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Quarta entrada dedicada à obra António Nunes, intitulada A Espada e a Balança. O Palácio da Justiça de Coimbra.
No último quartel do século XIX a família dos Condes do Ameal adquiriu o imóvel quinhentista numa fase em que este funcionaria como armazém de madeiras. O anúncio público de venda surgira na edição de 7 de Maio de 1892, no jornal local «O Conimbricense».
O arquiteto Augusto da Silva Pinto recebeu, cerca de 1895, a incumbência de projetar e orientar a transformação do Colégio de São Tomás em palacete senhorial.
Do projeto Silva Pinto chegou até nós o alçado principal, de linhas neorrenascença, que não chegou a concretizar-se. O projetista propunha uma fachada simétrica, de articulação horizontal, demarcando como eixo nuclear da estrutura arquitetónica o templete de entrada. Este elemento, em diálogo com os corpos extremos da fachada. imprimia ao projeto um ritmo vertical, pontuado por quatro frontões triangulares e um remate central alteado em jeito de "arco triunfal" ornado de estátuas.
Os corpos intermédios sugeriam ritmos de leitura horizontal ordenados. À semelhança da fachada atual, adotava-se uma estruturação em primeiro pavimento, sobreloja e piso superior, muito marcada nos esquemas de fenestração. Algumas das janelas do piso superior adotavam parapeitos de balaustrada, sendo os lintéis alternadamente rematados por formas curvas e triangulares. Esta análise de ordem genérica parece indiciar que o projetista do Palácio da Justiça, engenheiro Castelo Branco, conheceu o trabalho de Silva Pinto, embora tenha optado por uma gramática decorativa acentuadamente mais austera e despojada.
O certo é que a fachada principal nunca chegou a entrar em obras, tendo mantido até 1928 a estrutura herdada do Colégio de São Tomás.
Fachada principal do Palacete Ameal e prédios adjacentes destinados a aquisição amigável. ATRC. Op. cit., pg. 59
A visualização de um antigo postal ilustrado, com a "vista norte da cidade", apresenta uma ampla panorâmica da Rua da Sofia nos primeiros anos do século XX.
Postal ilustrado do início do século XX. Visível o aspeto do Palacete Ameal, entre a Rua da Sofia e a chaminé fabril. Acervo RA
O Palacete Ameal figura em grande plano, sendo de concluir que as fachadas voltadas às atuais Rua Manuel Rodrigues e Rua Rosa Falcão já tinham adquirido um aspeto muito próximo daquele que hoje conhecemos. De acordo com a imagem citada, a fachada principal não sofrera quaisquer modificações em relação ao período religioso do colégio. A fachada voltada à Rua João Machado apresentava-se desnivelada em relação aos alçados principal e posterior, sendo visível o claustro superior sobre o telhado.
A análise de uma fotografia realizada em 1928, aquando da aquisição do palacete, ilustra o estado das obras realizadas pelo arquiteto Silva Pinto nas fachadas sul e posterior.
Vista das fachadas sul e posterior, à data da aquisição do imóvel [pelo Ministério da Justiça] construídas sob direção do Arq.º Silva Pinto. Op. cit., pg. 59
O alçado sul, voltado à Rua Manuel Rodrigues, atingira o estado que hoje lhe conhecemos faltando concluir apenas o entablamento e cornija. Os contrafortes exteriores alinhados entre o torreão sul e a caixa das escadarias estavam construídos, funcionando como suportes dos tetos abobadados das futuras salas dos Advogados e dos Solicitadores. Quanto à fachada posterior, o corpo central apresentava um grande terraço aberto ao nível do piso superior, espaço que Castelo Branco viria a vedar e converter em Sala de Audiências da Relação, após homologação do projeto em sede do Conselho Superior Judiciário. No tocante à inexistente fachada norte, a "planta do estado atual do Palácio da Justiça de Coimbra com indicação das casas e terrenos a expropriar para a construção do edifício conforme o projeto aprovado", esboçada pelo engenheiro Castelo Branco em Março de 1929, mostrava bem os engulhos e dificuldades da empreitada a levar a cabo.
Ainda sob a direção de Silva Pinto, os espaços interiores foram submetidos a obras de remodelação, particularmente a zona do claustro. No mainel de uma das portas geminadas do claustro superior ficaram gravadas as iniciais JM e a data de 1907, marcas evidentes dos trabalhos lavrados por João Machado (Pai). Datam deste período as obras de elevação do antigo claustro renascentista, em parte soterrado devido às periódicas cheias do Mondego.
Com direção e acompanhamento do arquiteto Silva Pinto, o claustro foi levantado e reconstruído sobre um engenhoso dispositivo de pedraria abobadada, disposto sob os alicerces, a cerca de 15 metros de profundidade. Parte desta estrutura suporte é ainda observável a partir do alçapão detetado nos antigos calabouços da Polícia Judiciária.
…. Falecido o primeiro titular da casa fidalga em 1920, João Correia Aires de Campos … [foram] interrompidas as obras de remodelação, o palecete seria posto à venda. Ficou a memória de um espaço votado ao colecionismo, ao amor pelas artes e literatura. Não mais se animaram os jardins do palacete onde o conde mandara erguer um teatro desmontável cuja plateia conheceu dias de glória.
