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Depois de tantas correrias para Sul do Mondego … aconteceu que, naquele 6 de Dezembro de 1185, «da larga e muita idade foi vencido» o primeiro Rei de Portugal, D. Afonso Henriques … O corpo … foi vestido, ainda nos seus aposentos da alcáçova, de «Cónego Terceiro de Santa Cruz», que o era desde há meio século. E metido numa urna de «madeira de cedro» … Em procissão, na manhã do dia 7 de Dezembro, o caixão com o corpo do rei defunto foi levado aos ombros até à Sé Catedral, por entre cruzes de todos os mosteiros e igrejas paroquiais e os cânticos e as orações da multidão … com a particularidade de todos os acompanhantes, desde o Infante D. Sancho ao mais humilde dos servidores, se apresentarem de pés descalços.
… Durante todo aquele dia e boa parte do seguinte … houve velada contínua do corpo do Primeiro Rei na Sé Catedral … Já no dia 8, organizou-se nova procissão para a igreja do Mosteiro de Santa Cruz … o futuro rei, D. Sancho, transportando o histórico escudo das cinco quinas … e que ficaria pendurado junto ao túmulo em Santa Cruz … o alferes-mor Fernando Afonso … com a espada usada pelo Primeiro Rei em tantas batalhas e que também no seu túmulo seria colocada (permaneceria quase ininterruptamente, ao longo de quase sete séculos.
…. A primeira arca tumular … não teve qualquer ornamentação … foi, no entanto, um trabalho ‘provisório’ … sabe-se por documentos entretanto encontrados que, nas semanas seguintes ao falecimento, bons artistas conimbricenses … exercitaram toda a sua mestria num outro sarcófago real.
Este segundo sepulcro … também não chegou até nós, mas é de admitir que se tratasse de um mausoléu de tampa abaulada e ornamentação ao gosto românico … elogio fúnebre que neste sepulcro … se esculpiu:
… «Aqui jaz enterrado um outro Alexandre, um outro Júlio, guerreiro invencível, ilustre, honra do mundo. Os tempos do seu reinado foram-se alternando entre a guerra e a paz. Os reinos que reduziu ao poder da Igreja estão mostrando o muito que lhe mereceu a religião cristã e a fé no nosso Salvador. Para além dos gastos que fez e que convinham à majestade do seu Estado, daquilo que entesourou também muito distribuiu pelos mais pobres e miseráveis, levado a isso pela suavidade da Lei Evangélica. Foi um grande defensor da Cruz de Cristo, que usou como proteção no escudo real que adotou, em o qual se vê a mesma Cruz repartida em escudos menores. Ainda que a Fama Costumada de outros se ocupe por tempos dilatados, ninguém haverá que mereça mais louvores».
Quando a urna de madeira foi colocada dentro do segundo sepulcro no século XII – que ficou à entrada da igreja românica, encostado à parede e levantado do chão sobre duas pedras cuidadosamente aparelhadas – houve de novo cerimónia religiosa em Santa Cruz de Coimbra.
… Não muitos anos depois do falecimento de D. Afonso Henriques, porque os mouros continuassem a fazer incursões na linha do Mondego e o Mosteiro de Santa Cruz se situasse no ‘arrabalde’, D. Sancho I “ordenou e recomendou oralmente (‘mandauit et próprio ore commendauit’) aos frades crúzios que comprassem casas junto à torre dos sinos e aí construíssem igreja e casas para conservação dos restos mortais de seu pai e mãe, o que efetivamente se realizou…”
Lembra ainda o historiador José Pinto Loureiro … que «ao tempo, a torre sineira de Santa Cruz estava dentro da muralha, junto da Porta Nova, no local mais tarde ocupado pelo Colégio da Sapiência ou Colégio Novo».
Martins, A.S. 2006. Coimbra. “Cidade rica do Santo Corpo do seu Rei primeiro”. Coimbra. Edição do Autor. Pg. 19, 21 a 24, 27 a 29, 83 a 85
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