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A' Cerca de Coimbra



Terça-feira, 30.07.24

Coimbra: Mosteiro de Santa Ana, tratamento das doentes 2

Como sabemos, nos conventos, era comum a confeção de doces e bolos, destinados ao uso da comunidade, em alturas festivas e como forma de rendimento, ou seja, para venda.  … Do convento de Santa Ana registámos o fabrico de algumas iguarias: as amêndoas, o arroz doce, o arroz de leite, a aletria, o bolo de São Nicolau, os bolos de Natal, as famosas arrufadas, os também afamados “bolos de Sant’Anna”, os sonhos, a marmelada, os doces de pêssego, de ameixa, de pera e de chila.

CSA. Arrufada1.jpgArrufadas de Coimbra. Imagem acedida em: https://amodadoflavio.pt/2017/07/doce-tradicional

Na botica de Santa Ana, questionamo-nos sobre o motivo pelo qual despenderam valores tão elevados no doce de chila. Se nos fundamentarmos no seu valor nutritivo, a chila apresenta um alto conteúdo em vitamina C. às suas propriedades nutritivas é necessário acrescentar o seu alto conteúdo em fibras, em água e em potássio e baixo conteúdo em sódio, pelo que o seu consumo é recomendável no caso da retenção de líquidos, transtornos renais, cardiovasculares ou hipertensão arterial. Na época em que situamos o nosso estudo, sabemos que no hospital de Caminha, o doce de chila era dado a doentes que sofriam de gastro-hepatite e tísica pulmonar.

No grupo dos alimentos mais utilizados temos também o leite, frequentemente de burra, ficando em terceiro lugar na hierarquia das despesas, com um total de 11.520 reis

… O leite e, particularmente, o de burra, pelo seu alto valor nutritivo, era ministrado a pessoas debilitadas. Ao possuir uma consistência espessa e açucarada era aplicado em pomadas para feridas e doenças de pele, revelando-se um excelente cicatrizante. Entrava também na composição de soros para medicamentos, utilizado em moléstias crónicas do peito, do intestino, na gota e nas epilepsias.

“O leite, na altura, representava ainda um dos produtos mais unanimemente recomendado para os tísicos (tuberculosos), havendo na comunidade de físicos do tempo a crença que o seu soro mundifica as chagas do pulmão”.

Mas não era só para tratar a tuberculose que o leite de burra era quase obrigatório. Era-o também para uma série de outras enfermidades, como distúrbios gástricos, “pela sua facilidade de digestão, nas cistites, por amenizar a dor durante a micção, nas dores intestinais, por facilitar a cicatrização de fissuras do intestino, nas febres, porque refrescava, mas também na paralisia, nos espasmos ou no catarro”.

… Mas as terapêuticas mais usadas no convento de Santa Ana eram, indubitavelmente, feitas através das sanguessugas, também designadas pelas religiosas por bichas ou bissas.

CSA. Sanguessuga.jfif“Bissas” ou sanguessugas. Imagem acedida em:https://www.bing.com/images/search?view=detailV2&ccid=5718OTKw&id

.… A ideia corrente era a de que este verme extraía o sangue que tinha toxinas ou elementos deteriorados, que se acumulavam nos vasos sanguíneos e nos músculos enrijecidos, causando doença. Outra função prendia-se com os casos de gangrena, visto que a sua função sugadora forçava o sangue a circular, ajudando a manter as células vivas. O recurso a sanguessugas também era utilizado para a cura da pleurisia e da sífilis.

CSA. Prática da sangria.jpgPrática da sangria. Imagem acedida em: https://www.medicina.ulisboa.pt/newsfmul-artigo/115/tratamentos-medicos-aplicados-ao-longo-da-historia

A sangria era uma técnica muitíssimo usada nos séculos, XVII, XVII e XIX. Consistia na abertura de uma veia com uma lanceta, para deixar sair o sangue “causador de moléstia” e era aplicada, geralmente, quando ocorria uma inflamação seguida de febre. Mas esta não era a única forma de sangrar o doente, já que nos casos em que houvesse dificuldades para encontrar uma veia ou o estado do paciente fosse demasiado debilitado, eram usadas as sanguessugas.

… Será igualmente de relevar a utilização de açúcar para remédios que no Convento de Santa Ana nos aparece em terceiro lugar no total das despesas, ou seja 7.592 reis. Nestes casos, o que a escrivã regista é muito claro: “Despendi 6 arrateis de açucar para remédios 780 reis”, ou “Despendi em 8 arrateis de açucar para remédios 1000 reis”, em 186058. Portanto, não há qualquer dúvida que seria consumo de botica.

…. O açúcar, a marmelada, o mel eram usados particularmente na confeção de medicamentos. “O açúcar chegou a ser considerado, no século XVII, uma especiaria de luxo e só após o incremento do seu cultivo na América do Sul é que passou a ser acessível a todas as classes sociais; na alimentação veio substituir o mel e na medicina era tido já por Galeno como elemento essencial da farmacopeia”. Nos registos de boticas, encontram-se referências a açúcar rosado, levado “em ponto” com pétalas de rosas. Era recomendado especialmente para diarreias e disenterias, mas também para problemas respiratórios.

 Sousa, D. Comer e curar no Convento de Santa Ana de Coimbra (1859 a 1871). Texto acedido em: https://www.academia.edu/116755957/Comer_e_curar_no_Convento_de_Santa_Ana_de_Coimbra_1859_a_1871_?email_work_card=title

 

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por Rodrigues Costa às 11:08

Sexta-feira, 26.07.24

Coimbra: Mosteiro de Santa Ana, Tratamento das doentes 1

Não sabemos, ao pormenor, como estava regulamentada a dieta das doentes de Santa Ana, mas nela estava incluída a carne de galinha.

