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A' Cerca de Coimbra



Terça-feira, 19.06.18

Coimbra: A igreja de Santiago de Eiras

Às portas da cidade de Coimbra e da Bairrada se situa a antiga vila de Eiras.

Foi concelho extinto em 1836, com sua câmara, vereadores, juiz, escrivães, meirinhos e todas as usuais burocracias. Nos últimos tempos Eiras cresceu quase sem medida, encontrando-se praticamente ligada a Coimbra. Mas o seu centro histórico mantém carácter aprazível, detendo ainda um apreciável número de casas antigas, por vezes nem sempre bem intervencionadas, com trechos sugestivos e encantadores.

O largo principal é de fazer inveja a algumas cidades.

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Igreja de Santiago de Eiras

 Para ele voltam a fachada a igreja matriz, a fonte e a capela do Espírito Santo. Merece especial destaque o chafariz, ao lado da igreja, composição de grande efeito, mandado fazer por D. João V, em 1743. Lá se podem ver as armas do reino e o selo da vila, envolvidos no corpo central, rematado por pirâmides.

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 Fonte de Eiras

A igreja paroquial domina o largo, com a sua fachada monumental de duas torres, tendo, do lado oposto, a não menos interessante capela do Sacramento ou do Espírito Santo. É dedicada ao apóstolo Sant’Iago. Sobre a porta principal, entre o frontão curvo interrompido, vêem-se as armas reais, tendo, no escudete das quinas, gravada a legenda Vivat Rex Ioseph, que elucida a época da construção.

Trata-se de um edifício edificado na segunda metade do século XVIII para substituir a antiga igreja que, em 1721, ainda se encontrava fora da povoação e em estado de avançada degradação, no sítio hoje chamado Passal. O antigo templo remontava aos alvores da nacionalidade, pois fora mandado edificar por D. Afonso Henriques, sendo bispo de Coimbra D. Vermudo. Em 1306 D. Dinis concedeu ao mosteiro de Celas a vila de Eiras, por troca com a terça parte da vila de Aveiro, que as monjas detinham por doação da sua fundadora, Santa Sancha. Assim ficaram as monjas de Celas como donatárias da igreja e do território, cabendo-lhes a jurisdição cível e a apresentação do pároco.

Em dezembro de 1728 o cabido autorizou a demolição da velha igreja e construção da atual. Porém, o processo arrastou-se durante muitos anos, com incidentes vários que se podem ver na excelente monografia de João Pinho. Só por meados do século se teria iniciado a construção, com planta delineada por Gaspar Ferreira, virtuoso arquiteto e entalhador, com muitas obras espalhadas pela região e Beiras. A obra de pedraria foi arrematada por Manuel Francisco, de lugar de Sá (Esgueira). Em 13 de abril de 1758 foi benzida a parte da igreja que já estava capaz. O edifício deveria estar pronto no essencial em 1767, pois, em 19 de outubro desse ano, o carpinteiro Manuel Gonçalves contratou fazer toda a obra interior: retábulo da capela-mor, dois retábulos colaterais, dois retábulos no corpo da igreja, conforme planta e risco, com muita probabilidade também de Gaspar Ferreira, e ainda cinco portas, um púlpito e grades da comunhão.

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 Igreja de Santiago de Eiras interior

 Manuel Gonçalves não era um banal carpinteiro, pois sabemos da sua intervenção na feitura de outros retábulos, com riscos de Gaspar Ferreira e Domingos Moreira para as igrejas de Taveiro, S. Pedro de Coimbra e mosteiro de Lorvão. Era natural de Adães (Barcelos) e morador na rua da Trindade, em Coimbra.

No vasto espaço da nave única e luminosa desta igreja impressiona o conjunto dos retábulos marmoreados, numa unidade estilística deveras invulgar. De quatro colunas o principal e duas os restantes, todas de fuste liso e belos capitéis compósitos. Os remates, de movimentados frontões interrompidos, contrastam com as linhas calmas e clássicas dos corpos inferiores. Decoram-se com glórias solares, mas, no retábulo-mor, esta zona é obviamente enriquecida com figuras de anjos sentados, segurando palmas, e outros elementos. Rasga-se nele a boca da tribuna, outrora preenchida por uma tela com o martírio de Sant’Iago e agora exibindo o trono eucarístico de cinco degraus curvos.

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 Igreja de Santiago de Eiras imagem de S. Tiago

 Ainda se conservam algumas imagens, vindas da igreja antiga. De salientar é o Sant’Iago, no altar colateral esquerdo, boa e expressiva obra da renascença coimbrã.

O estilo retabular do rococó coimbrão, gerado a partir do retábulo de Santa Cruz, tem em Eiras um cunho deveras interessante, a merecer cuidados na sua preservação, porque expressão estética de uma época em que os artistas de Coimbra deixaram a sua marca em todo o centro do país.

Nelson Correia Borges

 

In: Correio de Coimbra, n.º 4695, de 07 Junho 2018, p. 8.

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por Rodrigues Costa às 10:12


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