Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
A caminho de um Organismo Autónomo de Futebol para o século XXI
A 12 de janeiro de 1990, Fernando Mendes Silva toma posse como presidente da Direção da Associação Académica de Coimbra / Organismo Autónomo de Futebol (AAC/OAF), após ter sido eleito para exercer um mandato válido para o biénio de 1990/91.
Primeiro emblema da Académica (1926-28). Acedido em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Associa%C3%A7%C3%A3o_Acad%C3%A9mica_de_Coimbra_%E2%80%93_Organismo_Aut%C3%B3nomo_de_Futebol
Emblema (1928-1974). Acedido em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Associa%C3%A7%C3%A3o_Acad%C3%A9mica_de_Coimbra_%E2%80%93_Organismo_Aut%C3%B3nomo_de_Futebol
Primeiro emblema enquanto CAC (1974-1977). Acedido em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Associa%C3%A7%C3%A3o_Acad%C3%A9mica_de_Coimbra_%E2%80%93_Organismo_Aut%C3%B3nomo_de_Futebol
Emblema (1977-1979). Acedido em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Associa%C3%A7%C3%A3o_Acad%C3%A9mica_de_Coimbra_%E2%80%93_Organismo_Aut%C3%B3nomo_de_Futebol
Emblema (1979-1980). Acedido em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Associa%C3%A7%C3%A3o_Acad%C3%A9mica_de_Coimbra_%E2%80%93_Organismo_Aut%C3%B3nomo_de_Futebol
Emblema (1980-1982). Acedido em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Associa%C3%A7%C3%A3o_Acad%C3%A9mica_de_Coimbra_%E2%80%93_Organismo_Aut%C3%B3nomo_de_Futebol
Último emblema enquanto CAC (1982-1984). Acedido em:https://pt.wikipedia.org/wiki/Associa%C3%A7%C3%A3o_Acad%C3%A9mica_de_Coimbra_%E2%80%93_Organismo_Aut%C3%B3nomo_de_Futebol
Emblema, após 1984 e até ao presente. Acedido em https://pt.wikipedia.org/wiki/Associa%C3%A7%C3%A3o_Acad%C3%A9mica_de_Coimbra_%E2%80%93_Organismo_Aut%C3%B3nomo_de_Futebol
E voltaria a ser reeleito e reempossado a 31 de janeiro de 1992 para cumprir um segundo mandato, o qual foi interrompido, abruptamente, com o seu falecimento em desastre automóvel ocorrido a 31 de maio de 1992. A grandeza e a afirmação do seu carácter, enquanto cidadão e dirigente desportivo, ficaram então uma vez mais comprovados, pelo facto de Fernando Mendes Silva se ter candidatado pela primeira vez à presidência da AAC/OAF, numa conjuntura particularmente adversa, em termos desportivos e financeiros, uma vez que a Académica disputava o campeonato da então designada 2.ª Divisão – Zona Centro. É preciso ter presente também que no final da época de 1987/1988 a equipa havia sido despromovida àquele escalão, despromoção essa que, por sua vez, desencadeou o início de uma longa disputa nos órgãos de justiça da Federação Portuguesa de Futebol, a qual transitaria mais tarde para os tribunais comuns, e tudo em torno do famigerado “caso N'Dinga”. Nesta altura da vida pública democrática, ocorre perguntar para quando é que as decisões dos órgãos de justiça desportivos ficarão subordinadas às leis da República? Seja como for, o facto é que os enormes prejuízos financeiros – avultadas quebras na angariação de patrocínios e consequente continuação de cumprimento das obrigações fiscais, vencimentos em atraso dos técnicos da formação, etc. – e desportivos, que resultaram da descida de divisão traduziram-se numa situação calamitosa para as direções do OAF, cujo mandato diretivo decorreu ao longo dos anos noventa.
