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Fado de Coimbra?
Mas a toada coimbrã, apregoada sob essa designação e como tal já universalmente reconhecida, deverá, efetivamente, enquadrar-se na veia paradigmática do «Fado» propriamente dito?
… Debrucei-me um pouco sobre … «fado lisboeta» para poder estabelecer uma linha de diferenciação com o «chamado fado coimbrão», ficando em melhores condições para justificar o cuidado que tive – e quero ter – em não utilizar a designação «Fado de Coimbra», antepondo ao título, cautelosa e restritivamente, o classificativo de «o chamado» - o «Chamado Fado de Coimbra».
E não é agora que se me antepõe a reticência. Num apontamento marginal de um livrito meu (quando a propósito da «revelada tendência de Luís Goes para a trova, balada ou canção, afirmei não hesitar tê-lo como um percursor das novas toadas, seu contemporâneo «Bettencourt»), já então escrevi: “E se não inculco este género de antípoda do «chamado» fado de Coimbra, é porque «verdadeiramente em Coimbra não houve fado», mas tão somente «canção», por vezes de reconhecida sentimentalidade, é certo, mas nunca enformada em temas trágicos ou fatalistas, tão específicos daquela efetivamente depressiva composição, em que Lisboa se louva e a minha sensibilidade também não enjeita”.
… Ao contrário do que sucede com a lisboeta, os compositores de Coimbra constroem as suas composições «abstratamente» (música por música), isto é, valem-se de uma fonte instintivamente criadora, dum espontâneo fogo interior, «sem disporem ainda de um tema literário a musicar», seja a tradicional quadra, seja outro poema,( «exceção para o soneto, em que se revelou mestre D. José Pais de Almeida e Silva, infelizmente sem continuadores; exceção ainda para as conhecidas «Carta da Aldeia» e «Carta de Longe», realçadas na voz de oiro de António Menano).
Não é curial, nem didática, a invocação do próprio testemunho. Releve-se-me, pois, a citação: Duas canções que vejo gravadas em discos por Almeida d’Eça, António Bernardino, Armando Goes e Luís Goes, compu-las quando ainda não tinha premeditado a letra, pelo que julgo da mesma forma terem procedido outros compositores.
Enfim: libertos desse condicionalismo, tantas vezes prejudicial à espontaneidade criacional – e na espontaneidade é que se revelam a garra, o talento e o génio – as composições resultam necessariamente «mais leves, menos arrastadas, consequentemente mais acessíveis e perduráveis».
… Estamos, assim, nitidamente, face aos primeiros pontos de divergência … na congénere coimbrã, toda cançonetista, airosa e leve, a que bem assenta a designação de «canção», a «Canção de Coimbra», ou mesmo, (por condescendência a uma tradicional nomenclatura, arreigada no tempo), «Fado Canção de Coimbra».
… E isto se diga em defesa da pureza daquilo que eu considero o «Chamado Fado de Coimbra»
Sousa, A. 1981. O Canto e a Guitarra na Década de Oiro da Academia de Coimbra (1920-1930). Coimbra, Comissão Municipal de Turismo, pg. 5, 8 a 13
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