Nunes, A. A Espada e a Balança. O Palácio da Justiça de Coimbra. Fotografias Varela Pécurto. 2000. Coimbra, Ministério da Justiça,
Terceira entrada dedicada à obra António Nunes, intitulada A Espada e a Balança. O Palácio da Justiça de Coimbra
Vale a pena viajar ao interior dos usos e memórias deste imóvel [Colégio de S. Tomás] cuja traça primitiva remonta ao século XVI.
A edificação do antigo Colégio de São Tomás de Aquino pode considerar-se reflexo da política reformista ensaiada por D. João III. Cogitando sobre a transferência da Universidade de Lisboa para Coimbra, frei Brás de Braga, monge culto e bem informado, conjeturou o traçado da nova Rua de Santa Sofia, ou da Sabedoria, onde seriam alinhados os vários colégios universitários a edificar pelas instituições religiosas e monásticas. A nova rua, de feição renascentista, causou espanto geral, dada a considerável largura e extensão das paralelas que delimitavam o retângulo, alinhado da Praça de Sanção ao Arco de Santa Margarida. El-Rei acompanhou de perto os anteprojetos dos vários edifícios a construir. A norte foram sucessivamente alinhados os colégios de São Pedro, da Graça, do Carmo, de São Bernardo e os blocos do primitivo Real Colégio das Artes. Do lado poente apenas se edificaram os colégios de São Tomás e de São Boaventura.
Planta de Coimbra assinalando a posição dos Colégios edificados a partir do séc. XVI. A letra A corresponde ao Colégio de São Tomás. In António de Vasconcelos. Escritos Vários I. 1987. Estampa XV. Op. cit., pg. 55
Visando acompanhar a reforma régia da Universidade, a Ordem de São Domingos mandou instalar os seus monges estudantes no Convento de São Domingos, sito na margem direita do Mondego. Solução precária, pois a Ordem em breve entendeu mandar construir um Colégio tendo por patrono São Tomás de Aquino, onde estudantes e mestres pudessem descansar longe das ameaçadoras cheias do Mondego.
As obras do novo imóvel terão começado pelo ano de 1549, com risco do apaniguado régio Diogo de Castilho, estando em bom andamento por 1556. O terreno loteado para a construção não estaria ainda urbanizado. Pouco se sabe dos seus usos anteriores, dado que as fundações do Palácio e jardins adjacentes não foram alvo de trabalhos de prospeção arqueológica.
No entanto, durante as obras de restauro e consolidação iniciadas em finais de 1998, descobriram-se fendas na estrutura. Tais fendas seriam provocadas pelo apodrecimento de uma estacaria de pinho, implantada cerca de 15 metros sob os alicerces primitivos. em processo de degradação após o rebaixamento do nível freático do leito do rio e o fim das cheias mondeguinas.
Na gravura assinada por Georg Hoefnagel em 1572 … O autor não menciona o Colégio de São Tomás. sendo de presumir que este se integre no lote de prédios do convento de São Domingos, confinantes com o Campo do Amado.
Da fábrica primitiva apenas resta o claustro renascentista …riscado por Diogo de Castilho no crepúsculo da primeira metade do século XVI. Iniciada a construção por Abril de 1547, ou em 1549 como querem alguns autores, as obras estiveram a cargo dos mestres pedreiros Pero Luís, António Fernandes e João Luís.
Aspeto do claustro térreo em 1928. ATRC. Op. cit., 58
Reintegrado sob direção do arquiteto Silva Pinto, o claustro apresenta planta quadrilátera, com cerca de 18,40 por 18,20 metros.
Observado a olho nu sugere um quadrilátero perfeito, com o eixo central marcado pelo tanque de água, numa possível evocação simbólica do Jardim do Éden e da Fonte da Vida. Cada uma das quatro alas é pontuada por três grupos de arcadas, cindidas por contrafortes paralelepipédicos, salientes na direção do jardim.
O antigo tanque renascentista, marcando o centro do claustro, é um dos raros vestígios do velho colégio. Imagem Varela Pécurto. Op. cit., pg. 18
…. Remontará também ao século XVI o portal da fachada nobre, em arco de volta perfeita, encimada pela estátua do patrono, hoje implantado na fachada lateral do Museu Machado de Castro.
Portal do Colégio de S. Tomás, implantado na fachada lateral do Museu Machado de Castro. Acervo RA
…. Uma fotografia de princípios do século XX confirma que o andar superior da fachada principal foi alvo de remodelação no século XVIII, visível no acrescento dos oito janelões de avental e no varandim de honra que coroava o portal. No piso inferior mantinham-se cinco dos antigos janelões com os lintéis rematados em arco redondo.
Colégio de São Tomás antes de ser transformado em Palacete Ameal. Acervo RA
No corpo direcionado para o demolido Arco de Santa Margarida, o rasgamento do piso inferior espelhava grande assimetria, visível na distribuição das janelas e porta de serviço que dava serventia a uma oficina expropriada amigavelmente em 30 de Novembro de 1929 e adquirida mediante escritura datada de 2 de Dezembro do mesmo ano em conjunto com outros lotes particulares.
