelo Arquivo Histórico Municipal de Coimbra, profundamente conhecedora do mesmo e sempre pronta a ajudar aquele que ali fazem as suas investigações.

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Aliás o Arquivo Histórico Municipal de Coimbra merece uma visita. Quanto mais não seja, pelas pequenas exposições, periodicamente renovadas, que ali são apresentadas.

Participe no debate e ajude por favor na divulgação do evento.

Rodrigues Costa

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por Rodrigues Costa às 11:15

Sexta-feira, 17.03.23

Conversa Aberta: Terras do aro de Coimbra

De hoje a 15 dias vai realizar-se mais uma Conversa Aberta que conforme, o habitual, decorrerá na Sala D. João III, do Arquivo da Universidade de Coimbra (junto ao Instituto Justiça e Paz, antigo CADC), na última sexta-feira de cada mês, a partir das 18h00, com entrada livre.

CartazA3_31.03 a.jpg

Desta vez o tema a ser tratado será As Terras do Aro de Coimbra nos documentos e objetos do Arquivo Histórico Municipal de Coimbra.

Flyer_31 a.jpg

A palestrante, Dr.ª Paula França que é a responsável pelo Arquivo Histórico Municipal de Coimbra, profundamente conhecedora do mesmo e sempre pronta a ajudar aquele que ali fazem as suas investigações.

Flyier 2 a.jpg

Aliás, o Arquivo merece uma visita. Quanto mais não seja, pelas pequenas exposições, periodicamente renovadas, que ali estão patentes.

Participe no debate e ajude por favor na divulgação do evento.

Rodrigues Costa

 

 

 

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por Rodrigues Costa às 21:17

Quinta-feira, 26.05.22

Coimbra: Santa Cruz de Coimbra, uma floresta iluminada 3

Como esperado, a extinção das ordens religiosas em 1834 abriu brechas no pequeno mundo paradisíaco desta paisagem monástica. “Vandalismos inauditos” é a expressão usada por Augusto Silva Pereira, o autor de Portugal Antigo e Moderno. O académico Vilhena Barbosa também se penalizou bastante com o que ali viu em 1886: “dói na alma, realmente […]” Mais tarde, o poeta simbolista Eugénio de Castro haveria de escrever, em 1900, que “apesar do bárbaro desbaste feito nos seus arvoredos” o jardim era ainda “um amável refúgio em dias de sol ardente”.

A autarquia adquiriu a parte recreativa da Quinta para que servisse de passeio público, mas só em 1885; a preocupação com o abastecimento da cidade com aquela água era tal, que logo de imediato foram encomendadas novas canalizações para as cascatas de Santa Cruz (p. 103).

Duas décadas depois, um Conselho de Arte e Arqueologia teve de se opor à sobrecarga de eventos de todo o tipo naquele espaço que considerava dever ser elevado a monumento nacional e como tal protegido. A perceção de que se trata de um lugar histórico detentor de uma “presença artística de grande fôlego” (p. 108) não terá sido suficiente para travar investidas para a instalação dos mais variados equipamentos ali.

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Planta do terreno da quinta de Santa Cruz com a planta de uma praça de touros […] com lotação para 10.000 pessoas”, datada de janeiro de 1899. Op.cit., pg.101

Quadras de ténis em 1885, campo de futebol da Associação Académica em 1914-17, eventualmente um coreto em 1923, são alguns exemplos, para já não falar da praça de touros para 10 mil lugares projetada em 1899 para a proximidade do grande lago, mas que felizmente nunca saiu dos papéis em que foi desenhada (pp. 101, 102) — ou da anacrónica instalação, em 1921, de um posto da GNR num dos belos torreões do pórtico, pintado com infinita exuberância rococó….

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Projeto para o gradeamento do jardim de Santa Cruz, datado de 1905. Op.cit., pg. 104

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Desenho de António Augusto Gonçalves, aprovado em 1906 e, provavelmente datado do ano anterior, para a grade a aplicar na vedação do Parque de Santa Cruz. AHMC. Repartição de obras municipais, pasta 43. Op.cit., 105

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Grade projetada e executada para vedação do Parque de Santa Cruz, posteriormente aplicada num muro da rua P. António Vieira. Foto Rui Gonçalves Moreno. Op.cit., 103

A ideia de que o parque constituía uma “sala nobre da cidade” (p. 105) levou a autarquia a realizar sucessivos restauros nos azulejos e nas esculturas e, sobretudo, a precaver novas delapidações do seu património artístico — e que o entulho de construções particulares vizinhas ali continuasse a ser despejado (p. 113)… — mandando vedar o Parque com grade de ferro, em 1906-7 e 1908-9.

