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A' Cerca de Coimbra


Quinta-feira, 21.09.23

Coimbra: Reservatório de água do Jardim Botânico

Prosseguindo na divulgação do texto do Professor Doutor Amado Mendes, inserido na brochura Abastecimento de água a Coimbra: Reservatório do Botânico, dedicamos esta entrada à referida estrutura, conhecida de muitos poucos.

Aquando dos primórdios do abastecimento domiciliário de água a Coimbra, cujo sistema primitivo foi instalado em 1888 e entrou em funcionamento em meados de 1889, como se disse já, foram construídos dois reservatórios: um na Cumeada (considerado o principal e que se mantém em funcionamento), destinado ao abastecimento da zona mais elevada da cidade; o outro (especial, segundo os termos do contrato), na Cerca de São Bento / Jardim Botânico, que desde há anos se encontra desativado.

RB. Reservatório do Botânico.jpg

Reservatório do Jardim Botânico, na atualidade. Foto RC

 O primeiro, localizado a uma cota de108 m, era o principal e enquadra-se na classificação de grande, pois a sua capacidade ultrapassa os 5000 m3. Por seu lado, o segundo, a uma cota de 50 m, era de média dimensão, pois tinha a capacidade de 3000 m3.

RB pg. 7.jpgReservatório do Jardim Botânico (desativado) Op. cit., pg. 7

Como são raros os reservatórios enterrados desativados, o do Jardim Botânico é um belo exemplar do património industrial da água, pelo que se reveste da maior relevância histórica e científica, suscetível de despertar interesse no âmbito do turismo cultural, a nível não só local, mas também nacional e internacional.

No que toca à sua localização, verificou-se uma certa hesitação inicial, não só pela natureza da respetiva área (parte integrante do Jardim Botânico, com toda a carga histórica e científica), mas também pela pouca adequação do terreno ao fim em vista. Aliás, praticamente na altura em que o sistema de abastecimento de água a Coimbra estava prestes a entrar em funcionamento (primeira metade do ano de 1889), já se manifestavam preocupações acerca da consolidação da estrutura. Com efeito, pode ler-se em ata camarária, acerca de alguns aspetos do empreendimento:

«Consolidação dos terrenos, na cerca de S. Bento, junto à casa das máquinas, que ameaçavam desmoronar-se; colocação de um portão de ferro no Arco da Traição, para serventia do reservatório das águas das zonas média e baixa da cidade»". Numa outra ata volta a focar-se o assunto, apontando as deficiências: «não foram construídos anexos da casa das máquinas; os reservatórios perdem quantidades de água assinaláveis; o reservatório das zonas média e baixa [Reservatório do Botânico] está ameaçado por desabamento de terras; o terreno vizinho ameaça escorregar por não ter sido drenado; não funcionam os indicadores elétricos de níveis de água».

RB. pg. 8.jpg

Op. cit., pg. 8

… Uma observação atenta do Reservatório do Botânico permite-nos observar, «in loco», parte do que geralmente é referido nas publicações da especialidade e, bem assim, na própria legislação que enquadra este género de estruturas.

Comecemos pelo exterior.

Aqui destaca-se uma pequena construção (em alvenaria e tijolo e com janelas), à qual o Presidente da Câmara Municipal de Coimbra se referia como a "casa das máquinas", na qual estava instalado o equipamento de controlo do Reservatório. Embora de pequenas dimensões, uma vez que já não alberga equipamento e que acaba de beneficiar de obras de consolidação, manutenção e restauro, esta pequena “casa” pode ser utilizada pra diversas funções culturais:   espaço de exposições permanentes ou temporárias), centro de interpretação (sobre o património hidráulico da cidade e do próprio Botânico, local de realização de atividades lúdico-pedagógicas, etc.).

No amplo espaço envolvente, de terreno com alguma vegetação e que pode bem ser ajardinado, para ali também se efetuarem eventos adequados, entre os quais exposições sobre temáticas diversas, observam-se pequenas estruturas, partes integrantes dos ventiladores / chaminés ou respiradouros. No total são 10, quatro um pouco maiores e seis mais pequenos.

A ventilação tem uma função importante na qualidade da água, processo muito antigo e que antecedeu. inclusive, o uso do cloro (começado a utilizar nos Estados Unidos da América em 1908 e que chegou a Portugal (a Coimbra e a Lisboa), em finais dos anos 1920", e para manter a pressão atmosférica.