À semelhança dos restantes colégios universitários tutelados pelas congregações religiosas, o edifício foi incorporado na Fazenda Nacional, conforme o estipulado no Decreto de 31 de Maio de 1834.
Nunes, A. A Espada e a Balança. O Palácio da Justiça de Coimbra. Fotografias Varela Pécurto. 2000. Coimbra, Ministério da Justiça.
Segunda entrada dedicada à obra António Nunes, intitulada A Espada e a Balança. O Palácio da Justiça de Coimbra.
Dos antigos espaços da justiça, percurso (continuação)
A Câmara Municipal abandonou a Torre logo nos alvores do século XVII. Por 1607 funcionava no Paço dos Tabeliães, à Praça Velha, nas imediações da Misericórdia. Este Paço fora edificado pelos idos de 1532, nele funcionando a Câmara, a Casa dos Vinte e Quatro, dois açougues e as audiências do Juízo dos Órfãos. Os estragos provocados pelo terramoto de 1755 estiveram na base da decisão que trouxe a Câmara novamente à Torre de Almedina, em permuta com o Tribunal. Mas, corria o ano de 1785, a Câmara regressou uma vez mais ao Paço dos Tabeliães, aí permanecendo até ao grande incêndio de 3 de Outubro de 1810, ateado pelos soldados de Massena. A Câmara volta a partilhar os espaços do Tribunal em 1826, vinda do extinto Palácio da Inquisição. Entrado o ano de 1835, os serviços camarários abandonam definitivamente a Torre de Almedina, instalando-se nas dependências do Mosteiro de Santa Cruz, um ano após a expulsão dos cónegos regrantes.
O tribunal é transferido para o Bairro Latino e instalado na igreja-salão do extinto Colégio da Santíssima Trindade. Desafetada do culto, a igreja foi adaptada a Sala de Audiências, servindo de Tribunal até ao ano de 1870. As obras correram por conta do orçamento municipal, conforme estipulava o Código Administrativo em vigor. O povo de Coimbra chamava-lhe o "Tribunal da Trindade".
Colégio da Santíssima Trindade, em cuja igreja-salão funcionou o Tribunal comarcão. Op. cit., pg. 32
Entretanto, a Câmara deliberou mandar erguer condignos Paços do Concelho sobre os escombros do Mosteiro de Santa Cruz. Em 1876 o engenheiro Alexandre da Conceição tinha alinhavado o risco do novo polivalente, destinado a Câmara e Tribunal de Comarca. A empreitada ficou pronta em 1 de agosto de 1879.
Levantam-se algumas dúvidas no sentido de dilucidar se o Tribunal Judicial funcionou nos Paços do Concelho,
Paços do Concelho e Tribunal de Coimbra … O Tribunal ocupou o primeiro piso. Iluminada por sete janelões a Sala de Audiências, ainda hoje visível, tinha planta quadrangular e teto policromado. Imagem Varela Pécurto. Op. Cit., pg. 33
ou um pouco mais atrás, no Salão dos Artistas. Segundo Armando Carneiro da Silva, o Tribunal funcionava no grande salão do antigo Refeitório do Mosteiro, conhecido localmente por Salão dos Artistas, donde transitou em junho de 1933 para o Palácio da Justiça.
O Refeitório do Mosteiro de Santa Cruz, dito Salão dos Artistas, nas traseiras da Câmara, última morada que foi do Tribunal da Comarca antes da sua transferência para o Palácio da Justiça. Imagem Varela Pécurto. Op. cit., pg.33
Porém, testemunhos de pessoas idosas recordam que as audiências realizadas nos alvores dos anos vinte tinham lugar no imóvel camarário, no primeiro piso da ala esquerda (antiga Biblioteca), onde aliás existe uma sala com teto trabalhado, correspondente aos espaços do antigo Tribunal.
A transferência dos Serviços de Justiça para o denominado Salão dos Artistas terá resultado da sobrelotação dos Paços do Concelho.
[Do funcionamento do Tribunal de Coimbra, no rés-do-chão dos Paços do concelho, posso dar o meu testemunho. Comecei a trabalhar na Biblioteca Municipal em finais de 1958, e recordo-me de, logo à entrada, à direita, existir um espaço que poderia ter sido destinado aos serviços de secretaria que, por sua vez, dava acesso a um pequeno gabinete com ligação à Sala de Audiências. Mais me recordo de, em salas utilizadas como arquivo de jornais, existirem centenas de processos judiciais, alguns dos quais ainda tinham apensas as provas do crime, tais como pedras e ferramentas de lavoura. Também se falava entre os funcionários da Biblioteca, que entre essas peças processuais tinham existido armas brancas e de fogo. Rodrigues Costa].
Nunes, A. A Espada e a Balança. O Palácio da Justiça de Coimbra. Fotografias Varela Pécurto. 2000. Coimbra, Ministério da Justiça.
As Conversa Abertas deste ano aproximam-se do seu fim.
De hoje a oito dias, na 6.ª feira dia 30 de maio, às 18h00, o estudioso do assunto Doutor Sérgio Dias Branco, Professor Associado de Estudos Fílmicos da Universidade de Coimbra irá fazer a sua palestra dedicada ao tema O passado e presente do cinema em Coimbra.
