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A' Cerca de Coimbra



Segunda-feira, 08.07.19

Coimbra: Conquistas e reconquistas

De como as Reis de Leão ganharão Coimbra, antes do Imperador D. Fernando, e de como se sustentou na Fé.

Antes que o Imperador D. Fernando Magno libertasse Coimbra, a ganhou aos infiéis D. Ramiro, Rei de Leão [770-850] e a tirou do poder de Haneh, Rei tyranno della.

Ramiro I de Leão.jpg

Ramiro I, Rei de Leão
Acedido em: http://www.barrosbrito.com/1386.html

Depois deste heroico Principe a conquistou outra vez D. Affonso, o Terceiro Rei de Leão [866-910]… quando castigou o traidor Vostisa.
Vindo sobre ela com hum grande exercito no anno do Senhor de 838, a 30 de Dezembro, dia da Trasladação do Apostolo Sant-Iago. Nesta batalha se achou com elle o Conde Hermenegildo seu parente, e seu Capitão General, de Nação Portuguez.

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Afonso III, o Magno
https://ww.alamy.com/stock-photo-afonso-iii-o-magno-tumbo-a-r-132573717.htm

Representação de Hermenegildo Guterres.jpg

Representação de Hermenegildo Guterres
Acedido em https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/69/Estacao_de_Rio_Tinto_Azulejo_07.jpg 

Mas logo foi conquistada por El-Rei Almaçor [938c.-1002], com que chegou a tal desventura, que sete annos esteve despovoada, e quasi arruinada, no fim dos quaes os Mouros a reedificarão.

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El-Rei Almanzor, acedido em
https://alchetron.com/Almanzor#demo

Busto_de_Almanzor_(26_de_marzo_de_2016,_Calatañaz

Busto de Almaçor em Algeciras de onde era natural
Acedido em https://pt.wikipedia.org/wiki/Almançor#/media/Ficheiro:Question_book-4.svg

…. Vendo-se seus nobres moradores deitados de suas casas, despojados dos sues patrimonios; mas de continuo alegres por terem suas Igrejas, e Mosteiros concedidos de E-Rei Alboacem, neto de Tarif, aquelle forte vencedor de Hespanha, que foi Senhor e Principe della. E toda a mais terra, que banha os rios Alva e Mondego. Hum deles foi de clérigos claustraes, que estava em Santa Justa, que o fez hum D. Rodrigo … Os mesmos Religiosos tinhão em S. Bartholomeu, que o dotou o Sacerdote Samuel a Lorvão nestes infelices dias.

… Aquelle bellicoso Rei Mouro Alboacem … que reinou prosperamente em Coimbra, inda que bárbaro, Principe clementíssimo, foi o que benignamente concedeo nova Lei, que os Catholicos, que estavão debaixo do seu Senhorio, tivessem Condes para com elles serem governados, conforme seus Institutos, e Fóros. E sendo Rei desta Cidade Marvam Ibenzorach, foi Conde della hum generoso varão, chamado Theodoro, descendentes dos Serenissimos Reis Godos.

Gasco, A.C. Conquista, Antiguidade, e Nobreza da mui Insigne, e inclita Cidade de Coimbra… Recolha de textos e notas por Mário Araújo Torres. 2019. Lisboa, Sítio do Livro. 51

 

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por Rodrigues Costa às 08:49

Quinta-feira, 04.07.19

Coimbra: Cernache, o concelho que foi a freguesia que é

A comunidade rural de Cernache … [é] desde 1836 mais uma das freguesias do concelho de Coimbra. Todavia, durante mais de quatro séculos gozou da prerrogativa de vila – sede de um concelho sem termo, que detinha a jurisdição cível e crime.

Livro onde está guardado o Foral de Cernache. AHM

Livro onde está guardado o Foral de Cernache. AHMC

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Livro do Foral de Cernache, fl.1 AHMC

Foral de Cernache.jpg

Foral de Cernache. AHMC

… A paisagem é marcada por largos vales de fundos aplanados, com vertentes muitas vezes em escadaria, onde facilmente se detecta a fertilidade dos solos, a abundância de água e a riqueza do espaço agrícola.
… A região envolvente de Cernache divide-se em duas partes distintas, contrastantes mas complementares. A ocidental é baixa, com largos fundos aluviais, onde as ribeiras entalham os seus leitos, sendo aqui que a acção humana mais se evidencia.
… Opondo-se a este pequeno mundo onde a água reina e o verde impera, surge-nos a serra, mais dura, agreste e seca.

