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Na entrada, hoje bastante prejudicada pelo leito erguido da rua, teremos de considerar duas partes: a porta, propriamente, e o corpo que a encima.
Entrada da casa de Sub-ripas: fachada da rua. Pg. 267.
Esta porta apresenta-nos, talvez, nas molduras e na verga, uma modificação do arco de sarapanel, fórmula adotada pelo estilo manuelino, assim como a volta inteira e tantas outras.
O corpo que coroa a porta, representa uma espécie de retábulo, cuja moldura apresenta a forma de um arco alteado.
Do fundo deste retábulo ressalta em pleno relevo uma cruz de troncos, tão comida já, que se torna impossível decifrar-lhe qualquer intenção emblemática. Assenta o retábulo, propriamente, numa longa mísula lavrada de folhagens, de onde prende, para fixar-se também no alto da porta, um pequeno escudo, hoje quase gasto, que talvez tivesse representado as chagas, envolvidas em flores.
De toda a frontaria, é a entrada a peça mais importante. Liga-se pelo estilo com as janelas, como disse, aparentando especialmente com as do primeiro andar.
O próprio remate acogulhado do arco e do seu retábulo a relaciona logo com todas estas. Abrindo arcos conopiais, munidas de painel, realçadas de cordões, ou guarnecidas de colunelos, de variada base e molde, vegetalizadas de cogulhos pelo extradorso o fecho das curvas, floridas de rosinhas ou relevadas de folhas e frutos ao longo dos intradorsos, golpeadas de lavores torçalados ou trabalhadas de foliado nos sub-rebordos dos parapeitos — as janelas da frente, umas por outras, revelam-nos, como a porta, nas linhas de corte, nas molduragens, nos motivos de decoração — alguma coisa da caprichosa liberdade desse estilo que, não sendo original de raiz, representando antes um compromisso de formas tradicionais e de simbolizações recentes da época, prestando-se, por vezes, a manifestações de intemperante inventiva — representou, contudo, larga concessão à mais opulenta fantasia artística, ficando, além disto, a valer para nós como documento, como associado traço de consoladora evocação histórica. Mas toda a casa, além desta fachada da frente, o revela sob variadas formas nos seus vãos e rasgaduras: nas janelas dos corpos voltados para a escarpa—embora algumas o acusem somente na curva o no golpe das vergas, nos cortes do aparelhamento—; e ainda em portas antigas do interior, o nos muitos cachorros, florões, medalhões e escudos encontrados por dentro e por fora do edifício.
Quem vir apenas a fachada unida sobre a rua, mal suspeitará que a Casa de Sub-ripas forma, no seu exterior mesmo, um conjunto curiosamente irregular, como se pôde reconhecer observando-a do poente, do norte, ou de algum ponto sobredominante da cidade, de onde então os múltiplos telhados da casa, telhados de quatro águas, nos dão logo a ideia de corpos diversos ligados numa só construção.
É que, além da parte recuada junto ao cunhal da rua, outras se destacam do corpo principal.
Prolongando este, avança sobre a escarpa, entre sudoeste e poente, um corpo em forma de terraço — livre e aberto ao rés do primeiro pavimento, mas cobrindo uma curta galeria, fendida de janelas que medem para baixo uma altura de andar. Desta galeria devia ter havido qualquer descida interior para a faixa dos quintais—chão da antiga barbacã.
A casa de Sub-ripas, vista de sudoeste – o terraço. Pg. 268
Fazendo ângulo com o mesmo corpo central, a olhar entre noroeste e norte, destaca-se outra massa em forma do torre, [Chamar lhe-hei sempre torre; para não haver confusões, designarei por Torre do Prior do Ameal a que fica situada distante, a norte da casa] cujo ressalto mede a sua menor extensão de curto retângulo. Mas com esta torre liga ainda, para norte, por detrás de um pequeno terraço triangular, hoje desfigurado em cubículo, uma estreita manga de construção.
A Casa de Sub-ripas – A torre, que, de certos pontos, parece a parte central do edifício. Pg. 268
Era esta — ao nível do primeiro pavimento, a passagem para a antiga cortina de comunicação com a Torre do Prior do Ameal — no pavimento superior — um miradouro coberto de telhado, a dominar, como toda a casa, a baixa da cidade, antigo arrabalde, e o vale doce do Mondego.
Gaio, M.S. Palácios, castelos e solares de Portugal. IV – A casa de sub-Ripas, In “Illustração Portugueza”, 9, Primeiro semestre, 2.ª série. Lisboa, 1906, p. 265-272.
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