… Este consumo de galinha contrapõe, à partida, o que se comia no quotidiano desta comunidade. Encontramos significativos valores na aquisição de carne de vaca, porém nunca de galinha. Existe, aliás, um rol mensal destinado exclusivamente à carne de vaca, com uma despesa mensal que ronda os 20.000 réis.

CSA. Comer e curar. Op. cit. pg. 224.jpgAUC, Livro de Receitas e Despesas do convento de Santa Ana 1859 – 1871, doc. 46. Op. cit., pg. 224

 Que comiam em Santa Ana para além da carne de vaca? Algumas vezes referem despesa com a matança do porco e aquisição de tripas para os enchidos (“shorissos”). Surgem com alguma frequência despesas em lombo e pastéis de carne.

São, ainda, frequentes as despesas com bacalhau e com peixe fresco, embora sem mencionarem qual a espécie. O seu consumo surge, habitualmente, nos períodos de abstinência de carne ligados à Quaresma, em particular nos meses de Março ou Abril. Veja-se, por exemplo, que em Santa Ana, em abril de 1866, despenderam em peixe “que se deo na Coresma três vezes e em letria 5ª feira Santa 4.120 reis”. De igual modo, em Março de 1867, despenderam em bacalhau e arroz para as conçoadas da Coresma 2.000 reis”, “em peiche 3 vezes que se da na Coresma e letria e castanhas 9.470 reis”.

Embora não saibamos qual o peixe que compravam, percebemos que este alimento não seria, de todo, desvalorizado em relação à carne, dado que, com frequência, era manjar de festa, como aconteceu em Abril de 1862, “Despendi em peixe de Domingo da Festa dos Passos 1.060 reis”; Em Março de 1863 “Despendi em peixe pelo Banquete 1.615 reis”. Despenderam, novamente, em peixe pelos Passos 1.715 reis”.

Complementando o quotidiano alimentar, encontramos também o arroz, as batatas, as castanhas, os figos, o queijo, a manteiga, o leite, o azeite (usado também na iluminação), o trigo (não só para o pão, mas também para bolos, havendo às vezes preferência pelo trigo galego para as arrufadas), o vinho, o chá e a cidra.

CSA 8.jpgPlanta do Convento de Sant’Ana e respetiva cerca… 1873-74. In: «Sant’Ana. Três séculos de convento, um século de quartel», pg. 61.

CSA 2.6.jpgPlanta do edifício e terrenos confinantes, 1905, DSE – 6845 – 1.º-5-64-73 In: «Sant’Ana. Três séculos de convento, um século de quartel», pg. 103.

Para o cultivo do terreno que lhe restou junto à cerca, após a extinção das Ordens Religiosas, arrolam detalhadamente as despesas com os trabalhos agrícolas ligados às vindimas (incluindo fabrico da aguardente), ao ciclo do milho, enxertia de árvores de fruta como limoeiros e laranjeiras, aos cortiços para as abelhas, à sementeira de alhos, feijões, grão-de-bico, cebolas, repolhos, favas, entre outros.

Porém, a aquisição de galinhas jamais é registada, a não ser nas Despesas da Botica. Estamos já num período de decadência, pelo que já não as recebiam através dos foros, como outrora acontecia. Poderiam criar algumas em galinheiros existentes nos seus terrenos junto à cerca, mas seriam talvez insuficientes, tendo o desvelo de as comprar para as doentes. Por sua vez, o seu preço comparado com outros produtos, era elevado: o valor despendido na aquisição de tripas, vinho, sal e meio porco, para enchidos, importava em 1.200 reis; um lombo para o Procurador 1.100 reis, ao passo que 4 galinhas custavam 1.400 reis.

… Os elementos de que dispomos também não nos dão informação de como seria confecionada a galinha na botica de Santa Ana. Porém, no contexto da dieta alimentar de alguns hospitais de então, regista-se que a carne de galinha era servida cozida, assada ou usada na preparação de caldos.

… Mas a presença de sobremesas ou da doçaria na dieta alimentar hospitalar desta época era comum e o convento de Santa Ana não foi exceção. No período em que nos situamos, a despesa com doce de chila e outros doces (que não se identificam), atinge um valor considerável, só comparável com os gastos em sanguessugas e bichas. Aliás, é com estes dois itens que gastam mais dinheiro: com sanguessugas e bichas 36.980 reis; com doce de chila e doces 36.910 reis.

Este consumo significativo de doces poderá ser entendido mediante duas perspetivas: uma forma de agraciar o médico; aquisição ou confeção de produtos que, por sua vez, o médico ministrava às doentes.

 Sousa, D. Comer e curar no Convento de Santa Ana de Coimbra (1859 a 1871). Texto acedido em:

https://www.academia.edu/116755957/Comer_e_curar_no_Convento_de_Santa_Ana_de_Coimbra_1859_a_1871_?email_work_card=title

 

 

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por Rodrigues Costa às 12:02

Quarta-feira, 24.07.24

Coimbra: Convento de Santa Ana, a enfermaria e a botica  

Ao debruçarmo-nos sobre o papel da enfermaria e da botica de Santa Ana, acreditamos estar perante uma comunidade que manifestou um especial cuidado e desvelo para com as doentes.

Enquanto professas da Ordem de Santo Agostinho, a Prioresa tinha uma responsabilidade especial sobre as que se declaravam doentes, em relação às quais lhe competia garantir um trato apropriado e prover adequadamente as suas necessidades. Competia-lhe nomear uma freira acompanhante ou uma enfermeira, sempre que a doença assumia maiores proporções, impedindo a freira afetada de continuar a fazer a sua vida religiosa normal. Tais eram os casos descritos nas constituições “…das febres tercãs ou quartãs, dobres ou sigelas, contínuas ou quotidianas ou intermitentes”.