Portanto, foi numa conjuntura de enormes dificuldades na vida desportiva do OAF e, consequentemente, num momento pouco propício para a afirmação do arrivismo no dirigismo – potenciado e propiciado, por sua vez, pelo nepotismo, pela corrupção, tráfico de influências e pelo oportunismo mediático que predominam em torno das estruturas e do jornalismo do futebol português – que Mendes Silva decidiu candidatar-se à presidência do futebol profissional da Académica. O que significava ter a consciência clara de que não colheria os efeitos diretos das “luzes da ribalta” propiciados pelos programas televisivos direcionados e pela imprensa especializada no futebol praticado por três clubes – dois de Lisboa e um do Porto e segundo esta rigorosa proporção de ocupação e de difusão do tempo comunicacional – que disputam o campeonato principal do futebol português, ordem comunicacional que, no essencial, foi herdada do Estado Novo para cumprir o seu papel de “nacionalização das massas” agora em contexto democrático. Com efeito, é possível constatar que trinta e três anos decorridos sobre o 25 de Abril de 1974 e da instauração de um Estado de Direito democrático, a organização e a colonização do espaço público comunicacional futebolístico em Portugal, continua a ignorar o sentido mais profundo da reflexão ensaística sobre a cultura desportiva que Sílvio Lima iniciou e empreendeu durante a década de trinta do século passado, ou seja, durante os “tempos sombrios” – para utilizar a conhecida expressão de um livro de Hannah Arendt – do Estado Novo, segundo a qual: “O desporto constitui uma escola (ou ginásio) permanente de sã democracia.” Vivemos hoje num contexto social e mediático, onde o espaço público comunicacional é uniformizado e domesticado, segundo uma lógica ditatorial e um discurso que transmitem, subliminarmente, um clima de guerrilha protagonizada, ao nível do “espetáculo” futebolístico nacional, pelos denominados “Três Grandes”. Esta última expressão é, por sua vez, o testemunho mais acabado de uma cultura desportiva periférica – assente numa lógica provinciana – patente na forma passiva como a massa dos “adeptos” e dos “comentadores”, cirurgicamente selecionados, assistem e comentam o “espetáculo” do futebol, uma vez que, normalmente, todos eles possuem um traço comum entre si, a saber: o de não terem qualquer passado relevante como atletas e tão pouco serem praticantes de desporto. A este propósito, poderíamos adaptar a reflexão de Fernando Pessoa ao campo da cultura desportiva em Portugal e constatar que o provincianismo que a caracteriza em linhas gerais não é um problema geográfico, mas sim uma pretensa atitude mental de incapacidade de organização democrática da sociedade portuguesa, no sentido de se “pertencer a uma civilização sem tomar parte no desenvolvimento superior dela – em segui-la pois mimeticamente, com uma subordinação consciente e feliz” (cf. O Provincianismo Português, in Fernando Pessoa – Páginas de Doutrina Estética. Lisboa: Inquérito, [s. d.], p. 137). Este é o resultado de vivermos num país e numa sociedade, cuja história é em geral, pontuada e marcada pela inexistência de uma política de cidades e, consequentemente, pelos baixos níveis de cultura e de consciência urbana cidadãs. Em consequência, acumula-se um enorme défice coletivo em termos da vivência efetiva da cidadania participativa, na qual a relação com o corpo no espaço urbano passaria pela promoção e vivência de uma cultura ativa no confronto com a diferença, esclarecida e responsável, de promoção de hábitos e da prática desportiva no quotidiano. A este propósito, a Direção presidida por Mendes Silva, conhecedora das manobras de “bastidores” típicas do “espetáculo” do futebol e dos poderes fácticos instalados na sociedade portuguesa, tomou uma posição ética e desportivamente irrepreensível perante o alastrar do fenómeno do nepotismo e da corrupção endémicas nas estruturas federativas do futebol no início dos anos 90, a propósito do balanço desportivo de uma época em que a Académica tinha obtido o 6.º lugar como classificação final, tendo afirmado Mendes Silva: “A influência dos 'bastidores' (árbitros, aliciantes pecuniários a adversários, etc.) foi uma área onde indiscutivelmente o OAF saiu prejudicado. Não tem o nosso clube qualquer interesse em enveredar por este caminho.” (in Reunião dia 13.05.1991, Actas da Direcção da AAC/OAF). Neste sentido, se compreende também o seu empenhamento pessoal na procura de uma solução associativa alternativa e nova para o futebol profissional em Portugal, facto que levaria Mendes Silva a integrar o grupo restrito de dirigentes desportivos que estiveram nas reuniões preparatórias e fundadoras da Liga de Futebol Profissional Português (LPFF), procurando promover os interesses superiores do desporto em Portugal e da Académica em particular, e sobretudo encontrar uma alternativa à ditadura da “ordem vigente” (cf. www.lpfp.pt/default.aspx?CpContentId=285919). A criação da Divisão de Honra contou então com todo o seu empenho e entusiasmo associativos.