Para aqueles que no seu tempo de juventude saltitavam entre o Tetro Avenida, o Tivoli e o Sousa Bastos na procura de realidades e de sonhos, é por certo um tema que lhes interessa.
Fica o convite para participarem, na formato habitual, de hoje a oito dias, às 18h00, no Arquivo da Universidade de Coimbra.
Venham e tragam um ou uma Amigo/a.
Rodrigues Costa
Sexta e última entrada dedicada à divulgação do livro de historiador brasileiro Milton Pedro Dias Pacheco, Do aqueduto, das Fontes e das Pontes.
Estabelecendo a vital ligação entre os dois lados do rio Mondego, a antiga ponte real foi durante séculos a principal entrada em Coimbra, integrando a via terrestre que ligava Lisboa ao Porto – não no trajeto conhecido através das ruas Ferreira Borges e Visconde da Luz –, mas sim através da íngreme Couraça de Lisboa.
Alguns autores defendem a tradição de que as primeiras pontes construídas sobre o Mondego tiveram, tal como no caso do aqueduto citadino, uma origem romana.
Fig. 4. Ponte da cidade de Coimbra (pormenor) | Civitates Orbis Terrarum, vol. V, 1598, pg. 235
Depositada no Museu Nacional Machado de Castro
Ponte Manuelina e vista de Santa Clara. 1860. Acervo RA
Entretanto, iniciada a formação do Reino de Portugal, consta que D. Afonso Henriques … mandara reconstruir a ponte no ano de 1132, seguida dos arranjos planeados por D. Sancho I, em 1210, e pelos seus sucessores ao longo de toda a Baixa Idade Média.
Estas sucessivas reconstruções ficar-se-iam a dever, sobretudo, devido aos danos provocados pela força das correntes, como se verifica numa carta enviada por D. João II ao conselho da cidade: “a ponte dessa cidade está muito danificada das cheias passadas e em mui grande perigo”
Com efeito, os autores mais fidedignos apontam para uma intervenção sabiamente estruturada durante o reinado de D. Manuel I, nos alvores do século XVI. Segundo o que as fontes documentais apontam, o monarca … ordenara aos mestres Boytac e Mateus, em Setembro de 1510, de promoverem os estudos necessários para o “corregimento da ponte” campanha seria efetivamente concluída nos três anos seguintes, pois, em 1513, a ponte estava aberta ao tráfego.
A estrutura ficava assim a dispor de vinte e quatro arcos, executados em pedra, provavelmente em calcário dolomítico da cidade, inclusive as guardas laterais, que na seção correspondente ao oitavo arco eram encimadas em cada um dos flancos pelas esferas armilares do monarca reinante. No extremo sul, já próximo da margem de Santa Clara, parte do troço da ponte fora alargado, com acessos a jusante e a montante, como se vê ainda nalgumas das gravuras antigas dedicadas a Coimbra.
A extremidade norte era rematada por um torreão-peagem, quadrangular, destinado à aplicação das taxas e impostos sobre quem entrava na cidade. No frontispício principal, sobre o arco de entrada, fora colocada uma lápide brasonada ladeada das esferas armilares, retirada para o Museu do Instituto de Coimbra e hoje depositada no Museu Nacional de Machado de Castro … sobre o referido padrão estaria a representação escultórica com a Virgem Maria, segurando Cristo Menino, que se encontra igualmente no principal museu da cidade, provavelmente ambos da autoria de Diogo Pires o Moço.
…. D. Filipe I de Portugal determinava, por carta régia, o lançamento da finta para se proceder à reconstrução da dita ponte e das margens envolventes onde aquela assentava. Muito provavelmente, as obras não teriam sido logo executadas, pois na correspondência epistolar trocada com o arcebispo de Braga, em 1586, o monarca salientara os estragos provocados pelos “grandes invernos do anno passado”.
A ponte quinhentista, reformada pela última vez naquela centúria pelo arquiteto régio Fillipo Terzi, teria outras obras de consolidação até ser substituída por uma nova em Maio de 1875, não devido ao assoreamento do leito do rio, mas sim às necessidades de permitir, com maior segurança, a passagem do trânsito rodoviário.
Setenta e nove anos depois, a estrutura de ferro assente em pilares de alvenaria ...
Ponte de ferro (finais dos anos 30). Acervo RA
... deu lugar à atual ponte, uma estrutura de betão armado, dotada de tabuleiro plano e assente em cinco pilares pendulares, com talha-mares elípticos … Erguida em local próximo da anterior, a nova ponte, desenhada pelo arquiteto Peres Fernandes.
Ponte de Betão, em construção
Pontes de Ferro e de Betão
Ponte de Santa Clara. Inaugurada em 1954
Curiosamente, em 1950, durante as sondagens geológicas realizadas no seguimento dos estudos de engenharia, seriam encontrados, a 14 metros de profundidade, nas proximidades da margem de Santa Clara, vestígios de uma escada executada em cantaria. Pertenceriam estes achados arqueológicos à ponte real manuelina como sugeriram os engenheiros responsáveis pela última obra?
