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No âmbito da sua música regional e local, Coimbra sempre foi um «caldeirão de culturas», fruto do cruzamento de diversas práticas musicais oriundas de diferentes regiões do País e do Estrangeiro que, uma vez na cidade, conviviam com duas culturas musicais autóctones mas reciprocamente influenciáveis: a «popular», não só proveniente do mundo rural que de Coimbra estava próximo, mas, igualmente, do próprio povo da cidade; e a «erudita», proveniente de outros grupos sociais que habitavam o velho casco urbano, tais como a «burguesia» e alguma «nobreza».
Estas danças e cantares estão na génese de uma música, assimilada e recriada pelo povo de Coimbra que, no fundo, transmitia algo de si e assim a divulgava, qual marca própria, local, daqueles que a cultivavam – a «Música Tradicional de Coimbra» – constituída por um repertório de «canções de trabalho, cânticos de embalar, cantigas de amor, baladas, trovas, noturnos, descantes, romances», canções relacionadas com o «Sagrado», o «Religioso» e o «Natal», etc., divulgadas pela cidade em festas e romarias e nas «fogueiras do S. João» – uma manifestação etno-musical que em Coimbra remonta, pelo menos, ao século XV – onde as «tricanas» (mulheres do povo de Coimbra e dos arredores) e os «futricas» (habitantes da cidade não-académicos) cantavam e dançavam e onde os estudantes (os “sacos de carvão” na gíria popular) marcavam presença, nem sempre muito pacífica nas suas relações com os populares.
As danças das fogueiras chamavam-se «modas», dançadas em roda – as «danças de roda» – com mandador e com uma coreografia muito simples à volta de um mastro central onde se situavam os tocadores, os cantadores e as cantadeiras. A partir da década de 70 do século XIX, surgiram fogueiras com um estrado – «pavilhão» – onde, numa salutar rivalidade musical, atuavam ranchos de diversos bairros da cidade que previamente ensaiavam e bailavam um repertório criado para esse tempo de folguedos com base em «cantigas, marchas, barcarolas» e “alguns fados para as fogueiras” – os «fados coreográficos» – que, como estrutura e modelo de dança, mais não eram do que músicas populares locais cantadas e dançadas de roda, em ambiente de grande ruralidade – que Coimbra sempre foi – e ligadas a primitivas formas de cança que estão na base do «Folclores de Coimbra».
A Música Tradicional de Coimbra tinha como instrumentos tradicionais do seu toque, o «machinho» (espécie de cavaquinho), o «bandolim», a «guitarra», o «violão» (que na gíria popular da cidade dava pelo nome de “bacalhau”), o «cavaquinho», o «violino», a «rabeca», a «flauta» e a «viola toeira» (principal instrumento popular de Coimbra no século XIX), entre outros.
A partir dos anos 20/30 de Oitocentos, Coimbra, cidade de fortes tradições musicais, viu, incluído no seu repertório, vários géneros musicais oriundos da Europa e da América do Sul, como sejam a «valsa», a «sonata», o «tango», a «polca», a «mazurca», o «lundum», o «lied», etc., dos quais absorveu o suficiente para a criação de novas sonoridades, mas sempre matricialmente identificáveis com a toada regional e local da cidade.
Cravo, J. 2012. Os Salatinas e a Música Tradicional de Coimbra. In: Músicos Salatinas. 1880-1947. Exposição Fotográfica e Documental. Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra, pg. 17
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