Grandeza de carácter como dirigente desportivo em prol da Académica que já tinha ficado evidenciada, por sua vez, pela sua discrição e generosidade, em outros momentos críticos e particularmente difíceis para a existência do futebol profissional praticado ao mais alto nível em Coimbra. É que, em 1976, Mendes Silva estivera disponível para integrar o grupo de cento e quatro notáveis cidadãos – damos à palavra notável, uma vez mais, o sentido sociológico que Max Weber deu ao termo – que constituiu a PROCAC, uma sociedade anónima fundada com o objetivo específico de comprar o edifício n.º 37, na Rua Alexandre Herculano, aos Arcos do Jardim. Edifício que está hoje classificado como sendo de interesse municipal. Uma vez adquirido o edifício, este foi cedido a título gracioso para nele instalar o então novo Clube Académico de Coimbra (CAC), para que este pudesse disputar o principal campeonato do futebol português.
Sede do Clube Académico de Coimbra, aos Arcos do Jardim. Acervo RA
E mais tarde, também foi Mendes Silva que, no ano de 1978, vendeu ainda ao CAC, e por uma quantia quase simbólica, a maior das três parcelas de terreno para que esta agremiação pudesse vir a construir o Pavilhão Gimnodesportivo Jorge Anjinho, edificado na Solum,
Pavilhão Gimnodesportivo Jorge Anjinho, em parte construído em terrenos vendidos a preço simbólico pela SOLUM. Acervo Carlos Ferrão.
Pavilhão Gimnodesportivo Jorge Anjinho. Inauguração, com o patrono a hastear a bandeira do Clube. Acervo Carlos Ferrão
o qual integra hoje o património da AAC/OAF, e cujas instalações desportivas têm a finalidade social de servir “além dos sócios do Clube a comunidade em geral” (Cf. Escritura de Compra e Venda, fls.4).
Jorge Manuel Pais de Sousa. Cidade e Académica, em Fernando Luís Mendes Silva. Ensaio sobre um perfil de um dirigente desportivo. Texto inédito preparado para as comemorações dos 120 anos da AAC.
Perfaz-se hoje, dia 28 de agosto, 23 anos sobre a partida do Eng.º Jorge Anjinho, uma das personalidades que marcou, indelevelmente, a cidade de Coimbra na segunda metade do século XX.
Jorge Manuel Serrano Anjinho nasceu em Estremoz, mas, apesar disso, acabou por se tornar, por adoção, um verdadeiro conimbricense.
Frequentou os preparatórios de Engenharia na Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, embora, por razões óbvias, tivesse de ir concluir a licenciatura na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.
Jorge Anjinho, estudante de Coimbra
Contudo, ao partir para a antiga Portus Cale, já levava consigo a marca inapagável da cidade do Mondego e, conjuntamente com outros colegas idos de Coimbra, fundou, em 1959, e foi “Mor”, a "Real República dos LyS.O.S", sediada num prédio atualmente desaparecido da Praça de Mouzinho de Albuquerque. A “República”, inicialmente marcada por uma intensa atividade cultural e política, presentemente é quase desconhecida.
Jorge Anjinho, após a licenciatura, concluída no ano de 1963, cumpriu o Serviço Militar no SFOM (Serviço de Fortificações e Obras Militares), primeiro no Continente, nos Açores e, por fim, na Guiné (Bissau), onde permaneceu durante cerca de 4 anos. Ao longo deste tempo aplicou os seus conhecimentos técnicos em obras de índole estritamente militar que passaram pela construção de edifícios, pela abertura de estradas, pela construção de pontes, etc.
Jorge e Maria da Luz Anjinho
Quando, em finais de 1966, regressou a Coimbra, os Serviços Municipalizados contrataram-no e, então, exerceu o cargo de Diretor de Obras.
No desempenho desta função assumiu-se como primeiro responsável pela construção da Estação de Tratamento de Águas da Boavista, pela adaptação de uma zona das bancadas do antigo Estádio Municipal (Estádio do Calhabé) a Centro Ordenador Municipal da Câmara Municipal de Coimbra, entidade, ao tempo, responsável pelo processamento da faturação de água, contabilidade e vencimentos dos serviços municipalizados (atual AIRC), pela construção da central de transportes localizada na Guarda Inglesa, pela construção das torres de iluminação do Estádio Municipal de Coimbra e por muitas outras obras de menor dimensão.
