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A' Cerca de Coimbra


Terça-feira, 17.12.19

Coimbra: Cerca do Colégio de S. Agostinho

Extrato de uma comunicação apresentada no ciclo de conferências comemorativo dos 900 anos de Almedina.

A Cerca de S. Agostinho, quando ali nasci, estaria, praticamente, como quando em 1834 o Mosteiro de Santa Cruz foi extinto. Constituía um anexo do Colégio da Sapiência ou de S. Agostinho. Era, então, chamada Cerca dos Órfãos ou simplesmente Cerca.

Imagem mais antiga da Cerca.jpgImagem mais antiga da Cerca que se conhece

Já não conheci, obviamente, o passadiço e casas anexas que ligavam o Colégio da Sapiência à Cerca.

Passadiço do Colégio.jpeg

Passadiço do Colégio para a Cerca

Disposta em socalcos era um mundo fantástico, cheia de segredos e de subterrâneos.

Cerca outra imagem.jpg

Outra imagem antiga da Cerca

A casa onde nasci estava em parte sobre o que poderá ser uma cisterna, pois ainda me lembro de ver parte de uma abóbada feita em tijolos, e quando se deitava água por um buraco ouvia-se cair no fundo.
Sobre os restos da antiga muralha que a separava da Couraça dos Apóstolos corria um cano vindo da fonte que existiu em frente ao Laboratório Chimico, o qual lançava água num pequeno tanque. Dali ia, por um outro cano enterrado, ia para a leira do jardim, onde vertia para um outro pequeno tanque. Leira do jardim onde existiam arbustos e flores que só ali se viam.
Encostadas ao muro do lado nascente que a separava da cerca dos Jesuítas, existiam duas capelas, com vestígios de pinturas murais. A de cima com bancos de pedra embutidos na parede e a de baixo, com bancos de madeira.
Sobrepujava a capela de baixo uma imagem de pedra que hoje já não existe. Arruado da colunata.jpg

O arruado da colunata e ao fundo a capela de baixo onde ainda se pode vislumbrar a estátua de S. Agostinho.

Ligando diretamente a capela de baixo à entrada da Cerca estava uma colunata, a que chamávamos o arruado, uma longa fila de pilares que sustentavam uma latada cheia de roseiras.
A meio da colunata, na parede, havia o que parecia uma porta de pedra. Tinha um buraco e, hoje, penso deveria ser por onde passava a ligação da referida possível cisterna, ao tanque da leira mais abaixo.
A ligação entre os socalcos era feita por escadas de pedra, uma delas com lindos balaustres também em pedra.

Cerca leira de cima.jpg

A leira de cima da Cerca … uma pálida imagem do passado

Na leira mais elevada, no muro sobranceiro ao arruado, havia uma série de bancos de pedra separados entre si por pequenos alegretes. Na leira junto ao muro sobre a Rua do Colégio Novo havia uma pedra com uma data. Era ali que os meninos do Colégio dos Órfãos, raramente, brincavam. Recreio que estava separado, por uma porta de madeira, da leira que o prolongava e de uma outra leira que era a mais baixa.
Ali existia uma mina que devia ter cerca de 50 metros de extensão cuja água vertia para um tanque de grandes dimensões.
Como se pode constatar o aproveitamento da água, tinha ali um exemplo da luta de séculos do Mosteiro de Santa Cruz pelo controlo desse bem essencial.
Na Cerca – que estava e está na posse da Misericórdia de Coimbra – eram então produzidos vegetais e fruta destinados à alimentação das meninas e meninos do Colégio dos Órfãos, hoje Colégio de Caetano.
Rodrigues Costa 

 

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por Rodrigues Costa às 09:55

Terça-feira, 12.11.19

Coimbra: Memórias de um salatina 3

Extrato de uma comunicação apresentada no ciclo de conferências comemorativo dos 900 anos de Almedina. (conclusão)

Na Alta também havia venda ambulante.

Leiteiras antigas.jpgLeiteiras antigas

As leiteiras. Inicialmente eram assim, mas havia quem dissesse que tinham por hábito “mijar no cântaro” o que terá de se entender por juntar água ao leite.