Pacheco, M. P.D. Do aqueduto, das Fontes e das Pontes: a Arquitetura da Água na Coimbra de Quinhentos. In: História Revista. Revista da Faculdade de História e do Programa de Pós-graduação em História, v. 18, n. 2, p. 217-245, jul. / dez. 2013. Goiânia (Br.). Acedido em:
É já na próxima 6.ª feira, pelas 18h00 que voltam a acontecer as Conversas Abertas.
Desta vez o tema é: Assistência Social às Crianças e Adultos Pobres em Coimbra, dos séculos XVIII e XIX.
A palestrante é a Doutora Maria Antónia Lopes que tem como primeiras áreas de interesse e investigação, a História da Pobreza e políticas sociais e a História das Misericórdias.
Como é habitual as Conversas Abertas decorrem na Sala D. João III, do Arquivo da Universidade de Coimbra.
A entrada é livre e após a apresentação do tema segue-se um período destinado às intervenções de quem participa.
Rodrigues Costa
A Doutora Maria Antónia Lopes, tem dedicado boa arte do seu trabalho de investigação ao estudo das Misericórdias em geral e da Misericórdia de Coimbra, em particular. Através desta entrada divulgamos um dos seus trabalhos, este intitulado A fundação da Misericórdia de Coimbra: condições e circunstâncias, do qual salientamos as seguintes passagens.
A fundação de misericórdias por todo o reino inseriu-se num “esforço da Coroa em organizar a assistência”. Trata-se, pois, de uma ação política.
…. O desejo do rei foi cumprido em Coimbra. Em carta de 12 de setembro de 1500, dirigida ao “juis, e vereadores, provedores e homens bons” de Coimbra, D. Manuel I congratula-se por terem já ordenado uma “Confraría da Misericordia” e, como pediam, concede-lhes por alvará do mesmo dia todos os privilégios outorgados à Misericórdia de Lisboa. A Misericórdia de Coimbra estava ereta. …. A Misericórdia de Coimbra foi, portanto, constituída, como quase todas, graças à devoção, à boa-vontade e aos interesses próprios de todos os envolvidos, entre os quais avultavam os das elites locais. De facto, ingressando numa Misericórdia conseguia-se ou patenteava-se prestígio pessoal e adquiriam-se privilégios civis e indulgências; mais tarde, com o seu enriquecimento, acesso fácil ao mercado de capitais ou ao arrendamento ou aforamento de terras, entre outras vantagens, não sendo a menor ser-se associado à imagem de personagem exemplar.
…. Em 1500, Coimbra ainda estava longe de atingir a dimensão e importância que viria a ter com a instalação definitiva da Universidade em 1537. Mas Coimbra era, como sempre fora, um importante ponto de passagem e de cruzamento de pessoas, bens e ideias, tanto no sentido Sul-Norte/Norte-Sul como na ligação entre o interior e o mar, em estrada rasgada pelo Mondego. Nesse último ano do século XV, a cidade de Coimbra albergava cinco a seis mil habitantes, sobretudo no Arrabalde (a Baixa), com a Almedina (a Alta) parcialmente em ruínas e rarefeita de população. O centro vital de Coimbra era, pois, a parte baixa, polarizada pelo mosteiro de Santa Cruz, que limitava a cidade a Norte, pois que a Rua da Sofia estava ainda por nascer, mas também com poder e força vital na sua bela Praça, rematada nos dois extremos pelas igrejas de S. Tiago a Norte e S. Bartolomeu a Sul (em edifício anterior ao atual). A colina era encimada pelos Paços Reais, mas, sem rei que os habitasse, nela pontificava o bispo e o cabido, na sua catedral fortaleza a meia encosta.
É a esta cidade, longe ainda de ocupar o terceiro lugar em honra e dimensão, que no fim do verão de 1500 chega o diploma consagrando legalmente a sua Misericórdia, após a fundação das de Lisboa, Lagos, Portel, Tavira, Évora, Montemor-o-Novo, Porto, Setúbal e, talvez, Santarém.
Muito provavelmente, nessa altura a Misericórdia estaria já a funcionar, mesmo que de forma incipiente, pelo menos há alguns meses, o que pode fazer remontar a sua fundação a 1499 ou inícios de 1500. E como tantas outras, nos seus primórdios, sobrava-lhe em ambição – e que ambição!, praticar a totalidade das obras de misericórdia entre toda a população carenciada da urbe – o que lhe faltava em recursos. Por isso os “principais” de Coimbra quiseram desde logo anexar as instituições existentes com as suas rendas, o que desagradou ao rei, que lhas nega perentoriamente.
…. Nascera, pois, a Misericórdia de Coimbra, cumprindo todos os requisitos legais, a 12 de setembro de 1500, mas ainda pobre, sem sede própria … escreve o autor anónimo do texto “Instituição da Misericordia de Coimbra, e Cathalogo dos Provedores, e Escrivaens, que até ao presente nella tem servido”, que acompanha o compromisso de 1620, na sua edição de 1747: “He tradicçaõ vulgar nesta Cidade, que primeyro se assentou esta Confraria na Sé della, dahi se passou para a Igreja de Santiago na casa que hoje serve de celeyro, aonde se diziaó as Missas, e mais obrigaçoens da Casa e se chamava a Capella da Misericordia”.