Ainda no exercício das obrigações da Prioresa, “em relação aos doentes, cabia-lhe solicitar o conselho de médicos e cirurgiões, sempre que se revelasse necessário, e preparar um local para enfermaria que devia visitar com frequência”.

Neste cenário vamos encontrar médicos, cirurgiões e boticários a praticarem a arte de curar, seguindo os princípios médicos e farmacêuticos em constante atualização científica pois, como é óbvio, também nos mosteiros se refletem os progressos que, ao longo dos séculos, foram acontecendo na medicina e na farmácia.

 

CSA 4.jpgFachada Norte inicial, 1905, DSE. In: «Sant’Ana. Três séculos de convento, um século de quartel», pg. 65

Porém, em dezembro do ano seguinte já referem que “despendi em bissas para a Madre Boticária 969 reis”.

Em abril de 1861, voltam a registar que despenderam “em galinhas para a Boticária 1.600 reis”. Ou seja, inicialmente seria uma figura masculina, talvez exterior à comunidade a exercer esta função, depois passa a ser uma religiosa que assume esse papel. Surge-nos também a figura da criada e da servente da botica, com um pagamento mensal de 1.200 reis, assim como da lavadeira da botica que recebia 480 reis.

Refira-se uma interessante particularidade: em agosto de 1864 mencionam “despendido na paga de hua Soregiãe 480 reis”. Perante este registo, deduzimos que apesar de terem em permanência ao seu serviço um cirurgião a quem pagavam mensalmente 8.000 reis, por algum motivo que desconhecemos, recorreram ao serviço de uma mulher que já desempenhava essa tarefa. Algo pouco comum nesta época.

CSA 2.5.jpgPlanta do rés-do-chão das hospedarias. In: «Sant’Ana. Três séculos de convento, um século de quartel», pg.63.

 Sobre a botica de Santa Ana, para além da sua localização espacial, não encontrámos descrições que nos permitissem reconstituir com pormenores a sua configuração, os seus utensílios ou alfaias … Porém, em agosto de 1864, a escrivã da botica de Santa Ana regista a aquisição de um precioso utensílio: “Despendido com hua comadre para as doentes 600 reis”. As comadres de estanho eram recipientes onde se colocava água quente, utilizados para aquecer a cama das pacientes. Era um recipiente muito comum no quadro hospitalar.

Não sendo claros os registos documentais sobre as doenças das religiosas de Santa Ana, sobre as terapêuticas aplicadas e sobre a alimentação que lhes era ministrada, sabemos, com alguma regularidade, a quem se destinavam os produtos terapêuticos, pois aqueles referem os nomes das pacientes.

Estas eram assistidas na enfermaria, espaço que se situava em local arejado e ensolarado, afastado do núcleo principal das construções devido ao perigo das infeções e contágio e, ainda, à necessidade do sossego necessário às freiras doentes, que recebiam alimentação e cuidados diferentes das outras.

De acordo com o Inventário do Arquivo dos Próprios Nacionais do Distrito de Coimbra de 1857, Santa Ana tinha no andar térreo a “caza da botica”, bem perto da cozinha e no primeiro andar “hum dormitório grande que corre do norte ao sul, abrange em cumprimento ambos os clautros e tem quatro centos e sincoenta palmos com vinte e seis celas e outras tantas janellas”. Faz-se alusão a mais outros dormitórios do poente para nascente composto por mais vinte e duas celas. Uma casa de noviciado com cinco celas e regista-se que “tem sento e noventa e três palmos de comprido, por dezoito de largura”, e que “tem uma boa caza de enfermaria”.

Sousa, D. Comer e curar no Convento de Santa Ana de Coimbra (1859 a 1871). Texto acedido em: 

https://www.academia.edu/116755957/Comer_e_curar_no_Convento_de_Santa_Ana_de_Coimbra_1859_a_1871_?email_work_card=title

 

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por Rodrigues Costa às 20:02

Quinta-feira, 18.07.24

Coimbra: Convento de Santa Ana

Com a série de cinco entradas que hoje iniciamos chamamos a atenção dos leitores para o trabalho de investigação intitulado Comer e curar no Convento de Santa Ana de Coimbra (1859 a 1871), da autoria da Dr.ª Dina de Sousa.

O Convento de Santa Ana

O primitivo convento situava-se na margem esquerda do Mondego, próximo de um local vulgarmente designado por “Ó da Ponte”. Então conhecido por “Cellas da Ponte”, teve como grande impulsionadora D. Joana Pais, devota de Santa Ana, que fundou o convento numas casas e respetiva quinta que recebera por doação de seus pais, tendo sido aí colocada a primeira pedra a 26 de Julho no ano de 1174, precisamente no dia consagrado a Santa Ana. Devido aos seus parcos recursos, o convento ficou dependente dos bispos de Coimbra, que o sustentavam através das suas esmolas.

Um século após a edificação do convento, “(...) por causa das cheias do Rio Mondego com as quais o dito Convento estava devastado e as ditas freiras por muitas vezes estiveram em perigo de vida”, tornou-se insustentável a continuidade da comunidade naquele espaço.

CSA. Coimbra, gravura de Hofnageal, 1583. Pormenor

Coimbra no final do sec. XVI, ruínas das “Cellas da Ponte”. Pormenor da gravura de Coimbra, de Hoefnagel

 No “anno de 1561, em que as sucessoras de D. Joanna viram não poder elle continuar a ser habitado”, recorreram ao bispo D. João Soares, tendo-lhes sido feita doação da Quinta de S. Martinho para nela se recolherem, até ser construído um novo edifício.

CSA 2.jpg

Quinta de S. Martinho (Vestígios do Convento). In: «Sant’Ana. Três séculos de convento, um século de quartel», pg. 20.

