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Quando os primeiros jesuítas, chefiados por Simão Rodrigues vieram para a cidade do Mondego, em 1542, com o objetivo de fundar o colégio donde sairiam tantos missionários para terras do Brasil e do Oriente, estariam bem longe de supor que a igreja construída com tanto desvelo e rigor acabaria por ser a Sé Catedral de Coimbra.
A construção da igreja, que havia de servir não só para o colégio, mas para envolver e catequizar o povo de Coimbra, iniciou-se em 1548, inaugurando-se a nave em 1 de janeiro de 1640, sendo dedicada ao Santíssimo Nome de Jesus. Teve como arquiteto Baltazar Álvares que executou outros projetos para a Companhia de Jesus e seguiu de perto a planta da igreja do Gesù, de Roma, concebida por Vignola, segundo modelo anterior. A planta é a que melhor servia aos propósitos da Companhia: ampla nave central, bem iluminada, com capelas nos flancos, obscurecidas. A atenção da assembleia podia centrar-se toda no grande espaço e no altar-mor no topo, bem como nos púlpitos que, em local estratégico da nave, possibilitavam uma boa audição da palavra inspirada dos pregadores. Ao contrário de outras igrejas da Companhia, em Coimbra as capelas laterais têm a mesma altura da nave, o que confere ao conjunto arquitetónico impressionante rigor e monumentalidade. Entre estas destaca-se a do meio, do lado nascente – fugindo à tradição de orientar as igrejas, isto é, voltar as fachadas a poente e as cabeceiras a oriente, os jesuítas preferiram erguer a fachada para sul, o que lhes possibilitava ter mais luz na nave central, ainda mais potenciada pela cúpula, no transepto.
Esta capela foi dedicada a S. Francisco Xavier e patrocinada por Francisco da Fonseca, lente de Leis na Universidade de Coimbra, nela tendo ficado sepultado em 1631, bem como sua mulher, em 1661. Deixou os seus bens para dotação e ornamento da mesma, trabalho que somente se concluiu em 1688.
Não foram fáceis os tempos para os jesuítas na Europa, acabando por expulsos de vários países, e vendo por fim ser extinta a Companhia de Jesus pelo papa Clemente XIV, em 1773. Em Portugal, o campeão do antijesuitismo foi o Marquês de Pombal que determinou a prisão e expulsão dos seus membros em 1759. O colégio de Coimbra foi encerrado e a igreja ficou abandonada. Só em 1772, estando o Marquês de Pombal a reformar a universidade, passou uma provisão, cedendo a igreja ao cabido catedralício para sé, com anexos da sacristia e claustro.
Sé Nova capela de S. Tomás de Vila Nova
Algumas alterações foram operadas no edifício para a nova função. A capela de S. Francisco Xavier viu o seu titular ceder o lugar a S. Tomás de Vila Nova, santo levantino muito da devoção dos cónegos, a que havemos de voltar. No nicho central do retábulo colocaram a sua imagem, vinda da Sé Velha, paramentado de pluvial, mitra e báculo.
Sé Nova, imagem de S. Tomás de Vila Nova
A capela é totalmente revestida de talha dourada, solução muito característica do barroco português, ao jeito das igrejas todas de ouro que enchiam de espanto os estrangeiros que nos visitavam. A obra foi contratada pelo entalhador de Lisboa Matias Rodrigues de Carvalho, em 10 de agosto de 1682 e é de excecional qualidade, mesmo a melhor de quantos retábulos desta época há na cidade.
Sé Nova, capela de S. Tomás de Vila Nova colunas
Sé Nova, capela de S. Tomás de Vila Nova colunas, pormenor
O retábulo segue o tipo nacional ou D. Pedro II, com colunas espiraladas, prolongando-se na parte superior em arquivoltas e deixando amplo nicho central. As colunas são revestidas de parras, gavinhas, cachos de uva e aves debicando, de talhe fortemente naturalista.
Sé Nova, capela de S. Tomás de Vila Nova tecto
O tecto é totalmente revestido de caixotões, tendo ao centro um tondo com anjos exibindo uma coroa.
A talha alastra para as paredes laterais, onde se abrem dois nichos afrontados, conservando as imagens de S. Estanislau Kostka e S. Luís Gonzaga, de grande qualidade – obras primas dentro de uma obra prima.
Resumindo: a atual capela de S. Tomás de Vila Nova na Sé de Coimbra é uma destacável obra de arte, uma obra prima que muito enriquece o património artístico da cidade e da diocese.
Nelson Correia Borges
In: Correio de Coimbra, de 2018.10.06
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