Acerca do assunto, e como alerta dc prevenção, já foi escrito: «As coberturas dos reservatórios devem ser providas de uma ou mais chaminés de ventilação, a fim de que o nível da água fique sempre sob pressão atmosférica.

RB. pc. 10.jpg

Interior do Reservatório do Jardim Botânico (desativado). Op. cit., pg. 9

Da casa das máquinas, por duas escadas íngremes e com espaço reduzido (inclusive na altura, relativamente à estrutura superior o que obriga a fazei algum exercício para as utilizar), tem-se acesso às duas células ou câmaras, simétricas e que ocupam uma área considerável, cujas dimensões apenas são devidamente perspetivadas quando se acede ao seu interior. Aquelas encontram-se em estado razoável de conservação, não obstante no teto já se notarem certas fendas que podem denotar alguma fragilidade, em termos de futuro.

As paredes laterais assim como a parede divisória entre as duas células são em alvenaria rebocada. Em cada célula ou câmara se encontram 6 pilares, também de alvenaria, sendo o de uma das células (a do lado direito, quando se entra pela porta principal da casa das máquinas) reforçado.

Em termos de tecnologia, pouco se encontra no local, salvo algumas canalizações e equipamento metálico de regularização do fluxo de água,

…. Em suma: trata-se de um espaço amplo que, caso venha a ser devidamente restaurado e consolidado, bem poderá servir não só para visita turística mas também para eventos culturais, como espetáculos de teatro, música ou dança, exposições, oficinas de atividades pedagógicas, etc.

Mendes, J.A. Abastecimento de água a Coimbra: Reservatório do Botânico. Sem data. Coimbra, Águas de Coimbra E.M.

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por Rodrigues Costa às 21:03

Terça-feira, 19.09.23

Coimbra: Abastecimento de água 1

Começamos hoje a divulgar um texto do Professor Doutor Amado Mendes, inserido numa pequena, e muito interessante, brochura editada pelas, hoje, Águas de Coimbra, Empresa Municipal. O texto está dividido em duas partes, a que conta, de forma breve, a história do abastecimento de Água, em Coimbra e outra dedicada ao Reservatório do Botânico.

RB. capa.jpg

Op. cit., capa

Entre os maiores benefícios para o bem-estar das populações conta-se precisamente o abastecimento de água ao domicílio e, bem assim, a implantação do saneamento básico. Na sequência da invenção da máquina a vapor … viria a expandir-se por diversos países ao longo dos séculos XIX-XX, beneficiando não só a indústria, os transportes e comunicações e outro tipo de serviços como também o abastecimento de água ao domicílio.

Esta inovação, adotada por algumas grandes cidades nos anos de 1830-1850, viria depois a beneficiar muitos centros urbanos, inclusive em Portugal. Assim, Lisboa, teve acesso a esse melhoramento excecional em 1880, o Porto em 1886 e, Coimbra, pouco depois, ou seja, em 1889.

… A população da cidade, em1863, para se abastecer de água tinha que recorrer aos meios tradicionais. Nessa altura existiam em Coimbra 10 fontes, 2 poços e 2 cisternas. A situação era muito difícil, agravando-se com o desenvolvimento com o desenvolvimento urbano, espacialmente na parte alta da cidade e no verão, quando era mais frequente a ocorrência de incêndios. Por isso o abastecimento de água passou a ser um assunto prioritário, como se pode constar pelas notícias da imprensa local, com destaque para as de «O Conimbricense». Com efeito, neste podia ler-se, na sua edição de 05 de setembro de 1867:

“A primeira e, incontestavelmente, a mais urgente necessidade que há em Coimbra é a do abastecimento de águas. Pode-se mais ou menos suportar uma rua mal calçada; pode-se tolerar uma casa de residência municipal mais ou menos luxuosa e confortável – o que não se pode adiar, o que de forma nenhuma se pode sofrer é a falta de água.

E Coimbra está a esse respeito cada vez pior. Havia antigamente só no bairro baixo três chafarizes, um na Praça de S. Bartolomeu, hoje do Comércio, outro na Calçada e outro em Sansão, hoje Praça 8 de Maio; e até em épocas antigas, houve neste último local dois chafarizes. Atualmente não há nenhum, porque esse mesmo que se vê na Praça do Comércio é como se não existira, porque quase nunca tem água.