Cernache Moinho das Lapas 1 a.JPG

Museu Moinho das Lapas

… Em setecentos, o elemento que dominava a paisagem era, sem dúvida, a água. As ribeiras que ainda hoje vão tomando o nome das povoações que nasceram nas suas margens (Ribeira de Cernache, Ribeira de Casconha, Ribeira de Pão Quente) e as múltiplas linhas de água que atravessam os campos até atingirem o Munda, actuaram não só como elementos definidores da paisagem agrária, ao permitirem as culturas de regadio e de estruturas transformadoras, mas também como elementos delimitadores do território dos poderes que aí eram exercidos.
… A origem e evolução medieva do regime senhorial neste “ilhéu” da periferia da cidade de Coimbra foi traçada por António de Oliveira num texto que passamos a citar dado o seu relevante conteúdo:
“Cernache pertencia a um dos muitos donatários que dividiam entre si o termo coimbrão – Fernão Vasques Pimentel - o primeiro que aparece como senhorio da vila”.
… Em 14 de Junho deste mesmo ano [1375], Coimbra toma posse da jurisdição cível de Cernache, aldeia do seu termo.
… Em 1417, pelo menos, Cernache com outros lugares, é dado a D. Pedro, duque de Coimbra, separado do termo desta cidade.
… D. Manuel I concedeu foral à vila, em 15 de Setembro de 1514.

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Monumento a Álvaro Anes de Cernache

… Álvaro Anes de Cernache, antes de partir para a batalha de Aljubarrota, fundou no seu solar, nesta vila, um hospital, que dotou com bens que seus pais ali deixaram, entregando a sua administração, bem como a dos respectivos rendimentos, à cidade de Coimbra. Por mercê régia, a “administração” e o “rendimento” do hospital, que estava na vila de Cernache, pertenciam à cidade e Câmara de Coimbra, recebendo o juiz de fora, vereador mais velho e escrivão municipal uma “ordinaria” pelas visitas anuais ao mesmo hospital. … O hospital e albergaria funcionaram até que, por força do decreto de 25 de Abril de 1821, este o fez voltar à coroa.

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Igreja Matriz de Cernache. Torre sineira

… O prior … que faz a abertura do livro de casamentos em 1738, já que aí deixa exarado:
“He hey ser costume nesta freguezia darem os noyvos de offerta quando se recebem huã guallinha e huã quarta de trigo; ou dizem que quatro bollos grandes de trigo, isto alem da offerta que lançarem elles e padrinhos quando se lhe der a beyjar o Senhor depois das bênçãos de que fiz esta lembrança”.

Já quando o pároco realizava o baptizado, que representa a entrada do neófito na comunidade cristã, regista no início do livro de baptismos:
“He estillo nesta fregesia dar de offerta de cada Baptizado huã quarta de trigo e huã guallinha e huã vella de cera branca, ou seis vintens per ella dando ao pároco, e isto alem da offerta que o padrinho quizer dar, ao qual pertence dar a vella, e a quarta de trigo e guallinha dam os pais do baptizado. E por verdade fis esta lembrança informado de pessoas antigas e por expriencia digo tenho recebido the hoje de Junho 7 de 1751”.

Figueira, A.S. A comunidade de Cernache. A governança municipal (1787-1834). Dissertação de Mestrado em História Moderna. 2009. Acedido em 2019.01.25, em https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/13483/1/Tese_mestrado_António%20Figueira.pdf

 

 

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por Rodrigues Costa às 16:57

Terça-feira, 02.07.19

Coimbra: Retábulo da Vida da Virgem, na Sé Nova

Os retábulos dos altares da Sé Nova formam um conjunto notável e raro que demonstra a evolução da talha desde os fins do séc. XVI até ao princípio do XVIII. Já aqui nos referimos ao retábulo barroco da capela de S. Tomás de Vila Nova. Quedamo-nos agora no que representa a Vida da Virgem, na segunda capela do lado direito, a seguir à porta da entrada.