… Aprovou-se então, em 1546, um projeto absolutamente radical: erigir o templo da Misericórdia sobre a igreja S. Tiago. Construir uma igreja assente no teto de outra!, eis a solução encontrada pelos Irmãos, que não queriam abandonar o coração da cidade. E assim surgiu um santuário originalíssimo.
Igreja de S. Tiago. Acervo RA
Igreja da Misericórdia, entrada. In: Boletim da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, n.º 28
Aproveitando-se o desnível entre a Praça e os arruamentos orientais, virava a nova igreja da Misericórdia para a Rua de Coruche (atual Visconde da Luz), com porta encimada por belo frontão de João de Ruão, representando a Senhora do Manto ou Senhora da Misericórdia, a que se acedia por escadório. Mas a Misericórdia precisava de outros espaços: casa do despacho, cartório, armazéns, etc. Em 1589 ainda se iniciaram essas obras na Rua do Corpo de Deus, mas por dificuldades várias desistiu-se do projeto. Em 1605 aprovou-se a construção dessas dependências adossadas à igreja, sobre outra nave de S. Tiago. Cerca de cem anos depois, acrescentaram-se com a edificação do Recolhimento das Órfãs, já assente em terra e alinhando pela Rua de Coruche, e outro século volvido, instalava-se nas lojas desse imóvel a botica da Santa Casa.
O templo quinhentista da Misericórdia já não existe: inicialmente mutilado, tal como a cabeceira da igreja de S. Tiago e outros edifícios da Rua de Coruche quando esta foi alargada em meados do século XIX, veio a ser completamente destruído, em inícios do século XX.
Igreja de S. Tiago e da Misericórdia, restauro. In: Illustração Portuguesa.
…. A Misericórdia pontificou, pois, e durante trezentos anos, na Baixa coimbrã: com entrada pela Rua de Coruche, vizinha ao mosteiro de Santa Cruz, mas virando também para a Praça da Cidade, que dominava da sua altura, governou-se pelo estipulado no Compromisso de 1500.
Lopes, M. A. A fundação da Misericórdia de Coimbra: condições e circunstâncias” in Lopes, Maria Antónia (coord.), Livro de todallas liberdades da Sancta Confraria da Misericórdia da cidade de Coimbra. Estudos, facsimile e transcrição. Coordenação de Maria Antónia Lopes. 2016. Coimbra, Santa Casa da Misericórdia de Coimbra, pp. 9-16.
Nesta entrada do blogue “A’Cerca de Coimbra” vamos relembrar um texto escrito por Sousa Viterbo em finais do século XIX, na Revista Archeologica onde se refere à história das grades que, no passado, separavam, na igreja de Santa Cruz, a zona do falso transepto [cruzeiro] ocupada pelos Cónegos Regrantes, do espaço destinado aos fiéis.
Imagem onde se podem ainda vislumbrar as grades. Acervo RA
Revista Archeologica. Imagem acedida em: https://archive.org/details/revistaarchaeolo03lisb/page/n5/mode/2up
Sousa Viterbo. Imagem acedida em: https://www.bing.com/images/search?view=Francisco-Marques-de-Sousa-Viterbo.png&cdnurl …
Deste interessante texto, respigamos o que segue.
Dignas de rivalizar com alguns destes trabalhos artísticos, de que se ufanam as catedrais espanholas,
Baeza. Reja del presbitério. In: Navascués Palacio, Pedro, Sarthou Carreres, Carlos.Catedrales de España, Madrid. Espasa-Calpe, 51984, pg. 43.
seriam porventura as grades monumentais, que, no venerando templo de Santa Cruz, separavam o cruzeiro do restante da igreja e as que vedavam os túmulos dos reis. Hoje já não as podemos contemplar, mas sabemos da sua existência por alguns documentos e referencias históricas, que mais ou menos diretamente lhes dizem respeito.
Citaremos em primeiro lugar o trecho de uma carta de 19 de março de 1522, em que Gregório Lourenço dá conta a D. João III do estado em que se achavam as obras que o seu antecessor, D. Manuel, mandara fazer no templo de Santa Cruz. Um dos itens da carta é do teor seguinte: «Item Senhor, mandou que fezessem huua grade de ferro grande que atravessa o corpo da egreja de xxv palmos d'alto com seu coroamento, e ao rredor das sepulturas dos rreix a cada hua sua grade de ferro, segundo forma dhum contrato e mostra que pera ysso se fez. Estam estas grades feitas e asentadas, e pago tudo o que montou na obra dos pillares e barras das ditas grades porque disto avia daver pagamento a rrazom de dous mill reis por quintal asy como fosse entregando ha obra. E do coroamento das ditas grades que lhe ade ser pago per avalliaçam nom tem rrecebidos mais de cinquoenta mill reis, que ouve dante mão quando começou a obra, que lhe am de ser descontados no fim de toda hobra segundo mais compridamenle vay em huua certidam que antonio fernandes mestre da dita obra diso levou pera amostrar a V. A. E nom se pode saber o que desta obra he devido atee o dito coroamento destas grades ser avalliado».
