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Uma notícia, não assinada, publicada na edição de 19 de dezembro de 2004 do jornal Público, referencia a existência, na cave da antiga livraria Coimbra Editora, de vestígios arqueológicos – um trecho do fosso que integrava o sistema defensivo da cidade, silos árabes entulhados de cerâmicas e de fragmentos de alcatruz cerâmico – que julgamos relevantes para todos quantos se interessam pelas coisas de Coimbra.
A esta notícia acrescem documentos que nos foram disponibilizados que referem a realização em 2004, de uma reunião nos Paços do Concelho que teve por objetivo «aferir/otimizar a melhor solução para o fosso», na qual foi autorizado «um corte de 0,80m paralelo à parede sul, ao nível da cave» e, ainda, «um rebaixamento do coroamento do fosso no máximo de 0,34m».
“Acordo/autorização” que permitiu que os vestígios então encontrados sumissem parcialmente e os que restavam fossem seriamente mutilados.
Vestígios mutilados que a Livraria em ordem aos quais a Livraria Coimbra Editora. Ld.ª criou condições mínimas para a sua visualização.
Porta da Barbacã e fachada lateral do prédio, ainda com letreiro da Coimbra Editora. Imagem acedida em: https://www.bing.com/images/search?view=detailV2&mediaurl=https …
Logotipo da Coimbra Editora, colocado na frontaria das suas antigas instalações, na Rua do Arnado. Imagem acedida em: https://observador.pt/2020/09/22/coimbra-editora-cessa-atividade-ate-ao-fim-do-mes/
À declaração, no final de 2015, da insolvência da Coimbra Editora. Ld.ª, seguiu-se a compra do imóvel pela empresa Gomes & Góis, Ourives e Joalheiros que continuou a facilitar a visualização do que restava das descobertas feitas.
Porta da Barbacã e fachada lateral do prédio, com letreiro da empresa Gomes & Góis. Imagem acedida em: https://www.bing.com/images/search?view=detailV2&mediaurl=https
Recentemente, o imóvel voltou a ser vendido agora, segundo parece, a uma empresa estrangeira da área da restauração. Atualmente o edifício está encerrado, não sendo conhecidas informações seguras quanto a futura utilização do mesmo.
Os factos referidos, levaram-nos a refletir sobre o assunto e a voltar a uma questão que, desde há longos anos, tenho procurado interessar Coimbra, a qual resumo colocando as seguintes interrogações.
Será que Coimbra não merece um núcleo museológico dotado das condições técnicas de exposição hoje disponíveis, destinado a dar a conhecer a história milenar da urbe?
Será que o edifício onde durante tantos anos esteve instalada a Livraria Coimbra Editora e que possui ainda, no seu subsolo, alguns vestígios arqueológicos ligados aos primórdios longínquos da existência do burgo não seria o local mais adequado para nele se instalar esse núcleo?
Será que a civitas irá assistir sem um arrepio a que, dos vestígios arqueológicos ali descobertos, nada mais reste do que um conjunto de documentos esquecidos nos arquivos?
Será que interessa a Coimbra que, num local tão nobre, seja dada prioridade à abertura de mais uma venda de pizas ou de “artesanato”?
É para esta reflexão que convoco todos os que amam Coimbra.
Texto do artigo
Livraria Coimbra Editora. Instituto Português de Arqueologia e o Instituto Português de Património Arquitetónico tem opiniões distintas quanto à conservação do achado.
A remodelação da Livraria Coimbra Editora, implantada junto à Cerca e Portas de Almedina, em Coimbra, desvendou importantes tesouros do passado, mas um achado inédito – um fosso do sistema defensivo da cidade – ... Presumivelmente do período medieval, essa vala escavada na rocha, que ainda conserva uma profundidade de cerca de dois metros e meio, é um achado único em Coimbra. Embora apareça vagamente referenciada em documentos antigos, nunca tinha sido encontrada.
Para o IPA, sendo o fosso parte integrante do sistema defensivo de Coimbra, e encontrando-se este classificado como monumento nacional desde 1910, através da Cerca e das Portas de Almedina, deverá ser preservado e musealizado.
Mas o IPPAR, que tutela os monumentos nacionais, a 12 de novembro último deu parecer favorável à reformulação do projeto de arquitetura do dono do imóvel, autorizando o “desmonte de um trecho do fosso, salvaguardando o princípio da conservação pelo registo cientifico” … na prática, isso consistiria na destruição de uma parte significativa deste troço de fosso com a colocação no piso da cave de uma espécie de tampa amovível para que uma pequena parte pudesse ser observada...
Tesouros do passado
Além do troço do fosso, as obras de remodelação da livraria desvendaram no subsolo da cave outros tesouros do passado, considerados de grande importância para o conhecimento da ocupação da cidade de Coimbra.
“Naquela cave conseguimos percorrer a história de Coimbra, desde o século VIII até à atualidade”, comentou Costa Santos. Aí foram descobertos antigos silos árabes entulhados com cerâmicas e moedas de várias épocas, e ainda fragmentos de alcatruz cerâmico que cronistas norte-africanos diziam existir no vale do rio Mondego.
Várias peças cerâmicas de uso doméstico, algumas delas do período árabe, foram recolhidas quase intactas, e os arqueólogos admitem que ainda será possível a reconstituição de outras através da colagem de fragmentos. Três dos quatro silos foram destruídos durante as obras, após o seu registo científico … O silo conservado, semi-incrustado numa parede do edifício, será futuramente convertido em suporte expositivo da livraria. Igualmente a parte de uma das torres das portas da cidade aí descoberta, que Costa Santos julga datadas do século XIII ou XIV, ficará visível aos utentes da livraria, em consequência das adaptações ao projeto original de remodelação.
Publico, jornal. 2004. Achados Arqueológicos em Livraria Opõem Entidades em Coimbra. Texto acedido em: http://jornal.publico/2004/12/19/LocalCentro/LC03.html
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