Este seria mandado edificar pelo bispo–conde D. Afonso de Castelo Branco, situado no local outrora conhecido por Eira das Patas, numa colina fronteira à cerca de São Bento e ao aqueduto. O seu domínio estendia-se até ao atual Penedo da Saudade. A 13 de Fevereiro de 1610, as religiosas ingressam no novo convento de Santa Ana, passando a usar o hábito das Eremitas de Santo Agostinho.

Refira-se que esta comunidade acolheu a jovem Josefa de Óbidos. Além dos ensinamentos religiosos, ali recebeu aulas de pintura. Assim, foi nesta cidade que Josefa começou a pintar, pois, parece que a sua obra mais antiga data de 1644, uma série de gravuras de Santa Catarina e São José. Como não seguiu a vida religiosa regressou a Óbidos, em 1653, trabalhando para conventos e igrejas. Mais tarde, foi convidada pela família Real, para fazer os retratos da rainha D. Maria Francisca de Saboia e da sua filha, a infanta D. Isabel.

CSA. Josefa de Óbidos.jpgJosefa de Óbidos. Santa M aria Madalena.1650. Museu Nacional de Machado de Castro. Imagem acedida em:https://www.wikiart.org/pt/josefa-de-obidos/santa-maria-madalena-1650

CSA. Josefa de Óbidos. A Anunciação.jpg

Josefa de Óbidos, A Anunciação, 1676. Imagem acedida em: https://ilustracaoportugueza.wordpress.com/2016/08/15/josefa-de-obidos-a-anunciacao-1676/

Tal como aconteceu em outros espaços monásticos, em 1810, as religiosas perderam muitos dos seus bens, devido às Invasões Francesas. Poucos anos depois, as guerras liberais vieram agravar a sua frágil situação económica, no contexto da extinção das ordens religiosas masculinas, em 1834. Assim, as ordens femininas ficaram proibidas de receber noviças, pelo que se regista um envelhecimento da comunidade, necessitando de mais cuidados.

O convento é considerado extinto a 6 de Junho de 1885, altura em que a última prelada, D. Maria José de Carvalho, de idade já avançada, e desprovida de bens económicos, abandona Santa Ana, juntamente com mais algumas idosas que com ela viviam, na sua maioria criadas e encostadas. Consigo levou apenas alguns objetos como recordação de um espaço no qual entrara quando tinha sete anos de idade. A sua mudança dá-se para o Real Colégio Ursulino das Chagas, instalado no extinto Colégio de S. José dos Marianos.

CSA. Colégio de S. José dos Marianos.jpegColégio de S. José dos Marianos, atual Hospital Militar

O edifício conventual patenteia uma arquitetura modesta, bem ao espírito dos Eremitas de Santo Agostinho, valorizando a sua fachada dois pórticos que, entretanto, foram retirados e que hoje estão, respetivamente, na Igreja de S. João de Almedina

CSA. Igreja de S. João de Almedina, portal.jpg

Pórtico do Convento de Santa Ana, aplicado na Igreja de S. João de Almedina. Imagem acedida em: https://www.bing.com/images/search?view=detailV2&mediaurl=https%3A%2F%2Fimages...

 e na fachada do Museu Machado de Castro.

CSA. MNMC, portal.jpgPórtico do Convento de Santa Ana, aplicado na entrada do Museu Nacional Machado de Castro. Imagem acedida em: https://www.bing.com/images/search?view=detailV2&mediaurl=https

De estrutura quadrangular, desenvolvida em torno de dois claustros e de dois pátios internos, na sua primitiva construção, no piso térreo encontrava-se a entrada para a Igreja e para o pátio das hospedarias, a roda e as grades, o refeitório, a cozinha e a casa da botica. Existiam outras dependências: casas para criados, celeiro, forno, duas arrecadações e a cerca amuralhada que abrangia a entrada do Penedo da Saudade.

No primeiro andar situavam-se os dormitórios, a casa do noviciado e as enfermarias.

Sousa, D. Comer e curar no Convento de Santa Ana de Coimbra (1859 a 1871). Texto acedido em: https://www.academia.edu/116755957/Comer_e_curar_no_Convento_de_Santa_Ana_de_Coimbra_1859_a_1871_?email_work_card=title

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por Rodrigues Costa às 17:19

Terça-feira, 16.07.24

Coimbra: Livro de receitas esquecido

Um meu antigo Colega, na minha opinião, um dos maiores gastrónomos portugueses, tem dedicado o seu labor à pesquisa documental sobre receitas portuguesas, quer em livros portugueses, quer em livros editados no estrangeiro.

Presenteou-nos agora com uma esquecida edição de origem coimbrã, datada de 1899, que tinha a particularidade de, para além das páginas impressas, dispor de páginas em branco, nas quais podiam ser registadas outras receitas.

O texto e as imagens, ora divulgadas por Virgílio Nogueiro Gomes – a quem agradeço a autorização para a sua utilização – foram recolhidas em http://www.virgiliogomes.com/index.php/cronicas/1150-receitas-unicas.

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Cosinha Portugueza ou Arte Culinária, capa

Tenho um verdadeiro entusiasmo por livros antigos. E, por vezes, encontro verdadeiras relíquias. Recentemente publiquei uma crónica sobre um livro dos inícios do século XX e no qual, nas páginas em branco, a proprietária do livro escreveu, adicionou, receitas pessoais. Se quiser ler ou reler, pode clicar aqui.

Hoje vou escrever sobre receitas manuscritas nos espaços livres do último livro publicado no século XIX: Cosinha Portugueza ou Arte Culinaria Nacional, publicado em Coimbra na Imprensa Académica em 1899. A sua autoria é da “Collaboração de senhoras”, ficando o livro como propriedade do Instituto de Santo António, sediado na “egreja de Santo Antonio do Olivaes”, e a sua venda revertia para as obras assistenciais daquele instituto. As receitas que irei transcrever são apresentadas pela ordem como aparecem no livro, sem correções, e, portanto, transcrição literal.