Depois de, em 1970, abandonar a função pública e passar a exercer a sua atividade como profissional liberal, criou, em parceria com um outro colega um gabinete técnico de projetos que, oito anos depois, se constitui como sociedade, com a designação de “Eugénio Cunha e Jorge Anjinho, Lda".
A sociedade manteve-se até ao ano de 1984, data em que Anjinho adquiriu a participação que Eugénio Cunha detinha na empresa; esta, a partir de então, foi redenominada de "Jorge Anjinho, Lda. - Estudos e Projectos", tendo o seu responsável participado ativamente como elemento da gerência, tanto no plano técnico, como no comercial-administrativo.
Jorge Anjinho, durante os anos de vigência da sociedade “Eugénio Cunha e Jorge Anjinho, Lda", criou e administrou, em Antuzede, a fábrica Betex (blocos de leca, abobadilhas e elementos pré-fabricados) e em Albergaria-aVelha, a fábrica Pavileca (blocos de leca, abobadilhas e elementos pré-esforçados). Simultaneamente, no Porto, participou na administração da fábrica Patial (elementos pré-esforçados).
Posteriormente, desempenhou o cargo de sócio gerente da firma Setobra - Construções do Centro, Lda e, em 1998, fundou e presidiu ao Conselho de administração da Luzfisa, Sociedade Técnica de Instalação de Gás, S. A.
A grande dedicação de Jorge Anjinho a Coimbra e a enorme capacidade de fazer, ficaram bem comprovadas em duas áreas.
Uma, passou pelo associativismo empresarial, com destaque para a sua ligação à Associação Comercial de Industrial de Coimbra (ACIC), onde exerceu os cargos de membro da Direção Geral (1977 a 1979); membro da Direção do Sector Industrial (1979 a 1981); Presidente da Direção Geral (1981 a 1983). Enquanto coordenador responsável pelo Departamento de Feiras da ACIC, criou e assumiu-se como motor da Feira Comercial e Industrial de Coimbra que tão boas memórias deixou.
Fundado em 1992, o Clube dos Empresários de Coimbra, teve Jorge Anjinho como um dos sócios-fundadores e, posteriormente, como vice-presidente e diretor. A ele se deve, também, a criação da empresa Odabarca - Animação Turística do Mondego S. A., proprietária do Barco "Basófias", de que foi administrador, e a Sociedade Quinta das Varandas, de que ajudou a fundar e da qual foi acionista.
Não se pode ainda esquecer a sua participação, desde 1996, na Associação Industrial Portuense, como membro do Conselho Consultivo.
Jorge Anjinho, empresário
A outra grande paixão de Jorge Anjinho por Coimbra centra-se na enorme dedicação ao futebol da Associação Académica de Coimbra, facto que não passou desapercebido e ganhou a admiração dos habitantes do burgo.
Ainda como estudante, em 1966/1667, assumiu o cargo de diretor da Seção de Futebol da AAC e, em 1979/1980, o de Relator do Conselho Fiscal.
Durante sete anos, entre 1983 e 1990, exerceu o cargo de Presidente da Briosa e, em julho de 1984, celebrou o protocolo de reintegração do ainda Clube Académico de Coimbra na Associação Académica, como Organismo Autónomo de Futebol. Consequentemente, Jorge Anjinho foi o primeiro presidente da Direção da AAC-OAF.
Jorge Anjinho, presidente da AAC-OAF. Foto Zézé Eliseu Trego
Ao longo da sua vigência na presidência implementou o Bingo da Académica e fez construir o pavilhão da Académica OAF.
Na época de 1984/1985 participou e esteve presente n a assembleia conhecida pelo nome de "Pacto dos Presidentes", movimento que mais tarde daria lugar à Associação Nacional de Clubes.
Os Antigos Orfeonistas, no próximo dia 17 de setembro, em Extremoz irão, por certo, reconhecer o grande amor de Jorge Anjinho pela Briosa e por Coimbra na homenagem que então lhe irão prestar.
Resta-nos a esperança que, em 2024, vinte e cinco anos após o seu falecimento, Coimbra o recorde e que pelo seu amor à Cidade e pela sua capacidade de fazer, ainda que a título póstumo, lhe tribute a mais do que merecida homenagem.
Rodrigues Costa
Agradeço a ajuda da Isabel Anjinho na disponibilização dos dados e imagens para esta tão justa, como singela publicação fosse possível.. Igual agradecimento é extensivo a Zézé Eliseu Trego pela cedência da fotografia assinalada com sendo da sua autoria.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.