Leiteira. Palácio de Sobre Ribas.jpg

Leiteira fardadas e com cântaros lacrados

Depois, veio a obrigação de andarem de bata branca e com um cântaro de folha de flandres com um feitio esquisito, no qual dependuravam as medidas. Cântaro, diariamente lacrado pela Delegação de Saúde.
Os padeiros e as padeiras, com grandes cestos de vergas às costas cobertos com um pano branco, indo de casa em casa, deixar o pão que era pago à semana.

Peixeiras da Figueira.jpgPeixeiras das Figueira

As peixeiras da Figueira, vestidas com as suas saias tradicionais, a blusa e o xaile traçado e a rodilha na cabeça. Normalmente esguias e apressadas com as canastras à cabeça e o seu pregão tradicional, entoado de uma forma única: sardinha da areiaaaa! Oh freguesa é linda e fresquinha! 3 dez tostões! Quase sempre descalças, ou com um chinelo calçado e outro na mão pois havia que evitar as multas policiais de vinte e cinco tostões por se andar descalço.
O cafezeiro com a sua mala castanha e o seu pregão: Olha o cafezeiro! Compre agora! Vou para o norte e só volto para a semana!
Havia ainda o petrolino com a sua carroça puxada por um cavalo que vendia petróleo e azeite e que avisava a sua presença com o toque de uma corneta.

Amolador.jpgAmolador

E o amolador, com a sua flauta e toque típico, cujo pregão era: amola tesouras e navalhas, põe gatos nas panelas e gatos nas talhas! Exercia, ainda, as funções de capador de gatos.
Um aparte para terminar.

Flávio  Rodrigues.JPGFlávio Rodrigues e José Trego mestres de tantas gerações de estudantes e futricas. Fotografia retirada de “Flávio Rodrigues Silva - Fragmentos para uma Guitarra” de António Manuel Nunes e José dos Santos Paulo

Quando se fala de fado de Coimbra associa-se sempre a estudantes. Não é inteiramente verdade. Basta lembrar Artur Paredes e Flávio Rodrigues mestres e iniciadores no fado de Coimbra de tantos estudantes e futricas.

Três breves reflexões à laia de conclusão.
A primeira é óbvia. A Alta dos tempos dos salatinas está a desaparecer com a geração dos que viveram esse tempo. Não obstante a permanência de alguns velhos resistentes, passaram, na atualidade, a predominar os alojamentos para estudantes e os de curta duração, com o consequente surgimento de bares e de lojas para turistas.
Embora reconhecendo estarem em curso algumas obras de recuperação, há que assinalar a existência de situações carecidas de intervenção urgente: os imóveis em ruína e o estacionamento abusivo de automóveis nas ruas da Couraça dos Apóstolos, João Jacinto e, nomeadamente, no Largo da Sé Velha, aqui com evidentes consequências negativas para a fruição e preservação deste monumento nacional.
Terceira e última reflexão. O fenómeno da “turisficação” que começa a surgir na Alta está estudado, bem como os perigos e efeitos de uma aposta exclusiva no turismo. Há que nunca esquecer que um destino turístico está sujeito à moda de momento e são inúmeros os destinos que deixaram de estar na moda. Não obstante a tendência para o crescimento sustentado do turismo, o percurso de um destino turístico, se depende essencialmente da sua riqueza patrimonial e/ou paisagística, também depende da forma como organiza a sua oferta e se é capaz de criar experiências nos turistas que o procuram.
A Alta necessita de ser repensada e planeada para o curto e para o longo prazo. Daí o meu apelo à União de Freguesias para organizar umas jornadas técnicas, com a participação de credenciados especialistas multidisciplinares, quer da Cidade, quer de fora dela, tendo por tema a “Alta de hoje e a Alta do futuro”. O evento não se deve limitar a elencar ideias, mas, fundamentalmente, a definir projetos e a congregar esforços que permitam à Alta do futuro fazer jus ao seu passado.
A “nossa” Alta precisa do saber, do conhecimento, mas também precisa de carinho e de amor.
Que as Comemorações dos 900 de Almedina não sejam um ponto de chegada, mas sim de partida.
Rodrigues Costa

 

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por Rodrigues Costa às 10:12

Quinta-feira, 07.11.19

Coimbra: Memórias de um salatina 2

Extrato de uma comunicação apresentada no ciclo de conferências comemorativo dos 900 anos de Almedina. (continuação)

Em meados do século passado, subsistiam algumas atividades económicas hoje desaparecidas da Alta.