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VG, imagem 3.jpg Carne afiambrada

A ½ kilo de carne que se passa pela machina, junta-se lhe 3 bolachas de água e sal também passadas pela machina. Depois amassa-se a carne com vinho branco, pimenta, sal, e nos muscada. Estende-se um pano com três nastros nas extremidades, depois deitar lhe a carne batendo se com a mão e juntando-a até ficar bem unida. Tem-se partidas tiras de toucinho e chouriça que se lhe introduzem, calcando bem. Depois enrola-se a carne deforma a não se ver o toucinho nem a chouriça, depois envolve-se nos panos e aperta-se bem com os nastros. Em seguida mette-se na panella do caldo supra antes da hortaliça, onde deve ferver por espaço de meia hora. Tira-se e só no dia seguinte é que se tira o pano. Parte-se às tiras e serve-se.

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Doce de noz

Bate-se ½ kilo de assucar com 4 claras de ovos, por espaço de 1 hora, depois de bem batido junta-se-lhe ½ kilo de nozes que também devem estar pisadas, e deita-se-lhe uma colher de farinha. Depois de tudo bem misturado, deitam-se com uma colher em latas para irem ao forno.”

VG, imagem 5.jpgCoscoreis de massa tenra

Amassa-se ½ arrátel de farinha com uma chávena de leite e 2 onças de manteiga, depois de tudo muito bem amassado, estende-se com um rodo, de forma que fique muito fina. Depois de estendida dobra-se aos bocadinhos cortando-se com uma faca, e fritam-se em bastante azeite.”

Nota: arrátel; +- 459g; onça +- 23,5g

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Batatas cosidas à Italiana

Arranja-se primeiro que tudo uma caçarola de porcelana, que se pode comprarem Lisboa ou no Porto e não querendo manda-a vir d’aquellas duas cidades, pode -se tambem comprar cá; Depois manda-se buscar um cantaro de água de S.to André ou à Torna (?), tanto dá, mas deve-se dar a quem a fôr buscar um tostão em níkel. Em se tendo a agua e a caçarola manda-se vir de viveiro 20 reis de sal, mas este deve vir em cambraia especial para não chegar mais salgadito. Deita-se a agua na caçarola, junta-se-lhe sal e põe-se ao lume até ferver a agua. Depois tira-se do lume e em a agua estando fria deitam-se-lhe as batatas e ficam cosidas. Sevem-se com a casca.

Guarda? 18-2-903”, Receita de Cesar Raul

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“Bolla parda”

Batem-se 5 ovos inteiros com 250gr de assucar até engrossar. Depois de batido junta-se lhe a farinha que deve ter o peso de 3 ovos um calice de vinho do Porto, e 20 XX de canella.

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“Lindins”

250g de assucar, 12 gemmas, 1 calice de vinho do Porto, 2 colheres de leite, 1 colher de farinha maisaine e 1 de manteiga. Depois do assucar estar em ponto, junta-se-lhe o vinho e a manteiga, depois de frio junta-se-lhe o leite em seguida os ovos já batidos e misturados com a farinha. As latinhas devem ser untadas com manteiga.”

Como podem ver as receitas nem sempre parecem completas, em especial a das “Batatas cosidas à Italiana”, pois parece que na parte final falta algum detalhe. No entanto, estas receitas deveriam ser de prática familiar e, portanto, de boas confeções e aprovadas pelas famílias. Não há como experimentar, e provar!

© Virgílio Nogueiro Gomes

Gomes, V.N. Texto sobre o livro Cosinha Portugueza ou Arte Culinária. 1899.Coimbra, Imprensa Académica, publicado e: http://www.virgiliogomes.com/index.php/cronicas/1150-receitas-unicas

 

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por Rodrigues Costa às 11:18

Quinta-feira, 11.07.24

Coimbra: Volta de S. João, em Cernache 2

Com esta entrada concluímos a revisitação de um artigo do Professor Doutor Nelson Correia Borges, dedicado a uma tradição popular – a Volta de S. João – que tinha lugar na freguesia de Cernache e que, infelizmente, voltou a ser esquecida.

 A «Volta compõe-se de um grupo a cavalo e outro apeado. O grupo a cavalo é constituído por homens que montam cavalos ou éguas. de jaezes enfeitados com fitas ou flores de papel de cores garridas. Um destes cavaleiros é o porta-bandeira e segue no melo dos outros que se dispõem em duas filas de um e outro lado. Os restantes empunham lanças de madeira enfeitadas com duas fitas de seda, em reminiscência das primitivas cavalhadas. Estas fitas, nas cores verde e rosa, eram, no final, oferecidas às pessoas amigas.

No início deste século o trajo dos cavaleiros era formado por botas com polainas ou botas de cano alto, com esporas; calça preta, lisa ou de casimira às riscas, com fivela atrás; camisa branca de linho ou popelina. com peitilho e colarinho simples, sem vira; cinta azul com riscas finas transversais vermelhas e amarelas, de pontas franjadas, enrolada aberta, deixando pender uma ponta ao lado esquerdo; colete simples, ou com pequenina gola na parte da frente, de tecido geralmente igual ao das calças, com costas de riscado de cores vivas; chapéu preto de feltro, de aba larga, ou carapuça.

À frente dos cavaleiros seguia o grupo apeado, constituído por mulheres (as «mulheres da Volta»), igualmente dispostas em duas alas.

O trajo feminino utilizado na mesma época era também multo característico.