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Sé Nova. Retábulo da vida da Virgem

Datará ele de cerca de 1676 e apresenta uma estética ainda claramente maneirista.
É uma bela composição arquitetónica, fazendo apelo a elementos clássicos. Divide-se em três panos verticais e três zonas em altura. Pares de colunas laterais, com entablamentos em avanços e recuos definem espaços preenchidos por relevos. São totalmente revestidas com motivos vegetalistas. O topo, em meia lua, para se adaptar à abóbada da capela, é preenchido por motivos decorativos envolvendo um medalhão oval com simples pintura alegórica, outrora um Pentecostes, de Josefa de Óbidos, que agora se encontra no museu Machado de Castro.

Sé Nova. Retábulo da vida da Virgem, pormenor. c

Sé Nova. Retábulo da vida da Virgem, pormenor

Sé Nova. Retábulo da vida da Virgem, pormenor da

Sé Nova. Retábulo da vida da Virgem, pormenor da predela

A predela do retábulo é ilustrada com três relevos baseados em gravuras do renascimento italiano. O Nascimento da Virgem é o mais pitoresco, com a parturiente numa cama de dossel, uma serva aquecendo a roupa e outras três dando banho à menina, enquanto S. Joaquim dorme recostado numa cadeira. Segue-se a Apresentação de Maria no templo e os Esponsais da Virgem com S. José, acompanhados, respetivamente de três figuras femininas e outras tantas masculinas.

Sé Nova. Retábulo da vida da Virgem, pormenor da

Sé Nova. Retábulo da vida da Virgem, pormenor da Coroação da Virgem

Mesmo um olhar menos experimentado notará que os relevos do andar superior não têm o mesmo nível de execução dos do inferior. O tema central do andar inferior é a Coroação da Virgem, de figuras delicadas e suaves, tanto da Virgem como da Trindade, como dos inúmeros anjitos envolventes, que formam uma auréola oval por sobre a Virgem. Nos intercolúnios laterais vêem-se a Assunção e a Anunciação. A Virgem da Assunção é criatura de graça recatada e pura, panejamentos naturais, bem talhados. O estreito espaço disponível obrigou o escultor a colocar o anjo da Anunciação quase na vertical, parecendo descer com sua mensagem sobre a Virgem recetiva, resultando numa cena de gracioso encanto.
A parte superior destes relevos laterais denota, porém, já mão de outro artista menos hábil. Será o mesmo dos relevos da parte superior, de figuras mais rígidas e tipificadas. O quadro central é dominado pela Senhora da Conceição e os laterais mostram a Sagrada Família e a Visitação a Santa Isabel.
O retábulo da capela fronteira, dedicado à Senhora do Pópulo ou Santo António é, sem dúvida, do mesmo escultor dos relevos da parte inferior da Vida da Virgem. Apresenta uma linguagem já protobarroca e tem como principal valor artístico a Assunção, plena de serena graciosidade.
Quem terá sido o escultor destas figuras vagamente aparentadas com a escultura castelhana contemporânea?
Não existe prova documental para este retábulo, mas outros indícios indicam o nome de Manuel da Rocha. Manuel da Rocha era original da região do Porto e veio estabelecer-se em Coimbra, cidade onde o trabalho não faltava para dotação dos colégios universitários que então ainda se erigiam. Casou em 1647 com uma filha de Manuel Tibau, outro escultor radicado em Coimbra. Em 1654 contratou fazer o retábulo da Senhora das Neves, antecessor do que agora se encontra na Sé. Faleceu em 30 de janeiro de 1676, sendo sepultado na igreja de S. João de Santa Cruz (hoje o Café), onde repousam também outros artistas de Coimbra, designadamente João de Ruão. A morte impediu-o de terminar o retábulo da Vida da Virgem, continuado talvez por um seu colaborador, donde a diversidade de execução que ficou saliente.
A capela apresenta um revestimento lateral de mármores polícromos almofadados que deixam livre espaço superior outrora ocupado por pinturas que agora se encontram noutro lugar da Sé. A sua linguagem encontra-se, por isso incompleta, mas as figuras de Manuel da Rocha continuam a encantar com o seu ar de repouso, de ventura íntima e serena tocada de ternura que, porque não?, continuam a encaminhar-nos à devoção.

Nelson Correia Borges. Correio de Coimbra, n.º 4744, de 20.06.2019

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por Rodrigues Costa às 10:34


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