Diap. 30a.jpg

Onde havia uma tipografia, há um bar

Existiam cinco tipografias. Uma junto à igreja do Salvador, as restantes quase ao cimo da Couraça, na rua do Norte nas traseiras da Sé Velha.
Haviam duas carvoarias.

Diap. 32a.jpg

Aqui era a carvoaria a Rua do Loureiro

Uma mesmo junto ao Arco do Bispo e outra na rua do Loureiro. Eram casas escuras, de trabalhadores todos cobertos de pó negro onde se comprava o carvão a peso que era carregado com pás metálicas. Ali também se vendia carqueja para acender o fogareiro e que ao arder, deitava um cheiro muito agradável.
Dois marceneiros. O Sr. Herculano que tinha a oficina por baixo do arco que liga a hoje Casa da Escrita.
O outro, era o Sr. Casimiro que morava na Couraça e cuja oficina, à maneira medieval, estava à porta da sua habitação.
Ao lado estava o Clemente alfaiate e na Rua da Matemática o Sr, Moura era um alfaiate afamado, bem como o Sr. Lapa, ao cimo da Couraça. E nas escadas de Quebra Costas estava o Mário alfaiate.
Dos barbeiros restava o Senhor Albino barbeiro que ia, de casa em casa, cortar os cabelos.
No inicio da Rua dos Coutinhos um colchoeiro fazia travesseiros de suma-a-uma e colchões de palha cozidos com umas agulhas muito grandes, as agulhas de albardar.
E as vendas da Alta! Umas só mercearias, outras um misto de taberna e mercearia.

Diap. 35a.jpg

Onde era a venda do Romão, há um alojamento turístico

Na Couraça a venda do Romão era um misto de taberna e mercearia e a venda da Camila só taberna, cujo dono para além de vendeiro era o regedor da freguesia.

Diap. 37a.jpg

Onde era a venda do Zé Bruto, hoje uma ruína

No Largo da Matemática a loja do Zé Bruto, hoje uma ruína. Na Rua da Matemática já não existem as vendas do Senhor Ventura e do Senhor Carvalho, como já não existe a Menina Lídia, julgo que é um alojamento para estudantes, junto à Casa da Escrita.
Na zona da Sé Velha havia 4 lojas. No Largo, a grande loja das sete portas uma espécie de mercearia fina e hoje uma loja para turistas. A loja do Barão – não sei se era apelido – com mercearia e taberna, hoje um restaurante para turistas. Muito perto, na Rua do Correio já não há a loja da Batateira, nem a loja da rua dos Coutinhos.

Diap. 38a.jpg

Onde era a loja das 7 portas, há uma loja de cerâmica artesanal

Tasca do Pinto.jpg

A tasca do Pinto, com seu ramo de loureiro

Já me ia a esquecer da célebre e muito antiga venda que servia refeições e petiscos, na esquina da Rua do Cabido com o Largo do Salvador, ao tempo gerida pelo Sr. Pinto e sua Mulher.
As tabernas eram identificadas com um ramo de loureiro colocado sobre a porta e o vinho era guardado em grande toneis e vendido nuns copos estreitos e altos de vidro muito grosso.
Nas mercearias, os cereais, o açúcar, as batatas estavam guardadas em tulhas, ou sacos de serapilheira. Eram vendidos a peso. Também haviam bacias com água e bacalhau cortado às postas, o bacalhau demolhado, vendido a 15 tostões. Ainda existiam as barricas de manteiga e de peixe salgado e seco, polvo e sardinha esta com um aspeto amarelado.
Em frente à igreja do Salvador havia uma padaria muito concorrida e um depósito de pão, na Sé Velha, abaixo da loja do Barão.
Mas, para mim a melhor loja – se assim se podia chamar – era a Senhora Prazeres que vendia à porta de sua casa, pevides, tremoços, alfarroba, amendoins e sobretudo bananis, uma espécie de chapeuzinho de açúcar caramelizado suportado por um pequeno pau.