Sobre duas ou três saias brancas a mulher vestia uma sala preta de armur ou outro tecido, ou até de chita estampada; a saia atava à altura da anca com uma cinta de tecido de lã nas cores azul ou vermelha, formando grande laço atrás. O chambre era do tipo usual na região, em tecido de algodão liso, com lavrados ou estampados, em cores que podiam ir do rosa ao azul claro, com predomínio do branco; continha um forro interior que só na parte das costas era costurado conjuntamente com o tecido exterior, ficando a parte da frente a formar um corpete apertado sob o tecido solto de fora; muito justo ao pescoço, formava um espelho sobre o peito, enfeitado com rendas, espiguilhos ou favos; as mangas apertavam no pulso com elástico ou botão, colocado de modo a formar um folho rematado com renda, mas habitualmente usavam-nas puxadas até ao cotovelo. Este tipo de chambre, de corte rebuscado para fazer realçar as linhas do corpo, vestia muito justo nas costas e algo folgado à frente, conferindo grande elegância a quem o usava. Por cima da saia levavam ainda um avental de zampa ou outro tecido de algodão de cor clara – as preferências iam para o rosa, o azul e o branco – com terminação arredondada ou em bico, bordado com raminhos e flores. Nos pés calçavam chinelas, que multas vezes levavam na mão para poderem caminhar mais desembaraçadamente. A cabeça era coberta com o cachené de ramagens, atado sob a nuca, a deixar cair uma das pontas sobre o peito. Restam ainda dois complementos indispensáveis a este trajo: o xaile «chinês», ou de quadradinhos pretos e brancos, de oito pontas, levado à cabeça, cuidadosamente dobrado, e a sombrinha para defesa da ardência dos ralos solares.

VSJ Op.cit., pg. 17.jpgTrajos da VOLTA DO S. JOÁO de cerca do 1900, apresentados na exposição «Coimbra Etnográfica», realizada pelos Serviços Municipais de Cultura e Turismo, em agosto de 1982. Op. cit., pg.17

Hoje em dia os trajos modernizaram-se em muitos aspetos, mas a maioria das pessoas manifesta a vontade de manter a tradição, utilizando algumas peças talhadas «à moda antiga», ou mesmo antigas, de acordo com as possíbilidades e o gosto de cada um.

Juntam-se ao grupo várias pessoas que vão a cumprir promessas, bem como outros homens e mulheres que queiram acompanhar, a pé.

O cortejo organiza-se junto à capela de Vila Nova e inicia a volta, sempre através de carreiros velhos, pela Feteira, onde o povo o recebe com colchas às janelas e lançando flores sobre a bandeira. Passa em frente da capela de Nossa Senhora da Conceição.

Capela da Feteira, Cernache.jpgCapela de Nossa Senhora da Conceição. Fotografia de Zizas Bento, acedida em: Capela da Feteira - Google Maps

Aqui os feteirenses presenteiam os cavaleiros e «mulheres da Volta» com bolachas e bebidas e há pessoas que oferecem fitas à bandeira, em pagamento de promessas.

De Feteira seguem para Pousada, onde dão três voltas à capela de S. Pedro.

Capela de S. Pedro, Pousada, Cenache.jpgPousada, capela de S. Pedro. Imagem acedida em: Rua do Ribeiro - Google Maps 

Renova-se o ritual da oferta de bebidas e bolos e cumprimento de promessas, como aliás, em todos os lugares por onde a «Volta» passa.

Cernache é a próxima etapa, com passagem em frente da capela de S. João Evangelista. De uma janela pende a bandeira do titular da capela, a saudar o cortejo.

Continuam em direção a Vila Pouca, onde entram no adro da capela de` Santo António por uma porta e saem por outra.

Capela de S. António.Vila Pouca.jpgVila Pouca, Capela de` Santo António. Imagem acedida em:  Capela De Santo António - Google Maps

Aqui os cavaleiros dão três corridas pelas ruas do lugar, enquanto as mulheres vão seguindo para a frente, pela velha estrada da Ribeira do Pão Quente, até atravessar a Quinta das Senhoras, no Orelhudo.

Casconha é a última povoação a ser visitada. Noutros tempos mudava o ritual neste lugar: os cavaleiros apeavam-se, à exceção do porta-bandeira e passavam a levar os animais pela arreata. Uma banda de música que os esperava incorporava-se no cortejo e seguiam todos de regresso a Vila Nova.

A missa da festa marca o ponto final da «Volta». As fitas que ornamentaram as lanças eram oferecidas às pessoas amigas ou às namoradas dos cavaleiros solteiros.

Não é única no seu género esta tradição na zona do campo de Cernache, pois assinalam-se manifestações semelhantes em Vila Pouca, em honra de Santo António, e em Cernache, dedicadas a S. João Evangelista que, todavia, se afastaram um pouco do costume tradicional. De facto, trata-se de um acontecimento típico dos festejos dos santos populares de junho e em especial de S. João Batista, o santo de mais rico folclore.

A «Volta do S. João» de Vila Nova de Cernache é uma expressão coletiva rica de sincretismo onde se caldeiam memórias da velha Cavalaria nas lanças e na carga que tem lugar em Vila Pouca e de antiquíssimos rituais pagãos propiciatórios cristianizados, nas três voltas à capela de S. Pedro da Pousada, com outros costumes menos antigos. Na caminhada através dos campos destes romeiros sem romaria, a cavalo e apeados, há como que o perpetuar de ancestrais ritos quase tão velhos como o próprio homem, como que o ecoar de uma ladainha do maio vinda da própria natureza. É a festa de solstício transformada pela igreja para honra de S. João e dos dois outros grandes santos populares de junho.

Nada disto conta, porém, para as gentes de Vila Nova de Cernache que teimam briosamente em não deixar morrer a tradição, numa afirmação da sua identidade como povo.