O trecho da carta de Gregório Lourenço é parcamente descritivo, mas, apesar disso, muito agradecido lhe devemos ficar por ter salvado, ainda que involuntariamente, o nome do artista que fabricou a obra, António Fernandes.
Como se sabe, D. Francisco de Mendanha, prior do mosteiro de S. Vicente de Lisboa (1540), escreveu uma descrição em italiano do templo de Santa Cruz, a qual D. João III ordenou se traduzisse em português, sendo impressa nos prelos deste último convento. De tão curioso opusculo cremos que não se conhece hoje nenhum exemplar, mas D. Nicolau de Santa Maria perpetuou-o, incluindo-o na sua «Chronica», prestando assim um serviço, literário e artístico, bastante apreciável. Mendanha não se esquece de falar das grades e dedica-lhe as seguintes linhas:
«Além d'este pulpito espaço de 20 palmos contra a Capella mór está a grande e vetusta grade de ferro, que atravessa toda a Egreja, ficando dentro o Cruzeiro, e tem de alto trinta palmos».
O epiteto vetusta sintetiza, para assim dizer, em toda a sua singeleza, a formosura da grade. Entre Mendanha e Gregorio Lourenço há, todavia, uma discrepância no que respeita às dimensões; Mendanha dá a grade 5 palmos mais alta. Outra diferença notamos ainda. O prior de S. Vicente diz que as grades dos túmulos eram de cinco palmos de alto, todas de pau preto e bronzeadas com ouro: Gregório Lourenço claramente especifica que eram de ferro. Coelho Gasco { classifica de sumptuosas as grades do cruzeiro e accrescenta que n'ellas havia um epitáfio, ou antes letreiro, latino, em letras de ouro, que rezava da seguinte forma: Hoc templum ab Alphonso Portuqaliae primo rege instructum ac tempore pene collapsum, Regno succesore &: actore Emmanuele restauraoerit. Anno Natalis Domini MDXX.»
Esta data 1520 refere-se por certo á época em que foi assentada a grade e colocado o seu despectivo letreiro. A igreja já estava reconstruída, como, além de outros documentos, o demonstra o epitáfio do bispo D. Pedro. falecido a 13 d'agosto de 1516.
No priorado de D. Acúrcio de Santo Agostinho (eleito em princípios de maio de 1590) as grades foram pintadas e douradas de novo. Diz o cronista «… e porque as grades de ferro do cruzeiro e capellas da mesma igreja estavão pouco lustrosas, as mandou alimpar, pintar e dourar em partes e particularmente mandou dourar as armas reaes e folhagens, em que as ditas grades se rematão e tem as do Cruzeiro trinta palmos de alto e as das capellas quinze tambem de alto, e ficarão depois de pintadas e douradas muy aprazíveis á vista».
Não sabemos até que época durassem as grades de Santa Cruz.
Das que circundavam os sepulcros temos informação de 1620. Ou haviam chegado a extrema ruína ou foram substituídas ineptamente por outras. Referindo-se ao governo de D. Miguel de Santo Agostinho, que foi eleito pela segunda vez em 30 de abril de 1618, escreve o cronista da ordem: «Nos ultimos mezes do seu triennio ornou o P. Prior geral as sepulturas dos primeiros Reys deste Reyno, que estão na capella mór de S. Cruz com grandes grades de pao santo, marchetadas de bronze dourado.»
Ao que ficou descrito acrescento que, tanto quanto julgo lembrar-me, ainda vi junto dos túmulos reias umas grades destinadas a impedir os visitantes de se acercarem. Contudo, já não me recordo das suas caraterísticas. Se algum leitor estiver na posse de qualquer informação sobre este assunto seria interessante que a transmitisse.
Viterbo, F.M.S. V. As grades de S. Cruz-Cruz de Coimbra. In: Revista Archeologica, II, n.º 4. Abril 1888. Texto acedido em:
No próximo dia 31 de Janeiro, às 18h00, na sala D. João III, as Conversas Abertas retomam o caminho iniciado em 2019, na então designada Casa da Escrita, numa iniciativa do blogue A´Cerca de Coimbra.
Vicissitudes várias, incluindo a crise do COVID, impuseram uma interrupção após a qual, em 2022, veio a ser acolhida pelo Arquivo da Universidade de Coimbra. Entidade que, desde o ano passado, assume o todo da sua organização, mantendo o esquema inicial:
. Decorrem no última sexta-feira dos primeiros seis meses de cada ano, às 18h00, na sala D. João III, do Arquivo da Universidade de Coimbra;
. Após a intervenção do tema pelo palestrante, segue-se um período aberto à livre participação dos assistentes.
Os seguidores desta iniciativa – aberta a quantos amam e se preocupam com Coimbra – podem tomar conhecimento do programa para o ano em curso na imagem que se divulga da folha de sala que irá ser distribuída no próximo dia 31.
Esperamos por todos.
Rodrigues Costa
Completamos a recolha de informações sobre a igreja de S. Cristóvão com excertos de um trabalho realizado por Sérgio Madeira e Maria Antónia Lucas da Silva, intitulado Vestígios arqueológicos na Alta de Coimbra: Redescobrir a igreja de S. Cristóvão.