Rodrigues Costa (continua)

 

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por Rodrigues Costa às 11:04

Terça-feira, 05.11.19

Coimbra: Memórias de um salatina 1

Extrato de uma comunicação apresentada no ciclo de conferências comemorativo dos 900 anos de Almedina.

Diap. 19.jpg

Coimbra. Alta. 1930. Foto Varela Pècurto

A Alta era um bairro, se assim lhe chamarmos, maioritariamente pobre. Muitas das casas eram pequenas para tantos filhos e com muito pouca privacidade, não tinham eletricidade e utilizavam-se, habitualmente, bacios e latrinas.
Ali conviviam, basicamente, três grupos sociais.
O primeiro grupo era o dos donos das grandes casas de famílias de nome conhecido e posses mais ou menos alargadas que incluía alguns Professores da Universidade.

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Casa da Família Costa Lobo

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Casa do Professor Doutor Costa Pimpão

O segundo grupo eram os estudantes que tanto viviam em Republicas

Diap. 25.jpg

República dos Kagados

Como em casas que alugavam quartos e ainda em pensões.

Diap. 26 a.JPG

Casa da pensão da Aninhas, na Rua da Boavista

O terceiro grupo era os chamados salatinas. Uma mistura de empregados de escritório e de balcão, de funcionários públicos, de operários, de motoristas de táxi, de policias, vendeiras da praça e de artesãos das mais diversas profissões.
Ainda povoam a minha memória.
Quatro sapateiros. O Sardinha, na rua do Loureiro, era o sapateiro da Académica. Perto deste, na mesma rua, havia o sapateiro conhecido por Guilherme e na Rua de Sobre Ribas o Senhor Augusto.

Diap. 28a.jpg

Rua das Flores casa que foi do latoeiro

Latoeiros havia dois. O da rua das Flores que tinha um ramalhete de filhas para as quais os mais crescidos iam olhando. O outro era na ruas das Fangas.

Diap. 29a.jpg

Onde havia uma serralharia, há um bar … vá lá chama-se Bigorna

O Sr. São Bento – seria apelido ou alcunha? – era um serralheiro afamado, junto à Sé Velha, no início da Rua das Covas.

Rodrigues Costa (continua)

 

 

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por Rodrigues Costa às 13:22

Quinta-feira, 01.12.16

Coimbra: a Baixinha 2

No final do século XVI, o arrabalde apresentava uma estrutura bastante consolidada e o seu poder económico superava já o da Alta, tornando-se num centro vital para a sobrevivência da cidade. Em relação à morfologia, foi a altura em que se finalizou a ligação entre os adros de Santa Justa, o largo de Sansão e a Praça do Comércio, formando-se um aglomerado contínuo. “A cidade afirmou urbanisticamente a sua determinação em se instalar na zona mais baixa e plana.” O território distinguia dois conjuntos urbanos que vieram evidenciar a polaridade entre a Alta e a Baixa. Os dois polos tinham funções diferentes no panorama citadino e não entraram por isso em colapso, uma vez que se completavam nas necessidades funcionais da urbe. Na cidade Alta, intramuros, vivia o clero, os cónegos da Sé e outros beneficiários eclesiásticos, a nobreza local, os seus servidores e algum povo. Na cidade Baixa, habitavam o povo miúdo, os comerciantes, os artesãos e alguns mesteres. Já no século XV, a praça do arrabalde tinha sido denominada pelo infante D. Pedro como a P r a ç a d a C id a d e, expressão que denota claramente a importância crescente da cidade Baixa no contexto urbano. O sistema já consolidado do arrabalde é composto sequencialmente pelo Largo da Portagem, Rua dos Francos, a Praça do Comércio e a Praça 8 de Maio. Todos estes elementos formalizam a estrutura principal da Baixinha e referenciam-na como espaço singular da urbe. O modelo de rua e praça, de cheios e vazios representa, assim a imagem da cidade medieval com estruturas agregadoras de lugar da vida comum e das atividades relacionais da sociedade. A condição central da praça funciona como “sala de estar” urbana de encontro e troca, pois faz confluir todos os percursos estreitos para um lugar amplo e espaçoso de desdensificação da malha construída e concentra programaticamente funções importantes no contexto urbano