Borges, N.C. «A Volta de S. João» em Vila nova de Cernache. In. Munda, n.º 5 Maio 1983. Revista do Grupo de Arqueologia e Arte do Centro. Pg. 15 a 18

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por Rodrigues Costa às 10:26

Terça-feira, 09.07.24

Coimbra: Volta de S. João, em Cernache 1

Nesta e na seguinte entrada relembramos um excelente artigo do Professor Doutor Nelson Correia Borges, dedicado a uma tradição popular – a Volta de S. João – que tinha lugar na freguesia de Cernache. Tradição que, infelizmente, entre 1983, data de publicação do artigo na revista Munda, e o presente voltou a ser esquecida.

A tradição é o canteiro onde germinam as sementes dos frutos novos. Neste despertar para a fraternidade como fruto amadurecido da arte de viver, um povo que sabe manter a festa como irmã do trabalho é um povo próximo do futuro.

Numa época voltada para o consumo imediato, como é a que vivemos, em que o automóvel destronou para sempre a diligência, o trator o boizinho pachorrento, a rádio e a televisão alienaram os serões familiares, o motor de tirar água fez parar a nora de alcatruzes gotejantes à beira do rio ou no poço, com o burrico paciente andando à volta horas e horas, e em que a lâmpada elétrica apagou a velha candeia de azeite, o lampião ou o próprio candeeiro de petróleo, causa admiração ver como ainda se pode manter o culto popular de certas velharias que permanecem indiferentes à evolução da vida moderna.

Quando a sobrevivência destas manifestações populares se verifica em aldeias recônditas onde as formas de vivência ainda não foram muito alteradas pelo progresso do presente, o facto poderá ter fácil explicação. Mas, nas imediações dos grandes centros, onde o contacto com as novas ideias e as novas modas de todos os dias é direto e permanente, o caso é de admirar e refletir, evidenciando bem como a prática de certos costumes, fruto de séculos de aculturação, se arreigou profundamente na alma coletiva do nosso povo.

As cavalhadas, que sobrevivem em alguns pontos do país, são um exemplo. Ainda há bem pouco tempo se realizavam na Malveira, às portas de Lisboa e continuam a ter lugar em Vil de Moinhos – Viseu.

Tal é também o caso de Vila Nova de Cernache.

Trata-se de uma pequena povoação, a cerca de 8 quilómetros ao sul de Coimbra, inscrita numa zona agrícola de certa importância que no passado foi um dos principais centros abastecedores do mercado da cidade do Mondego ….  Pois aqui em Vila Nova do Cernache, sobrevivem as cavalhadas sob forma híbrida e transformada, numa manifestação anual de cultura popular a merecer registo e atenção.

Capela de S. Vicente, Vila Nova.jpgVila Nova, Capela de S. Vicente Fotografia de Zizas Bento, acedida em: Capela de S. Vicente - Google Maps

As cavalhadas têm as suas origens na longínqua (e ainda tão próxima...) Idade Média, época em que floresceu a Cavalaria que, com suas justas e torneios lhes serviu de modelo. A Cavalaria, de autêntica lnstituição que era, degenerou para o espetáculo. O povo copiou e parodiou, misturou o sério com o cómico, o profano com o religioso, juntou-lhe reminiscências de lutas entre mouros e cristãos, celebradas nas «mouriscas», fez as mais variadas versões: a corrida ou jogo de argolinhas, jogos de canas, festejos equestres combinados com touradas ou «combates com os infiéis», cortejos de bandeiras, de círios ou alegóricos, etc.

Em Vila Nova de Cernache as cavalhadas são em honra de S. João Baptista,

São João Batista.jpgS. João Batista. Imagem acedida em: https://www.bing.com/images/search?...

seu orago, como aliás em muitas outras terras onde se realizavam, e constituem uma variante da região, isto é, da forma de cortejo de condução da bandeira. Este cortejo podia assumir aspetos que iam desde o carnavalesco, como outrora na Figueira da Foz, ao ar mais compenetrado, como aqui.

Chamam-lhes, expressivamente, a «Volta do S. João».

Não há memória de quando, como ou porquê se deu início a esta tradição, retomada em 1976, depois de mais de três décadas de interregno. Organizada pelos mordomos da festa, tem lugar no dia 24 de junho de manhã e consta fundamentalmente de um cortejo composto por homens e mulheres, envergando trajos típicos e conduzindo a bandeira de S. João que se encontra na capelinha da aldeia. A «Volta, para além de ser uma expressão da religiosidade popular, tem o sabor de uma visita de cortesia às capelas e povoações limítrofes.

Borges, N.C. «A Volta de S. João» em Vila nova de Cernache. In. Munda, n.º 5 Maio 1983. Revista do Grupo de Arqueologia e Arte do Centro. Pg. 15 a 18

 

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por Rodrigues Costa às 19:05

Sexta-feira, 05.07.24

Conversas Abertas: Bio-Reserva Senhora da Alegria

É já de hoje a uma semana, na 6.ª feira, dia 12 de julho, às 18h00 que na sala D. João III, do Arquivo da Universidade de Coimbra, irão chegar ao fim as Conversas Abertas 2024.

O tema a abordar será uma, ainda pouco conhecida, preciosidade do concelho de Coimbra. Trata-se da Bio-Reserva da Senhora da Alegria, localizada na freguesia de Almalaguês, numa encosta virada a norte entre aquele lugar e Rio de Galinhas.

Bio Reserva da Senhora da Alegria, Coimbra 2.jpgBio-Reserva Senhora da Alegria. Imagem acedida em https://www.theuniplanet.com/2020/02/bio-reserva-senhora-da-alegria-reserva-que-nasceu-da-juncao-de-um-grupo-de-amigos/

A um local de grande beleza paisagística, acrescem o interesse do ponto de vista geológico, a biodiversidade aí existente e um vasto património cultural.

