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Muitas pestes afligiram Portugal no século XVI. A de 1569 matou gentes e causou terrível fome.
Uma cidade se mostrou disposta a acolher pobres e esfomeados: Coimbra. Os seus habitantes tinham fama de serem caridosos, como se a Rainha Santa ainda por lá andasse, a espalhar cuidados, a socorrer necessitados. Até a própria Câmara contraiu grandes dívidas para poder acudir a tanta miséria. De toda a parte afluíam carenciados. Os pobres pagaram-lhe, dando a Coimbra o nome de Cidade Santa – título honroso que ela poderia ostentar, mas que resolveu esquecer.
Cidade Santa, o seria de há muito, desde os primórdios, desde as enceladas da ponte, a virtuosa D. Mor Dias, os nus das procissões de penitência – e tantas se faziam! Santa, sim, mas pelos seus filhos.
Entre os filhos de Coimbra há uma legião de homens e mulheres ilustres, cuja enumeração se tornaria fastidiosa, além de despropositada. A lenda e a história trazem-nos, no entanto, memórias de figuras aureoladas pela santidade, que na cidade nasceram ou nela passaram parte da sua vida, em muito contribuindo para aumentar o perfume da poesia que Coimbra exala.
Coimbra tem também a sua mártir lendária, em tempos longínquos do imperador Aureliano: Santa Comba.
Santa Comba, imagem atribuída a Mestre Pêro existente no Museu Nacional Machado de Castro
Filha de gente ilustre, foi instruída na fé cristã por uma ama, contra a vontade de seu pai. Donzela feita, é pretendida para esposa por um príncipe vizinho, mas ela tinha escolhido consagrar-se a Deus, e perante a pressão que lhe era feita, preferiu fugir de casa e ir refugiar-se no bosque, onde uma pastorinha lhe indicou uma gruta para esconderijo. O príncipe é que não desarmou. Lançou o fogo aos matos, até descobrir a gruta. Vendo-se assim desprotegida, Comba pediu a Deus «que lhe mudasse a formosura de modo que, ou não fosse conhecida, ou desagradasse tanto ao príncipe que antes quisesse tirar-lhe a vida do que violar a sua castidade». Deus opera a metamorfose e o príncipe, despeitado, ficou-lhe com tal ódio que a mandou açoitar e crucificar numa árvore, que a tradição diz ser uma oliveira. Assim costuma ser representada a sua imagem.
Santa Comba de Celas
Muitos anos mais tarde foi o corpo encontrado no local. Construíram aí uma ermida.
Borges, N. C., 1987. Coimbra e Região, Lisboa, Presença, p. 61-62.
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