Trata-se do relatório do acompanhamento arqueológico da remodelação do edifício da Rua Joaquim António de Aguiar, n.os 26 e 28, contíguo ao que resta do Teatro de Sousa Bastos, resultante da obrigatoriedade de este se situar numa área a que o Plano Diretor Municipal vigente atribui o Grau de Proteção 1 (grau máximo de proteção no que diz respeito ao património histórico e arqueológico).
Desse documento, destacamos:
Através da picagem de rebocos e arranque de taipas, para além de aparelhos construtivos pobres, de pedra e argamassa, ficou a descoberto, no interior do edifício, a partir do 1º piso, um cunhal composto por pedras de grandes dimensões. Comparando a localização destes vestígios com a planta da antiga Igreja de S. Cristóvão poder-se-á concluir que tais vestígios poderão pertencer à parede de um anexo do lado norte da igreja, talvez no espaço que outrora abrangeu «uma casa annexa de religiosos da regra de Santo Agostinho».
O prolongamento vertical do cunhal revela a existência de, pelo menos, dois níveis de alteamento, visíveis sobretudo no 3º piso e, muito provavelmente, relacionados com a construção e adossamento do imóvel (séculos XVIII/XIX) e o posterior alteamento desse mesmo piso (eventualmente após a destruição da igreja no século XIX).
Remoção de argamassas inerentes ao projeto de empreitada e aspeto do cunhal em evidência. Op. cit., sem numeração.
A referência mais antiga à Igreja de São Cristóvão remonta ao século XII, altura em que foi construída à semelhança da Sé Velha no seu estilo e disposição, ainda que de mais reduzidas dimensões. Sob a tutela de um grupo de Religiosos Agostinhos vindos de França este foi, assim, um dos templos mais antigos de Coimbra, sendo que se idealiza a hipótese de ter sido edificado sobre um outro templo religioso mais antigo, fundamentando-se essa teoria em vestígios de ossadas com cronologia anterior à construção da igreja românica, descobertas em escavações na década de 90 do século passado. Na planta da Igreja de S. Cristóvão (1859) pode observar-se a representação de uma cripta que poderá corresponder ainda ao vestígio dessa pré-existência.
O edifício medieval manteve-se ao longo dos séculos quase sem alterações estruturais, à exceção de algumas obras no 2º quartel do século XVIII, das quais constam um alongamento lateral a Norte no terceiro e quarto tramos e a abertura de cinco novas frestas.
Sobreposição da Planta do 1º piso dos números 26-28 da Rua Joaquim António de Aguiar e da Planta da Antiga Igreja de São Cristóvão. Op. cit., sem numeração.
No entanto, em meados do século XIX, a igreja encontrava-se muito arruinada e desprovida da importância que havia tido em tempos anteriores. Após várias ponderações, acabou por se avançar em 1859 com o desmonte integral da igreja, com vista à construção do Teatro D. Luís, inaugurado a 22 de Dezembro de 1861. A leitura da planta do teatro permite verificar que manteve grosso modo a implantação da igreja destruída, com alargamentos que resultaram na eliminação da rua e consequente adossamento da fachada sul às construções existentes e na redução da rua a nascente. Em resultado de falta de obras de manutenção e da apressada demolição da igreja, este novo edifício irá cair também em ruína e acabará por sofrer outras alterações arquitetónicas importantes na sua adaptação a cinema em meados do século XX para dar origem ao Cine-Teatro Sousa Bastos em 15 de Junho de 1914, em homenagem ao empresário ligado ao mundo do teatro.
Após uma vida de vários momentos de notoriedade o Cine-Teatro Sousa Bastos entrou num declínio que culminou com o seu fecho em 1978, ficando o edifício votado ao abandono até aos dias de hoje, encontrando-se a edificação totalmente devoluta e com sinais evidentes de degradação.
Estado atual do edifício do extinto Teatro Sousa Bastos, na sua maioria desprovido de cobertura e de miolo e fachadas com janelas partidas, rebocos soltos, vegetação nos beirados. Op. cit., sem numeração.
Por entre todas as alterações que o espaço sofreu ao longo de quase mil anos de História, o cunhal posto em evidência aquando da recuperação do imóvel sito nos números 26-28 da Rua Joaquim António de Aguiar mantém-se como vestígio dessa Igreja cuja imponência se pode agora reconstituir e que, a seu tempo, foi sede de paróquia e de freguesia e onde nas ruas que dela radiavam, agora camufladas pela atual malha urbana, múltiplos mesteres e respetivas confrarias se fixaram, numa importante dinâmica económico-social.
Considerando o seu potencial patrimonial e estético, propôs-se como medida de minimização e salvaguarda que o cunhal fosse mantido a descoberto e integrado no projeto de remodelação do imóvel em apreço.
Madeira, S. e Silva, M. A. L. Vestígios arqueológicos na Alta de Coimbra: Redescobrir a igreja de S. Cristóvão. Texto acedido em file:///C:/Users/Fernando/Desktop/Rel%C3%ADquias%20da%20Arquitectura%20Romano/Vestigios%20arquel%C3%B3gicos%20...%20-Igreja-de-S.-Cristovao.pdf
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