Se isto sucede no bairro baixo, no bairro alto é a situação dos habitantes muito mais deplorável. É certo que há um chafariz no Largo da Feira e outro na Sé Velha;

RB. Largo da Feira. Fonte dos Bicos 01.jpg

“Mãe" de água e chafariz do Largo da Feira

RB. Sé Velha. Archivo Pittoresco. 1866.09.jpg

Fonte da Sé Velha, in “Arquivo Pitoresco”. Col. RA

RB. Igreja de  Santa Cruz.jpg

Fontes do Largo de Sansão. “Estampas Coimbrãs.”, pormenor

mas de ano para ano vão cada vez mais diminuindo na porção de água que deitam; e; assim; aquele bairro, que se abastece quase exclusivamente de água as fontes, sofre das maiores inclemências pela falta deste género, indispensável à vida. As criadas aglomeram-se em número extraordinário junto dos dois chafarizes e ali se demoram longo tempo, até que possa achar vez para

encher os potes».

RB. Mulher de Coimbra com cântaros.jpg

“Estampas Coimbrãs. Mulher de Coimbra conduzindo água da fonte ou do Mondego”

… O primeiro projeto de abastecimento de água à cidade, cujo contrato, entre a Câmara Municipal de Coimbra e a dita empresa. [empresa londrina da especialidade, representada pelo Eng.º James Easton] foi publicado no «Diário do Governo» de 09 de agosto de 1982.

RB. pg. 4 e 5.jpg

Op. cit,, pg. 4-5

 Todavia, o projeto não se concretizou, pois houve atrasos sucessivos quanto ao início das obras. Entre outros entraves, verificava-se uma divergência relativamente ao avanço simultâneo do processo de abastecimento de água ao domicílio e do saneamento (“canalização dos esgotos”), defendido pela empresa, mas não aprovado pela Câmara Municipal. Não tendo sido possível ultrapassar o impasse, na sessão camarária de 21 de setembro de 1887, foi apresentada a escritura de rescisão do contrato.

Logo no mês seguinte (outubro de 1887) foi publicado edital para abertura do concurso para o abastecimento de água a Coimbra (O Conimbricense, de 29-10-1887), bem como o respetivo regulamento.

… A proposta mais baixa foi a de Albert Nillus & C. (83 700$000 réis), pelo que as obras lhe foram adjudicadas.

Como previsto no contrato as obras terão começado no primeiro semestre de 1888, prolongando-se por cerca de ano e meio … até que «provavelmente na segunda quinzena de maio de 1889, Coimbra vê chegar o extraordinário melhoramento, que é o abastecimento de água por métodos modernos». O fenómeno é de tal relevância para a qualidade de vidas das confinidades que até já foi designado como “o Milagre da Torneira".

Op. cit. imagem do contrarosto.jpg

Op. ct., pg. de contra rosto

 … o abastecimento é suportado por uma estrutura bastante complexa, da qual fazem parte, fundamentalmente, os seguintes pilares:

. Processo da captação da água no rio Mondego (junto ao Parque Dr. Manuel Braga, de 1889 a 1956-58 e, desde então, na Boavista), sua adução e respetivo tratamento;

. Estação elevatória (instalada na Rua da Alegria, de 1889 a 1924, no Parque da Cidade, de 1924 a meados dos anos de 1950 e, desde então, na Boavista), que tem por função conduzir a água para os reservatórios, distribuídos por locais estratégicos da cidade;

. Sua distribuição, por força da gravidade, através de uma vasta rede de canalizações, pelos numerosos locais de abastecimento (doméstico, público, industrial, institucional, etc.);

- O apertado controlo de qualidade é efetuado em laboratório e por meio de tecnologia adequada, enquanto a medição da água captada, consumida ou desperdiçada é realizada por equipamento apropriado e, obviamente pelos conhecidos contadores de água que, ao longo do tempo, têm registados sucessivos aperfeiçoamentos.

 Mendes, J.A. Abastecimento de água a Coimbra: Reservatório do Botânico. Sem data. Coimbra, Águas de Coimbra E.M.

 

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por Rodrigues Costa às 22:17


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