 ... Era à volta da praça principal do arrabalde que se concentravam os principais serviços comerciais. Atualmente, com uma forma alongada, esta praça resultou da união das igrejas de S. Bartolomeu (o adro de trás) e de S. Tiago (o adro cemiterial fronteiro), da consolidação, em contínuo dos respetivos núcleos e da reconformação da estrutura viária Norte/Sul. Localizada próximo da porta principal da cidade e em zona ribeirinha, a praça serviu as necessidades mercantis e agregadoras da dinâmica urbana da cidade medieval. Por ser uma área plana de fácil acesso e ponto de transição do rio para a cidade intramuros, rapidamente ganhou um estatuto central e identificador para a comunidade urbana. Logo se tornou a Praça da cidade e o valor da sua propriedade superava o das restantes zonas. São características evidenciadas pela altura dos edifícios que, era térrea na cidade em geral e atingia os três pisos neste local. Inicialmente foi intitulada Praça de S. Bartolomeu como referência à igreja que a conformava. Mais tarde, passou a ser referido o seu papel de Praça do Comércio.  A transferência de poder e de funções da cidade Alta para a Baixa, mais especificamente para a Praça do Comércio, veio acentuar e potenciar a sua condição central no seio do restante tecido. O reconhecimento deste espaço como praça surgiu no século XV, quando foi transferido para o local o mercado que inicialmente se realizava na parte alta. Com melhores características espaciais e de acessibilidade para o efeito, a praça foi progressivamente palco de feiras, mercados e açougues da cidade. A ação de D. Manuel, no século XVI, instaurou um processo de reestruturação e consolidação na cidade de Coimbra. Os empreendimentos de renovação e requalificação urbana levaram a cabo o melhoramento dos pavimentos das ruas e a redefinição programática da praça, com a localização do pelourinho, da Casa da Câmara, do Hospital Real e da Misericórdia, na primeira ação global de modernização. Neste mesmo século, o Mosteiro de Santa Cruz promoveu uma intervenção urbanística de grande importância, pela reconformação do seu espaço fronteiro, potenciando o desenvolvimento da interação social de mais um espaço urbano. Foram instaladas fontes de abastecimento público de água e era o espaço preferencial para as atividades lúdicas. A denominação de Largo de Sansão viria a mudar no século XIX, adaptando-se a designação de Praça 8 de Maio. A Rua Visconde da Luz, que estabelecia a sua ligação com os restantes espaços do sistema, ganhou gradual importância na vida urbana, instalando-se aí ourives e latoeiros. O sistema de largos, ruas e praças estava assim conformado e interligado no novo zoneamento urbano. 

Ferreira, C. 2007. Coimbra aos Pedaços. Uma abordagem ao espaço urbano da cidade. Prova Final de Licenciatura em Arquitectura pelo Departamento da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, orientada pelo Professor Arquitecto Adelino Gonçalves, p. 32-34

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por Rodrigues Costa às 16:58

Terça-feira, 12.04.16

Coimbra: tipologia da habitação corrente nos séculos XIV a XVI 2

Em Coimbra, à semelhança do que se passava um pouco por todo o país, a casa de sótão e sobrado era então uma solução recorrente. A tendência para elevar as casas térreas, através da sobreposição de um sobrado fez-se sentir ao longo de todo o seculo XIV … São pardieiros que se transformam em casas sobradas no prazo de um ano, são casas térreas na Almedina ou na Rua dos Caldeireiros às quais, de «San Miguel que passou a huu ano», deve ser acrescentado um novo piso; é o ar que se afora sobre duas tendas da comuna judaica sob condição que façam «no dicto aar huu sobrado».

… em finais do século XIV, as casas sobradadas fossem claramente predominantes. Dispersas por toda a cidade, encontram-se tanto no arrabalde, na zona ribeirinha da Madalena ou em Montarroio, como na Alta … a partir do adro da Sé, em direção ao Paço da Alcáçova e castelo, a casa térrea ganha protagonismo, rareando a casa sobradada … já em 1312, eram abundantes os pardieiros e casas arruinadas.

