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É uma das várias igrejas de Coimbra que tiveram de mudar de local, para fugir às inundações das cheias do Mondego. A igreja medieval situava-se no largo que é hoje conhecido por Terreiro da Erva – onde ainda se podem ver vestígios da capela mor e nave lateral –, no coração do território dos seus mesteirais: os oleiros de branco e de vermelho e os pintores de louça e azulejos – gerações de artífices que, durante séculos, fizeram de Coimbra um dos mais importantes centros ceramistas do país, com louça exportada para os quatro cantos do mundo e de que hoje pouco se sabe e nada resta, perdida a última oportunidade de estudar os seus vestígios com as demolições da famigerada viela central.
As cheias do Mondego foram sempre em crescendo. A de fevereiro de 1708 obrigou à trasladação do Santíssimo e da imagem do Santo Cristo para a igreja de Santiago, de barco! Logo se tratou de construir nova igreja. O local escolhido foi a encosta sobranceira ao Arnado, bem longe das investidas do bazófias. A primeira pedra foi lançada pelo bispo D. António de Vasconcelos e Sousa em 24 de agosto de 1710.
Igreja de Santa Justa, fachada principal
A fachada da igreja é monumental, pela sua situação altaneira. Flanqueada por duas torres, está amplamente rasgada de janelas que enchem de luz o interior. Inclui um retábulo da segunda metade do século XVI, trazido da igreja velha. Sobre o frontão das janelas intermédias situam-se quatro nichos com esculturas dos séculos XV e XVI incluindo as santas Justa e Rufina, padroeiras dos oleiros. Junto à base das torres encontram-se duas lápides epigrafadas com a história da igreja.
Igreja de Santa Justa, interior
O interior é de arquitetura sóbria, mas bem delineada, de nave única, coberta por abóbada de arco um pouco rebaixado. Divide-se em cinco tramos, sendo o primeiro ocupado pelo coro alto. Neles se rasgam arcos, formando capelas à face. A capela-mor, de um só tramo mais profundo, é mais estreita que a nave, encontrando-se o altar em plano mais elevado.
Igreja de Santa Justa, a imagem do Santo Cristo dos Oleiros
Os primeiros arcos a seguir ao coro alto são preenchidos na parte superior por pinturas do início do século XVIII, envolvidas em molduras de talha dourada, representado a Virgem com o Menino e o Batismo de Cristo. No arco, do antigo lado do Evangelho, encontra-se a imagem do Santo Cristo dos Oleiros, do século XV.
Igreja de Santa Justa, interior pormenor
Os arcos dos tramos seguintes abrigam retábulos. Os quatro primeiros enquadram-se no rococó coimbrão, embora de forma mais original: as colunas têm grinaldas de flores envolventes e entrecruzadas e, no terço inferior, caneluras em espiral. Sobre os altares da nave, oito telas da época joanina, mostram os passos da paixão de Jesus, cujos símbolos se exibem também no coroamento da fachada exterior. Os capuchinhos, que em tempos detiveram esta igreja, fizeram nela algumas alterações, como a ablação das mesas dos altares da nave e a substituição das imagens antigas por outras do século XX.
Os retábulos junto à capela-mor têm diferente linguagem. O do lado norte é adaptação de outro, seiscentista, vindo da igreja antiga. Tem colunas espiraladas, revestidas de vinha, uvas, meninos e aves debicando. Na predela há um relevo com a degolação dos Mártires de Marrocos. O retábulo fronteiro, da época joanina, também de colunas espiraladas, mas com grinalda no cavado. É dedicado às Almas do Purgatório, tema não muito comum na diocese.
Igreja de Santa Justa, altar-mor pormenor
A capela-mor é dominada pelo magnífico retábulo de talha dourada, de grande aparato, saído, certamente, de oficinas do Porto. Data dos primeiros decénios do século XVIII. Estrutura-se em colunas retorcidas sobre mísulas e reveste-se de acantos, flores, aves e profusão de crianças e anjos. Um grande sacrário, com quatro colunas salomónicas por lado, em diagonal, serve de base à escultura do Padre Eterno, com a pomba simbólica e anjos. Aos lados dispõem-se as imagens das titulares: as santas Justa e Rufina. Encima este conjunto escultórico o camarim onde se ergue o trono eucarístico, com baldaquino.
Desconhecem-se nomes de arquiteto, artistas e artífices. A mesma esponja que apagou a memória da atividade dos oleiros parece ter atingido também esta igreja. Mas as obras valem por si e basta o retábulo-mor para ombrear com outras obras-primas da arte em Coimbra.
Nelson Correia Borges
In: Correio de Coimbra N.º 4732, de 21.03.2019
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