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Desenho do par de lanternas criadas por Albertino Marques para serem aplicadas à entrada do Jardim de Santa Cruz, nos ângulos dos torreões. “Gazeta de Coimbra”, 17 de Setembro de 1945. Op.cit., pg. 108

No início da década de 1940, lanternas em ferro forjado e cinzelado, num estilo conhecido como revivalismo rocaille, serão instaladas nos torreões e arco principal da entrada principal, e em outros pontos estratégicos, como a Cascata e a Fonte do Tritão, e é feito reaproveitamento do gradeamento dos demolidos Liceu Feminino e Alameda de Camões.

Como Marco Daniel Duarte reconhece nas últimas páginas do seu livro, “o Jardim de Santa Cruz é um dos mais difíceis espaços públicos para gerir” (p. 143), como comprova uma história quase bicentenária de administração do Estado. Ainda assim, é curioso notar que a contestação duma comissão camarária ao projeto de remodelação do Parque de Santa Cruz apresentado pelo arquiteto paisagista A. Vianna Barreto em 1956, baseada no argumento de “não se afigurar possível conseguir a unidade introduzindo elementos modernos num ambiente monástico” (p. 123), choca de frente — meio século depois, é verdade — com a magnificência do programa escultórico de Rui Chafes, a quem o autor reconhece uma “modernidade e uma transconsciência que faz ecoar os níveis culturais dos ancestrais cónegos regrantes de Santo Agostinho” (p. 126) — fazendo do Parque de novo um “locus artístico” (pp. 133, 140), “não obstante as mazelas que o tempo lhe infligiu” (p. 143).

Rosa, V. Santa Cruz de Coimbra: uma floresta iluminada. In: Observador, edição de 4 de abril de 2018.

 

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por Rodrigues Costa às 09:47

Quarta-feira, 25.05.22

Coimbra: Conversas Abertas, quarto debate

Aproxima-se do seu términus, no ano em curso, a iniciativa do blogue “A’Cerca de Coimbra”, que com o apoio do Arquivo da Universidade de Coimbra e do Clube de Comunicação Social, tem vindo a decorrer na Sala D. João III do Arquivo da Universidade de Coimbra. Arquivo que também guarda pinturas de grande qualidade, de que é exemplo esta pintura da escola italiana.

Imagem pintura italiana.png

Ali decorrerá a quarta sessão deste ciclo, já na próxima 6.ª feira,  no dia 27 de maio, às 18h00, com entrada livre, até ao limite da lotação, no formato habitual, ou seja, intervenção inicial do Palestrante convidado, seguida de período aberto à participação dos assistentes

A entrada é livre, até ao limite da lotação, e serão respeitadas todas as diretivas em vigor emanadas pela Direção Geral de Saúde e a sessão decorrerá no formato habitual, ou seja, intervenção inicial da Palestrante, seguida de período aberto à participação dos assistentes.

Marco Daniel.png

Doutor Marco Daniel Duarte

O Palestrante será o Doutor Marco Daniel Duarte diretor Museu do Santuário de Fátima e do Departamento de Estudos do mesmo Santuário, onde dirige o Arquivo e a Biblioteca. É ainda diretor do Departamento do Património Cultural da Diocese de Leiria-Fátima.

Doutorado em História da Arte pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, pertence à Academia Portuguesa da História, como Académico de Número, à Academia Nacional de Belas-Artes, como Académico Correspondente Nacional, é Sócio Efetivo da Associação Portuguesa de Historiadores da Arte, Membro da Sociedade de Geografia de Lisboa, da Sociedade Nacional de Belas Artes e da Sociedade Científica da Universidade Católica Portuguesa.

Autor de vários estudos publicados em revistas científicas e editados em livro – entre , alguns deles premiados, comissariou diversas exposições científicas subordinadas às temáticas da sua especialidade.

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O tema que irá tratar será o Jardim do Mosteiro de Santa Cruz ou Jardim da Sereia: Uma imagem do Paraíso na cidade de Coimbra.

Situado hoje num dos centros cívicos da cidade, o popularmente conhecido por Jardim da Sereia foi um dos recantos mais belos da cerca dos Cónegos Regrantes de Santa Cruz que, sob a ação de Frei Gaspar da Encarnação (1726-1760), ali construíram um lugar de recreio para a comunidade monástica a que não faltou a marca intelectualizada típica daquela ordem religiosa.

Construído entre 1731 e 1736, os diferentes espaços que compõem o Jardim de Santa Cruz revelam-se, ainda hoje, clara imagem do Paraíso, não obstante as alterações a que têm sido sujeitos e os vandalismos por que tem passado.

Solicito e agradeço a todos os leitores do Blogue “A’Cerca de Coimbra”, a ajuda na divulgação desta iniciativa.

Com o obrigado do

Rodrigues Costa

 

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por Rodrigues Costa às 09:33


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