Bio Reserva da Senhora da Alegria, Coimbra 1.jpgBio-Reserva Senhora da Alegria. Imagem acedida em https://www.theuniplanet.com/2020/02/bio-reserva-senhora-da-alegria-reserva-que-nasceu-da-juncao-de-um-grupo-de-amigos/

Os palestrantes, membros da ONGA Milvoz, serão Pedro Gomes e Margarida Portela.

CA, 12.07.2024, folha de sala.jpg

Conversa Aberta de 12 de junho de 2024. Folha de sala

Como é usual, após a apresentação seguir-se-á um período de debate, aberto a todos os participantes.

Pedimos a ajuda de todos na divulgação deste evento.

Rodrigues Costa

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por Rodrigues Costa às 11:58

Quinta-feira, 04.07.24

Coimbra: Locomotiva Coimbra

A locomotiva à qual veio a ser atribuído em Portugal, o nome de Coimbra e o número 10, foi construída em 1855, por uma empresa alemã criada por Georg Egestorff em 1835, da qual foi a obra número 83.

Locomotiva semelhante à Coimbra. Extraída de DieImagem de uma locomotiva semelhante à locomotiva Coimbra, extraída do livro “Die Entwicklung der Lokomotive”.

A empresa construtora era inicialmente designada por Eisen-und Maschinenfabrik Giesserei Hannover, e foi criada tendo em vista a construção de motores a vapor de pequeno porte, utilizados em máquinas agrícolas.

A partir de 1846 dedicou-se à construção de locomotivas para os caminhos de ferro do Estado de Hannover. Em 1870 já tinha capacidade para produzir e vender 500 locomotivas e, em 1871, mudou o seu nome para Hannoversche Maschinenbau AG, o qual ainda hoje é mantido, tendo a empresa se especializado na construção de veículos automóveis industriais.

A locomotiva Coimbra foi construída tendo em vista a sua apresentação na Exposição de Paris de 1855, numa tentativa de encontrar outros mercados para além dos estados alemães.

Segundo a imprensa da época, a ferrovia francesa tentou, sem êxito, a sua aquisição, mas a mesma viria a adquirida por Portugal em 1856.

Tecnicamente, é semelhante aos motores construídos pela Egestorff para o estado de Hannover e para a Brunswick Railways, com uma caldeira de tráfego misto 2-4-0, de cilindros externos.

Esta locomotiva foi uma das utilizadas em 1856, na viagem inaugural dos caminhos de ferro em Portugal.

Inauguração do caminho de ferro em Portugal 1.JP

Inauguração do caminho de ferro em Portugal 2.jp

Inauguração do caminho de ferro em Portugal 3.jp

Viagem inaugural dos caminhos de ferro em Portugal. Na primeira imagem visualiza-se a locomotiva Coimbra.

Imagens acedidas em: https://www.bing.com/images/search?view=detailV2&ccid=D6J9AE9z&id

Posteriormente, foi convertida para a bitola larga. Desde antes de 1883, é desconhecido o seu paradeiro.

Bas, G. Texto adaptado de uma publicação em 29 de outubro de 2022, com a epígrafe Alguns pensamentos sobre motores portugueses antecipados (parte 2), acedida em:

https://www.facebook.com/groups/1614960195255335/permalink/...

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por Rodrigues Costa às 11:02

Terça-feira, 02.07.24

Coimbra: Albertino Marques, Sacrário do Seminário Maior 2

A estrutura de acesso ao interior do Sacrário da Capela do Seminário insere-se numa moldura e surge decorada com elementos relacionados com a Paixão de Cristo. No interior de um friso dourado retangular, rematado superiormente em hemiciclo pode observar-se a Cruz, que tem uma forte carga simbólica, sobrepondo a coroa de espinhos e os cravos.

Cruz, coroa de espinhos e cravos.jpgCruz, coroa de espinhos e cravos

A tradição cristã engrandece prodigiosamente o simbolismo da Cruz ao condensar nesta imagem a história da Salvação e da Paixão do Salvador e a iconografia utiliza-a tanto para expressar o suplício do Messias, como a sua presença. Onde está a Cruz, está o Crucificado.

Abaixo da Cruz podem ver-se duas palmas cruzadas que, de alguma forma, envolvem o crismon.

Palmas e crismon.jpgPalmas e crismon

A palma simboliza a vitória, a regeneração, a imortalidade e, para os cristãos, representa a Ressurreição de Cristo depois da Paixão. Por seu turno, o crismon é um importante símbolo da Igreja primitiva formado pelas letras gregas do nome de Jesus Cristo, isto é, XP. Na Idade Média foi substituído pelas três primeiras letras do seu nome IHS.

Enjunta e alfiz.jpgEnjunta a alfiz

A zona superior do Sacrário, a enjunta, ou seja, a zona triangular compreendida entre o friso semicircular superior e o alfiz (moldura que rodeia a frente da estrutura) encontra-se decorada com duas rosas estilizadas. Na iconografia cristã, a rosa simboliza tanto o cálice que recolhe o sangue de Cristo, como a transfiguração das gotas deste sangue, ou ainda se pode assumir como símbolo das chagas de Cristo.

Fechadura.jpgFechadura

No centro da porta, rodeia a fechadura uma fina grinalda.

Em suma, Mestre Albertino Marques bem podia sentir-se orgulhoso com o Sacrário que havia forjado e cinzelado, na sua oficina da Rua João Machado, para a Capela do Seminário Maior de Coimbra.

 

Sacrário da Capela do Seminário Maior de CoimbraSacrário da Capela do Seminário Maior de Coimbra

Anacleto, R. Albertino Marques. Sacrário do Seminário Maior de Coimbra. 2024. Texto inédito.

 

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por Rodrigues Costa às 19:08


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