… No espaço intramuros fronteiro ao arrabalde … predominam os artífices e mesteirais tais como açagadores, cuteleiros, sapateiros ou ferreiros, para quem a tenda do piso térreo era fundamental … nas imediações da Alcáçova, se situam serviços e dependências régias como os açougues ou os celeiros do vinho e do pão, as casas da falcoaria, os pombais, a chancelaria, as «casas do ofício da merçee del Rey». É também aí que se situam (ou situavam) as escolas das leis, da lógica, da gramática.

… embora a casa sobradada se encontre um pouco por toda a cidade … adquire uma presença incontestável, por vezes única, nos locais de maior dinamismo comercial … nas Ruas da Almedina e Ferraria, nelas residem sapateiros, ferreiros, marçeiros, peneireiros, para quem a residência era simultaneamente local de trabalho, oficina ou tenda. A duplicação de portais proporcionaria ao mesmo tempo preservar o espaço doméstico.

… Em relação aos materiais utlizados na construção das casas … elementos dispersos em documentação coeva asseguram que o leque de escolha não seria muito diferente do utlizado em tantas outras localidades: as omnipresentes pedra e madeira, a telha e a cal.

… segunda metade do século XIV as muralhas encontravam-se … parcialmente obstruídas por casas, encostadas ao interior da cerca, na rua da Ferraria, adossadas ao exterior do muro, na Judiaria Velha.

Trindade, L. 2002. A Casa Corrente em Coimbra. Dos finais da Idade Média aos inícios da Época Moderna. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra. Pg. 127 a 130

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por Rodrigues Costa às 10:47

Sexta-feira, 22.01.16

Coimbra, as ruas por profissões

As posturas do município não obrigavam os ofícios mecânicos a arruamentos. Mas disciplinavam, em nome do bem público, a localização de certas atividades. … Sendo o produtor ao mesmo tempo vendedor, os mesteres não deixariam de disputar os sítios mais favoráveis ao desenvolvimento económico … Livreiros e impressores, alfaiates, sapateiros, taberneiros e recoveiros, contam-se entre a população da Alta que contribuiu para as fintas das sisas. Os livreiros deviam ter subido a colina depois de 1567. Com efeito, no livro das sisas deste ano, é possível identificar seis. Mas cinco pertencem à freguesia de Santiago. Dos catorze livreiros conhecidos em 1613, moravam 9 em S. Cristóvão e apenas três em Santiago.
… Pelas freguesias da Baixa distribuía-se a maior parte do artesanato e da riqueza que lhe podia estar associada. Mais de três quartos dos ofícios mecânicos identificados em 1567 situavam-se nesta zona. Em 1617 pertenciam-lhe pelo menos 74%. A freguesia de Santa Cruz detinha o maior número de unidades artesanais. Seguiam-se-lhe Santiago, S. Bartolomeu (mesmo excluindo Santa Clara) e Santa Justa.
Os sapateiros e oleiros predominavam em Santa Cruz, os alfaiates e ourives em Santiago. Os cordoeiros sobressaíam em Santa Justa. Em S. Bartolomeu salientavam-se os sombreireiros, sapateiros e barqueiros.
Dentro das paróquias havia locais onde eram (ou foram) exercidos, predominantemente, certos ofícios, como deixam transparecer os topónimos Terreiro das Tanoarias, Terreiro das Olarias e ruas das Solas, dos Sombreireiros, dos Sapateiros, dos Toalheiros … A «nobreza» da Rua de Coruche ou da Calçada, por exemplo, não deixará de andar associada, certamente, aos mercadores, merceeiros ou ourives.
… Nos dias de trabalho as oficinas abriam cedo e fechavam tarde: laboravam, por certo, de manhã cedo até ao cair da noite, de sol a sol. Às sete horas, no tempo da Quaresma, as lojas já estavam abertas. E a esta hora deviam os tabeliães das notas estar na casa da Praça para atender o público. Era a hora normal de iniciar o trabalho ou o estudo … As aulas em Coimbra, pelo menos nos Estudo Menores, começavam às oito horas no Inverno e às sete no Verão.

Oliveira, A. 1971. A Vida Económica e Social de Coimbra de 1537 a 1640. Primeira Parte. Volume I. Coimbra, Universidade de Coimbra, pg. 362 a 364

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por Rodrigues Costa às 09:53


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